Resumo
O termo reintegrar traz a ideia de fazer com que o egresso se torne novamente um ser social, capaz de viver em sociedade, e manter-se integrado como um cidadão comum. O artigo em tela faz uma sucinta análise da real situação dos ex-detentos quando voltam à sociedade, depois de tempos na prisão. Faz-se também uma exposição de programas sociais que contribuem para a inclusão desse egresso, que muitas vezes, sai da prisão ainda mais vulnerável aos problemas sociais e econômicos.
Palavras chave: prisão, egressos, reintegração, programas.
1. Introdução
Um problema que aflige a sociedade brasileira é o que se fazer com aquela pessoa que agiu de forma ilícita, que transgrediu as normas ditadas pelo estado. Principalmente como lidar com esse problema quando o sujeito esteve inserido no cárcere por algum tempo. Por que mesmo depois de ter pago sua pena na justiça o estigma de ex preso não sai do sujeito. Ele mesmo leva consigo essa característica, não consegue se inserir na sociedade, pois sente que os outros vão agir com preconceito, ou por acharem que não são mais capazes de voltar a sua vida habitual. Temos também o que podemos considerar como a questão mais preocupante, alguns sujeitos não conheceram outro modo de vida, sempre viveram rodeados pela criminalidade. Então como aprender algo que nunca viveram?
A forma através da qual o infrator é punido tem que ser eficaz e a pena deve ser justa, uma vez que o condenado deve estar recuperado quando sair da prisão, pronto para reincorporar-se à sociedade e não mais agir em desacordo com a lei. A prisão deve servir para contribuir para o aprendizado do sujeito, não apenas ser um estabelecimento onde se joga os homens e mulheres condenados. O que se vê atualmente no Brasil, no entanto, são instituições penitenciárias conhecidas como escolas do crime que não cumprem seu papel ressocializante. A prisão mostrou-se em sua realidade e em seus efeitos visíveis denunciadas como “grande fracasso da justiça penal” como diz Foucault. Pessoas que não conseguem viver plenamente a sua humanidade, não conseguem também ver a humanidade do outro. Ainda mais se esse outro foi capaz de subtrair bens alheios, matar ou cometer outros crimes. A sociedade os rejeita imediatamente e transfere para o Estado a responsabilidade da punição – que nesses casos espera-se que sejam os mais severos possíveis – assim se sentem mais seguros. Porém uma segurança falsa, já que estar na prisão não é garantia de segurança, uma prova concreta são os esquemas dos crimes feitos a
partir da cadeia.
Na tentativa de contribuir com a inclusão do apenado foram criados alguns programas que visam acolher esse egresso e recuperá-lo para a sociedade. Temos os exemplos do trabalho adotado pela Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais, que criou desde 2005 o Programa de Inclusão do Egresso do Sistema Prisional, Presp. Do Pró-Egresso que é o Programa Estadual de Apoio ao Egresso do Sistema Penitenciário desenvolvido no Estado de São Paulo.
2. A realidade dos egressos no Brasil
Já devemos afirmar a necessidade de uma instituição penitenciária humana, que recupere de fato o preso, para que dessa forma a sociedade não sofra as conseqüências da revolta gerada pela degradação humana do preso como há muito vem ocorrendo. Nota-se que as penitenciarias brasileiras se encontram lotadas, os presos são colocados em situações degradantes, não a espaço, nem critérios para separar presos com delitos diferenciados. Acredito ser importante essa separação, visto que um detendo acaba aprendendo e se envolvendo no delito do outro preso. Fazendo com que a cadeia se transforme metaforicamente na escola do crime. A prisão deve deixar de ter o caráter meramente punitivo para também ser educativa e ressocializadora. O preso quando sai das prisões brasileiras, saem sem perspectiva, sem aprendizado algum, pelo menos positivo. Alguns saem revoltados (mais do que quando entrou) pois não encontraram nenhum amparo da instituição que em tese deveria tê-lo ajudado e, não raro, volta à criminalidade. A realidade do egresso brasileiro não é fácil, alem de lutarem contra o fator dessocializante da pena, pois não é fácil para um ex detento conseguir emprego, seus antecedentes na maioria dos casos o impedem de conseguir trabalho, lutam como todos os outros brasileiros contra os fatores econômicos, contra a miserabilidade. Diante desse quadro podemos afirmar que a criminalidade estar intimamente ligada à baixa escolaridade e ambas a questão econômica e social. De modo que precisam ser desenvolvidos dentro das prisões projetos educacionais que trabalhe para a conscientização dos educandos, fazendo-os o perceber a realidade e conseqüentemente seu lugar na história. Pois um indivíduo que nasceu na miséria e por conseqüência não teve acesso a uma educação satisfatória ou a de nenhum tipo, não pode agir com discernimento em seus atos. E principalmente lutam contra o preconceito dos cidadãos que não querem conviver com egressos, o que demonstra que cumprir a pena não basta para a sociedade. Contraditório, se pensarmos que negando os egressos estarão dificultando sua integração e levando-os a reincidência.
A reincidência é causada muitas vezes pela falta de oportunidade do egresso de ser inserido no convívio de todos, sendo que no mundo da criminalidade ele acha a facilidade de ser aceito. Não há como negar que a ressocialização é, no seu aspecto mais evidente, a preparação do infrator para voltar a ser sócio. Em outros termos, visa preparar o ser humano banido para o regresso à sociedade. Há aqui talvez um ponto de discordância, pois a pena não tem ressocializado, e os séculos são provas disso. Como a pena é dessocializante, difícil torna ressocializar.
