RESUMO: O presente artigo científico, analisa a inteligência da lei complementar nº 105/2001, na qual autoriza o Fisco a ter acesso aos dados bancários do contribuinte sem que seja necessária a prévia requisição judicial com vistas à maior efetividade da obtenção ao crédito tributário. Demonstra também que a norma supra-referida não fere o primado constitucional da intimidade, sendo fundamental mecanismo para o combate aos crimes tributários, propiciando mais justa e equilibrada tributação.
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Desenvolvimento 2.1 Abordagem Constitucional 2.2. A Instituição do Sigilo Bancário 2.3. A inteligência da Lei Complementar 105 de 2001 3. Considerações finais Referências.
1. INTRODUÇÃO
A presente pesquisa analisa o atilamento da lei complementar de número 105 do ano de 2001, na qual, autoriza o Fisco a ter acesso a dados bancários do contribuinte sem que seja necessária a prévia requisição judicial com vestimenta à maior efetividade da obtenção do crédito tributário, em situações pontuais.
No que concerne aos dados de seus correntistas, na existência do dever de segredo dos bancos, impetrados em razão da atividade financeira, é tema para um longo estudo jurídico. Diz-se que “o segredo é a alma do negócio”, em aplanamento perigoso que só atende, em princípio, aos interesses das instituições de financiamento, sendo o sigilo uma das razões de seu sucesso.
Este artigo, não possui a pretensão de esgotar o tema discutido, mas tão-somente consentir que novos argumentos, cientificamente fundados, sejam capazes de aditar fatos novos ao exame em questão.
Diante das alegações de inconstitucionalidade da lei complementar 105/2001, objeto de várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade, propõe este trabalho científico encetar novas adjacências à discussão, trazendo à colação elementos de lógica multidisciplinar, certamente úteis a melhor compreensão do cenário vigente à época da edição do texto legal.
O direito ao sigilo bancário se enquadra no rol dos direitos constitucionais à intimidade, sendo somente possível ao magistrado mitigar esta circunstância, através de juízos de ponderação quanto aos interesses envolvidos. Costumeiramente só se dá voz a quem decide publicamente posicionar-se contra a quebra do sigilo bancário, sendo assaz difícil vislumbrar a exposição pública de um ponto de vista contrário a estes maiores interesses, o que, não raro, ocorre por intermédio de autoridades fiscais, desnudos de sua condição de administradores públicos.
Este trabalho científico relata um breve histórico do instituto do sigilo bancário, sua conceituação enquanto aspecto de relevância no ordenamento jurídico dos Estados, bem como se transitará por algumas teorias explicativas do fenômeno, capacitando-nos a melhor compreender a evolução do sigilo.
O poder de tributar é outorgado aos estados, em consonância com o artigo 37 da Lei Magna. O encargo público que encerra esta atividade, dotando da premissa de indisponíveis os créditos tributários, deverá ser exercido de forma eficiente, sendo capaz de assegurar à tributação a busca da real capacidade de contribuir dos sujeitos passivos da obrigação tributária. A tributação justa tem por premissa a obediência ao princípio constitucional da capacidade econômica, já assentado como garantia individual do contribuinte, a teor de decisão da Corte Suprema Brasileira, na qual tem por vista a obtenção da desejável justiça fiscal, também, será objeto de pesquisa neste trabalho.
A ensejo do tema a ser discutido, surge por força da publicação da Lei Complementar 105, de 10 de janeiro de 2001 que, entre outros assentamentos, disciplinou a possibilidade de ter a fazenda pública acesso direto às contas bancárias dos contribuintes, independentemente de prévia autorização de um magistrado, sempre que existir procedimento administrativo instaurado, e os dados bancários forem considerados indispensáveis à instrução processual.
Diante que, o dever de sigilo se enquadra no corpo de direitos e garantias constitucionais, empreender-se-á oportuna pesquisa referente aos direitos à personalidade, e sua extensão à intimidade e à vida privada, tidas como supostas premissas deste sigilo.
Ao colocar em cheque o próprio status de direito absoluto concernente ao direito à intimidade, faz pesquisar acerca da ponderação de interesses no plano constitucional brasileiro, em que os princípios da razoabilidade e proporcionalidade entram em cena, seja no âmbito legislativo, quanto no judicial.
Em face dos ditames desta lei complementar, no contexto sócio-político em que ela está inserida, não há em se apartar.
Por fim, almeja-se analisar com profundidade os meandros da Lei Complementar 105/2001, baseado em dados bibliográficos tais como, livros, enciclopédias, periódicos, revistas e jornais especializados. Vale ressaltar que, além dessa pesquisa minuciosa, também serão consultados documentos oficiais, os quais se podem citar: certidões, processos judiciais e jurisprudências. Do mesmo modo, a pesquisa eletrônica e de observação será uma fonte preciosa de consulta. Tudo isso para buscar a mens legis dos ditames por ela introduzidos no ordenamento jurídico pátrio.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1. ABORDAGEM CONSTITUCIONAL
A Constituição Federal em vigor, diz expressamente em seu texto os ditames mais basilares da proteção aos direitos fundamentais do cidadão, tal como o direito à vida, à liberdade, à honra, erigidos à categoria de direitos imutáveis, cláusulas pétreas da Lei Magna.
O artigo 5º, § 2º, da Lei Maior, dispõe que os direitos e garantias expressos em seu texto não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou decorrentes dos Tratados Internacionais de que o país seja signatário.
O direito da personalidade é decorrente de direitos essenciais inatos, fundamentais à consecução dos fins naturais do homem e decorrem da condição de pessoa de seu titular, conforme afirma Covelho[1] .
Alexandre de Moraes[2] em sua obra menciona que os direitos fundamentais resultam em previsões absolutamente necessárias a todos os diplomas constitucionais, visando consagrar o respeito à dignidade humana e propiciando a limitação do poder estatal para o desenvolvimento da personalidade do homem.
