A Lei Estadual 5680/87 vem à lume para instituir o mês de novembro como o mês da “Consciência Negra” e em seguida surge a Lei 7968/92, estabelecendo o dia 20 de novembro como o “Dia da Consciência Negra”. Portanto, no decorrer desse mês e especialmente neste dia é direito e dever de todos e especialmente dos integrantes da raça negra a divulgação e prestígio da cultura negra.
Visando essa divulgação e prestígio, determina a legislação sobredita a veiculação de informações, o estudo e o debate sobre a origem dos povos, conflitos, os efeitos da colonização e independência do continente africano, seus mártires, a contribuição da cultura negra na formação e desenvolvimento de nosso país e a situação atual dos povos e seus descendentes na África, no Brasil e no restante do globo. Essa é a temática geral a ser enfocada nos eventos promovidos no mês de novembro e principalmente no dia 20 de novembro anualmente.
Sem dúvida, um dos aspectos relevantes para a formação e cultivo de uma verdadeira “Consciência Negra”, além do conhecimento histórico, sociológico e cultural, é a promoção do conhecimento jurídico que garante aos povos negros no Brasil seus direitos e a promoção da igualdade formal e material entre as raças.
Todo o processo de conquista de direitos passa por um círculo virtuoso entre a conscientização ou descoberta desses direitos, sua instituição jurídica através de leis e finalmente a aplicação concreta dessas leis no retorno à efetiva consciência de sua validade e necessidade, tornando o exercício desses direitos realmente efetivo. Esse círculo é que, estando completo, garante a efetivação de direitos reconhecidos como naturais ao homem. De nada adianta conhecer esses direitos naturais, sem que sejam instituídas leis que os defendam e, principalmente, sem que a consciência desses direitos se materialize na efetiva aplicação dessas normas protetivas.
É por isso que o cultivo da consciência negra é importante e assume especial relevância a conscientização dos povos negros e de toda a sociedade acerca das normas legais que tutelam em nosso país a igualdade racial.
Os diplomas legais, desde a Constituição Federal, passando pelas leis federais ordinárias e chegando à legislação estadual visam promover uma chamada “discriminação positiva”, instituindo um tratamento privilegiado aos povos negros e à sua cultura, em compensação pela história de exploração e de “discriminação negativa”, bem como exclusão social.
Com vistas à mencionada necessidade de consciência quanto às normas legais referentes ao tema, se passará a um breve panorama sobre os dispositivos de interesse.
Inicia-se, como não poderia deixar de ser, pela Constituição Federal de 1988, lei maior da nação brasileira à qual todas as demais normas devem respeito hierárquico:
A nossa Constituição, logo em seu Título I, ao tratar dos “Princípios Fundamentais”, estabelece que o Brasil é um “Estado Democrático de Direito”, sendo de se destacar neste contexto os fundamentos desse Estado Democrático referentes à “cidadania”, “dignidade da pessoa humana” e do “pluralismo”.
Em seguida, em seu artigo 3º., passa a delinear os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Dentre eles destacam-se no contexto da igualdade racial: “construir uma sociedade livre, justa e solidária”; “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” e, especialmente, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Finalmente, o artigo 5º., da Constituição Federal estabelece em seu “caput” que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Esse é o denominado “Princípio da Igualdade ou Isonomia” que veda qualquer “discriminação negativa”, ou seja, que venha a prejudicar qualquer categoria social, religiosa, racial, profissional etc. Mas, ao mesmo tempo impõe em certos casos uma chamada “discriminação positiva”, visando promover uma igualdade material para além da igualdade formal estabelecida legalmente. Muitas vezes é necessário tratar desigualmente os desiguais e igualmente aos iguais. É nesse contexto que se erigem as normas legais que privilegiam em nosso ordenamento jurídico os povos negros e sua cultura, a fim de combater e compensar o tratamento discriminatório negativo vigente por séculos.
O início desse tratamento discriminatório positivo encontra-se na própria Constituição no corpo dos incisos do artigo 5º., supra mencionado. Estabelece o inciso XLI que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória aos direitos e liberdades fundamentais” e em seguida o inciso XLII determina que “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”.
