Sumário: 1. Introdução; 2. Historicidade e conceituação dos Direitos fundamentais; 3. Considerações acerca dos princípios fundamentais; 4. Princípio da Razoabilidade do processo; 5. Problemática da morosidade do Judiciário e prejuízo à efetividade (concretização) dos direitos fundamentais; 6. Considerações finais; 7. Referências.
Resumo: Este trabalho tem por finalidade analisar de que forma acontece a concretização dos direitos fundamentais diante da morosidade do judiciário e como se dá a aplicação do princípio da razoabilidade na tentativa de tentar solucionar o problema da não efetividade do processo.
Palavras-chave: Razoabilidade. Morosidade. Efetividade.
1. Introdução:
Este trabalho tem por finalidade apresentar o princípio da razoabilidade e os problemas decorrentes de sua não devida utilização quando da constatação da morosidade do Poder Judiciário e desta forma a não efetividade dos direitos, também tem o fim de mostrar possíveis soluções que poderão ajudar a dirimir os conflitos que se edificam.
Antes de empreendermos a tarefa de esclarecer algumas questões que nos ajudarão a compreender esse ramo do saber jurídico, torna-se necessário apresentar algumas idéias que são fundamentais. Todo conhecimento traz dificuldades e perplexidades. Coisa natural, já que não vivemos em um mundo de uma só opinião.
*Advogada Militante em Pernambuco. Graduada pela Associação Caruaruense de Ensino Superior em 2006.Pós Graduada em Direito ´Processual Civil pela FACOL em 2009. Currículo registrado no Lattes.
Então, por que se preocupar com a não aplicação do Princípio da Razoabilidade e a consequente não concretização dos direitos fundamentais diante da morosidade do Judiciário?
Ao encaminhar um conflito de interesse para o crivo do Poder Judiciário o autor espera obter com a instauração do processo o reconhecimento de seu direito, essa expectativa não poderia esbarrar na lentidão da justiça, acarretando um ônus para o autor.
Quando o Estado proibiu a autotutela assumiu a responsabilidade de solucionar os litígios de forma adequada e efetiva, garantindo a concretização dos direitos fundamentais.
Para a devida ocorrência da efetividade dos direitos tutelados a resposta do Estado-Juiz deve ocorrer o mais rápido possível, dando àquele que tem a razão exatamente o que tem direito a obter, não permitindo que o fator tempo ocasione inconvenientes as partes.
O tempo passou a ser um dos principais fatores da crise do judiciário, e a insatisfação da sociedade diante da lenta prestação jurisdicional, levaram o legislador a se posicionar sobre a questão do tempo no processo.
Na tentativa de modificar este quadro, o mecanismo de aceleração da composição dos conflitos utilizado pela reforma do judiciário se preocupou com a morosidade da atividade jurisdicional. Por isso, foram adotadas algumas providências que nasceram para auxiliar no andamento mais rápido dos processos e a efetividade dos direitos consignados no ordenamento jurídico.
A Emenda n° 45/2004 inseriu no artigo 5°, que dispõe sobre direitos e garantias fundamentais, o inciso LXXVIII. A função da inserção deste inciso foi à apresentação do principio da razoável duração do processo.
A todos no âmbito judicial e administrativo é assegurado a razoável duração do processo[1], esta garantia constitucional trás um caminho para que decorra a tão almejada celeridade da tramitação do processo, assegurando a cidadania contra eventual vilania do Estado.
Definido desta forma, o princípio da razoabilidade do processo possui o condão de obrigar o magistrado a limitar seu poder discricionário, dando em tempo hábil uma resposta aos litigantes, não permitindo que direitos elevados à categoria de fundamentais, na lei maior do país, tenham sua aplicação restringida, ou nem mesmo, decorra a sua aplicação.
O que se irá apresentar neste trabalho é a questão da existência de um princípio que garante que as partes de um processo tenham uma solução de seu litígio em tempo hábil, mas que esbarra na morosidade do Judiciário que notoriamente não permite à aplicação do citado princípio e consequentemente a não efetividade dos direitos fundamentais levados as mão do Juiz.