Em regra os direitos decorrentes da personalidade guardam semelhanças entre si. Estas semelhanças nos permitem concluir que há características próprias quanto a eles, e que lhes dão o talho definitivo. Para a grande maioria dos autores, estes direitos revestem-se de caráter absoluto, extra-patrimonial, sendo ainda vitalícios, intransmissíveis e imprescritíveis.
Ao cenário e a despeito do desejo de viver em sociedade, que o homem vislumbra resguardar uma parcela assaz significativa de sua intimidade à curiosidade dos outros e ao domínio público, visando sua própria proteção: a preservação de um espaço interno incólume de interferências exógenas e garantidor de direitos atrelados à sua dignidade.
Quanto ao conceito de vida privada, aquela que esta protegida da interferência ou curiosidade dos outros, onde são resguardados aspectos pessoais que envolvem privacidade, segredos e intimidade.
Pressupõe a proteção da vida privada a defesa intransigente de outros direitos dela decorrentes, como o direito à honra, à intimidade, à privacidade, que devem ser preservados da curiosidade e da intromissão de terceiros.
A Ada Pellegrini Grinover[3] esclarece que a intimidade representa uma esfera de que o indivíduo necessita vitalmente para poder livre e harmoniosamente desenvolver sua personalidade, ao abrigo de interferências arbitrárias. E com base nesse conceito, o direito à intimidade há de ser reconhecido como fator primordial em qualquer sistema de liberdades públicas.
O ordenamento jurídico brasileiro tem reconhecido no direito à intimidade uma conotação bastante ampla, capaz de resguardar aspectos tão diversos desta intimidade como, por exemplo, a honra, a imagem, a vida privada, a privacidade das correspondências, o sigilo de dados, a inviolabilidade do lar, apenas para citar algumas.
A Constituição Federal incluiu em suas previsões legais a proteção ao direito à intimidade e ao sigilo de dados, sendo posição francamente majoritária na doutrina e jurisprudência brasileiras a extensão dessas premissas ao sigilo bancário, ali não expressamente mencionado, mas entendido como dever implícito na norma. O acesso aos
dados bancários, quando necessários, deverá ser autorizado pelo poder judiciário, que analisará a legalidade desta transferência de dados.
Advindo a Lei Complementar nº 105/2001, criou-se novo ambiente propício à discussão dos limites deste sigilo, face à disposição expressa facultando ao fisco o acesso direto aos dados independente de requerimento judicial.
O Código Tributário Nacional (Lei 5.172/66), lei esta que em sua disciplina das normas gerais de direito tributário igualmente possui status de lei complementar, por força supletiva do artigo 192 da CF/88. Tal codificação, em seu artigo 197, II, estabelece o dever dos bancos, casas bancárias, caixas econômicas e demais instituições financeiras, de fornecerem mediante intimação escrita do fisco, as informações de que disponham com relação a bens, negócios ou atividades de terceiros.
Para vários doutrinadores este artigo impõe a não validade das regras de sigilo bancário para a administração tributária. Tal é a conclusão de Covello, que afirmou inexistir o sigilo bancário frente ao fisco.
Advindo a Lei Complementar nº 105, de janeiro de 2001, e do Decreto 3.724, do mesmo ano, mudou-se o foco do dever do sigilo, persistindo sua disciplina, mas disciplinadas as hipóteses autorizativas de sua flexibilização e transferência a terceiros, sem necessária requisição judicial. Relativamente a esta legislação, oportunamente será emitido mais detalhado juízo.
Sustenta a Constituição Federal que a proteção ao sigilo bancário encontra respaldados nos incisos X e XII do artigo 5º, em ambos as previsões pro força das construções de autores e da jurisprudência majoritária dos tribunais. No caso da proteção ao sigilo de dados exteriorizam-se os dados bancários, como subespécies deste e, portanto, albergadas pelo segredo.
A Constituição Brasileira agasalha inúmeros princípios implícitos, que refletem valores fundamentais partilhados por grande parcela da sociedade, como por exemplo, o da proporcionalidade das leis, da interpretação do interesse público, da presunção da constitucionalidade das leis, da interpretação conforme nossa Carta Magna, da motivação dos atos administrativos, do efeito retroativo das decisões no controle de constitucionalidade das leis, entre vários outros.
Em espírito de conciliação, e objetivando que sejam expurgadas as ilegalidades e contidos os abusos de poder, que se vislumbra a importância do uso do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.
Forçoso é concluir que o princípio da proporcionalidade, de inspiração germânica, e o princípio da razoabilidade do direito norte americano, se aproximam em sua essência. Tanto a busca de ponderações proporcionais em que se almeje a melhor adequação da norma, seja na verificação de sua razoabilidade e adequação aos fins almejados, percebe-se a influência e pujança destes dois princípios exegéticos, no tocante à ponderação de interesses no plano constitucional.
2.2. A INSTITUIÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO
A atividade bancária é das mais antigas que há, remontando a tempos idos é observado na antiga Babilônia, junto ao povo hebreu e na Grécia, onde os templos religiosos funcionavam como verdadeiras instituições de custódia e empréstimo de valores, como .relatou Sérgio Carlos Covelho[4] em sua obra sobre o Sigilo Bancário.
Envolvendo comerciantes, agricultores e todos quantos necessitassem desta atividade, sacerdotes eram encarregados de ultimar operações negociais. Devido à evolução da atividade bancária, principalmente com a sua profissionalização, a guarda de bens e de informações quanto à vida econômica do cliente, passou a se revestir ainda mais da condição de sigilo, a esta época já com a roupagem de sigilo profissional, dada à especificidade da prestação bancária e das características do exercício.
A positivação do direito bancário deveu-se fundamentalmente à busca de segurança jurídica para albergar suas práticas de usos e costumes.
O significado da palavra sigilo, posto que inequivocamente é atrelada ao segredo, ou seja, aquilo que não se deve revelar.
Na visão do Professor Aurélio Buarque de Holanda[5], o sigilo profissional, é um dever ético que impede a revelação de assuntos confidenciais ligados à profissão, segredo profissional.