Na esteira desses mandamentos constitucionais vem a legislação ordinária federal e estadual a concretizar todo um arcabouço garantidor dos direitos de igualdade racial no que tange ao tratamento diferenciado a ser conferido aos povos negros no Brasil. O conhecimento e exercício desses direitos legalmente estabelecidos são cruciais para a defesa da igualdade racial, da dignidade dos negros e para a formação de uma efetiva consciência e sentimento quanto a essas igualdade e dignidade.
Assim é que é digna de menção a chamada Lei Afonso Arinos (Lei 1390/51), alterada pela Lei 7437/85 para incluir entre as contravenções penais a prática de atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil. Este é certamente um marco histórico nos avanços e conquistas relativos ao repúdio e repressão aos atos de preconceito racial no Brasil.
Não obstante, o tratamento dado ao tema do preconceito racial e de cor como mera contravenção penal não satisfaz o sentimento de injustiça deixado por tais atos, nem reflete a consciência nacional majoritariamente dada a rejeitar com veemência o preconceito. Uma medida mais drástica merecia espaço quanto ao tema e em 1989 surge a Lei 7716/89 que “define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor”. Agora as condutas de discriminação negativa baseadas na raça ou na cor das pessoas passam de simples contravenções para crimes gravemente apenados numa postura legal coerente com a Carta Constitucional de 1988 que, como já visto, deu grande importância para a questão do racismo e sua devida repressão penal.
No seguimento vem a Lei 9459/97 que promove uma alteração nos artigos 1º. a 20 da Lei 7716/89, objetivando um aprimoramento da matéria. Esse mesmo diploma legal altera o Código Penal no Capítulo dos Crimes contra a honra para acrescentar um parágrafo 3º. ao artigo 140, CP, que trata do crime de injúria. Com isso cria-se a figura da chamada “Injúria Racial” ou “Injúria Preconceito”, que é uma espécie de “Injúria qualificada” com apenação mais severa de “reclusão, de um a três anos e multa”. A partir de então as ofensas proferidas às pessoas utilizando “elementos referentes a raça, cor etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência” passam a contar com maior reprovabilidade penal, tendo em vista a característica preconceituosa da atitude do ofensor. [1] Para além de criar uma qualificadora do crime de injúria devido ao preconceito embutido na ofensa, aumentando a reprovabilidade da conduta mediante a previsão de uma pena mais rigorosa, operou o legislador todo um sistema de tratamento mais severo para o xingamento preconceituoso, pois que com a elevação do patamar de pena máxima para três anos, afastou a possibilidade de reconhecimento de uma injúria racial como sendo infração de menor potencial ofensivo, de modo a obstar os benefícios concedidos aos autores do fato pela Lei 9099/95, já que os crimes para serem considerados de menor potencial devem ter pena máxima não superior a dois anos (artigo 61 da Lei 9099/95).
Essa alteração tem então importantes repercussões penais e processuais penais, como por exemplo:
a)Inviabilização de transação penal;
b)Possibilidade de prisão em flagrante e não mera lavratura de Termo Circunstanciado;
c)Impossibilidade de arbitramento de fiança pela Autoridade Policial nos termos do artigo 322, CPP, já que a pena passa a ser de “reclusão”.
Note-se, porém, que a Injúria Racial, ou seja, a mera ofensa verbal envolvendo elementos raciais ou de cor da pessoa ofendida, não configura “Crime de Racismo” e sim uma espécie diferenciada e qualificada de “Crime contra a honra”. Assim sendo, caberá fiança concedida pela Autoridade Judiciária nos estritos termos do artigo 323, I, CPP. Não se tratará também de crime imprescritível nos termos do artigo 5º., XLII, CF, prescrevendo a pretensão punitiva em oito anos de acordo com o artigo 109, IV, CP. Será ainda a infração sujeita a ação penal pública condicionada à representação do ofendido de acordo com o artigo 145, Parágrafo Único (parte final), CP, de forma que a vítima decairá do direito se não o exercer no prazo de 6 meses a partir do conhecimento da autoria (artigo 38, CPP). Neste tópico é mister ressaltar que a ação penal era originalmente privada mesmo nessa forma qualificada de crime contra a honra, sendo fato que passou a ser pública condicionada com o advento da Lei 12.033/09 que certamente representa mais um avanço considerável no trato das questões raciais e no combate ao preconceito. Note-se que antes, sendo a ação privada, caberia à vítima contratar advogado para promover a responsabilização criminal do ofensor, o que obstaculizava de certo modo o acesso à justiça, principalmente para aqueles menos privilegiados financeiramente. A partir da Lei 12.033/09 tal acesso torna-se bem mais fácil, bastando a simples representação para que a Autoridade Policial possa atuar na fase investigatória e o Ministério Público esteja legitimado a intentar a respectiva ação penal sem qualquer ônus para o ofendido.