Aponta-se, em primeiro lugar, a historicidade e conceituação dos direitos fundamentais, logo em seguida, destacam-se algumas considerações acerca dos princípios fundamentais para se demonstrar a importância dos direitos fundamentais em nossa legislação.
Posteriormente, mostra-se o princípio da razoabilidade e a problemática da morosidade do judiciário e o prejuízo à efetividade dos direitos fundamentais.
O panorama apresentado está disposto para mostrar a importância do princípio da Razoabilidade na concretização dos direitos fundamentais. Também se tenta amenizar a descrença da sociedade diante de um Judiciário que não oferece resposta em tempo célere.
2. Historicidade e Conceituação dos Direitos Fundamentais:
Os Direitos Fundamentais têm uma cadeia evolutiva em caráter histórico, obtida por meio de lutas, batalhas, revoluções e rupturas sociais na busca da afirmação da Dignidade da Pessoa Humana.
A noção destes direitos é muito antiga, poderíamos a ter remetê-la ao primeiro Código de Leis Escritas, o Código de Hamurabi, que já apresentava a defesa da vida e da propriedade, contemplando a honra, a dignidade e a família, se não fossem as práticas de mutilação admitidas por esse Código que entram em conflito com a finalidade dos direitos fundamentais, que é a instauração da Dignidade da Pessoa Humana.
A constatação filosófica e religiosa de que os homens são detentores de direitos naturais e inalienáveis foram à base para o surgimento formal dos Direitos Fundamentais. Nas antigas sociedades, era comum a presença do traço da desigualdade fruto do absolutismo opressivo do sistema feudal, o que fez nascer na sociedade o instituto de busca da fixação da dignidade da pessoa humana. A doutrina cristã, trouxe a idéia de estar o homem em situação de semelhança com Deus, portanto serem todos os homens iguais.
Fernando de Andrade preleciona que a Idade Média é marcada pela forte influência do Cristianismo que defendia a igualdade entre todos os homens. Neste período Histórico encontramos importantes contribuições para a evolução e desenvolvimento dos direitos fundamentais. [2]
Mas tarde com o surgimento de uma nova classe, a burguesia, e a formulação das propostas do Iluminismo, que nasciam com a finalidade de disciplinar o poder Estatal, fixou-se cada vez mais a idéia dos direitos fundamentais, que vieram a assumir prevalência nos séculos XVII e XVIII, onde o homem passou a ser visto como titular de direitos que antecedem a instituição do Estado, razão porque lhe deve ser assegurada uma esfera inviolável de proteção.
Influenciados pelo pensamento iluminista, os direitos fundamentais encontraram base sólida na passagem do Estado Absoluto para o Estado Moderno e na ascensão do princípio da separação dos poderes, isto posto, porque a idéia de Estado Liberal surgiu como patamar do conceito de direitos fundamentais.
Neste contexto, a Constituição surge como instrumento de afirmação dos direitos fundamentais, promovendo um Estado servidor e garantidor, diante disto, a Declaração dos Direitos do Povo da Virgínia (Em 1776, com a independência e surgimento do Estado Norte Americano) e a Declaração Francesa (1789, com a Revolução Francesa), inaugura a era dos direitos fundamentais Constitucionais.
Esses documentos inicias, que faziam parte da denominada fase do liberalismo, deram previsões para os conhecidos direitos fundamentais de 1° dimensão, onde foram assegurados direitos como liberdade,igualdade,vida,segurança,propriedade.O Estado se caracteriza pelo não intervencionismo,não havendo uma preocupação do mesmo em propiciar medidas que pudessem minimizar os problemas da sociedade.
Os direitos fundamentais de primeira geração, também denominados direitos civis, ou individuais e políticos são direitos de defesa do indivíduo perante o Estado. Sua preocupação é a de definir uma área de domínio do Poder Público, simultaneamente a outra de domínio individual.
Como impacto da industrialização e o crescimento das desigualdades sociais, no início do século XX, o conceito de igualdade começa a ser questionado e não mais se aceita a sua consagração formal, o Estado então começa a ser preterido como responsável por impor e preservar um bem estar para a coletividade, é o inicio do Estado Social e juntamente com ele os direitos fundamentais de 2° dimensão. A exigência passa a ser a intervenção do Estão na realização da Justiça Social.