A conotação do que é sigilo bancário é variável de doutrinador a doutrinador, sendo que estas caracterizações, por vezes, enfocam o dever de sigilo, em caráter de obrigação exigida dos bancos em razão de seu mister profissional, ou em algumas opiniões, refletem o instituto sobre o ponto de vista dos clientes, como verdadeiro direito subjetivo a eles ínsito.
Para Brandão[6] o sigilo bancário é o dever jurídico imposto às instituições financeiras, consistente em não revelar a terceiros, sem motivo justificado, dados pertinentes à sua clientela, que tenham chegado a seu conhecimento por decorrência da relação jurídica que os vincula.
A opinião de Sérgio Covello[7] para quem o sigilo bancário é obrigação que têm os bancos de não revelar, salvo justa causa, as informações que venham a obter em virtude de sua atividade profissional.
A dificuldade em se perceber a exata extensão do instituto se deve a seu caráter dúplice, traduzindo por vezes não só um verdadeiro direito ao cliente da instituição bancária, o qual estaria protegido pela inviolabilidade de seus dados pessoais, mas também uma prática profissional dos agentes bancários, visando corresponder à premissa da confiança que lhes foi depositada, quanto à guarda e administração de valores pertencentes a outrem.
Sérgio Covello[8] sustenta: em se tratando do sigilo bancário, o problema do fundamento jurídico se agrava ainda mais, porque nem todos os ordenamentos têm disposição legal que estabeleça de maneira inequívoca essa obrigação de segredo, e que tomados pela ânsia do positivismo legal, são impelidos a recorrer a malabarismos jurídicos para justificar a obrigação de sigilo bancário, originando as mais diversas teorias.
Não resta a menor dúvida de que o sigilo bancário tem origem consuetudinária, tendo se iniciado pelo simples uso, evoluído como hábito e transformado em costumes praeter legem.
Como bem observado ainda por Covello; citando Scheerer, onde diz que se um banqueiro satisfaz um desejo legítimo do cliente, não se pode dizer que se trata de simples condescendência de sua parte, senão de execução de uma obrigação que lhe incumbe, já que está ligado não somente por tudo o que promete expressamente no contrato, ou em virtude de lei, de modo como deve comportar-se todo bom banqueiro, segundo os costumes e a boa fé.
É totalmente dependente esta proposição da preexistência de uma norma que lhe anteceda, criando assim o vínculo jurídico oriundo de seu inadimplemento e, por conseguinte, do dever de reparar o dano causado.
2.3. A INTELIGÊNCIA LEI COMPLEMENTAR 105 DE 2001
Para o Direito Tributário, tributo é prestação pecuniária, de cunho obrigatório, imposta pelo Estado aos seus súditos, em razão do próprio existir estatal, com finalidade vinculada à satisfação das necessidades da coletividade, e à organização do corpo social, pressupõe a obtenção de valores capazes de garantir a efetividade destes empreendimentos.
A sonegação fiscal, que assume proporções inimagináveis, não só deve ser vista apenas como uma atitude ilícita isolada de um contexto, ou mesmo atividade de um só contexto.
A omissão dos tributos devidos ou mesmo a fraude a eles relativa, visa ocultar atitude anterior, igualmente ilícita, onde de fato se exteriorizaram os fatos geradores. Tal ocorre, exemplificativamente, como o crime de corrupção, com o tráfico de drogas, com o crime de seqüestro, em que o não recolhimento dos tributos apenas evidencia a dificuldade de ocultação da fonte escusa dos rendimentos auferidos e dos desconfortáveis sinais exteriores de riqueza.
A Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, publicada no Diário Oficial da União em 11 de janeiro do mesmo ano, o debate quanto ao dever de sigilo bancário reacendeu-se de forma muito intensa. Por meio do disposto neste texto legal está a Receita Federal autorizada a obter, mediante requisição aos bancos e instituições financeiras brasileiras, dados relativos a movimentação financeira de seus clientes, sem a prévia e necessária intervenção do poder judiciário.
Com efeito, a partir da publicação da Lei Complementar acima referida, houve revogação expressa do artigo 38º, da Lei 4.595, de 31 de dezembro de 1964, na qual observava sobre o dever de sigilo bancário até aquela data, passando tal norma a reger o assunto.
Tal norma reafirmou o dever de sigilo das instituições financeiras, mais igualmente estabeleceu as hipóteses em que a transferência dos dados bancários não constituiria violação a este dever de sigilo.
O artigo 5º da referida lei, estabeleceu que o Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os critérios segundo os quais as instituições financeiras deverão informar à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços. Dispõe também que as informações obtidas em razão da transferência deste dados bancários estarão protegidas pelo sigilo fiscal, levando os excessos de seu infrator a cumprir sob as penas da legislação em vigor.
È importante ressaltar sobre a Lei Complementar que um dos aspectos mais relevantes diz à delimitação deste poder requisitório, através do qual apenas algumas autoridades relacionadas à atividade administrativo-tributária poderão fazer uso da outorga legislativa.
Tornando-a mais precisa e segura, o Poder Público editou o Decreto nº 3.724, de 10 de janeiro de 2001, com o objetivo de regulamentar o artigo 6º, da Lei Complementar, no atinente à requisição, acesso e uso pelos agentes da Receita Federal, dos dados obtidos junto às instituições bancárias quanto aos serviços por elas prestados.
A Lei Complementar restringe aos estritamente necessários, o acesso e uso dos dados bancários, quando tais elementos forem considerados imprescindíveis ao andamento de processo administrativo tributário que já esteja em curso, e mesmo assim se requisitados por autoridade competente para analisá-los.
As requisições das informações tidas como imprescindíveis, deverão ser feitas através de um documento denominado de Requisição de Informações sobre movimentação Financeira (RMF), endereçado pelas autoridades fazendárias competentes para fazê-lo, ao Senhor Presidente do Banco Central do Brasil, ao Presidente da Comissão de Valores Mobiliários, ao presidente de instituição financeira ou entidade a ela equiparada ou gerente de agência.
