Co-autor: JACOB ARNALDO CAMPOS FARACHE: Graduação em Administração pelo Centro Universitário do Estado do Pará (2003), especialização em Docência do Ensino Superior pelo Centro Universitário do Estado do Pará (2005), especialização em Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Pará (2005). Atualmente é Administrador Pleno da Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras) e está cursando o 7º período de Direito na Faculdades de Vitória (FDV).
RESUMO
O instituto jurídico do patrimônio de afetação é, indubitavelmente, uma garantia aos agentes financiadores e aos compradores de unidades autônomas de condomínios edilícios, entretanto sua utilização é facultativa aos incorporadores. Isto posto, o presente trabalho pretende mostrar que os novos paradigmas contratuais e seus princípios, tais como o da função social do contrato e o da boa-fé objetiva tornam necessária a inclusão deste regime de incorporação nos contratos de compra e venda de unidades autônomas em condomínios edilícios.
PALAVRAS-CHAVE
Incorporação imobiliária; patrimônios de afetação; princípios do Direito Civil Brasileiro.
1 INTRODUÇÃO
Apesar da crise atual, o mercado imobiliário brasileiro passou nos últimos anos por um momento de expansão extraordinária em função da combinação de alguns fatores. Recente reportagem[1], destaca que esta boa fase se justifica em função do aporte de capital estrangeiro em fundos de investimentos imobiliários e empresas nacionais que abriram seu capital na bolsa de valores. Outrossim, o aporte de capital estrangeiro neste setor, aqui no Brasil, se justificou em decorrência do fim do boom imobiliário nos Estados Unidos e no México que já viveram o auge do mercado imobiliário. A tendência, segundo a mesma reportagem, é de que uma parte das 63.000 empresas do ramo seja incorporada por grandes empresas do setor.
Este movimento já podia ser constatado no mercado imobiliário, o qual já recebia quantias significativas de fundos de investimentos internacionais, tal como fundo de investimentos Equity International Properties que aplicou 50 milhões de dólares na compra de 32% da Gafisa, empresa nacional do ramo de construção civil. Nesta mesma linha de captação de recursos para investimentos em empreendimentos imobiliários, as quatro grandes empresas que abriram capital na bolsa de valores de São Paulo, Cyrela Brazil Realty, Gafisa, Rossi Residencial e Company, captaram juntas mais de três bilhões de reais.
Apesar de toda a euforia e indicadores positivos a respeito do crescimento deste setor, a reportagem destaca três pontos a serem considerados importantes para acompanhamento com o intuito de dar sustentabilidade ao processo de expansão imobiliária: o risco da bolha imobiliária nos Estados Unidos, a segurança jurídica e as taxas de juros.
Diante do exposto, o primeiro recorte para a análise do presente artigo é relativo a um dos fatores considerados como crítico ao seu desenvolvimento sustentável que é a segurança jurídica. Segundo Denise Carvalho[2], as inovações que ocorreram em decorrência do caso Encol ainda não foram testadas ao ponto de se saber se foram suficientemente inovadoras e articuladas para evitar um impacto negativo nos clientes e agências financiadoras, tal como ocorrido na época da Encol.
A Encol era a maior construtora do país em 1995 e a partir desta data começou a passar por dificuldades financeiras culminando com a decretação da falência em 1999. De acordo com Eduardo Salgado[3], 42.000 famílias foram vítimas da falência da Encol, que segundo a reportagem houve desvio de patrimônio da empresa pelo seu presidente, e maior acionista, o que desencadeou uma crise de credibilidade no mercado imobiliário brasileiro.
2 A instabilidade no setor imobiliário e as mudanças jurídicas
Diante da situação caótica desencadeada pela falência da Encol e o impacto significativo na classe média brasileira, que investia suas economias no sonho da casa própria, os juízes de início foram favoráveis aos consumidores. Segundo Tutikian[4], os tribunais concediam adjudicação compulsória dos imóveis livre de todos os ônus[5], inclusive das garantias de hipotecas dada aos agentes financeiros que alavancavam a construtora, aos clientes e promitentes proprietários das edificações em questão.
No entanto, conforme ressaltado pela autora, o que de imediato parecia uma solução conveniente aos clientes ao longo do tempo trouxe impactos negativos em todo o mercado imobiliário, já que as financiadoras dos projetos ao perderem a garantia hipotecária do empréstimo realizado, amargaram enormes prejuízos desencadeando uma dificuldade de financiamento dos projetos imobiliários.
