EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE SEGURO. REEMBOLSO DE DESPESAS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA E/OU HOSPITALAR. PRÊMIO. OBRIGAÇÃO DO SEGURADO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. - Em um contrato de seguro, repartem-se os ônus: a seguradora assume os riscos futuros e o segurado paga o prêmio. Assim, a obrigação do segurado em pagar um prêmio, para ser beneficiado por um contrato de seguro, é imposição legal. E o prêmio é devido, mesmo se não se verificar o sinistro ou não se utilizar o seguro. - Tratando-se de obrigação contratual, a correção monetária e os juros incidem desde a data do vencimento.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0134.05.059794-4/001 - COMARCA DE CARATINGA - APELANTE(S): NUTRICIA S/A PRODUTOS DIETETICOS NUTRICIONAIS PRIMEIRO(A)(S), BRADESCO SAUDE S/A SEGUNDO(A)(S) - APELADO(A)(S): BRADESCO SAUDE S/A, NUTRICIA S/A PRODUTOS DIETETICOS NUTRICIONAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO BERNARDES
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO À PRIMEIRA APELAÇÃO E DAR PROVIMENTO À SEGUNDA.
Belo Horizonte, 25 de setembro de 2007.
DES. PEDRO BERNARDES - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. PEDRO BERNARDES:
VOTO
Cuida a espécie de duas apelações cíveis, interpostas por Nutrícia S/A - Produtos Dietéticos Nutricionais e por Bradesco Saúde S/A contra a sentença de fls. 84-86, proferida nos autos de Ação Ordinária de Cobrança ajuizada por Bradesco Saúde S/A, julgando procedentes os pedidos iniciais, condenando a primeira apelante a pagar à segunda recorrente a quantia de R$18.813,76 (dezoito mil, oitocentos e treze reais e setenta e seis centavos), com juros de 1% ao mês a contar da citação e correção monetária a partir do ajuizamento da ação, condenando, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, devidamente atualizado.
Nas razões de fls. 89-92, a apelante Nutrícia S/A - Produtos Dietéticos Nutricionais alega que não restou demonstrado nos autos a prova do débito, ou seja, a prova de que houve prestação de Serviços de Reembolso de Despesas de Assistência Médica e/ou Hospitalar a todos os funcionários da recorrente; que deveria haver cobrança relativa à proporção daqueles que eventualmente tenham usufruídos dos serviços; que a apelada não apresentou nota fiscal dos serviços prestados e emitiu unilateralmente boletos bancários; que os documentos apresentados pela apelada são controles internos, que não servem para o deslinde da causa; que não compete à apelante a prova negativa da não prestação de serviços; que a correção monetária deve incidir a partir da decisão e não do ajuizamento da ação.
Ao final, requer a primeira apelante seja reformada a sentença monocrática, para julgar improcedentes os pedidos iniciais ou para determinar outro termo da incidência da correção monetária.
Nas razões de fls. 96-103, a apelante Bradesco Saúde S/A alega que a incidência da correção monetária se dê a partir do vencimento das faturas e não a partir do ajuizamento da presente ação; que a correção monetária representa a reposição do valor da moeda, em nada aumentando a dívida; que incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo; que a incidência de juros moratórios deve ocorrer a partir da data do evento danoso, ou seja, do desembolso da Cia Seguradora e, não, a partir da citação.
Ao final, requer a segunda apelante seja reformada em parte a sentença monocrática, para determinar que a incidência da correção monetária e dos juros seja a partir do desembolso.
Em contra-razões (fls. 108/113), alega a apelada Bradesco Saúde S/A, em breve síntese, que carreou aos autos todos os documentos necessários para a comprovação do vínculo contratual e da inadimplência da apelante; que caberia à recorrente juntar aos autos os recibos comprobatórios do pagamento dos prêmios relativos aos meses reclamados; que o termo inicial da incidência de correção monetária e juros deve ser fixado a partir dos respectivos vencimentos das faturas representativas dos prêmios devidos pela apelante. Ao final, requer o não acolhimento do recurso, mantendo-se na íntegra a r. sentença do juízo a quo.
Também em contra-razões (fls. 124/126), alega a apelada Nutrícia S/A - Produtos Dietéticos Nutricionais, em breve síntese, que a correção monetária e os juros devem incidir a partir da decisão e, não, a partir do ajuizamento ou do vencimento das faturas, pois causaria prejuízo à apelada. Ao final, requer o não acolhimento do recurso.
Preparos devidamente efetuados pela primeira apelante às fls. 93 e pela segunda apelante às fls. 104/105.
Conheço dos recursos, pois presentes os pressupostos de admissibilidade.
Inicialmente, registre-se que ambos os recursos, interpostos pelas partes, serão analisados conjuntamente, em virtude de as matérias discutidas estarem interligadas.