Os direitos de segunda geração são chamados de direitos sociais, não porque sejam direitos de coletividade, mas por que se ligarem a reivindicações de Justiça Social - na maior parte dos casos, esses direitos têm por titulares indivíduos singularizados. [3]
Constituem os direitos fundamentais de segunda geração os direitos sociais, os econômicos e os culturais, quer em sua perspectiva individual, quer em sua perspectiva coletiva. Eles outorgam ao indivíduo direito a prestações sociais estatais, como assistência social, saúde, educação, trabalho, etc. Além disso, trouxe as liberdades sociais, como a liberdade de sindicalização, do direito de greve, direitos fundamentais dos trabalhadores (férias, repouso semanal remunerado, salário mínimo, limitação da jornada de trabalho). Acentuam o princípio da igualdade material.
Após o impacto tecnológico do pós Segunda Guerra, surgiram novas reivindicações fundamentais fundados nos idéias de direitos de solidariedade e fraternidade, relacionados à titulares difusos ou coletivos com objetivos voltados para a sociedade.
Os direitos de 3° dimensão voltaram-se para a proteção de um meio ambiente equilibrado, desenvolvimento social e econômico, a paz, a conservação do patrimônio histórico e cultural.
A 4° dimensão, surgiu dentro da ultima década por causa dos avanços tecnológicos, seriam direitos de responsabilidade, tais como promoção e manutenção da paz,democracia,informação,autodeterminação dos povos,defesa da bioética,dos direitos difusos entre outros.
As três gerações que exprimem os idéias de liberdade (direitos individuais e políticos),igualdade(direitos sociais,econômicos e culturais)e fraternidade(direitos da solidariedade internacional),compõe atualmente os direitos fundamentais.
O desenvolvimento e ampliação pelos quais passaram e passam os direitos fundamentais, acrescenta dificuldades quando nos propomos a conceituá-los. Além dos momentos históricos, outro obstáculo que dificulta a conceituação é a pluralidade de terminologias adotadas pela própria Constituição Federal, que utiliza expressões como: direitos humanos, direitos e liberdades fundamentais, direitos e liberdades constitucionais, direitos fundamentais da pessoa humana, direitos da pessoa humana, e direitos e garantias individuais.
Para José Afonso da Silva direitos fundamentais “são aquelas prerrogativas e instituições que o Direito Positivo concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas” [4]
Os direitos fundamentais são os direitos do homem juridicamente garantidos, seriam direitos objetivamente vigentes de uma ordem jurídica concreta, ou seja, são os enunciados constitucionais de cunho declaratório, com o objetivo de reconhecer a existência de uma prerrogativa fundamental do cidadão, tendo por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de proteção contra o arbítrio do poder estatal.
Por serem direitos que visam garantir ao ser humano, o respeito à vida, à liberdade e a dignidade, para o pleno desenvolvimento de sua personalidade, possuem características importantes como: historicidade, imprescritibilidade, irrenuciabilidade, inviolabilidade, universalidade, efetividade, interdependência e complementaridade.
Desta forma pode-se então definir os direitos fundamentais como sendo as normas que tenham por objetivo a garantias dos direitos considerados indispensáveis para o desenvolvimento digno do ser humano, criados em um conteúdo Histórico, não prescrevendo no decurso do tempo, ou seja, são direitos permanentes que não podem ser desrespeitados pelo direito público que possuem a função de atuar para garantia da efetivação destes direitos.
3. Considerações acerca dos princípios fundamentais:
O Brasil é uma República Federativa formada pelos Estados, municípios e Distrito Federal. Eles estão reunidos de forma indissolúvel por não haver desligamento. Federação, no Direito Público, é empregado como união indissoluvelmente instituída por Estados independentes para a formação de uma só entidade soberana.
É objetivo do Estado brasileiro, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, na garantia do desenvolvimento nacional, na erradicação da pobreza e da marginalização, na redução das desigualdades sociais e regionais e na promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
O Brasil constituiu-se com os princípios da: soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, pluralismo político. Destaca-se dentre os princípios apresentados à dignidade da pessoa humana, que significa respeitar os direitos fundamentais consagrados no art. 5. º da Constituição.