Deverá ainda a RMF ser precedida de intimação ao sujeito passivo, para apresentação de informações sobre sua movimentação financeira, tidas como necessárias à execução do MPF.
A RMF somente será expedida com base em relatório circunstanciado, elaborado pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal encarregado da execução do MPF, ou por seus chefe imediato. Preocupou-se ainda a forma em disciplinar no que constituem as informações requisitadas, bem como a forma de proceder das autoridades fiscais no trato destes dados.
Preocupada com eventual desvio de função quanto ao uso dos dados obtidos por servidor fazendário, tipificou os comportamentos funcionais tidos como lesivos ou desidiosos, estabelecendo-se punições ao seu mentor, nas quais determinações constam dos artigos 8º, 9º, 10º e 11º do Decreto 3.724/2001.
E o sujeito passivo que se considerar prejudicado por uso indevido das informações requisitadas nos termos do decreto referido acima, ou por abuso de autoridade requisitante, poderá dirigir representação ao Corregedor-Geral da Secretaria da Receita Federal, com vistas à apuração do fato e, sendo o caso, à aplicação das penalidades cabíveis ao servidor responsável pela infração.
Ao definir os poderes do administrador tributário, o Código Tributário Nacional afirmou, em seu artigo 194, que as regras constantes de seu capítulo I são as aplicáveis à fiscalização de tributos, devendo ser seguidas por todas as autoridades tributantes e respeitadas por todas as pessoas por elas atingidas.
Segundo P. R. Tavares Paes[9], esta norma constante do § único do artigo 194 do Código Tributário Nacional, procura afastar paralogismos e atos contra legem, impondo a obrigatoriedade da obediência da norma a todos, inclusive aos imunes e aos isentos. Não restam dúvidas de que a mens legis foi a de garantir total efetividade às normas atinentes aos poderes de fiscalização, com o sentido de possibilitar a mais ampla investigação dos fatos tributáveis.
Complementando tudo que era impossível à Lei Maior disciplinar, por descabido, dado seu caráter delineador apenas das linhas mestras sistêmicas nas normas gerais de direito tributário, garantias à eficácia da administração tributária em geral, e voltadas à fiscalização, em seu caráter particular. Não é correto, portanto, afirmar-se que as normas relacionadas à administração tributária são tão-somente as constantes dos artigos 194 a 200 do CTN.
O parágrafo único do artigo 116 do CTN foi acrescido por força da Lei Complementar 104/2001 onde impõe ao agente fiscalizador um enorme poder quanto ao exercício de suas funções. De fato, e desde que seguidos os procedimentos da lei ordinária, ainda por definir, estará apto o agente público a aparar as arestas da atividade realizada pelo sujeito passivo, buscando-se o verdadeiro objetivo econômico do ato praticado. É com certeza norma atinente à administração tributária, embora não prevista no capítulo pertinente.
No que concerne os ditames do artigo 144 do CTN, é nítido que o legislador tributário quis consignar ao administrador tributário, encarregado da fiscalização e arrecadação dos tributos, a possibilidade de valer-se de novos critérios surgidos, ampliadores dos poderes de investigação, a despeito de ser aplicada ao lançamento a lei vigente à época de ocorrência do fato gerador, tempus regit actum. Respeitados os prazos decadenciais, poderá a lei tributária, que ampliou os poderes de investigação, retroagir aos fatos praticados, facilitando-se sobremaneira a detecção dos mesmos. E não há que se falar em reformatio in pejus, posto que não se está a mudar o cenário original dos fatos geradores, apenas se está a jogar luzes sobre o mesmo para sua melhor compreensão.
Exatamente objetivando a obtenção de informações no interesse da administração tributária, que se estabeleceu no artigo 197 do CTN, o dever de prestarem informações, mediante intimação escrita da fazenda, todos os que disponham de dados relativos a bens, negócios ou atividades de terceiros.
Tal norma relaciona, em rol meramente exemplificativo, os tabeliões, escrivãs e demais serventuários de ofício; os bancos, casas bancárias, caixas econômicas e demais instituições financeiras; as empresas de administração de bens; os corretores, leiloeiros e despachantes oficias; os inventariantes; os síndicos, comissários e liquidatários; bem como quaisquer outras entidades ou pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão, como estando obrigados a prestar informações sobre os dados de que tenha conhecimento.
A Lei Complementar nº 105 de 2001, que trata do dever de sigilo bancário, que entre os seus ditames, estabelece que não constitui violação do sigilo o fornecimento de dados aos agentes tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, relativos às operações ativas e passivas e serviços prestados pelas instituições financeiras, desde que haja procedimento administrativo instaurado e este dados sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
Por último, mas não menos importante, cabe menção do que consta do artigo 200 do CTN, que autoriza às autoridades administrativas federais requisitar o auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou mesmo quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária, mesmo não se configurando como crime ou contravenção, é o chamado prestígio ao princípio da supremacia do interesse público, em detrimento do privado.
No artigo 195 do CTN, determina, que quanto ao acesso de dados, os mais diversos possíveis, pelas autoridades fiscais, em razão de seu ofício, de fato, seria praticamente impossível o mister da fiscalização e arrecadação de tributos sem se consignar autorização legal às autoridades fazendárias para examinar livros, documentos, arquivos, mercadorias. Tais dados interessam, de forma legítima, tão-somente ao próprio sujeito passivo, sendo eles reflexos de sua realidade, e ao fisco, posto que deles necessita para ultimar as providências de sua alçada.
Angariadas nas informações na atividade de fiscalização são protegidas pelo direito à intimidade, tutelado na Lei Maior, sendo, não obstante, legítimo ao fisco valer-se das mesmas em razão de seu ofício, sendo seu mero detentor, e cabendo-lhe o dever de sigilo, assemelhado ao dever de sigilo funcional, punidas as condutas a ele contrárias, por expressa disposição do artigo 325 do Código Penal Brasileiro.