As posições dos tribunais em favor dos consumidores e em desfavor dos agentes financiadores aprofundaram a crise no setor imobiliário a tal ponto de prejudicar o desenvolvimento econômico do país.
Sendo assim, Tutikian destaca que se tornaram necessárias ações governamentais para intervir na situação de maneira a minimizar os impactos relatados e alavancar novamente o setor imobiliário no Brasil.
Alerta-se, não bastava qualquer saída, era necessário encontrar uma solução que atendesse a todos os interesses: das incorporadoras que são uma das alavancas do país, geradoras de empregos e desenvolvimento econômico; dos agentes financeiros que são detentores do dinheiro, financiadores da atividade imobiliária, e dos consumidores, que precisam ter a segurança para aquisição das unidades imobiliárias[6].
Surge então a medida provisória n° 2.221/2001 e posteriormente a Lei Federal n° 10.931/2004, mais conhecida como Lei do Patrimônio de Afetação, porém antes de analisar-se suas características e finalidades é importante ressaltar os institutos jurídicos que regulam as incorporações.
Conforme relata Venosa[7], a incorporação imobiliária carece de um instituto próprio já que existem detalhes em relação à figura do incorporador e da incorporação imobiliária que não são completamente amparados pela doutrina ou jurisprudência, principalmente após a edição da Lei n°10.931 de 2004. O autor ressalta que o assunto é tratado pelo novo código civil, no que tange a parte de condomínios, pela Lei 4.591/64, em relação a condomínio e edificações e pela Lei 10.931/04 que trata do patrimônio de afetação.
O condomínio em edifícios passou a ser regulado pelo Código Civil de 2002, embora de forma lacunosa, estando a matéria a exigir um estatuto próprio ou micro sistema, com legislação abragente de todas as novas manifestações condominiais, como os chamados loteamentos fechados, clubes de campo, time sharing, shoping centers[8].
Embora existam lacunas, tratar-se-á o tema focando os aspectos relacionados a uma visão geral da incorporação imobiliária, que já está contemplada em nosso ordenamento jurídico, qual seja a incorporação imobiliária de condomínios verticais, de modo que as lacunas referidas sejam minimizadas em relação aos tipos de condomínios existentes.
Primeiramente é importante salientar as inovações trazidas pela Lei 4.591/64, entre elas Cambler[9] destaca a atribuição do caráter propter rem aos encargos condominiais, ou seja, os débitos do alienante passaram a acompanhar a coisa, sendo o responsável seu adquirente; a previsão de uma convenção de condomínio; e a escolha de um síndico por assembléia realizada com os condôminos.
Estas inovações trouxeram maior segurança jurídica estabelecendo a natureza jurídica da incorporação, os direitos e deveres de cada um e o contrato incorporativo, que é a figura jurídica que determina a existência do condomínio por andares. O conceito do incorporador imobiliário, anteriormente fruto do costume comercial, passou a receber tratamento legislativo, sendo responsável pelo lançamento, venda e entrega das unidades condominiais[10].
Segundo o mesmo autor, a revogação dos artigos da Lei 4.591/64 com a entrada em vigência do novo Código Civil de 2002, aconteceu de forma pontual, sendo que as matérias não contempladas no novo código devem ser tratadas pela Lei 4.591/04.
O novo Código Civil de 2002 estabelece em seu art. 1.332 que o condomínio edilício se constitui por atos entre vivos ou testamentos, devidamente registrados no Cartório de Registro Geral de Imóveis. A exigência desta formalidade gera as modalidades de condomínio edilício, que segundo Cambler[11], a doutrina aponta três modalidades como básicas: a construção direta, que é instituída por um grupo de pessoas proprietárias do solo; a incorporação imobiliária; e o testamento, que trata da situação em que o de cujus possui um prédio que mediante vontade testamentária será feita a partilha entre os herdeiros.
Considera-se incorporador, conforme estabelece o art 29 da Lei 4.591/64, in verbis:
a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceita propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas.[12]
Clambler ainda destaca que os elementos do condomínio edilício são a fração ideal de terreno, as áreas comuns e as privativas, e os elementos da incorporação imobiliária são: objetivos, no qual a incorporação só pode existir em face de edifícios a serem construídos; subjetivo, com o qual o incorporador é o responsável pela entrega das unidades; negocial, com o qual o contrato toma a forma de compromisso de compra e venda, promessa de cessão de direitos ou venda e compra definitiva com pacto adjeto de alienação fiduciária; e, o último elemento é o formal, que trata do registro do memorial de incorporação que se inicia com a constituição da propriedade edilícia e se encerra com o registro da instituição do condomínio, da convenção de condomínio e com a averbação da construção.