A pessoa é vista em nossa Lei Maior como valor a ser respeitado e tendo como princípio correspondente a dignidade da pessoa humana, que é absoluto sempre prevalecendo sobre os demais princípios, a sociedade passou a entender que o homem devia ser compreendido de acordo com os seus anseios, para que assim obtivesse sua realização pessoal, o que contribuiria para o desenvolvimento da família da qual ele era integrante.
Eleito como princípio norteador do sistema jurídico, a dignidade da pessoa humana elevou o indivíduo como principal fim de proteção e de desenvolvimento de sua personalidade como objetivo primordial. Sendo umas de suas funções não permitir que o indivíduo seja lesado em seus direitos.
Compreende-se, portanto, o descumprimento a esse princípio quando o Estado, responsável por dirimir os conflitos na sociedade,se exime ,deixando de aplicar o direito pelo transcurso do tempo. O Princípio da Dignidade da pessoa Humana é mitigado por processos que se dilatam no tempo.
Nas palavras do escritor José Saramago que, refletindo sobre a morte da Justiça, assim eternizou o que outrora quer se afirmar:
(...) Suponho ter sido a única vez que, em qualquer parte do mundo, um sino, uma câmpula de bronze inerte, depois de tanto haver dobrado pela morte de seres humanos, chorou a morte da Justiça. Nunca mais tornou a ouvir-se aquele fúnebre dobre da aldeia de Florença, mas a Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta de nossa casa, alguém a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira cotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria o mais exato e rigoroso sinônimo do ético. (...) Uma justiça exercida pelos tribunais, sem dúvida, sempre que a isso os determinasse a lei, mas também, e sobretudo, uma justiça que fosse a emanação espontânea da própria sociedade em ação, uma justiça em que se manifestasse, como um iniludível imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que a cada ser humano assiste. [5]
Os direitos fundamentais têm sua concretização baseada justamente na preservação a dignidade do indivíduo, quando a morosidade do sistema judiciário quebra esse liame, os princípios elevados à categoria de fundamentais na Constituição Brasileira de 1988 perdem o seu real sentido.
O Estado acaba por atropelar suas próprias regras, deixando de garantir o equilíbrio entre as medidas persecutórias do Estado e as medidas de defesa do cidadão, isso, dentro de um prazo razoável, pois não adianta acelerar o processo e atropelar as garantias individuais.
4. Princípio da Razoabilidade do processo:
Os princípios são valores básicos, inerentes a todos, que estão inseridos em uma sociedade desde a sua fundação, sendo à base de uma sociedade. Paulo Bonavides afirma que:
... princípios são verdades objetivas, nem sempre pertencentes ao mundo do ser, senão do dever-ser, na qualidade de normas jurídicas, dotadas de vigência, validez e obrigatoriedade[6]
Os princípios estão intrínsecos ao ser humano, não existindo nada acima deles. Por serem formadores das leis, sua violação é considerada gravíssima. Acerca disso, Celso Antônio Bandeira de Mello observa que:
Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo sistema de comandos. É amais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade.[7]
Diante desta perspectiva de importância dos princípios no ordenamento jurídico e da certeza de te-los garantidos pelo Poder Judiciário, é que a Constituição da República Federativa do Brasil, com a edição da emenda Constitucional 45/2004, trouxe a realidade jurídica o princípio da razoável duração do processo dentro das garantias fundamentais asseguradas a cada indivíduo, insculpido no inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal de 1988.
Os motivos que levaram o legislador a erigir a questão do tempo do processo ao nível de garantia fundamental mostram-nos uma insatisfação da sociedade com a prestação dado direito de ação, mas que a tutela jurisdicional deve ser efetiva, tempestiva e adequada, sendo atribuição do Estado alcançar este objetivo. tutela jurisdicional e o entendimento que a jurisdição não deve ser apenas "prestada" pelo Estado como decorrência
O direito processual moderno já supera a idéia de "prestação jurisdicional", preocupando-se com o sentido de tutela jurisdicional, e isso se pode observar em duas perspectivas: a tutela como resposta do Estado às expectativas sociais e normativas; depois, como proteção do indivíduo à lesão ou ameaça de lesão ao bem da vida, através do direito de ação.