A previsão legal da violação do sigilo funcional, consistente no revelar de fatos de que se têm ciência, em razão do cargo e que deveriam permanecer em segredo, ou mesmos na facilitação de sua revelação, é punível com pena de detenção de seis meses a dois anos, ou multa, se tal fato não constituir crime mais grave.
Por oportuno, que sem prejuízo das sanções de natureza criminal, ressalvadas pelo artigo 198 do CTN, já mencionado acima, são inequivocamente possíveis outras, de ordem administrativa e cível, indo desde a abertura de inquérito contra agente público causador da violação, até a eventual indenização ao sujeito passivo pelos danos eventualmente causados, seja pelo servidor, seja pela Fazenda Pública.
Sem dúvida, esta é a inferência decorrente do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, quando se afirma a responsabilidade civil do Poder Público aos danos causados por seus agentes, nesta qualidade, a terceiros, embora previsto o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Quanto a divulgação de representações fiscais para fins penais, inscrições relativas à dívida ativa da Fazenda Pública, e situações de parcelamento ou moratória. Igualmente não há que se falar de vedação de divulgação do sigilo fiscal, quanto às hipóteses previstas no artigo 199 do CTN, no tocante ao dever da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de prestarem mutuamente assistência para fiscalização de tributos e permuta de informações de que são detentores, em razão de seu ofício.
A lógica do sigilo fiscal, são dados meramente transferidos à fazenda em razão da constitucional atribuição para aferir-se a capacidade contributiva do sujeito passivo, devendo sua guarda estar eivada de todas as cautelas compatíveis com os princípios norteadores da administração pública.
Não há porque s e falar em atingimento do direito à privacidade, posto que o segredo não se divulga, apenas troca de mãos, em razão de sua relevância, e certamente estará mais protegido do que se encontrava na instituição bancária, onde nem sempre se pode ter por premissa, a lisura das operações ali ocorridas.
Ao serem previstas as limitações constitucionais ao poder de tributar, o legislador definiu os nortes quanto ao exercício da atividade tributária, estabelecendo, entre outros tantos, o primado da legalidade.
Outro princípio da eficiência pressupõe que exista qualidade no desempenho das atividades administrativas, que devem ser aptas para atingirem os resultados almejados.
Vale lembrar também que a atividade administrativa deve ser exercida respeitando a moralidade pública, verificando-se critérios de oportunidade, conveniência e justiça em todas as ações desenvolvidas, em respeito a preceitos éticos de lógica rigorosa.
A todo ato administrado por direito constitucional de ter acesso as informações do ente público que lhe interessem, por intermédio do direito de petição e do direito de obter certidão (Constituição Federal, artigo 5º, XXXIV, “a” e XXXIV, “b”).
A atividade administrativa deve ainda respeitar o princípio da publicidade, garantindo-se que existirá plena divulgação de todos os atos administrativos, para garantir-se assim a lisura no proceder do Poder Público.
Não obstante tal dever, quando a prática deste atos envolver o acesso a dados que estão nos limites da privacidade e intimidade das pessoas, deverá o administrador público valer-se das informações, embora guardando segredo das mesmas em função de seu dever legal de sigilo.
Em verdade, o dever de sigilo fiscal deve ser respeitado pelo administrador tributário em nome da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da eficiência da atividade fiscalizatória.
A utilização destes elementos é condicionada aos ditames normativos constitucionais, sendo os desvios de finalidade punidos com todo o rigor, conforme estabelecido pelo próprio legislador.
Mas não menos importante, urge fazer referência a determinados princípios, tidos como implícitos, ou ainda mencionados como princípios reconhecidos pelo ordenamento jurídico constitucional brasileiro. É o caso do princípio da supremacia do interesse público, em virtude do qual deve ser vislumbrado como fim último da atividade administrativa o interesse coletivo, não sendo os atos administrativos endereçados ao favorecimento individual. Se assim fosse, haveria desvio de finalidade do ato administrativo.
Pode-se afirmar que o direito tributário é ramo do direito público de clara sede constitucional. Seus primados são oriundos de ditames previstos na Lei Maior, o que possibilita a pujança da atividade tributária.
O poder-dever de agir do Estado, quando do exercício da atividade tributária está todo delimitado no texto constitucional, onde estão rigidamente definidas as limitações ao poder de tributar, verdadeiros princípios constitucionais atinentes à tributação, de acordo com os estudos empreendidos pela mais festejada doutrina acerca do tema.
Pelo princípio da anterioridade legal, a título meramente exemplificativo, foi estabelecido que não se pode permitir a instituição de novo tributo, ou o aumento de tributo já existente, senão em virtude de lei.
Os princípios constitucionais tributários, em verdade, são decorrentes dos direitos e garantias individuais assentados no Título II, de nossa Lei Maior, apenas reforça seu grau de importância no ordenamento jurídico pátrio.
Quanto ao princípio da irretroatividade tributária, que dispõe que a lei tributária não poderá atingir fatos já ocorridos, antes de sua vigência, seja para tributá-los, seja para aumentar tributo já existente, é inconteste que esta previsão apenas exterioriza o comando da irretroatividade da lei a fatos já ocorridos (artigo 5º, XL, CF), bem como reforça o primado da legalidade.
Os direitos e garantias individuais, e os princípios deles decorrentes, tendo em vista sua importância já aqui ressaltada, fazem parte de uma seleta nata de primados constitucionais que não podem ser objeto de mudanças.
Segundo a inteligência do artigo 60, § 4º, da Constituição em vigor, não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais, citatos entre outras hipóteses não alteráveis na Lei Magna.
As cláusulas pétreas, conforme expressão já consagrada no ordenamento jurídico brasileiro, são as oriundas de comandos constitucionais tidos como fundamentais pelo próprio legislador constituinte, que as dotou deste status visando garantir sua proteção e perenidade no tempo em que vigorar a norma constitucional.
Soa inconteste que as cláusulas pétreas (de pedra, sólidas) não podem ser a qualquer título ou motivação modificadas, salvo alterações realizadas pelo poder constituinte originário, com amplos poderes para delimitar novo cenário constitucional.
