A imprensa noticiou nos últimos dias a sanção pelo presidente em exercício José Alencar da Lei nº 11.785 que altera o parágrafo 3º do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor, como se estivéssemos diante de uma grande inovação legislativa favorável ao consumidor, tal como as recentes normatizações de qualidade aos atendimentos nos telemarketings.
O Código de Defesa do Consumidor Brasileiro é elogiado por todo o meio jurídico, sendo referência internacional. Seu texto foi redigido na melhor técnica legislativa e buscou com o uso adequado do vernáculo cercar todos os atos que pudessem causar prejuízo ao consumidor. Formas de atuação das empresas, clareza das ofertas, qualidade dos produtos, responsabilidades pelos reparos e prazos para que sejam feitos, inversão do ônus da prova, dentre inúmeros beneplácitos garantiram ao cidadão hipossuficiente na relação de consumo uma proteção legal que o coloca em igualdade no trato com a empresa.
Quanto aos contratos de adesão, estabeleceu o CDC formas de elaboração e requisitos mínimos para configurar a boa-fé objetiva, ou seja, a demonstração exterior de que não há intenção prévia de lesar a parte aderente. Tais requisitos foram bem delineados pelas expressões: termos claros, caracteres ostensivos e legíveis.
Com essa imposição legal já era permitido aos órgãos fiscalizadores exercer seu dever de autuar as empresas que não obedecerem tais preceitos. E assim vinha sendo feito pelos “PROCONS”, muitos dos quais obtiveram êxito invejável ao forçar grandes grupos econômicos a reformularem todos seus contratos, adequando à legislação para evitar sanções pecuniárias cada vez maiores.
Ótimo. Lei é isso. Determina o certo e quem fizer o contrário é punido. Não há como criar lei que impeça o ato delituoso na nascente. Por essa razão ao Estado cabe o exercício de seu poder de polícia e jurisdicional, punindo civil e criminalmente aqueles que descumprirem seus preceitos.
Bem o disposto no até então vigente parágrafo 3º do artigo 54 estava suficiente, cabendo ao Estado fiscalizar seu cumprimento, punindo conforme o caso. Incluir no texto legal o tamanho da fonte a ser utilizada, não impedirá a existência de contratos de adesão de difícil leitura, visto que são inúmeros os tipos de fonte de texto, muitas delas tão pequenas que o tamanho 12 ainda seria ilegível e outras cujo tamanho 10 têm proporções quase garrafais para a leitura.
Pior ainda é que a inserção do tamanho mínimo no texto legal poderá servir às empresas para descumprir o preceito primordial da lei, que era facilitar a compreensão pelo consumidor. Agora, poderão usar fonte cujo tamanho 12 seja extremamente reduzido e ao serem autuados poderão alegar que estão cumprindo a lei, vez que ao estabelecer um “tamanho padrão” sem estabelecer o tipo de fonte, permitiu o legislador a conclusão pelo cidadão de que referido tamanho uma vez utilizado presume ser o contrato de fácil compreensão, porquanto há “presunção de ostensividade”.
O deputado Nelson Goetten, relator do projeto na Comissão Consumerista da Câmara dos Deputados, ao justificar a alteração disse:
Ocorre que, com freqüência, tais contratos são redigidos com caracteres minúsculos, que dificultam uma leitura clara e compreensível de suas cláusulas, acarretando, não raras vezes, prejuízos ao consumidor.
Bastava, data vênia, cobrar dos órgãos a devida fiscalização, concedendo a eles estrutura de trabalho adequada com recursos suficientes e aí sim impedir-se-ia tentativas de lesão ao consumidor. Claro que aprovar orçamento demanda muito mais empenho dos parlamentares do que ocupar-se de projetos que por mais que tenham um fim digno, acabam tornando-se prejudiciais ao cidadão, pela não utilização de boa técnica legislativa.
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