Mas o tempo, assim como perpetua situações não guerreadas e corrói direitos que não são adequadamente tutelados na esfera jurisdicional, tem o poder de ir além da sua característica cronológica (horas, minutos, dias) e passa a interferir na própria concepção doprocesso, uma vez que é o tempo que controla a máquina judiciária. A questão do "tempo" é matéria que vem ocupando grande relevância no universo do direito. Primeiramente, porque é através dele que se desenvolve a sociedade, tanto com relação ao tempo cronológico, determinável, quanto ao tempo social, dos acontecimentos e das relações jurídicas que se operam na sociedade, portanto variável, e que imprimem o desenvolvimento de novas leis por parte do Estado.
As críticas a essa urgência que se verifica nos juízos de primeiro grau e, agora também nos tribunais de 2º grau e superiores, estão ligadas justamente à inefetividade do provimento jurisdicional.
O resultado esperado pelo processo por vezes é tão demorado que já perdeu sua finalidade ou, em casos mais raros, mostra-se imprestável à realidade fática que se apresenta na sociedade.
O princípio da razoável duração do processo, inserto na Carta Constitucional no art. 5º, LXXVII, por ocasião da Emenda Constitucional n. 45/2004 não é instituto novo. A Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida pelo Pacto de San José da Costa Rica, que tem o Brasil como signatário, estabelece em seu art. 8º, que o direito a ser ouvido com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz, imparcial, independente e competente para o exame da matéria, é pertinente a todos os indivíduos.
No dizer de Humberto Theodoro Júnior, tal garantia "trata-se de uma aproximação com o ideal do processo justo que entre os constitucionalistas contemporâneos funciona como um aprimoramento da garantia do devido processo legal. Para merecer essa nomen iuris, a prestação jurisdicional, além de atender aos requisitos tradicionais – juiz natural, forma legal, contraditório e julgamento segundo a lei – têm de proporcionar à parte um resultado compatível com a efetividade e a presteza”. [8]
Hoje em dia muito se discute acerca dos possíveis caminhos para se efetivar o novel inciso LXXVIII do artigo 5º, CF/88, vez que o legislador se omitiu ao não fixar qual seria o prazo considerado razoável para a duração do processo nem as medidas a serem usadas para sua implementação.
Levando em consideração os prazos processuais, há quem defenda que o ideal seria afixação de prazos peremptórios para a prática dos atos processuais, assim ter-se-ia um prazo inalterável dentro do qual, sem exceção, deve-se praticar o ato ou não mais se pode praticá-lo. Por outro lado, há doutrinadores que expõem a impossibilidade dessa fixação e, assim, se perpetuaria a indeterminação do prazo razoável.
De acordo com a Corte Européia dos Direitos Humanos haveria três critérios para delimitar o prazo razoável do processo: complexidade do assunto, comportamento das partes e atuação do órgão jurisdicional. Por esse posicionamento, o conceito de dilações indevidas ficaria indeterminado, impossibilitando a pré-fixação de prazos processuais.
No Brasil ainda não se tem uma definição concreta do que seria esse tempo razoável, restando às partes ficarem ao arbítrio do Juiz, decorrendo assim o descumprimento deste princípio fundamental, que nasceu com função de limitar a discricionariedade do juiz, trazendo uma resposta mais célere, mas acabou por se tornar letra morta diante da realidade do nosso Judiciário.
O certo seria que a violação do direito de ser julgado em um prazo razoável fosse reparada civilmente, pois o tempo perdido não se recupera, e desta forma o Estado-Juiz cumpriria com o descrito na base de nosso ordenamento jurídico.
5. Problemática da morosidade do Judiciário e prejuízo à efetividade (concretização) dos direitos fundamentais:
Infelizmente, a efetivação dos direitos fundamentais que como já afirmado, são direitos indispensáveis ao ser humano, vem a cada dia mais esbarrando na problemática da morosidade dos atos do poder judiciário.