Surge, então, a obrigação do incorporador em entregar as unidades autônomas e aos compradores cumprirem com suas obrigações estabelecidas contratualmente. Esta relação obrigacional entre incorporador e cliente juntamente com o contexto do setor imobiliário do fim da década de 90 são pano de fundo para o projeto de lei que deu origem a Lei 10.931/04 do patrimônio de afetação, que, segundo Venosa[13], cria um sistema opcional aos incorporadores de separar o empreendimento do patrimônio geral do incorporador, não sendo atingido por insolvência falências ou outras deficiências econômicas e financeiras do incorporador.
Sendo a aplicabilidade da lei opcional, o legislador permitiu que o incorporador se utilizasse de um regime tributário especial, por meio do qual o mesmo faria um pagamento unificado de impostos e contribuições, obrigando-o a manter uma escrituração contábil em separado para cada empreendimento, conforme art 31 - A, in verbis:
A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime de afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto da incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.[14]
Venosa arremata que a idéia do legislador foi de separar todo volume financeiro do empreendimento dos outros empreendimentos do incorporador ou de outros negócios, constituindo-se em maior garantia para os adquirentes e agentes financiadores, consequentemente ao desenvolvimento econômico face ao suposto incentivo e segurança dada ao setor imobiliário.
3 A NÃO-OBRIGATORIEDADE DA APLICAÇÃO DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO NAS INCORPORAÇÕES IMOBILIÁRIAS
Apesar da boa intenção do legislador com a criação do patrimônio de afetação, percebe-se na prática que tal instituto jurídico não vem sendo aplicado, conforme relata Mônica Izaquirre[15], pois, apesar de sua utilização vir crescendo, ele ainda se apresenta de forma muito tímida já que em 2005 apenas 12% dos empreendimentos adotaram o regime de patrimônio de afetação, subindo para 20% em 2006.
Os argumentos apresentados para sua não utilização são as dificuldades de adaptação das incorporadoras às exigências necessárias para operacionalização deste regime, que exige uma mudança cultural, a necessidade de instituição do regime especial de tributação (RET) no âmbito federal, que exigiu sua regulamentação por parte da Receita, além da necessidade de aprovação do processo na Secretaria da Receita Federal (SFR). Apenas a título exemplificativo, destaca-se que a SFR aprovou 38 desses processos em 2005 e 90 em 2006:
A efetiva utilização da lei nova só começou em 2005, quando saiu a regulamentação da Receita. José Carlos Martins lembra que, no início, porém, houve muita resistência por parte das empresas porque foi constatado outro problema, relativo à tributação, corrigido posteriormente por uma Medida Provisória. A incidência de uma alíquota única de 7% sobre a receita do empreendimento "afetado" - em substituição ao Imposto de Renda, contribuição sobre lucro e demais tributos administrados pela SRF - só era considerada definitiva quando a favor do Fisco. Se, ao fazer a declaração consolidada, a empresa constatasse alguma vantagem, tinha que recolher a diferença, o que, na prática, neutralizava o incentivo.[16]
Apesar de todo o esforço dos legisladores e dos governantes para estabelecer formas e institutos jurídicos para alavancagem do setor imobiliário com garantias ao consumidor e aos agentes financeiros, ainda se percebe uma discrepância entre as proteções desejadas quando se analisa os agentes financeiros e os consumidores finais.
Em geral, as construtoras só adotam o patrimônio de afetação por exigência do banco financiador do empreendimento. Por isso, o percentual de adesão ao regime só leva em consideração o número de projetos lançados em parcerias com o sistema financeiro. Interessa aos bancos assegurar que os imóveis, que são a garantia do empréstimo, sejam concluídos, até para que o crédito seja posteriormente desdobrado e repassado aos compradores, pulverizando o risco da instituição financeira.[17]
Desta forma, percebe-se que o lado hipossuficiente, que é o consumidor, fica a mercê da vontade e arbitrariedade das incorporadoras quando não utilizado recursos financeiros do sistema bancário para financiamento da obra, já que o agente financeiro utiliza-se de seus poderes, e garantem para si a minimização dos riscos ao financiar uma incorporação por meio da utilização do regime de patrimônio de afetação.
