1. 1 INTRODUÇÃO
A Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional 64/2010 erigiu os alimentos à categoria de direito social passando o art. 6º da Constituição Federal de 1988 a vigorar com a seguinte redação:
São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Os direitos classificados como sociais são os considerados fundamentais ao homem, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito e que tem por finalidade a melhoria de condições de vida dos hipossuficientes.
Embora tenha tamanha importância e um caráter tão essencial, não é raro perceber a dificuldade do Poder Judiciário em garantir aos jurisdicionados a efetiva percepção dos alimentos que lhe foram concedidos por meio das ações judiciais. Na maioria das ações o credor percorre toda a marcha processual, aufere a declaração do direito aos alimentos, tem o valor da prestação definido, utiliza todos os meios judiciais para forçar o devedor a pagar, mas não consegue receber uma só prestação alimentícia.
A inadimplência dos devedores de alimentos é um problema grave, que chega a prejudicar o bem-estar e a subsistência dos credores, já que muitos dependem da prestação e enfrentam grandes dificuldades de sobrevivência diante da despreocupação do credor em cumprir com uma obrigação que é, no mínimo, moral, humana. Nunca será demais programar mecanismos que visem a forçar o devedor a cumprir a sua obrigação alimentar, especialmente se esses, tiverem como resultado, também, a redução do número das demandas judiciais.
O presente trabalho tem por objetivo, justamente, analisar um meio que, tem se despontado no mundo jurídico, com o objetivo de efetivar o direito aos alimentos àqueles que o buscam por meio das demandas individuais: a negativação do nome do devedor de alimentos por meio dos cadastros dos serviços de proteção ao crédito, SPC e Serasa.
2. A OBRIGAÇÃO ALIMENTAR
Nas palavras de Cahalli (2009, p 15.), a obrigação alimentar é um
(...) instituto cujos princípios são remarcados por uma acentuada complexidade, com reclamo de permanente atualização de seus estudos; do dissídio sobre a pluralidade de seus aspectos resulta um variegado de fórmulas legislativas e jurisprudenciais que a experiência da vida apresenta diuturnamente.
Por alimentos, deve-se entender tudo aquilo de que o ser humano necessita para sobreviver dignamente, incluindo, então, a própria alimentação, vestuário, medicamentos, habitação etc; incluindo também o sustento intelectual e moral. Em sentido técnico, os alimentos são a obrigação imposta a alguém, em função de uma causa jurídica prevista em lei, de prestá-los a quem deles necessite.
A obrigação de prestar alimentos é uma conseqüência da própria natureza humana que desde a sua concepção tem necessidades das quais depende a sua sobrevivência e, quando não tem condições de provê-los por si mesmo, a lei atribui a alguém o dever legal de prestá-los. A obrigação pode ser decorrente de vínculo de parentesco, devidos entre pais e filhos, por exemplo, ou de vínculo afetivo, devidos em função da dissolução do casamento ou da união estável.
3. OS CADASTROS DOS SERVIÇOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO
No Brasil, os arquivos de informações sobre os consumidores são um fenômeno recente. Em 1950 e 1960, o parcelamento dos preços de produtos e serviços (vendas a prazo) era uma tarefa dificultosa tanto para o fornecedor quanto para o consumidor. O procedimento revelava-se demorado, oneroso e de difícil manuseio. Cada empresa precisava organizar sua própria estrutura para viabilizar o financiamento sem prejudicar a sua segurança econômica. O cliente se submetia ao preenchimento de um cadastro minucioso, informando alem dos dados pessoais, outros estabelecimentos onde já havia adquirido produtos ou serviços com pagamento a prazo. As empresas tinham ainda, que contratar informantes, pessoas que detinham a função exclusiva de verificar a veracidade das informações que o candidato ao crédito apresentasse. Verifica-se assim, que nesse período, os cadastros de consumidores eram produzidos, individualmente, pelos empresários.
Segundo Stüner (citado por GRINOVER et tal., 2004, p. 401) foi em Porto Alegre que surgiu o primeiro SPC do Brasil, em 1950, quando 27 empresários da cidade, em reunião realizada na Associação Comercial, fundaram, como associação civil sem fins lucrativos, o Serviço de Proteção ao Crédito – SPC. Posteriormente, São Paulo criou o segundo SPC do país e em 1962 realizou-se em Belo Horizonte o 1º Seminário Nacional de SPC’s.
