(..) “ O trade trabalhista tem sua razão em protestar, acusam a União de tê-la transformado em mero agente arrecadador das contribuições sociais”...
Em 1932, brotava uma das sementes históricas mais importante no contexto da sociedade brasileira, a Justiça do Trabalho, que foi inserida na República, na esteira dos Tribunais Rurais criados pela Lei paulista n° 1.968 de 10 de outubro de 1922. O embrião foi fecundado nas Comissões Mistas de Conciliação com objetivo de harmonizar os conflitos do trabalho, os dissídios coletivos, com isso em novembro do mesmo ano, surgiram as Juntas de Conciliação e Julgamento para os dissídios individuais, através dos Decretos nº 21.396 e 22.132, respectivamente, ambas vinculadas ao então Ministério do Trabalho. Em 1940 o Decreto-Lei 6.596/40, (entrou em vigor no dia 1° de maio de 1941, data comemorada como o “Dia do Trabalhador”), para assim ganhar formato de Justiça do Trabalho. Para subsidia-la juridicamente, nascia a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que unia num só Código um elenco de normas trabalhistas através do DL n° 5.452, de 1° de maio de 1943, se constituindo, conforme denomino de “o projeto social mais importante do planeta”. A confirmação de órgão público dentro da estrutura da União, veio pouco mais a frente no Decreto-Lei nº 9.797, de 1946, e assim os 8 (oito) dos seus Conselhos Regionais do Trabalho passaram a denominar, Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e o Conselho Nacional Trabalho, em Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Apesar de sua deformação, o conteúdo social da especializada sobrevive, na pratica, sua tarefa, de entregar ao trabalhador a pecúnia fruto do seu trabalho, está a cada ano mais demorada, em muitos casos, embora ganhe a ação, o reclamante não consegue receber. Perto de comemorar “70 anos”, a JT, divide a alegria de ter suportado os revezes no Congresso, onde não faltaram propostas para sua extinção e flexibilização das suas leis, e a decepção de ver seus próprios integrantes, mais preocupados com seus interesses corporativos, em detrimento da vocação de servir a causa do trabalhismo. Protegida pela combatente massa de sindicalistas, principal combustível que ao lado dos advogados trabalhistas, alimentam esta gigantesca máquina jurídica, (são 24 tribunais, 1.360 Varas e um Tribunal Superior), se mostra frágil por suas mazelas jurídicas. Distante de ser a solução para exercer o papel moderador, através da conciliação, a JT se tornou uma justiça complexa, descuidada na feitura das suas decisões, insubordinada as regras superiores, e incompetente na execução, promovendo a debandada de micro e pequenos negócios para a informalidade.
A setuagenária resiste, assim foi na Constituição de 88, quando ganhou densidade com a representação classista, e no limiar (2001) do governo FHC, que tinha firme propósito extirpar direitos dos trabalhadores, através da flexibilização do artigo 618 da CLT, que é um dos seus pilares de sustentação. Para ampliar sua competência (EC n° 45/04), que a especializada mergulhou de vez na sua vertiginosa queda de produção, dando sinais de fadiga ideológica, passando ser a cobradora de “luxo” da Previdência Social (INSS). Sem dar cabo de seu compromisso político com a União, após receber uma enxurrada de ações de execuções que era da justiça federal e as novas execuções de oficio, acabou engessada. O texto legal é impositivo: “O art. 114 da Constituição Federal, ao dispõe que, compete à Justiça do Trabalho, processar e julgar: I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta, da União, dos Estados, dos Municípios; II…… VIII a execução de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I – a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes da sentença que proferir”. A Súmula 368 do C.TST, que deu interpretação ao citado preceito Constitucional, determina a limitação da competência para a execução, pela Justiça de Trabalho, dos títulos que foram objeto da condenação em pecúnia, de natureza salarial, sobre os quais incidam a contribuição previdenciária.
Assim positivamente com advento da Lei nº.11.457 de 16.03.2007, que imprimiu nova redação ao parágrafo único do art. 876 da CLT, não há mais dúvida quanto à competência material da Justiça do Trabalho, não apenas para executar as contribuições que derivam dos títulos da condenação sentencial, mas, também, para determinar os recolhimentos da contribuição, em face do reconhecimento do vínculo incidente sobre os salários pagos na vigência do contrato de trabalho, o que vai de encontro ao entendimento da Súmula 368. Por ilação, em se tratando de contribuição previdenciária sobre os salários pagos na vigência do contrato de trabalho, em atraso, é competente a Justiça do Trabalho para determinar os recolhimentos de responsabilidade do empregador. São duas execuções, a procuradoria do INSS liquida seus cálculos o processo retorna e o juiz faz a execução, um processo ordinária, acaba virando dois, a União é a responsável pro 25% das ações existentes na JT. Seu espaço físico foi invadido por milhões de execuções previdenciárias, fazendo com que as ações que tratam da indenização e execução do titulo laboral se tornassem mais lentas.
