Co-autor: LUÍS FERNANDO RIBAS CECCON - Advogado. Pós graduado em Direito Civil e Processual Civil junto a Faculdade Damásio de Jesus.
De proêmio, mostra-se necessário delimitar o tema a ser tratado no presente estudo, qual seja, a proteção jurídica dispensada ao ponto comercial, bem como da medida judicial presente em sua sistemática jurídica, a ação renovatória.
Nessa vertente, dita-se a definição de ponto comercial, em simples termos, como sendo o local da exploração da atividade empresarial exercida pelo empresário. Trata-se da mera localização física do estabelecimento empresarial, sendo elemento constitutivo deste, podendo ainda, assumir-se como elemento de identificação da clientela, adquirindo apreciação econômica e, por isso mesmo, merecedor da devida guarida protetiva do Direito Empresarial.
Ora, é bem verdade que duas situações serão possíveis no caso em tela, a saber: ser o empresário proprietário do imóvel onde se encontra instalado o seu estabelecimento empresarial, sendo nesse caso, resguardado pelas normas ordinárias civilistas do direito de propriedade.
Em sentido diametralmente oposto, poderá o empresário figurar como locatário deste imóvel, situação da qual haverá espaço para as normas protetivas do direito empresarial e, sobretudo, da Lei de Locação (Lei 8.245/91), referindo-se, nesse aspecto, à locação não residencial.
Realmente, durante a exploração da atividade empresarial, dita o senso comum que o empresário locatário tenha extremo interesse na segurança jurídica de que seu contrato de locação perdurará pelo tempo, mesmo porque, em determinadas atividades, a localização pode se mostrar de grande valia para o bom desempenho do negócio, considerando-se a facilidade de acesso ao local, a localização dentro do município, a vizinhança e até mesmo, a formação da clientela.
Nesse sentido, é de interesse comum que haja proteção legal de seu direito à manutenção do contrato locatício, para que este não seja interrompido abruptamente pelo locador, vedando-se a este ou a terceiro de má-fé que se utilize ardilosamente da boa fama e da clientela construída pelo empresário naquele local, colhendo indevidamente os frutos obtidos após longos anos de trabalho.
Desta feita, identifica-se assim a famigerada proteção jurídica conferida ao ponto comercial, qual seja, a proteção da própria atividade empresarial.
Partindo-se de uma interpretação sistemática, verifica-se que o artigo 2.037 do Código Civil de 2002, justifica a regulamentação do presente estudo pela Lei de Locação, ao asseverar in verbis:
“Art. 2.037. Salvo disposição em contrário, aplicam-se aos empresários e sociedades empresárias as disposições de lei não revogadas por este Código, referentes a comerciantes, ou a sociedades comerciais, bem como a atividades mercantis”.
Desta forma, o intérprete aplicador do direito deverá se valer das disposições presentes na suso referida Lei de Locação (Lei 8.245/91), quando tratar da matéria de proteção ao ponto comercial.
Diante do texto legal acima transcrito, pode-se concluir que estarão sob o manto protetivo da locação não residencial os empresários, sejam pessoas físicas na forma de empresários individuais, sejam pessoas jurídicas na forma de sociedades empresárias.
De fato, assevera a boa doutrina, que igualmente serão merecedores da mencionada proteção jurídica as indústrias e as sociedades civis com fim lucrativo, desde que regularmente constituídas, segundo inteligência do artigo 51, §4º da Lei 8.245/91, que assim dispõe:
“Art. 51. (...)
§ 4º O direito a renovação do contrato estende - se às locações celebradas por indústrias e sociedades civis com fim lucrativo, regularmente constituídas, desde que ocorrentes os pressupostos previstos neste artigo.”
Oportuno indagar, nesse momento, acerca do mecanismo jurídico de proteção reservado ao empresário locatário, para fazer frente ao desejo injustificado e, eventualmente, temerário do locador em intentar desfazer repentinamente o contrato de locação, atitude essa, que a depender das circunstâncias fáticas podem trazer sérios prejuízos ao bom andamento da atividade empresarial.
Nessa seara, a pedra angular denomina-se ação renovatória ou simplesmente renovação compulsória, podendo ser delimitada, em síntese, como sendo a possibilidade jurídica dada ao empresário locatário de obrigar o locador a continuar locando o seu imóvel.
Todavia, não será exercido o direito à renovação compulsória de forma discricionária e irresponsável, ao livre alvedrio do empresário locatário, a seu absoluto juízo de oportunidade e conveniência, não. Por se tratar de manifesta restrição ao direito constitucional de propriedade do ponto de vista do locador, a própria Lei 8.245/91 trouxe em seu corpo os requisitos legais para a concessão de tal medida.
Com efeito, assim dispõe o artigo 51, da Lei de Locação:
“Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:
I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;
II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos;
III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.”
Passa-se a análise criteriosa de cada um desses dispositivos. Senão vejamos:
Para fins meramente didáticos, adota-se uma divisão entre os requisitos preconizados pela Lei de Locação, como necessários à concessão da renovação compulsória, em dois grupos: o primeiro grupo contendo os requisitos de ordem formal e, o segundo, abrangendo os requisitos de ordem temporal.
Concernente ao grupo de requisitos de ordem formal, pode-se elencar tais elementos:
a) locatário empresário – aqui, encontram amparo legal tanto o empresário pessoa física (empresário individual), quanto o empresário pessoa jurídica (sociedade empresária).
Contudo, pode acontecer que o contrato de locação tenha sido assinado em nome de sócio da sociedade empresária; sendo que, nesse caso, nenhum óbice haverá para que se proceda à renovação do contrato de aluguel, mesmo sendo o sócio um não empresário.