Hoje, existem no Brasil inúmeras organizações operando como bancos de dados de consumo, mas os principais são o SPC e a Serasa.
O SPC foi criado com o objetivo de centralizar em um único Banco de Dados informações de pessoas físicas e jurídicas, auxiliando na tomada de decisão para concessão de crédito pelas empresas em todo o país e contribuindo de maneira relevante para o desenvolvimento do Mercado de Consumo. É um provedor de serviços e soluções para o mercado de consumo representado pelas CDLs - Câmaras de Dirigentes Lojistas - nos municípios, que reúnem informações do comércio nacional desde os pequenos lojistas até os grandes magazines, indústrias, serviços e mercado financeiro. É uma empresa de tecnologia vinculada à Confederação Nacional dos Dirigentes Logistas - CNDL para processar e armazenar todas as operações de crédito realizadas pelas empresas associadas.[1]
A Serasa Experian, parte do grupo Experian, é o maior bureau de crédito do mundo fora dos Estados Unidos, detendo o mais extenso banco de dados da América Latina sobre consumidores, empresas e grupos econômicos. Há mais de 40 anos presente no mercado brasileiro, participa da maioria das decisões de crédito e negócios tomadas no País, respondendo on-line/real-time a 4 milhões de consultas por dia, demandadas por 400 mil clientes diretos e indiretos. O diferencial da Serasa Experian está em oferecer soluções integradas que abrangem todas as etapas do ciclo de negócios: prospecção de mercado, gestão de clientes, retenção e rentabilização, aquisição e concessão de crédito, gestão do portfólio de crédito, gestão de cobrança e fraude e validação.[2]
No intuito de proteger o consumidor e todos aqueles que podem ter seus nomes negativados, o Código de Defesa do Consumidor impõe limites e responsabilidades à atuação dos órgãos de proteção ao crédito. Ter o nome negativado pode gerar inúmeros dissabores, ainda mais se isso for feito de maneira irresponsável com a utilização de informações inverossímeis, por exemplo.
Nesse contexto, o cadastro do devedor só pode ser efetivado quando houver absoluta certeza do débito e convicção sobre a informação em si mesma considerada. O credor só pode peticionar a inscrição da restrição quando o débito restar incontestado, seja por conformismo do devedor, seja por decisão judicial.
Além disso, as informações a ser incluídas nos cadastros de proteção ao crédito devem ser somente as relacionadas com o mercado de consumo, o § 1º do artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor exige que as informações sejam claras e objetivas, vedando-se assim, dados referentes à intimidade, à família, ao caráter do devedor e quaisquer outras que em nada se relacionem com o mercado de consumo.
Ainda quanto às informações constantes dos cadastros dos serviços de proteção ao crédito, o Código de Defesa do Consumidor exige que essas informações sejam claras e transparentes, além de garantir ao consumidor o direito de ser comunicado quando da inserção da informação, o direito de acesso e de retificação, caso conste algum equívoco e, ressalte-se, a informação tem que estabelecer exata correspondência com o fato que a deu causa.
Os cadastros de proteção ao crédito existem com a finalidade de auxiliar o funcionamento do mercado de consumo, logo, as informações contidas nele não são públicas e não podem ser acessadas por qualquer pessoa. O acesso será possível com o preenchimento de duas condições cumulativas:
a) solicitação individual decorrente de b) uma necessidade de consumo. Fora disso, qualquer utilização implicará mau uso, sujeitando os infratores (o que dá e o que recebe) às sanções penais, civis e administrativas aplicáveis às hipóteses de invasão de privacidade (GRINOVER et tal., 2004, p. 437).
A divulgação de informações negativas sobre alguém é uma prática que exige responsabilidade e cautela, por essa razão é perfeitamente louvável toda a proteção que o Código de Defesa do Consumidor estabelece em prol dos seus destinatários, até porque o faz com base na própria Constituição que garante a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e a inviolabilidade da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, X). Nesse contexto, por disposição do § 4º do art. 43 do CDC, os serviços de proteção ao crédito são entidades de caráter público e estão sujeitos ao habeas data.
As informações inseridas nos cadastros dos serviços de proteção ao crédito possuem vida útil e respondem pelo limite temporal, assim o Código de Defesa do Consumidor fixou dois prazos, o lapso de cinco anos e o correspondente à superveniência da prescrição da cobrança de débitos do consumidor, após esses prazos nenhuma informação poderá permanecer nos cadastros, tampouco ser divulgada.