Neste ponto fica uma questão em aberto: se a injúria racial tão frequentemente erroneamente chamada de “crime de racismo” não é na verdade um “crime de racismo”, que espécie de conduta configuraria tal crime?
Os crimes de racismo a que faz menção a Constituição Federal, os quais são, portanto, imprescritíveis e inafiançáveis tanto para a Autoridade Policial como para a Judiciária (artigo 5º., XLII, CF) são aqueles previstos na Lei 7716/89 já acima mencionada. Em resumo pode-se dizer que estão elencados nos artigos 1º. a 20 do referido diploma. Basicamente são previstos crimes cuja conduta se constitui em embaraçar ou obstar o acesso a benefícios, lazer, trabalho, locais públicos ou de acesso ao público, entidades de ensino, clubes, cargos, empregos, funções etc. devido à raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional da vítima. Também se reprime a prática, induzimento ou incitação da discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (artigo 20 da Lei 7716/89).
Em seus artigos 16 e 18 regula ainda a Lei 7716/89 os efeitos de uma condenação por crime de racismo, os quais devem ser motivamente determinados na sentença judicial condenatória. Se o autor do crime for funcionário público está sujeito à perda do cargo ou função pública. Se o fato se der em estabelecimentos particulares, estes poderão ter suspenso seu funcionamento por até 3 meses. Como esses efeitos não são automáticos é importante que o julgador atente para eles quando vier a proferir a sentença condenatória. Acaso sejam olvidados, caberá ao Ministério Público zelar pela correta aplicação da lei mediante embargos de declaração e/ou apelação, sob pena de transitar em julgado a decisão sem observação de todo o rigor imposto pela legislação.
Outras normativas legais não penais também são relevantes e dignas de menção, pois que refletem as iniciativas de difusão e reconhecimento da cultura negra e de sua história na formação da sociedade brasileira. Nesse diapasão é destacável a Lei 9125/95 que instituiu o ano de 1995 como “Ano Zumbi dos Palmares” em homenagem ao tricentenário de sua morte. Assim também a Lei 10.639/03 que alterou a Lei 9394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede Pública de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro – Brasileira”. É de suma importância a difusão dos heróis e das figuras históricas, bem como da cultura negra perante a juventude brasileira, a fim de que se conheçam e reconheçam não somente os expoentes de origem européia ou branca. A valorização e a própria autoestima racial somente pode se erigir quando se dá espaço para a narrativa dos feitos e da importância desse seguimento na conformação da sociedade brasileira.
No âmbito estadual são dignas de menção:
a)A Lei 5466/86 que dispõe sobre o Conselho de participação e desenvolvimento da Comunidade Negra.
b)A Lei 5680/87, já mencionada anteriormente, que institui o mês de novembro como mês da consciência negra.
c)A Lei 6175/88, que institui a Semana de Planejamento dos Direitos dos Negros.
d)A Lei 7576/91, que cria o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, dentre os quais certamente se encontra o direito à igualdade racial.
e)A também já mencionada Lei 7968/92, que institui o Dia da Consciência Negra.
f)A Lei 9156/95, que oficializa o Hino à Negritude.
g)A Lei 9757/97, que dispõe sobre a legitimação de posse de terras públicas estaduais dos remanescentes das comunidades de quilombos, em atendimento ao artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
h)A Lei 10.237/99, que institui política para a superação da discriminação racial no Estado.
