RESUMO: Trata de dispositivos dogmáticos que versam diretamente sobre os direitos humanos. A partir desta proposta, analisaremos a efetividade de algumas normas do direito interno, tendo como foco a seara penal.
SUMÁRIO: RESUMO; 1. INTRODUÇÃO; 2. ESPECIFICIDADES DO VIÉS PÓS-MODERNO CONCERNENTE AOS DIREITOS HUMANOS; 3. CONCLUSÃO 4. REFERÊNCIAS
1. INTRODUÇÃO
Os direitos humanos, apesar de sua relevância, profundidade e imprescindibilidade são comumente vilipendiados no Brasil.
A realidade é estarrecedora! Segundo Fernando Jayme, ao invocar a Declaração do Milênio(Resolução 55/2 da Assembléia Geral da ONU), colaciona propósitos importantes para a promoção dos Direitos Humanos.
“(...)Haver a erradicação da pobreza e da fome, a universalização do acesso à educação primária, a promoção da igualdade, a redução da mortalidade infantil, a melhoria da saúde materna, a promoção da igualdade entre os gêneros. (...)” (JAYME, 2005)
E prossegue: “ o combate à Aids, malária e outras doenças, a sustentabilidade ambiental, o desenvolvimento de parcerias para o desenvolvimento.”( JAYME, 2005)
O distanciamento da efetividade dos direitos humanos, certamente tangencia mazelas inclusive políticas. Por óbvio, não é necessário nenhum estudo profundo para compreender os impactos da corrupção perante a sociedade.
De forma simples, o artigo 3º da Constituição Federal, de forma programática, preceitua o objetivo da República Federativa do Brasil de erradicação da pobreza. Ora, esse é um preceito que, assim como outros tantos, está distante do plano de concretização. Aliás, fantástico seria se a abstração implicasse necessariamente a concreção.
2. ESPECIFICIDADES DO VIÉS PÓS-MODERNO CONCERNENTE AOS DIREITOS HUMANOS
A Constituição Federal de 1988 é programática. Em outros termos, há dispositivos que apesar de sua validade, vigência e eficácia constitucional, não serão materializados imediatamente, por conta de variáveis sociais, econômicas, políticas e culturais. Nesse tom, vejamos o seguinte suporte:
"Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
1. construir uma sociedade livre, justa e solidária
2. garantir o desenvolvimento nacional
3. erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais
4. promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."(BRASIL, 2006)
Esse dispositivo nos inclina também ao discurso da vulnerabilidade, a partir do qual é necessário o tratamento diferenciado em favor dos vulneráveis. Em outras palavras, não pode haver preconceito de qualquer natureza, o que francamente não procede materialmente. Dessa forma, por mais que tenhamos um texto constitucional engajado na defesa da igualdade, e microssistemas defensores do tratamento mais benéfico em favor dos vulneráveis, não há que se falar na igualdade prática de sexos, raça, idade origem etc.
Diante desse cenário, estamos distantes de uma sociedade livre, justa e solidária, não obstante o texto constitucional, distanciando-nos da concretização dos direitos humanos.
Vejamos o artigo 295 do Código de Processo Penal, conforme o qual somente farão jus a prisão especial:
Os ministros de Estado, os delegados, os oficiais das forças armadas, os membros do Parlamento, entre outros.
Conforme o parágrafo único, a cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana. Por certo, todas as prisões deveriam ser compatíveis ao mínimo existencial, de modo a prestigiar a dignidade da pessoa humana e salubridade.
Guilherme Nucci defende a razoabilidade como corolário de qualquer análise sobre as prisões.
Vejamos o artigo 87 da lei 7.210 de 1984, que dispõe:
A penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado. Dessa maneira, também destacamos o artigo 88 da referida Lei, conforme o qual:
“O condenado será alojado em cela INDIVIDUAL que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. “
Em continuidade, preceitua o parágrafo único:
“ São requisitos básicos da unidade celular:
salubridade do ambiente pela concorrência de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana.”
Condições adequadas de higiene e aeração são pontos nevrálgicos para os direitos humanos.
Continuamos com as alíneas:
“área mínima de 6 metros quadrados.” (BRASIL, 2004)
Acrescentamos o artigo 89:
“ Além dos requisitos referidos no artigo anterior, a penitenciária de mulheres poderá ser dotada de seção para gestante e parturiente e de creche com a finalidade de assistir ao menor desamparado cuja responsável esteja presa.”(BRASIL, 2004)
Ora, a razão teleológica, portanto, no que toca a estrutura da cela, é razoável. Contudo, o abismo em relação ao plano concreto é espantoso e sombrio.