4 AS TRANSFORMAÇÒES PARADIGMÁTICAS DOS CONTRATOS E INSTITUTO DO PATRIMÔNIO DE AFETAÇÃO
Outro aspecto importante para se compreender a importância da aplicabilidade do regime de patrimônio de afetação nos contratos de compra e venda de imóveis é a análise das transformações paradigmáticas dos princípios contratuais.
Desde o início da utilização dos contratos com os Romanos até os nossos dias, houve transformações importantes no que se refere aos institutos básicos dos contratos e sua relação com o desenvolvimento social e seus efeitos entre as partes contratantes e terceiros.
Caio Mário[18] ressalta que, além das diferenças de forma e actio entre o contrato romano e o moderno, deve-se focar a atenção nas alterações das relações jurídicas criadas. Segundo o autor, no direito romano o caráter personalíssimo da obligatio estabelecia a ligação entre os contratantes prendendo e vinculando aos seus próprios corpos as obrigações contratuais realizadas, já nos contratos modernos as relações contratuais podem se estender às necessidades de terceiros não sujeitos do objeto contratual e a execução de suas obrigações se desloca da pessoa do devedor para seus bens.
Caio Mário, ainda, destaca os princípios básicos dos contratos que, por sua vez, coadunam com os novos princípios a serem discutidos posteriormente, são eles: o da obrigatoriedade; o da autonomia da vontade; o da intangibilidade de seu conteúdo e da relatividade de seus efeitos, assim resumidamente definidos pelo mesmo autor.
O princípio da obrigatoriedade é aquele em que o ordenamento positivo estatui que a avença estipulada contratualmente possua força obrigatória entre os contratantes.
O princípio da autonomia da vontade defende a vontade livre entre os contratantes, que se exerce e concretiza em quatro momentos fundamentais. No primeiro, a faculdade de contratar ou não. O segundo se relaciona com as pessoas com quem se escolhe contratar (liberdade de contratar). O terceiro relacionado a liberdade de poder fixar o conteúdo do contrato (liberdade contratual). E o último defende a constituição de fonte formal que permita às partes mobilizarem o poder coator do Estado para obediência ao estabelecido contratualmente.
O princípio da intangibilidade de seu conteúdo nos conduz a máxima de que o contrato faz lei entre as partes (pacta sunt servanda) e de que os ajustes feitos entre as partes têm igual força cogente.
O princípio da relatividade dos contratos estabelece um limite de eficácia dos contratos, reconhecendo seus efeitos apenas entre as partes contratantes, não prejudicando ou beneficiando terceiros, conforme sintetiza Augusto Geraldo[19].
Diante destes princípios básicos, modernamente incrementa-se a importância e a influência de princípios modernos nas relações contratuais, tais como o princípio da função social dos contratos e o da boa-fé objetiva.
Primeiramente, analisar-se-á as características e conseqüências da aplicação da função social do contrato. Segundo Caio Mário, serve para restringir a autonomia da vontade das partes que vão de encontro ao interesse social, ainda que atinja a liberdade de não contratar. Nesta concepção alerta que: "o Código consagra a rescisão do contrato lesivo, anula o celebrado em estado de perigo, combate o enriquecimento sem causa, admite a resolução por onerosidade excessiva, disciplina a redução de cláusula penal excessiva"[20].
Desta maneira, o ordenamento jurídico procura equalizar as diferenças materiais entre partes que possuem poderes diferenciados, buscando uma igualdade substancial dos direitos das partes e os direitos coletivos.
Em síntese, a força obrigatória do contrato, que tinha na vontade dos contratantes seu fundamento primordial, se 'funcionaliza'quando a liberdade de contratar deva ser exercida em razão dos limites da função social do contrato, ou seja, o vínculo jurídico reconhecido à vontade individual não é mais derivado do acordo das partes contratantes, mas sim da própria lei, cujos fins albergados pelo direito são a justiça social, a segurança, o bem comum, a dignidade da pessoa humana[21].
Finalmente, analisar-se-á o princípio da boa-fé objetiva que se relaciona ao comportamento dos contratantes nas relações jurídicas. Para Caio Mário, tal princípio consiste num padrão de conduta que varia suas exigências de acordo com o tipo de relação existente entre as partes, sendo uma espécie de colaboração mútua entre as partes para que ambos consigam alcançar seus objetivos, sendo importante observar que o artigo 422 do novo Código Civil de 2002 trata tanto da probidade, quanto da boa-fé.