E não é somente no campo legislativo que se encontram normas visando a promoção da igualdade racial. Há também dispositivos administrativos previstos em Decretos e Resoluções de que são exemplos:
a)Decreto 34.117/1991, que dispõe sobre o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra.
b) Decreto 36.696/1993, que cria a Delegacia Especializada de Crimes Raciais.
c) Decreto 40.723/1996, que institui o grupo de trabalho para fins que especifica e dá outras providencias. Tratando-se de grupo de trabalho para estudo da colocação em prática da legitimação de posse de terras públicas por comunidades quilombolas, o qual resultou ulteriormente na já citada Lei 9757/97.
d)Decreto 41.774/1997, que dispõe sobre o programa de cooperação técnica e de ação conjunta a ser implementada entre a Procuradoria - Geral do Estado, a Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania, a Secretaria do Meio Ambiente, a Secretaria da Educação e a Secretaria do Governo e Gestão Estratégica, para identificação, discriminação e legitimação de terras devolutas do Estado de São Paulo e sua regularização fundiária ocupadas por remanescentes das comunidades de quilombos, implantando medidas socioeconômicas, ambientais e culturais. Note-se nesse passo que a ação se volta para o cumprimento da Lei 9757/97 de forma a ensejar uma infraestrutura para os quilombolas.
e) Decreto 42.209/1997, que institui o Programa Estadual de Direitos Humanos e cria a Comissão Especial de acompanhamento da execução desse programa, onde também estão incluídos projetos referentes à promoção da igualdade racial.
f)Decreto 48.328/2003, que institui, no âmbito da Administração Pública do Estado de São Paulo, a política de ações afirmativas para afrodescentes. Essas chamadas “ações afirmativas” constituem uma política de “discriminação positiva”, tendo em mira certa compensação com um tratamento privilegiado, considerando a exclusão e exploração histórica dos povos negros em nosso país.
g)Decreto 49.602/2005, que institui e disciplina o sistema de pontuação acrescida para afrodescentes e egressos do Ensino Púbico (fundamental e médio), nos exames seletivos para ingresso nas Escolas Técnicas Estaduais - ETEs e nas Faculdades de Tecnologia - FATECs, pertencentes ao Centro Estadual de Educação Tecnológica "Paula Souza" – CEETEPS. Tratando-se de uma “ação afirmativa” específica relativa ao campo das chances de formação técnica e universitária.
h)Resolução SJDC-97/2002, que cria a Comissão de Promoção de Ações Afirmativas, com nova redação das Resoluções SJDC -122/2003 e SJDC - 124/2003.
Essas iniciativas legais e regulamentares são apenas alguns exemplos de avanços e projetos para a promoção de uma verdadeira e material igualdade racial no Brasil.
Pode-se afirmar com certeza que toda essa mobilização culmina no âmbito federal com a edição da Lei 12.288/10, denominada “Estatuto da Igualdade Racial”, a qual em seu artigo 1º., preceitua: “esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica”.
O Estatuto da Igualdade Racial traz em seu bojo uma série de definições e conceitos importantes para a compreensão e interpretação das questões raciais e de cor. Estabelece as diretrizes básicas das ações afirmativas a serem implementadas nos âmbitos nacional, estadual e municipal. Trata dos Direitos Fundamentais a serem assegurados nos campos da saúde, educação, cultura, esporte, lazer, liberdade de consciência, crença e cultos religiosos, acesso a terra e moradia adequada, acesso ao trabalho e aos meios de comunicação. Finalmente, cria o “Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial”, estruturando-o administrativa e financeiramente de forma a garantir, ao menos no plano legislativo, a concretização de ações afirmativas capazes de tornar realidade os objetivos almejados no que respeita a uma sociedade igualitária, justa e harmônica no plano racial.
Tendo em vista o exposto conclui-se que a legislação e as normas regulamentares nacionais dão boa sustentação para o reconhecimento e a promoção efetiva da Igualdade Racial. Desde a Constituição Federal, passando pelas legislações ordinárias federal e estadual e pelos diplomas regulamentares administrativos, erigiu-se um sistema razoável a embasar ações afirmativas para a efetivação de isonomia no seio da população brasileira.