De forma a perceber o abismo, emergem os relatos de Drauzio Varella, a partir do qual:
“Voltei ao pavilhão quatro. O elevador estava quebrado, subi as escadas até o quinto andar, segui o corredor e saí da enfermaria. Era uma galeria com doze celas de um lado e dez do outro, uma copa no fundo à esquerda, um banheiro grande com mais azulejos despregados do que assentados na parede e três chuveiros elétricos, dos quais apenas um esquentava.”
Como reflexo inegável dos direitos humanos, temos no artigo 5º uma previsibilidade importante:
"XLIX- é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral"(BRASIL, 2005)
Drauzio Varella soma:
“Nos grandes xadrezes coletivos, como os de Triagem, com sessenta, setenta pessoas, as camas são substituídas por colchonetes de espuma de borracha, dispostos lado a lado no chão. A redução do espaço pode ser tal que os homens dormem invertidos, os pés de um no rosto do companheiro.” (VARELLA, 2003)
Segundo Michel Foucault, a reclusão pode implicar um suplício:”É um fenômeno inexplicável a extensão da imaginação dos homens para a barbárie e a crueldade”. (FOUCALT, 2000)
A conotação de suplício nos presídios repulsa a ressocialização e os direitos humanos. É necessário, portanto, que todas as atividades devem convergir ao cumprimento digno da pena, civilizando o indivíduo.
Segundo Nilo Batista, ao alertar sobre a superpopulação: “ A questão da superpopulação é considerada a mais grave de todas, raiz e seiva de diversas outras- representam, como o relatório registra, um desempenho insatisfatório da instituição penitenciária e uma advertência contra as penas curtas de prisão: trata-se de não lançar na esteira de produção dessa fábrica de criminosos quem tenha qualquer possibilidade de ver-se punido mediante uma alternativa penal” (BATISTA, 1990)
E posteriormente nos faz a seguinte proposição:
“O remédio proposto para a superpopulação é audacioso e criativo, à altura da doença: numerus clausus e vigilância eletrônica. Traduzindo: se uma penitenciária foi projetada para a convivência de 500 presos, quando chega a 501, a administração tem que escolher um entre os internos com melhor prognóstico de adaptabilidade social, e impor-lhe um domicílio vigiado eletronicamente.” (BRASIL, 1990)
Todo esse discurso é somado ao caótico cenário social e de segurança pública, razão pela qual o discurso de concretização dos direitos humanos soa distante.
3. CONCLUSÃO
Há um distanciamento monumental, por óbvio, entre a abstração e o plano de concreção, motivo pelo qual a Constituição vigente exala a valoração aos direitos humanos, tanto sob a égide internacionalista, nos termos do artigo 5º, 4º e 3º , quanto sob a égide interna.
Em similar teor, o plano infraconstitucional é defensor dos direitos humanos, a julgar pela Lei de Execuções Penais, ante a preocupação com os presos. Complementarmente, são múltiplos os microssistemas defensores dos vulneráveis, notadamente o Estatuto do Idoso (Lei 10.741 de 2003), Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069 de 1990), Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288 de 2010).
Todavia, apesar do catálogo humanitário esculpido pelos objetivos “erradicação da miséria” e “promoção de uma sociedade justa e solidária”, nos termos do artigo 3º da Constituição Federal de 1988, estamos diante de normas programáticas, portanto, de concretização distante.
4. REFERÊNCIAS
- BATISTA, Nilo. Punidos e mal pagos: violência, justiça, segurança pública e direitos humanos no Brasil de hoje. Rio de Janeiro: Revan, 1990.
-BRASIL; PINTO, Antonio Luiz de Toledo; WINDT, Márcia Cristina Vaz dos Santos; CÉSPEDES, Livia. Código de processo penal. 10.ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
-BRASIL, Código Penal, decreto-lei 2.848. Atualizado e acompanhado de legislação complementar, súmulas e índices, 19ª edição, São Paulo: Saraiva, 2004A.
BRASIL; OLIVEIRA, Juarez de. Constituição da Republica Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 21. ed. atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2005.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 23. ed. Petrópolis: Vozes, 2000.
JAYME, Fernando G. Direitos humanos e sua efetivação pela corte interamericana de direitos humanos. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
Professor de Direito Empresarial, Direito do Trabalho e Filosofia do Direito da Puc-Minas. Coordenador e professor de Direito Civil, Penal e do Consumidor no preparatório Projeto OAB na mesma Instituição. Professor do Cursinho preparatório da Serjus de Direito Constitucional, de Família, Direito Penal, Processual Penal e Títulos de Crédito. Coordenador em Minas Gerais do grupo de pesquisas do IRIB. Mestrando em Direito Privado, Pós-graduado em Direito Civil e graduado em Direito pela PUC-Minas. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRETAS, Hugo Rios. Problematizações acerca dos Direitos Humanos na Pós-Modernidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 fev 2011, 07:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/23682/problematizaes-acerca-dos-direitos-humanos-na-ps-modernidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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