Quanto a busca da capacidade econômica do contribuinte, é importante ressaltar que o legislador deverá estar atento as situações fáticas ou jurídicas capazes de denotar sinais exteriores de riqueza compatíveis com a cobrança de tributos. Tributar o que não reflita exteriorização, levará a incidência normativa inócua, e, via de regra, iníqua.
Se por um lado é dever do Estado de cobrar tributos dos cidadãos, para com os recursos obtidos promover a justiça social e o bem estar da população, por outro não é menos verdadeiro afirmar-se que a atividade tributária deverá ser exercida com moderação pelo Poder Público, para que não se traduza em uma tirania, ou denote um fim em si mesma.
Pelo fenômeno da tributação, entende-se que sejam mais intensamente atingidos aqueles que possam maiores condições de contribuir ao Estado, ou tecnicamente falando, os possuidores de maior capacidade contributiva, ou econômica, já no jargão do próprio do Direito Tributário.
Estas maiores condições de contribuir são auferidas em nosso regime tributário pela escolha de fatos geradores que indiquem esta potencialidade, cabendo igualmente a graduação dos tributos ora à base de cálculo apontada na norma, ora à graduação das alíquotas escolhidas de forma previamente estudada.
O princípio constitucional da capacidade contributiva respalda-se em premissas de outros princípios constitucionais, como o do mínimo existencial e o da isonomia, dos quais pode-se dizer ser decorrência lógica.
Constitui-se em pressuposto de justiça social, quando algumas pessoas, sejam físicas ou jurídicas, serão mais rigorosamente atingidas em detrimento de outras, em razão de seu menor pujança econômica.
Quanto à personalização, quis o legislador pátrio que a tributação levasse em consideração características pessoais do contribuinte, adequando-se de forma mais efetiva, sua real capacidade de contribuir. Tal ocorre quando se permite ao contribuinte a dedução de despesas médicas, próprias e de seus dependentes, gastos com educação, pensão alimentícia, entre outros tantos.
A busca da capacidade econômica possui nortes legais muitos claros, quais sejam os de respeitar os direitos individuais e a legalidade de ação fiscal. Registre-se que se a atividade tributária se constitui em múnus público para o Estado, consagrando verdadeiro dever inclinável de tributar, não se concebe que o Poder Público abra mão de fazê-lo, buscando a efetiva capacidade de contribuir de cada um, em cobrança plenamente vinculada.
Em resumo, está o princípio da capacidade contributiva ou capacidade econômica, profundamente inserido no sistema tributário nacional brasileiro, possui sede constitucional e está reconhecido pela Corte Suprema em nosso Estado o direito individual do Contribuinte.
Sua importância sistêmica reside de propiciar efetividade à ação fiscal, no tocante à arrecadação e fiscalização dos tributos, sendo, por conseguinte, fundamental para que se alcance a justiça na tributação.
Não se pode desqualificar este princípio, considerando-o subjugado aos direitos e garantias individuais insertos no artigo 5º da Lei Magna: em verdade há conflitos em sua previsões legais, e ante circunstâncias concretas deverá ser ultimado o desejável sopesamento dos valores envolvidos.
Quanto a busca da justiça fiscal, é certamente desnecessário afirmar-se, dada sua obviedade, que a tributação dever ser a ultimada da forma mais justa possível. As premissas de um Estado Democrático estão assentadas na promoção do bem estar social, valendo-se dos recursos obtidos no próprio seio da coletividade.
Tais recursos devem ser angariados prioritariamente junto àqueles que melhores condições tenham de contribuir com o Estado, embora isto não se dê como faculdade, e sim como dever jurídico a todos exigido.
A escolha dos fatos tributáveis, das hipóteses legais de incidência, deve ser procedida com extremo critério, para privilegiar àquelas circunstâncias fáticas que inequivocamente denotem condições de contribuir, por parte dos sujeitos passivos.
Portanto, o princípio da capacidade contributiva sonsagra, fundamental mecanismo de aferição da real capacidade econômica de cada contribuinte, valendo-se este primado de uma série de sub-princípios aqui mencionados, como o personalização e da proporcionalidade.
Impedir, ou a menos dificultar a busca da capacidade contributiva, gera por conseqüência a não efetividade da atividade administrativo-tributária, afetando sobremaneira o munus público desta função estatal indeclinável.
Por certo há o dever do Estado de buscar, quando da tributação, a real capacidade de contribuir do sujeito passivo, sendo-lhe defeso negligenciar esta apuração, sob as penas da lei.
Neste sentido deve ser percebida a inteligência da Lei Complementar nº 105/2001, na qualidade de norma assecuratória do princípio da capacidade contributiva, referentemente aos tributos que menciona e aos ditames que celebra.
Teve o devido cuidado, o legislador tributário, em sede da lei complementar da Constituição Federal, de corroborar o dever de sigilo das instituições financeiras, sobre os dados que administram, permitindo tão-somente em caráter excepcional, que sejam transferidos este dados ao exame criterioso e necessário das autoridades mencionadas na norma, e sempre em situações pontuais.
Com o ensejo da promulgação da Lei Complementar nº 105/2001, alimenta-se com bastante intensidade a discussão acerca do sigilo bancário e do direito constitucional à intimidade.
Para a grande maioria da doutrina e jurisprudência pátrios, são inconciliáveis o sigilo bancário, como exteriorização do direito à intimidade (artigo 5º, X e XII, da Carta Magna), e o direito da administração pública tributária de obter diretamente das instituições financeiras, os dados tidos como imprescindíveis à sua ação fiscal, em razão do princípio da capacidade contributiva.
Para tanto, advogam que somente após o juízo de oportunidade e necessidade de um magistrado, poderá se facultar ao fisco ter acesso a estes dados.
Soa claro do texto da Lei Complementar já referida, que o Poder Legislativo ultimou certo juízo de ponderação quanto ao eventual conflito de princípios constitucionais, ante o silêncio da Lei Maior, autorizando ao fisco, moto próprio, ter acesso aos dados bancários em limitadíssimas situações.