A atrofia do Poder Judiciário aconteceu em razão de vários fatores ligados às grandes mudanças que atingiram nosso país durante as últimas décadas, com os movimentos a favor dos Direitos Humanos, abrindo, assim o caminho para o aparecimento de novas correntes visando facilitar o acesso à justiça e atenuar as desigualdades socioeconômico-culturais. Essa problemática conhecida como "morosidade da Justiça", não é fato novo e inesperado. É produto de um Judiciário que tem uma estrutura orgânico-administrativa anacrônica e regulamentada por procedimentos que não acompanharam as mudanças havidas na sociedade.
Várias são as causas que concorrem para a morosidade da justiça: o aumento populacional, a conscientização por parte dos cidadãos de seus direitos, a ênfase que se deu na Constituição Brasileira de 1988 sobre os direitos das pessoas, o que lhe valeu o nome de Constituição cidadã, a evolução tecnológica porque passa o mundo, tudo isto concorreu para a procura da justiça em uma escala, sem precedentes, e o Poder Judiciário não se aparelhou para enfrentar tanta demanda nos últimos tempos.
Dentre os fatores já levantados as condições materiais também é outro fator que causa a morosidade. O jurista Dalmo de Abreu Dallari afirma que:
em muitos lugares há juízes trabalhando em condições incompatíveis com a responsabilidade social da magistratura. A deficiência material vai desde as instalações físicas precárias até as absoletas organizações dos feitos: o arcaico papelório dos autos, os fichários datilografados ou até manuscritos, os inúmeros vaivens dos autos, numa infindável prática burocrática de acúmulo de documentos.[9]
Não se podendo deixar de lado os recursos humanos, número insuficiente de juízes, funcionários e auxiliares da justiça, para dar vazão ao fluxo crescente de feitos. Crescendo a necessidade de aumentar o quadro dos juizes, além de prepará-los adequadamente para enfrentar os novos desafios. Sem uma reciclagem, tanto dos servidores da escala superior quanto da inferior, impossível atingir uma qualidade que satisfaça aos anseios da população.
O direito está em crise, porque a ética e a moral também estão. A Justiça é morosa e sua demora é, em si, causadora da injustiça; porém, a injustiça generalizada é a causa da morosidade judiciária. Conta-se com as dificuldades no acesso à Justiça e a morosidadedo excesso de processos para não se cumprir, voluntariamente, com as obrigações. decorrente
A função principal do processo acaba por evadir-se no transcurso do tempo, o que era pra ser um meio de persuasão das partes acaba produzindo um feito contrario desta forma a morosidade acaba por ser um meio de postergar o processo e não se ver reconhecido o direito de quem o pleiteia.
As obrigações não são cumpridas porque a prestação jurisdicional tarda; a prestação jurisdicional é tardia porque o volume de processos é desproporcional à capacidade de julgar, volume ocasionado pelos que contam com a morosidade do Judiciário e deixam, por causa dela, de cumprir, voluntariamente, com suas obrigações. E enquanto a justiça resolve não andar, a parte fica sem ter seus direitos reconhecidos e o descrédito na instituição acaba sendo inevitável.
Torna-se necessário não só se facilitar o acesso ao judiciário mais também o fechamento do ciclo processual, é preciso tornar vantajoso tanto o cumprimento imediato das obrigações quanto à solução rápida dos litígios, fazendo com que os direitos fundamentais almejados sejam efetivamente cumpridos em suas funções.
Faz-se necessário uma democratização do Judiciário, onde o ato de julgar deixe de ser visto como uma concessão e passe a ser visto como um dever do magistrado, envolvendo ainda o direito e o dever do magistrado de receber o povo, embora isso não signifique antecipar julgamentos pelo dever de isenção. O juiz não pode encastelar-se nos gabinetes e negar-se a receber partes ou advogados necessários também que se proceda a um controle da justiça.
As reclamações contra a ineficiência das leis de nada servem. Os operadores jurídicos devem formular propostas concretas de reformulação legislativa, pressionar os legisladores, informar a opinião pública e, enquanto não consegue seus intentos, buscar soluções práticas para fazer com que a justiça não tarde, para que também não falhe.