Duvidas não há de que as informações prestadas pelos órgãos de proteção ao crédito são decisivos em uma transação comercial, aquele que possui o nome negativado junto aos cadastros desses órgãos terá dificuldades em auferir crédito junto à sociedade comercial.
4. CONCLUSÃO
Com base no que aqui foi explicitado e tendo por base decisões já proferidas em Tribunais brasileiros, pode se concluir pela possibilidade de inclusão do nome do devedor de alimentos nos cadastros dos serviços de proteção ao crédito. Pois esse mecanismo equipara o devedor de alimentos a qualquer devedor da esfera civil, dificulta a sua movimentação financeira, pode gerar inúmeros prejuízos de ordem econômica e se revela mais viável até mesmo do que a própria prisão civil (art. 733 do CPC), pois na prática localizar o devedor para proceder à prisão tem se revelado uma tarefa difícil. Nessa hipótese, mesmo que o réu for revel, a medida poderá ser praticada e ele sofrerá as sanções em virtude do descumprimento da obrigação alimentar. Enfim, a fase de cumprimento de sentença poderá ser revestida de maior eficácia.
Não existe atualmente uma regulamentação legal que determina ou que permita a negativação do nome do devedor de alimentos, mas o art. 19 da Lei nº 5.478/68 prevê que cabe ao juiz da causa tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, o que autorizaria essa prática.
De antemão, é possível afirmar que, a inclusão do nome do devedor de alimentos não tem por objetivo garantir o débito questionado, nem punir o devedor faltoso ou coagi-lo ao pagamento, o objetivo é alertar aos outros empresários/credores sobre o risco de negociarem com determinado devedor.
De toda sorte, aquele que tem efetivo interesse ou necessidade de um crédito, estará forçado a saldar a dívida que, por inadimplemento seu, deu causa à negativação e, assim, “limpar” seu nome. Se, não ter crédito equivale a ser um nada na atual sociedade consumeirista, por via transversa, incluir o nome do devedor de alimentos nos cadastros dos serviços de proteção ao crédito, pode ser sim um mecanismo eficaz no sentido de forçar o devedor de alimentos a ser adimplente.
5. REFERÊNCIAS
BRASIL, Constituição, 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> Acesso em 19 nov. 2010.
BRASIL. Lei n° 5.478, de 25 de julho de 1968. Dispõe sobre a ação de alimentos e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> Acesso em 19 nov. 2010.
BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> Acesso em 19 nov. 2010.
CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
COSTA, Gabriela Jordão Duarte. Obrigações Alimentares: Devedores contumazes podem ter seus nomes cadastrados no SPC e no Serasa. Disponível em < http://www.rubensnaves.com.br> Acesso em 24 nov. 2010.
FARIA, Alexandre Augusto Silva. Opinião: O dever de prestar alimentos pelos avós. Disponível em <http://www.clicfolha.com.br> Acesso em 19 nov. 2010.
FRANÇA, Júnea Lessa, VASCONCELLOS, Ana Cristina de. Manual para normalização de publicações técnico-científicas. 8. ed. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2007
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. v4.
GRINOVER, Ada Pellegrini et tal. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
LAGRASTA, Caetano. Inserção do nome do devedor de alimentos nos órgãos de proteção ao crédito. In Tribunal de Justiça de São Paulo, Seção de Direito Privado. Texto enviado para divulgação pelo DESEMBARGADOR CAETANO LAGRASTA, na qualidade de Presidente da Coordenadoria de Estudos, Planejamento e Acompanhamento de Projetos Legislativos, que foi publicado pela Revista Brasileira de Direito e Sucessões - IBDFAM , ed Abril/Maio 2010, pp 104/110. Disponível em < http://www.tj.sp.gov.br> Acesso em 19 nov. 2010.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004.
Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Paula Graciele Pereira. Da possibilidade de inclusão do nome do devedor de alimentos nos cadastros dos serviços de proteção ao crédito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 dez 2010, 10:55. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/22821/da-possibilidade-de-inclusao-do-nome-do-devedor-de-alimentos-nos-cadastros-dos-servicos-de-protecao-ao-credito. Acesso em: 23 dez 2024.
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