Ambas as noções não se contêm dentro de parâmetros rígidos. A probidade resulta do confronto da conduta com um padrão de "homem leal e honesto", e terá de ser apurada em face das circunstancias de cada caso. O conceito de boa-fé, embora flexível, exige que o intérprete procure pesquisar a real intenção das partes, dentro do contexto efetivo do instrumento do contrato[22].
Conforme ressalta Augusto Geraldo, o princípio da boa-fé garante a estabilidade e a segurança dos negócios jurídicos.
Assim, considerar-se-á antijurídicas quaisquer vantagens desarrazoadas e injustificáveis, sempre que uma das partes obtenha proveito desarrazoado ou excessivo em detrimento da outra parte, portanto, a intervenção no domínio do contrato consistirá em segurança jurídica para os contratantes[23].
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pôde ser analisado, existem três aspectos importantes a favor de uma revisão da lei do patrimônio de afetação ou inclusão da obrigatoriedade de sua aplicação nos contratos de compra e venda de imóveis no regime de incorporação, são eles: a hiposuficiência dos consumidores diante dos incorporadores que, em sua maioria, só utilizam o regime de patrimônio de afetação quando obrigados pelos agentes financeiros; a função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva.
O primeiro argumento reforça a condição hiposuficiente do consumidor frente aos incorporadores que, seja por dificuldades administrativas ou contábeis, não aderem ao regime de patrimônio de afetação, ou por interesses particulares impõe aos clientes o aporte de suas economias no montante dos recursos das incorporadoras, ficando vulnerável a competência e probidade dos incorporadores, que em períodos de explosão do mercado se concentra em grandes empresas que podem cometer erros de ordem administrativa ou culposa.
O segundo argumento abarca a transformação paradigmática na qual a função social do contrato influencia na vontade entre as partes de maneira que se mitigue conseqüências prejudiciais na coletividade tais como ocorreram no caso da Encol, em que todo um setor econômico foi impactado e 46.000 famílias tiveram o sonho da casa própria virar pesadelos.
Outrossim, relacionado às mudanças recentes dos paradigmas contratuais, o princípio da boa-fé se transforma em argumento significativo para que, independentemente da obrigatoriedade estabelecida por lei, os incorporadores deveriam adotar o regime de patrimônio de afetação por representar condição mínima de probidade e boa-fé nas relações que decorrem do contrato de compra e venda entre os incorporadores e os compradores de unidades autônomas de incorporações imobiliárias
Para os incorporadores, exigir-se que administrem recursos de diferentes empreendimentos com diferentes condôminos é razoável, para não dizer prudente, pois a separação destas contabilidades é o caminho para se evitar alguns dos problemas, como os já ocorridos e vivenciados no caso da Encol.
Ora, os condôminos, nem mesmo todo um setor econômico, podem ficar condicionados as decisões de pequenos grupos detentores de grande parte do market-share de um determinado setor por mera liberalidade desses em relação à adoção das proteções jurídicas existentes. Logo, a situação que foi constatada no setor imobiliário no Brasil se encontra em completa divergência com os novos princípios balizadores das relações jurídicas contratuais, podendo vir a causar sérios danos aos consumidores.
Conclui-se este artigo, reforçando não só como indicado, mas como necessário ao desenvolvimento sustentável do mercado imobiliário a obrigatoriedade da adoção do regime do patrimônio de afetação nos contratos de compra e venda de unidades autônomas na incorporação imobiliária, a fim de se zelar por transparência e segurança jurídica das partes envolvidas. Principalmente, ao se considerar a presente crise, que apenas reforça a necessidade de se valorizar a segurança nas relações contratuais que envolvam imóveis, pois "bolhas" se forma e quando estouram seus efeitos são nefastos e, às vezes, duradouros.
REFERÊNCIAS
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CARVALHO, Denise. A explosão imobiliária: As razões que fazem o mercado de imóveis viver um momento exuberante -- e as dificuldades que podem atrapalhar o crescimento. Disponível em: http://portalexame.abril.com.br/degustacao/secure/degustacao.do?COD_SITE=35&COD_RECURSO=211&URL_RETORNO=http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0867/negocios/m0081904.html. Acesso em 10 de nov. de 2007.
IZAQUIRRE, Mônica. Segregação contábil atinge 20% dos empreendimentos em 2006. Disponível em: http://clipping.planejamento.gov.br/Noticias.asp?NOTCod=331605. Aceso em 10 de nov. de 2007.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Contratos. 12. ed. v.3. Rio de Janeiro: Forense, 2005. 604 p.