Retomando a figura do círculo virtuoso entre conscientização – legislação – aplicação anteriormente mencionado, deve-se ter em mente que cada elemento desse círculo se retroalimenta e dá sustentação. A descoberta e a consciência dos direitos impele à elaboração de uma legislação e essa mesma consciência que levou à elaboração das normas impulsiona sua aplicação concreta, fazendo valer na prática os direitos conquistados.
Quando esse círculo virtuoso não está completo e processando sua retroalimentação conforme acima demonstrado, quando muitas vezes a própria legislação não reflete os ideais de justiça e igualdade, mas sim os vícios da desigualdade e da opressão, o homem justo precisa se transformar em um “fora da lei” para arrostar a injustiça e fazer valer seu brado por justiça.
A história e as lendas estão repletas desses exemplos heróicos de homens e mulheres que à custa das próprias vidas e do abandono de uma situação acomodada, enfrentaram as injustiças, inclusive aquelas impostas pela legislação de seus tempos. Inicialmente vistos como revolucionários subversivos, converteram-se em heróis, passando de “foras da lei” para precursores de uma nova realidade legal e social mais justa e igualitária.
A tragédia grega bem retrata essa atitude de inconformismo com a injustiça de uma ordem jurídica com a desobediência de Antígona que, inobstante a proibição do decreto real, dá um túmulo digno a seu irmão. Também a lenda de Robin Hood retrata o momento histórico da edição da Magna Carta pelo Rei João Sem Terra da Inglaterra, reconhecendo os direitos humanos fundamentais de liberdade, igualdade, devido processo legal, habeas corpus, propriedade etc.
Gandhi é outro exemplo de enfrentamento das leis inglesas em sua colonização da Índia, assim como Nelson Mandela em sua luta, inclusive armada, contra o “apartheid” na Áfrida do Sul entre 1948 e 1994. O primeiro pagou com a vida, o segundo com sua liberdade coartada por trinta anos.
E o que foram no Brasil um Zumbi dos Palmares ou um Besouro Mangagá ou Besouro Cordão de Ouro (1897 – 1824), senão pessoas que se colocaram à margem da lei e lutaram por justiça e igualdade em seus tempos nos quais a legislação legitimava a escravidão dos negros e a exploração de uns homens por outros homens?
Hoje se vive em uma época privilegiada exatamente porque, conforme acima consignado, impera o círculo virtuoso conscientização – legislação – aplicação. Já não é preciso estar “fora da lei”, atuar de forma “marginal ou subversiva” para lutar pela igualdade e pela justiça racial no Brasil. A lei confere toda a base jurídica para a defesa pacífica e ordeira dos direitos das pessoas sem a possibilidade de discriminações de qualquer natureza. Tendo a consciência da justiça racial, da necessidade da harmonização e da igualdade de todos e de posse do arcabouço legal e regulamentar posto à disposição, basta concretizar sua aplicação pelos caminhos corretos. Já não são necessários grandes heróis ou vultos históricos, mas somente uma população consciente de seus direitos e deveres e homens públicos empenhados no cumprimento dos mandamentos constitucionais e legais.
Já dizia o dramaturgo Bertolt Brecht que não é miserável o país que não tem herois, mas sim aquele que precisa de herois. Pois então, já não precisamos de herois, precisamos apenas de homens e mulheres conscientes daquilo que sua condição e dignidade humana lhes confere e cientes dos instrumentos que a ordem jurídica lhes dispõe para concretização de seus direitos.
[1] Destaque-se que com referência às pessoas idosas ou portadoras de deficiência a inclusão como qualificadora não se dá pela Lei 9459/97, mas sim posteriormente pela Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso).
Delegado de Polícia, Mestre em Direito Social, Pós - graduado com especialização em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós - graduação da Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado da Unisal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Consciência negra e ciência dos direitos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 nov 2010, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/747/consciencia-negra-e-ciencia-dos-direitos. Acesso em: 25 nov 2024.
Por: Benigno Núñez Novo
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