JOAO MACIEL CLARO, Delegado Coordenador de Proteção ao Meio Ambiente e Animal da PCDF.
Após 4 anos de espera, expectativas e eventos fortuitos, em dezembro de 2023 a Polícia Civil do Distrito Federal – PCDF, iniciou o processo de posse dos novos Agentes e Escrivães de Polícia aprovados no último certame. O tão esperado aumento do efetivo veio com uma novidade: é a primeira vez que a instituição adota o sistema de cotas para o ingresso de negros em seus quadros. Das 1490 vagas oferecidas aos dois cargos, 20% foram destinadas a negros, conforme preceitua a Lei 12.990/2014 – a chamada lei de cotas no serviço público.
O certame teve seu edital publicado em 2019 e contou com alguns obstáculos: epidemia da COVID-19, falta de previsão orçamentária e várias interrupções judiciais. Ao final, segundo dados do CEBRASPE: das 285 vagas aprovadas para o cargo de escrivão, 45 foram preenchidas por negros; das 1240 vagas para agentes considerados aptos, 247 foram ocupadas por pretos e pardos. É uma nova roupagem da Polícia Judiciária da Capital da República, que teve sua origem em 1808, com a criação da Intendência Geral. Instituição que em tempos não muito remotos do ponto de vista histórico prestou-se a caçar e a castigar negros que fugiam dos seus senhores, prendendo capoeiras, mendigos e vadios em uma época em que, aos afrodescendentes, era negado acesso à educação, ao trabalho e à comida.
Segundo o censo de 2022, o Brasil assimila em sua população: 43,5% de Brancos e 45,7% de Negros. A maior população negra do mundo, precedida apenas pela da Nigéria. A mesma pesquisa indigita o Distrito Federal como um território de população predominantemente negra, sendo 40% de sua população constituída de brancos e 59,4% de pretos e pardos. Entretanto, mesmo com essa quantificação, segundo o historiador Guilherme Lemos (que utilizou em sua pesquisa dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE), o DF é uma das cidades que mais segrega do mundo, superando Emufuleni, na África do Sul, local em que por anos vigorou a política do apartheid.
O DF é majoritariamente branco na sua região central e negro nas demais regiões administrativas, principalmente nas áreas periféricas, onde se concentram: baixos salários, desemprego, violência e, por conseguinte, onde a presença policial é crucial. A política de cotas no ambiente policial é uma forma de reparação do Estado para com a comunidade negra, proporcionando uma representação mais diversificada dos agentes encarregados da aplicação da lei, um dos serviços mais sensíveis às suas necessidades. No âmbito institucional, a presença de policiais negros também trará o desafio de desenvolver políticas antirracistas para melhorar a qualidade do já eficiente serviço.
Levantamento realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudo – DIEESE, constatou que o funcionalismo público brasileiro não refletia a diversidade de seu povo. Segundo o estudo, do total de 519.369 servidores públicos federais, apenas 30% eram negros; além de pouca representatividade, os negros exercem posição de menor relevo e com menores salários. O aumento gradual na participação de negros nos últimos anos indica um progresso, mas ainda há muito a ser feito para alcançar uma verdadeira representatividade e equidade.
É tempo de promover uma nova cor ao serviço público brasileiro e dar um basta a exemplos únicos e solitários que romperam as barreiras do racismo estrutural e ocuparam espaços, até então, embranquecidos. Há uma espera para o próximo concurso de Delegado de Polícia, que fará com que mais negros ocupem cargos diretivos. É a PCDF atuando e se aperfeiçoando na agenda ESG racial, ou seja, nas práticas ambientais, sociais e de governança, que se amoldam aos princípios da impessoalidade, moralidade e eficiência do serviço público. É uma diretriz que tem o fito de, internamente, letrar os policiais e ofertar um atendimento e um serviço mais eficientes à população do DF, principalmente à mais carente, que tem cor e, em parte, vive na dor.
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