6. Considerações finais:
A introdução do prazo razoável na prestação jurisdicional como princípio constitucional traz um compromisso do Estado para com o cidadão a fim de dar maior efetividade ao processo, em respeito a dar cumprimento aos direitos fundamentais perseguidos na demanda, sendo de suma importância a concretização dos direitos que lhes são constitucionalmente assegurados.
A demora na prestação jurisdicional causa às partes envolvidas ansiedade e prejuízos de ordem material a exigir a justa e adequada solução em tempo aceitável.
Entretanto, para que o princípio do prazo razoável do processo tenha a aplicação efetiva é necessária sua regulamentação e espera-se uma estruturação do Estado, com a destinação de verbas para investimento de ordem estrutural no Poder Judiciário, com a aquisição de equipamentos e a contratação de pessoal suficiente para atender de forma satisfatória aos cidadãos.
A Reforma do Judiciário inclina-se à necessidade de mudanças nas legislações vigentes a fim de adaptar-se ao novo rumo que o princípio do prazo razoável do processo requer.
Assim, entende-se que a reforma produzida pela Emenda Constitucional nº 45, no que se refere ao princípio do prazo razoável do processo, apenas apontou o caminho para se pensar em um novo processo, mais célere e efetivo. Muitas mudanças ainda serão necessárias para a sua completa aplicação, que deve ser aplicado pelos operadores do direito de forma coerente, com observação do princípio implícito da razoabilidade.
O Poder Judiciário deverá passar por profunda reforma para, de fato, atender a todos os anseios da sociedade no que tange ao prazo para apreciação definitiva de uma demanda. As medidas paliativas, em que pese auxiliem sobremaneira, não é a solução definitiva. A necessidade de sua completa reestruturação é premente: modernização, mais juízes, mais funcionários, melhores treinamentos. Não há milagre. Há, sim, interesse do Estado em, de fato, prestar a tutela jurisdicional que lhe compete, de forma efetiva e célere.
7. Referências Bibliográficas:
ANDRADE, Fernando Gomes. Direitos Sociais e Concretização Judicial: Limites e Possibilidades. Recife: Nossa Livraria, 2008,P.31
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2001,P 32.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
DALARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juizes, São Paulo: Saraiva, 1996,P 25
"Da Justiça à democracia, passando pelos sinos", texto de encerramento do 2º Fórum Social Mundial.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006;P 98.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo, Malheiros, 31°Edição, 2007, P69.
THEODORO JÚNIOR, Humberto.Alguns reflexos da Emenda Constitucional 45, de 08.12.2004, sobre o processo civil. Revista de Processo. n. 124. São Paulo, junho/2005.
[1] BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
[2] ANDRADE, Fernando Gomes. Direitos Sociais e Concretização Judicial: Limites e Possibilidades. Recife: Nossa Livraria, 2008,P.31.
[4] SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo, Malheiros, 31°Edição, 2007, P69.
[5] "Da Justiça à democracia, passando pelos sinos", texto de encerramento do 2º Fórum Social Mundial.
[6] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2001,P 32.
[7] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006;P 98.
[8] THEODORO JÚNIOR, Humberto.Alguns reflexos da Emenda Constitucional 45, de 08.12.2004, sobre o processo civil. Revista de Processo. n. 124. São Paulo, junho/2005.
[9] DALARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juizes, São Paulo: Saraiva, 1996,P 25.
Advogada Militante em Pernambuco. Graduada pela Associação Caruaruense de Ensino Superior em 2006.Pós Graduada em Direito Processual Civil pela FACOL em 2009. Professora de Direito Cosntitucional de Admnistrativo em cursos preparatórios pra concurso.Currículo registrado no Lattes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARRUDA, Vanessa Karla G de. Razoabilidade do processo e a concretização dos direitos fundamentais diante da morosidade do Judiciário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 maio 2010, 01:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19892/razoabilidade-do-processo-e-a-concretizacao-dos-direitos-fundamentais-diante-da-morosidade-do-judiciario. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
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