A especializada é por essência simples e harmoniosa
Mestre da cultura brasileira, o escritor e poeta Guimarães Rosa, escreveu: “Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante”, ocorre que de todas as formas, em todos os ângulos, a Justiça do Trabalho, tem a personalidade de jurisdicionado prol trabalho, mas na pratica, subsiste um conflito de identidade, é utilizada pela União para cobrar titulo da previdência, garantir 54 mil empregos públicos a servidores estáveis, 2,7 mil juízes, e seus principais atores o trabalhador e o empregador, estão legados ao segundo plano. Podemos dizer que se trata de “duas em uma”, a primeira social, que envolve a “mais valia”, persegue o direito do assalariado, a outra julgadora por excelência, porém complexa, deformada em seus preceitos legais, mesclada de entendimentos diferenciados, garimpados nos códigos que a subsidia, data vênia, aplicados com fragilidade, a independência jurídica. Com essa edificação jurídica distorcida, convalesce de um dos seus maiores males, a morosidade, alimentada pela constante mutação, de genética de alto grau colateral.
Jose Carreira Alvim, citando a doutrina de Helio Tornaghi afirma que "se nenhuma lei restringe a jurisdição de um juiz, ele pode julgar tudo", mas "se alguma lei lhe atribui apenas o julgamento de determinadas controvérsias, a jurisdição fica determinada pela competência". (Elementos de Teoria Geral do Processo – 1ª ed., Ed. Forense, pág. 125). Ocorre ainda que este perfil de justiça judicializada ganhou densidade, ficando essa segunda também ocupada na solução da lide executória previdenciária, assim “processo pra lá, processo pra cá”, a procuradoria do INSS (de quadro restrito), não se dá conta dos seus afazeres, e não consegue empreender a agilidade necessária para zerar seu estoque de ações. Na maioria dos casos os procuradores retêm os autos processuais por meses. O juiz refém deste trâmite administrativo, e mergulhado na elaboração de texto complexo que a lide pode exigir, hesita entre a qualidade da decisão e a celeridade genérica, se distancia da máxima da EC 45/2004, no seu, "Art. 5º, LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
A essa altura a sociedade não deve comemorar, não apenas em razão do "engessamento" do Direito, causado pelo efeito vinculante das súmulas, sequer questionar em Juízo acerca da competência da Justiça do Trabalho em executar créditos previdenciários. O trade trabalhista tem sua razão em protestar, acusam a União de tê-la transformado em mero agente arrecadador das contribuições sociais, voltadas para presença de um terceiro estranho ao feito, o INSS que migrou o conflito de normas de processo civil, trabalhista e tributário, muitas vezes debatido na justiça estadual e federal. O escritor austríaco Stefan Zweig, há 70 anos, quando nascia a JT, publicou o livro “Brasil, País do Futuro”, a obra discorre sobre as possibilidades que o País tinha, na visão do autor, de se desenvolver de modo diferente do ocorrido na Europa, que naquele momento (1941) era assolada pela II Guerra Mundial. Num trecho do livro, observa: “(…) Milhões de pessoas não foram abrangidas nem no ponto de vista dum trabalho regulado, organizado, fiscalizado, nem no ponto de vista da civilização, e ainda decorrerão anos e decênios antes que elas possam ser ativamente incluídas na vida nacional”.
Não são poucos os que criticam a utilização do judiciário laboral por este instituto previdenciário, em sua doutrina Wagner Giglio, traduz brilhantemente o real motivo que impulsionou o legislador neste caso: "Em vez de aprimorar os mecanismos de fiscalização e cobrança das contribuições devidas ao INSS (o que implicaria grandes despesas, principalmente no que se refere ao aumento de quadro de procuradores do Instituto, para atuar junto à Justiça do Trabalho), o legislador buscou um atalho, impondo aos magistrados trabalhistas, através da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, a esdrúxula obrigação de exigir o pagamento imediato nos processos trabalhistas, das contribuições previdenciárias incidentes sobre as verbas que fossem reconhecidas como devidas ao trabalhador, em sentenças e acordos (arts. 43 e 44)”. (Ob. cit., pág. 36). O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou no dia 31 de março, um relatório dos cem maiores litigantes do país, a pesquisa mostrou que a Justiça trabalha para poucas pessoas. No bloco está o maior .litigante nacional, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), responsável por 22,3% das demandas.
Foi diretor de Relações Internacionais da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), editor do Jornal da Cidade, subeditor do Jornal Tribuna da Imprensa, correspondente internacional, juiz do trabalho no regime paritário, tendo composto a Sétima e Nona Turmas e a Seção de Dissídios Coletivos - SEDIC, é membro da Associação Brasileira de Imprensa - ABI, escritor, jornalista, radialista, palestrante na área de RH, cursou sociologia, direito, é consultor sindical, no setor privado é diretor de RH, especialista em Arbitragem (Lei 9.307/96). Membro da Associação Sulamericana de Arbitragem - ASASUL, titular da Coluna Justiça do Trabalho do jornal "Tribuna da Imprensa" do RJ, (Tribuna online), colunista da Tribuna da Imprensa online), no judiciário brasileiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINHO, Roberto Monteiro. A setuagenária JT e a semente do bem Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 abr 2011, 08:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/888/a-setuagenaria-jt-e-a-semente-do-bem. Acesso em: 26 nov 2024.
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