A primeira apelante alega que não restou demonstrado nos autos a prova do débito, ou seja, a prova de que houve prestação de Serviços de Reembolso de Despesas de Assistência Médica e/ou Hospitalar a todos os funcionários da recorrente; que deveria haver cobrança relativa à proporção daqueles que eventualmente tenham usufruídos dos serviços; que a apelada não apresentou nota fiscal dos serviços prestados e emitiu unilateralmente boletos bancários; que os documentos apresentados pela apelada são controles internos, que não servem para o deslinde da causa; que não compete à apelante a prova negativa da não prestação de serviços.
Entendo que razão não lhe assiste.
Trata-se de Ação de Cobrança de prêmio não pago, relativo a contrato de seguro saúde.
Na petição inicial, assim narrou os fatos a seguradora (fls. 03):
"A Cia. Seguradora, ora Autora, celebrou com a Ré contrato de seguro de Reembolso de Despesas de Assistência Médica e/ou Hospitalar, apólice nº 33803, com data de vigência a partir de 13 de março de 1998, tendo como objetivo cobrir as despesas médicas e/ou hospitalares ao segurado titular ou a seus dependentes incluídos no seguro, dentro das cláusulas dispostas nas condições gerais.
Desta feita, durante os meses de novembro e dezembro de 2003, bem como janeiro de 2004, os beneficiários do contrato contaram com o atendimento da Cia. de Seguros, porquanto a Requerida deixou de efetivar o pagamento dos prêmios dos mencionados períodos, conforme demonstram as faturas anexas.
Assim sendo, a requerida não cumpriu com sua obrigação determinada no contrato, que era o pagamento dos prêmios até a data do respectivo vencimento da fatura, sob pena de suspensão da cobertura garantida pela autora, tal como estabelece a cláusula décima quinta das condições gerais da apólice."
Estabelece o artigo 1.432, do Código Civil/1916:
"Artigo 1.432 - Considera-se contrato de seguro aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante a paga de um prêmio, a indenizá-la do prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato."
No mesmo sentido, estabelece o artigo 757, do Código Civil/2002:
"Artigo 757 - Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados."
Assim, a obrigação do segurado em pagar um prêmio, para ser beneficiado por um contrato de seguro, é imposição legal. A respeito do prêmio, ensina Sílvio de Salvo Venosa, in "Direito Civil", volume terceiro - Contratos em Espécie, 3ª edição, editora Atlas, São Paulo, 2003, página 390:
"Cuida-se da remuneração do segurador. Com o montante global dos prêmios arrecadados, o segurador forma o fundo que possibilita sua atuação no mercado securitário."
Aliás, esse é o entendimento do extinto 2º Tribunal da Alçada Civil do Estado de São Paulo:
"SEGURO DE VIDA E/OU ACIDENTES PESSOAIS. PRÊMIO E INDENIZAÇÃO. CONCEITOS. - O prêmio representa o valor que o segurado paga, direta ou indiretamente, à seguradora, como compensação da responsabilidade que ela passa a assumir pelos riscos. É, em termos mais simples, a prestação do segurado para consolidação do contrato de seguro. Indenização consiste no valor sobre responsabilidade da seguradora para ressarcimento dos danos sofridos pelo segurado" (2º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo - Apelação Cível 658.822-00/7 - 28/05/2003 - Rel. Juiz Irineu Pedrotti. - Cfr. Informa Jurídico, CD-ROM n. 40 - outubro-dezembro/2005).
Portanto, quando se estabelece um contrato de seguro, repartem-se os ônus: a seguradora assume os riscos futuros e o segurado paga o prêmio. Em alguns casos, como o dos autos, o prêmio é parcelado, conforme prevê o contrato firmado entre as partes, in verbis:
Apólice, fls. 07:
"Desde que o prêmio mensal seja pago de acordo com a legislação em vigor. Os prêmios mensais subseqüentes, enquanto vigorar este contrato e suas cláusulas, serão pagos de conformidade com as disposições legais."
Contrato, condições gerais (fls.37/38):
"15 - Pagamento de Prêmio, Suspensão da Cobertura e Cancelamento da Apólice
Os prêmios devidos por este seguro deverão ser pagos em parcelas mensais, através dos bancos indicados, devendo a primeira parcela ser paga na assinatura da proposta, e as demais, nas datas de seus vencimentos. Em caso de não-aceitação da proposta, o prêmio pago antecipadamente será devolvido ao proponente, corrigido conforme legislação em vigor."
E os boletos de fls. 11/13 comprovam o débito da segurada, primeira apelante, com a seguradora, segunda apelante, referente aos meses de novembro e dezembro de 2003 e janeiro de 2004.
Diz, ainda, a primeira apelante que não há prova de que houve prestação de Serviços de Reembolso de Despesas de Assistência Médica e/ou Hospitalar a todos os funcionários da recorrente; que deveria haver cobrança relativa à proporção daqueles que eventualmente tenham usufruídos dos serviços; que a apelada não apresentou nota fiscal dos serviços prestados e emitiu unilateralmente boletos bancários; que os documentos apresentados pela apelada são controles internos, que não servem para o deslinde da causa.