Conforme exposto, profundamente relevante nesta discussão, é o que diz respeito a supostamente necessária prévia autorização judicial, para se ter acesso aos dados bancários de alguém, em nome da proteção à intimidade.
A argumentação predominante justifica a anterior autorização do magistrado para a entrega dos dados financeiros à fazenda, com base no juízo de ponderações que deverá empreender o julgador, relativamente aos princípios constitucionais envolvidos, relativizando-os ao interesse mais justificável socialmente.
Será autorizada a transferência destes dados, segundo sustentam, se forem dados a conhecer ao magistrado aspectos que representem veementes indícios de crime ou fraude, e que mereçam melhor apuração.
Pode-se questionar se a necessidade de prévia outorga judicial, para ter o fisco acesso aos dados financeiros, em casos pontuais, praticamente não inviabiliza a efetividade da medida que se quer obter.
Sobre a reforma do Poder Judiciário, duramente centrou suas críticas no excessivo poder dos juizes, bem como na solução das lides, o que afeta sobremaneira o ideário de justiça. Afirma-se, de forma categórica, que justiça lenta não é justiça, é de fato a celebração do injusto. Na verdade, há casos em que não há tempo hábil para uma decisão do Judiciário, ocorrendo o perecimento do direito tributário.
Há que se considerar, via de regra, que a cotejo do interesse individual de proteção da intimidade, com o interesse público subjacente à apuração de um fato ilícito ou da capacidade contributiva do sujeito passivo, deverão ser empreendidos juízos de relatividade dos direitos envolvidos, através do peso de cada um deles ante as circunstâncias efetivas.
A proteção à intimidade deve ser preservada, por expressa previsão constitucional, garantido os direitos fundamentais. Por outro aspecto, igualmente de relevância constitucional, deve o administrador tributário buscar a real capacidade econômica dos contribuintes, realizando de forma vinculada a atividade de fiscalização e detecção dos fatos geradores de obrigação tributária, garantindo-se, deste modo, a efetividade de outros primados constitucionais como a isonomia, a livre iniciativa, e a promoção da justiça social.
De fato o que levou à extensão do direito à intimidade ao sigilo bancário, ocorreu por força de construção doutrinária e jurisprudencial, longe de ter sido definida explicitamente no texto da Lei Maior.
Coube ao legislador brasileiro efetivar as devidas ponderações de lógica constitucional, permitindo ao fisco o acesso direto, sem prévia oitiva do judiciário, dos frios dados contábeis da movimentação financeira dos correntistas de bancos, bem como o acesso às informações bancários, quando existir procedimento fiscal instaurado, e os dados requisitados sejam considerados imprescindíveis à ação fiscal.
Em verdade, o legislador brasileiro disciplinou aquilo que não estava regulamentado explicitamente no texto constitucional, quanto ao sigilo de dados bancários. Continuem os mesmos protegidos, embora se permita a transferência de dados a determinados entes possuidores da legitimidade constitucional, e somente em circunstâncias rigidamente definidas.
Restam infundados os argumentos segundo Mônica Neves Aguiar da Silva Castro[10], para quem a Lei Complementar nº 105 não atende os requisitos de constitucionalidade, porquanto, quando da verificação da proporcionalidade dos direitos envolvidos, não vislumbrou que a quebra do sigilo bancário e a “violação” da vida privada poderiam ser necessária à preservação de outro direito fundamental, qual seja, a efetiva busca da capacidade contributiva do sujeito passivo.
Para a autora, a quebra do sigilo bancário, como prevista na Lei Complementar acima referida, seria meio apropriado a se obter informações confidenciais administradas pelas instituições financeiras, mas não se poderia admitir sua legalidade por faltar direito fundamental amparado por seu rigor.
O relacionamento ao dever jurídico-legal é extremamente significativo, dos contribuintes de apresentarem seus dados ao fisco, em premissas de obrigação tributária acessória.
Para exemplificar, o convênio celebrado entre o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e o Banco Central, o qual viabiliza aos magistrados, mediante senha específica, terem acesso direito aos dados das instituições financeiras, via Internet, para instruir ações judiciais.
Tal convênio permite a consulta direta, sem necessidade de ofício ao órgão bancário, permitindo o bloqueio e desbloqueio de contas, o acesso irrestrito às informações financeiras, entre outras possibilidades.
Cuida este convênio de definir uma gama de poderes aos magistrados, sem que isto esteja a refletir, de forma prévia, uma real necessidade da obtenção dos mesmos. Cabe empreendermos mais reflexões.
A qualquer pretexto, não se pode permitir que se seria conceber que os bancos e instituições financeiras se transformem em porto seguro para os rendimentos oriundos de crimes tributários, de lavagem de dinheiro, do tráfico de drogas, da corrupção, e de outros ilícitos. A sociedade está a exigir do Poder Público uma providência imediata e efetiva contra esta nova forma de impunidade, impeditiva do desenvolvimento do país.
Subjacente às questões envolventes do sigilo bancário, o interesse público, é certamente capaz de alterar o tratamento dado pelo legislador constitucional referente aos direitos da intimidade.
Deve ser, portanto, possível ao Ministério Público, ter acesso aos dados financeiros do correntista, independentemente de prévia autorização judicial, em virtude da investigação de crimes, cuja apuração interessa a todo o corpo social; bem como ser estendida esta possibilidade ao fisco, no afã de apurar os fatos tributáveis omitidos pelo contribuinte a cobrar os valores devidos, capazes de viabilizar à promoção do bem estar da coletividade.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atividade bancária é das mais antigas que há na história da civilização, tendo desde cedo despertado a curiosidade de tantos quantos se interessam pelo assunto.
Uma conceituação padrão, tomem-se por base as ponderações de Sérgio Covello[11], para quem o sigilo bancário é a obrigação que têm os bancos de não revelar, salvo justa causa, as informações que venham a obter em virtude de sua atividade profissional.
