Não é incomum que o indiciado durante o Inquérito Policial e especialmente em casos de Prisão em Flagrante venha a negar o fornecimento de dados qualificativos ou mentir sobre eles, especialmente quando já tem vastas passagens criminais anteriores e, especialmente, quando já é procurado pela Justiça devido a Mandado de Prisão pendente. O Direito Material incrimina ambas as condutas. A negativa do fornecimento de dados qualificativos constitui Contravenção Penal prevista no artigo 68, LCP. Por seu turno, o fornecimento de dados falsos pode configurar o crime de Falsa Identidade, conforme consta do artigo 307, CP, isso se o infrator não se utilizar de documentos falsos, quando então incidirá no artigo 304, CP. Há considerável corrente doutrinária apontando para a não incidência dos dispositivos supra mencionados quando o indiciado ou réu assim age para evitar sua responsabilização criminal pessoal, alegando-se legítimo exercício da autodefesa.
Entende-se que a autodefesa somente abrange os questionamentos sobre os fatos em apuração e jamais a identificação do envolvido, mesmo porque, a ser assim, estar-se-ia admitindo a licitude da incriminação de terceiros inocentes para que alguém se livre de imputação, o que não pode ser legítimo nem mesmo para um advogado, constituindo, sem a menor dúvida, crime de denunciação caluniosa (artigo 339, CP). Quanto à sua qualificação o investigado ou réu não tem direito de mentir e nem mesmo de silenciar. Não está acobertado pela autodefesa e nem mesmo pelo Direito ao Silêncio e à não autoincriminação, pois que não se versa sobre o tema em discussão nos autos e sua conduta pode perfeitamente vir a atingir terceiros inocentes. Pense-se no caso de indivíduo que fornece a qualificação de irmão inocente, é condenado, foge e depois ocasiona a prisão do próprio irmão.
Sobre o tema decidiu recentemente o STF, no RE 640.139, consignando que a “autodefesa não protege apresentação de falsa identidade”. O relator, Ministro Dias Toffoli, asseverou que “a apresentação de identidade falsa perante autoridade policial com objetivo de ocultar maus antecedentes é crime previsto no Código Penal (artigo 307) e a conduta não está protegida pelo princípio constitucional da autodefesa (artigo 5º., LXIII, da CF/88)”. O “decisum” não é inédito, apenas reafirmando a jurisprudência já firmada pela Corte Suprema. Além disso, essa decisão do STF veio a alterar o posicionamento do STJ sobre o tema, que era no sentido de reconhecer o legítimo exercício da autodefesa. Após a consolidação do entendimento no STF, o STJ no HC 151.866/RJ, 5ª. Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 09.12.2011, DJ 13.12.2011, decidiu que não há mais como sustentar a atipicidade da conduta da falsa identificação como exercício da ampla defesa. O Ministro Mussi afirmou que “o uso de identidade falsa não encontra amparo na garantia de permanecer calado, tendo em vista que esta abrange somente o direito de mentir ou omitir sobre os fatos que são imputados à pessoa e não quanto à sua identificação”. Para o relator, “o princípio constitucional da autodefesa não alcança aquele que se atribui falsa identidade perante autoridade policial com o objetivo de ocultar maus antecedentes”. No alinhamento com a posição do STF, afirmou-se ainda que, “embora o direito à liberdade seja importante garantia individual, seu exercício não é absoluto e encontra barreiras em normas de natureza penal”. Consigne-se ainda que o artigo 313, Parágrafo Único, CPP, ao permitir, a partir da Lei 12.403/11, a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, está a indicar que o direito ao silêncio não abarca realmente os dados qualificativos, mas tão somente a matéria de fato.
REFERÊNCIAS
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