SALGADO, Eduardo. As Provas do Crime. Revista Veja. n. 1791, 26/02/03. Disponível em: http://veja.abril.com.br/260203/p_076.html. Acesso em 10 de nov. de 2007.
TEIZEN JÚNIOR, Augusto Geraldo. A função social no código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 192 p.
TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Incorporação Imobiliária, Patrimônio de Afetação e Garantia dos Imóveis. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, v.9, n.49, p. 112-130, set/out, 2007
VENOSA, Sílvio de. Direito Civil: Contratos em Espécie. 6. ed. v.3 São Paulo: Atlas, 2006, 672 p.
[1] CARVALHO, Denise. A explosão imobiliária: As razões que fazem o mercado de imóveis viver um momento exuberante -- e as dificuldades que podem atrapalhar o crescimento. Disponível em: http://portalexame.abril.com.br/degustacao/secure/degustacao.do?COD_SITE=35&COD_RECURSO=211&URL_RETORNO=http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0867/negocios/m0081904.html. Acesso em 10 de nov. de 2007.
[2] CARVALHO, Denise. A explosão imobiliária: As razões que fazem o mercado de imóveis viver um momento exuberante -- e as dificuldades que podem atrapalhar o crescimento. Disponível em: http://portalexame.abril.com.br/degustacao/secure/degustacao.do?COD_SITE=35&COD_RECURSO=211&URL_RETORNO=http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0867/negocios/m0081904.html. Acesso em 10 de nov. de 2007.
[3] SALGADO, Eduardo. As Provas do Crime. Revista Veja. n. 1791, 26/02/03. Disponível em http://veja.abril.com.br/260203/p_076.html. Acesso em 10 de nov. de 2007.
[4] TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Incorporação Imobiliária, Patrimônio de Afetação e Garantia dos Imóveis. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, v.9, n.49, p. 112-130, set/out, 2007.
[5] Neste sentido, é mister ressaltar a Súmula nº 308 do STJ: "A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel".
[6] Ibidem, p. 116.
[7] VENOSA, Sílvio de. Direito Civil: Contratos em Espécie. 6. ed. v. 3. São Paulo: Atlas AS, 2006. 672 p.
[8] Ibidem, p. 492.
[9] CAMBLER, Everaldo augusto. Condomínio Edilício, Incorporação Imobiliária e Loteamento. Revista Autônoma de Direito Privado. Curitiba, n.2, p. 279-285, jan/mar. 2007.
[10] CAMBLER, Everaldo augusto. Condomínio Edilício, Incorporação Imobiliária e Loteamento. Revista Autônoma de Direito Privado. Curitiba, n.2, p. 279-285, jan/mar. 2007, p.278.
[11] Ibidem, p. 279.
[12] Ver a Lei nº 4.591/64.
[13] VENOSA, Sílvio de. Direito Civil: Contratos em Espécie. 6. ed. v. 3. São Paulo: Atlas AS, 2006. 672 p.
[14] Ver Lei nº 10.931/04.
[15] IZAQUIRRE, Mônica. Segregação contábil atinge 20% dos empreendimentos em 2006. Disponível em http://clipping.planejamento.gov.br/Noticias.asp?NOTCod=331605. Aceso em: 10 de nov. 2007.
[16] IZAQUIRRE, Mônica. Segregação contábil atinge 20% dos empreendimentos em 2006. Disponível em http://clipping.planejamento.gov.br/Noticias.asp?NOTCod=331605. Aceso em: 10 de nov. 2007.
[17] Ibidem.
[18] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Contratos. 12 ed. v.3. Rio de Janeiro: Forense, 2005. 604 p.
[19] TEIZEN JÚNIOR, Augusto Geraldo. A função social no código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 192 p.
[20] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Contratos. 12 ed. v.3. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 13.
[21] TEIZEN JÚNIOR, Augusto Geraldo. A função social no código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 16.
[22] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Contratos. 12 ed. v.3. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 21.
[23] TEIZEN JÚNIOR, Augusto Geraldo. Op. cit., p. 179.
Graduação em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal do Espírito Santo - UFES (1994), especialização em Qualidade e Produtividade pela Universidade Federal do Espírito Santo - UFES (1998) e mestrado executivo em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas - EBAP - FGV (2004). Atualmente, é Engenheiro na Companhia Vale do Rio Doce (Vale) e está cursando o 7º período de Direito na Faculdades de Vitória (FDV).
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