O direito constitucional brasileiro alberga os primados dos direitos e garantias individuais que impõem ao Estado o dever de agir segundo estas claras limitações que lhe são impostas, entendendo que o homem é o fim último do Estado, sua própria razão de ser.
A maior parte da doutrina entende que por direito à personalidade se compreendem àqueles direitos inatos ao homem, por essenciais ao seu existir. Podem-se incluir neste especialíssimo rol os direitos à vida, à dignidade, à honra, à igualdade entre as pessoas, à liberdade de pensamento e de locomoção, entre outras tantas prerrogativas que deve o Poder Público inequivocamente preservar quanto às eventuais ameaças a sua existência.
Em razão da implícita, porém reconhecida, menção na Lei Maior, o direito ao sigilo bancário foi admitido como desdobramento do sigilo de dados, sendo, por conseguinte, um princípio protetor de uma garantia individual e dotado do status de cláusula pétrea do texto constitucional.
Pode-se suscitar a eventual existência de conflito entre o direito à inviolabilidade do sigilo de dados bancários e o que foi disciplinado pela Lei Complementar nº 105/2001, que autorizou à autoridade tributária, o acesso direito aos dados financeiros do correntista, sem a necessidade de prévia chancela do poder judiciário, buscando-se a verdadeira capacidade econômica do contribuinte.
A Lei Complementar, a seu juízo, entendeu autorizada a transferência destes dados, sem a necessária intervenção de um magistrado, sempre que existir procedimento fiscal instaurado para a apuração de fatos tributáveis, e este dados financeiros forem considerados indispensáveis ao desdobramento desta ação fiscal.
A referida Lei Complementar visa garantir a efetividade da busca da real capacidade de contribuir das pessoas, pelo acesso fiscal aos dados bancários, que já foram objeto de informação do sujeito passivo, em sede de obrigação acessória. A atividade fiscal não é invasora da intimidade e da privacidade, ela é apenas confirmatória dos dados previamente informados pelo contribuinte como dever tributário.
Cabe ainda consignar, à luz dos comandos inseridos pela Lei Complementar nº 105/2001, ser desnecessária a prévia autorização judicial para que tenha o fisco acesso aos dados bancários tidos como indispensáveis à ação fiscal. Isto porque não está a inviolabilidade do sigilo de dados sujeita à reserva constitucional de jurisdição, conforme se pode perceber da inteligência do texto constitucional.
Além do que, submeter os casos de necessidade de transferência dos dados financeiros ao fisco, à prévia oitiva e autorização de um juiz, parece-nos meio caminho a viabilizá-la, ante o risco de que se torne ineficaz a providência almejada, face sua morosidade e ao envolvimento de mais pessoas no processo decisório.
Não há, portanto, que se considerar que o acesso fiscal ao segredo bancário fere o direito à intimidade. Não existem dúvidas de que o comando do artigo 5º, X e XII da Constituição Federal protegem a intimidade e o sigilo dos dados bancários, oriundos de atividades lícitas, não impedindo que a eles se tenha acesso para apurar ilicitudes, dada a relatividade de sua proteção.
Percebe-se de forma nítida que a proteção ao sigilo bancário tem sido flexibilizada, a permitir uma maior intervenção do Poder Público quando a apuração de ilícitos, sejam eles tributários ou não, no afã de se garantir a ordem pública e a proteção às instituições estatais. Em vários deste Estados, é desnecessária a prévia autorização judicial para se ter acesso a dados bancários, como forma de se garantir a efetividade de tal providência.
É importante destacar também que, de forma cristalina, de que é vital para a arrecadação de tributos, pelo fisco, e para a apuração de crimes, pelo Ministério Público, que se permita o acesso responsável aos dados financeiros dos correntistas, sendo desnecessária a prévia requisição ao judiciário. Aduza-se, em expressa referência à Sérgio Carlos Covello[12]que “banco não é esconderijo”.
REFERÊNCIAS:
CASTRO, Mônica Neves Aguiar da Silva. Honra, Imagem, Vida Privada e Intimidade, em Colisão com Outros Direitos. Rio de Janeiro: Biblioteca de Teses Jurídicas, Renovar, 2002.
COVELHO, Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2001.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário da Língua Portuguesa - Conforme o Acordo Ortográfico. 2010.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades Públicas e Processo Penal. As interceptações Telefônicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982.
MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Rio de Janeiro: Atlas, 1997.
OLIVEIRA, Ary Brandão de. Considerações Jurídicas Acerca do Sigilo Bancário, In: Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1983.
PAES, P. R. Tavares. Comentários ao Código Tributário Nacional; São Paulo: Saraiva, 1981.
[1] COVELHO, Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2001.
[2] MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Rio de Janeiro: Atlas, 1997.
[3] GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades Públicas e Processo Penal. As interceptações Telefônicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982.
[4] COVELHO, Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2001.
[5] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda Dicionário da Língua Portuguesa - Conforme o Acordo Ortográfico, 2010
[6] OLIVEIRA, Ary Brandão de Considerações Jurídicas Acerca do Sigilo Bancário, In: Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1983.
[7] COVELHO, Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2001.
[8] idem
[9] PAES, P. R. Tavares. Comentários ao Código Tributário Nacional; São Paulo: Saraiva, 1981.
[10] CASTRO, Mônica Neves Aguiar da Silva. Honra, Imagem, Vida Privada e Intimidade, em Colisão com Outros Direitos. Rio de Janeiro: Biblioteca de Teses Jurídicas, Renovar, 2002.
[11] COVELHO, Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2001.
[12] COVELHO, Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2001.
Bacharel em Direito pela Universidade Estácio de Sá.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FREITAS, Tiago Maciel de. O Sigilo Bancário e o direito à intimidade sob a óptica da Lei Complementar 105 de 2001 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jan 2011, 09:07. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/22979/o-sigilo-bancario-e-o-direito-a-intimidade-sob-a-optica-da-lei-complementar-105-de-2001. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: WALKER GONÇALVES
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Mirela Reis Caldas
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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