Razão não assiste à primeira recorrente.
Ora, o prêmio é devido, mesmo se o segurado não utilizar o seguro. Nesse sentido, é a lição de Silvio de Salvo Venosa, obra citada, página 389:
"Prêmio é o pagamento de valor feito pelo segurado, devido independentemente da contraprestação do segurador."
Aliás, estabelece o artigo 1.452, do CC/1916:
"Artigo 1.452 - O fato de se não ter verificado o risco, em previsão do qual se fez o seguro, não exime o segurado de pagar o prêmio, que se estipulou, observadas as disposições especiais do direito marítimo sobre o estorno."
No mesmo sentido, estabelece o artigo 764, do CC/2002:
"Artigo 764 - Salvo disposição especial, o fato de se não ter verificado o risco, em previsão do qual se faz o seguro, não exime o segurado de pagar o prêmio."
Assim, mesmo se não houvesse contraprestação, apesar de a seguradora ter provado que houve contraprestação, conforme documentos de fls. 14/20, o prêmio seria devido.
Portanto, como a autora, ora segunda apelante, comprovou fato constitutivo de seu direito, caberia à ré, ora primeira recorrente, ter provado a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, nos termos do artigo 333, do Código de Processo Civil. Como não se desincumbiu de seu ônus, é de se negar provimento a seu recurso.
Quanto à correção monetária, alega a primeira apelante que deve a correção incidir a partir da decisão e não do ajuizamento da ação, conforme determinou o Magistrado de primeiro grau em sua sentença. Também alega a segunda apelante que a incidência da correção monetária se dê a partir do vencimento das faturas.
Entendo que razão assiste à segunda apelante, devendo incidir correção monetária a partir do vencimento das faturas.
Ressalte-se que doutrina e jurisprudência entendem que a correção monetária nada acrescenta ao direito, não é um plus que se adiciona, sendo apenas uma correção em decorrência da corrosão do poder aquisitivo da moeda, provocada pela inflação.
Nesse sentido, Theotônio Negrão, in "Código de Processo Civil e legislação processual em vigor", editora Saraiva, 35ª edição, 2003, nos comentários ao artigo1º, da Lei 6.899, de 08 de abril de 1981, que dispõe sobre a correção monetária, colaciona:
"A correção monetária não constitui parcela que se agrega ao principal, mas simples recomposição do valor e poder aquisitivo do mesmo. Trata-se, apenas, na verdade, de nova expressão numérica do valor monetário aviltado pela inflação. Quem recebe com correção monetária não recebe um 'plus', mas apenas o que lhe é devido, em forma atualizada. (JTA 109/372)."
Assim, deve incidir correção monetária a partir do vencimento de cada fatura, pois constitui simples recomposição do valor de cada obrigação.
Alega, ainda, a segunda apelante que a incidência de juros moratórios deve ocorrer a partir da data do evento danoso, ou seja, do desembolso da Cia Seguradora e, não, a partir da citação.
Os juros são um rendimento que recai sobre o capital. E juros moratórios correspondem a um rendimento do capital, por não ter sido este capital entregue na data convencionada.
A respeito, estabelece o artigo 397, do Código Civil/2002, in verbis:
"Artigo 397 - O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.
Parágrafo único - Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial."
Ressalte-se que o caput do citado artigo trata do inadimplemento de obrigações com termo certo, em que a mora é ex re.
A respeito, Sílvio de Salvo Venosa, in "Direito Civil", volume 2 - Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, 3ª edição, editora Atlas, São Paulo, 2003, página 240, ensina:
"Quando a obrigação é líquida e certa, com termo determinado para o cumprimento, o simples advento do dies ad quem, do termo final, constitui o devedor em mora. É a mora ex re, que decorre da própria coisa, estampada no artigo 960 antigo e no caput do artigo 397 do novo Código."
Considerando-se que no caso há data previamente ajustada para o cumprimento da obrigação, bem como que a obrigação é líquida, conforme boletos de ff. 11/13, tem-se que a primeira apelante foi constituída em mora tão-logo ocorrido o termo, configurando-se hipótese de mora ex re.
Assim, os juros são devidos a partir da data do inadimplemento.
Com estas razões, NEGO PROVIMENTO à primeira apelação, interposta por Nutrícia S/A - Produtos Dietéticos Nutricionais, e dou PROVIMENTO à segunda apelação, interposta por Bradesco Saúde S/A, para determinar a incidência da correção monetária e de juros de mora a partir do vencimento de cada fatura. Quanto ao mais fica mantida a r. sentença.
Custas de ambos os recursos pela primeira recorrente.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): TARCISIO MARTINS COSTA e JOSÉ ANTÔNIO BRAGA.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO À PRIMEIRA APELAÇÃO E DERAM PROVIMENTO À SEGUNDA.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0134.05.059794-4/001
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Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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