Também encontrará respaldo legal, a pessoa jurídica locatária que se apresenta como sociedade simples. Sendo assim, consectário lógico do que aqui fora exposto, afirma-se que apenas não fará jus ao instituto jurídico da renovação compulsória a pessoa física não empresária.
b) locação para fins comerciais – realmente, toda a disciplina do caso em tela se resume ao interesse do empresário em manter-se no imóvel onde se encontra o seu estabelecimento empresarial, ou, ao menos, ao interesse daquele que exerce atividade mercantil;
c) cumprimento integral do contrato anteriormente firmado – trata-se de requisito óbvio e decorrente do senso comum, sob pena de se ter declarada judicialmente a rescisão contratual antes mesmo de intentada qualquer ação renovatória.
d) contrato inicial celebrado por escrito e por prazo determinado – mostra-se como requisito específico para a renovação compulsória, mesmo porque, nada impede que haja contrato de locação não residencial celebrado oralmente e/ou com prazo indeterminado, que seja plenamente válido.
No que tange ao grupo de requisitos de ordem temporal, temos as seguintes exigências legais:
a) prazo mínimo de locação de 05 (anos) anos – aqui, sustenta-se que a locação tenha que ter se perdurado inicialmente, por um prazo mínimo de 05 (cinco) anos; pouco importando se tal lapso temporal se desenvolveu por ocasião de um único contrato de locação ou de vários, em trato sucessivo e ininterrupto.
Nesse diapasão, interessante se mostra a questão dos denominados “pequenos lapsos temporais”, que diuturnamente podem ocorrer na prática locatícia, onde por desídia ou mesmo por costume local, não se formaliza a renovação do contrato de locação logo de imediato ao seu término. Contudo, nada muda na relação empresarial e no trato diário entre locador e locatário.
Nesses casos, a boa doutrina amparada pelo posicionamento dos Tribunais Superiores já pacificaram que não haveria óbice à renovação compulsória, analisados os casos concretos, sempre sob à luz da boa fé objetiva dos contratos.
Tal benefício pode ser estendido até ao sucessor ou cessionário do locatário, conforme entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, a saber: SÚMULA Nº 482 - O LOCATÁRIO, QUE NÃO FOR SUCESSOR OU CESSIONÁRIO DO QUE O PRECEDEU NA LOCAÇÃO, NÃO PODE SOMAR OS PRAZOS CONCEDIDOS A ESTE, PARA PEDIR A RENOVAÇÃO DO CONTRATO, NOS TERMOS DO DECRETO 24150.
Há que se ressaltar ainda, posicionamento peculiar do Superior Tribunal de Justiça em que foi valorizado o tempo de locação ao revés dos requisitos de ordem formal, quanto ao contrato ser por escrito e por prazo determinado. Valorizou-se, in casu, o contrato de locação que se sucedera por mais de 30 anos de forma verbal, exigindo-se apenas que um único contrato de locação fosse feito, anteriormente à propositura da ação renovatória, ainda que de 01 ano, apenas para ser tomado como padrão de referência no caso concreto.
b) prazo mínimo de exploração da mesma atividade empresarial de 03 (três) anos – a razão de ser desse requisito se encontra no fato de que, toda a sistemática da ação renovatória de aluguel tem por objeto imediato a proteção do ponto comercial e, por objeto mediato, a proteção da clientela.
Ora, partindo-se desse pressuposto, entendeu o legislador pátrio que, antes de completado o prazo mínimo de 03 (três) anos na mesma atividade empresarial, o empresário individual ou a sociedade empresária ainda não constituíram clientela que mereça a proteção do instituto jurídico em análise.
Destarte, preenchidos todos os requisitos acima transpostos, poderá o empresário locatário usufruir da proteção jurídica que a renovação compulsória lhe oferece, vendo-se o locador obrigado a renovar o contrato nos termos do último pacto firmado, adaptando-se, por óbvio, a nova avença ao preço de mercado, que normalmente, será arbitrado pelo magistrado competente.
Sumamente importante é apontarmos o conteúdo do artigo 51, § 5º da Lei 8.245/91, que preconiza:
“Art. 51. (...)
§ 5º Do direito a renovação decai aquele que não propuser a ação no interregno de um ano, no máximo, até seis meses, no mínimo, anteriores à data da finalização do prazo do contrato em vigor.”
Em conclusão, afirma-se que, muito embora não haja limite legal para o exercício do direito de renovação compulsória, nem mesmo quanto ao prazo pelo qual se dará essa renovação, tal direito decairá, caso não seja exercido no lapso temporal compreendido entre 01 (ano) e 06 (seis) meses anteriores ao término do contrato, o qual intenta-se renovar, conforme dispositivo legal da Lei de Locação suso mencionado.
AUTORES COLABORADORES: MARINA VANESSA GOMES CAEIRO
LUÍS FERNANDO RIBAS CECCON
ADVOGADA, DEVIDAMENTE INSCRITA NA OAB/SP SOB Nº 221.435 E ESCRITORA DE ARTIGOS E LIVROS JURÍDICOS. PÓS GRADUADA EM DIREITO TRIBUTÁRIO PELA PUC/SP E PÓS GRADUADA EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL PELA FACULDADE DE DIREITO DAMÁSIO DE JESUS. AUTORA DA OBRA: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA NOS TEMPLOS E CULTOS RELIGIOSOS (ISBN 978-85-7786-023-4) PELA EDITORA RUSSELL. CONTATOS ATRAVÉS DO EMAIL: [email protected].
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAEIRO, Marina Vanessa Gomes. Ação renovatória - a instrumentalização da proteção jurídica do ponto comercial Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jul 2010, 01:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/20363/acao-renovatoria-a-instrumentalizacao-da-protecao-juridica-do-ponto-comercial. Acesso em: 23 dez 2024.
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