Entende-se que o Estado deve proporcionar instrumentos pós-pena, para amenizar, diminuir ou excluir o efeito dessocializador da sanção. Se a pena então dessocializa, cabe ao Estado efetivar medidas ressocializadoras pós-cumprimento da pena, sem que esteja carregada por um lastro de vigília eterna. Esses instrumentos devem ser difundidos positivamente para toda sociedade, não só para ressocializar o infrator, mas também evitar a reincidência. A prevenção deve ocorrer fora e não dentro do âmbito da pena.
3. A atuação dos programas de inclusão
No ano de 1974, sob a liderança do então Juiz das Execuções Dr. Sílvio Marques Netto, foi instituída a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC), uma entidade jurídica sem fins lucrativos, visando auxiliar a Justiça na execução da pena, recuperando o preso e protegendo a sociedade. Pelo fato de apresentar índices de reincidência tão pequenos (inferiores a 5 por cento ) , e tratar o preso como um ser humano detentor de direitos e deveres, tal modelo tem alcançado repercussão no Brasil e no exterior. Hoje existem cerca de 100 unidades espalhadas pelo país e outras tantas no exterior: no Equador, na Argentina, no Peru, nos Estados Unidos, na África do Sul, Nova Zelândia e Escócia.
Na mesma esfera de atuação, conta-se hoje com outras instituições que buscam a recuperação do condenado e a sua inclusão. Em Minas Gerais há o Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (PrEsp), em conformidade com a lei de execução Penal (artigo 25), foi fundado em 2003, a partir do decreto 43.295, sendo inicialmente instituído em três municípios a ampliado em 2006 para mais oito, presente hoje em onze localidades de Minas Gerais: Belo Horizonte, Contagem, Betim, Ribeirão das Neves, Santa Luzia, Ipatinga, Governador Valadares, Montes Claros, Uberlândia, Juiz de Fora e Uberaba. O Presp atua na prevenção terciária, isto é, especificamente para pessoas que sofreram processos de criminalização e cerceamento de liberdade, e visa diminuir as exclusões e estigmas decorrentes dessa experiência. Por isso o programa conta com uma equipe composta por profissionais e estagiários das áreas de Direito, Psicologia e Serviço Social. São acompanhadas por três supervisores metodológicos que escutam, discutem, propõem e contribuem no desenvolvimento metodológico do programa. Trata-se de um equipamento público de inclusão social que promove condições para que os egressos do sistema prisional retomem a vida social coletiva. Apenas em 2009, 2628 novos egressos foram inscritos e atendidos.
Os objetivos do programa são, ampliar as condições para o conhecimento e acesso do público aos direitos previstos na Lei de Execução Penal, viabilizar o acesso aos direitos sociais para potencializar condições de cidadania, reduzir fatores estigmatizantes, apresentar alternativas descriminalizantes de cumprimento de condicionalidades impostas pelo sistema penal, contribuir na diminuição dos impactos subjetivos da prisionização, contribuir na ressignificação de processos históricos e socioculturais de opressão. Os egressos podem procurar atendimento nos Centro de Prevenção a Criminalidade (CPCs), que funcionam nos onze municípios do estado de Minas Gerais.
O Pró-Egresso é o Programa Estadual de Apoio ao Egresso do Sistema Penitenciário; é resultado da conjunção de esforços entre a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), por meio da Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadania (CRSC) e a Secretaria do Emprego e Relações de Trabalho (SERT). O Programa visa promover a reintegração social dos egressos do sistema prisional, presos em regime semi-aberto e apenados com penas restritivas de direito, além dos familiares destas pessoas, considerando que a qualificação profissional e o trabalho são indispensáveis ao processo de reinserção na sociedade, ao acesso à condição de cidadania e a consequente diminuição da vulnerabilidade social e do índice de reincidência criminal. Trata-se de uma parceria onde os egressos são inclusos nos programas oferecidos pela SERT, com o diferencial de que em alguns deles as cotas estarão definidas. No Programa Estadual de Qualificação e de Requalificação Profissional (PEQ), os egressos atendidos pelas unidades da Coordenadoria de Reintegração e sentenciados que cumprem pena em unidades prisionais de regime semi-aberto tiveram cinco mil vagas disponíveis no ano de 2010. Os cursos são focados nas novas exigências do mercado de trabalho e nas necessidades de mão de obra da região onde os beneficiados residem. Para tanto, a Secretaria do Emprego e Relações de Trabalho possui mapeamento nesse sentido de todas as regiões do Estado. Assim, tanto os usuários da CRSC, como os presos do semi-aberto (que ganham a liberdade em curto espaço de tempo) qualificados, terão maior chance de serem imediatamente inseridos no mercado de trabalho, através dos programas oferecidos pela SERT como o “Emprega São Paulo”, “Time de Emprego”, “Frente de Trabalho” e outros. No caso do programa “Emprega São Paulo” esses grupos têm um identificador no site visível somente para nossos operadores, permitindo dar preferência a esses usuários cadastrados.
O Pró-Egresso vem de encontro à demanda mais urgente apresentada pelos egressos que é a empregabilidade. Pensando nesse ponto intrínseco da reintegração, O Governo do Estado de São Paulo, lançou o decreto nº 55.126/09 que faculta aos administradores dos órgãos do Estado, quando da contratação de empresa para prestar serviços, exigir que esta tenha no seu quadro funcional um percentual mínimo de 5 % de egressos do sistema prisional. O programa vem impulsionar a reintegração social no Estado de São Paulo criando mecanismos que visam combater todas as possibilidades de que os usuários voltem a delinqüir em decorrência da falta de oportunidades e do preconceito. O apenado, ao ser tratado com dignidade e respeito, vê que é possível recuperar-se e não mais ter uma vida delituosa como antes. Tal fato implicará diretamente na vida dele próprio e também na vida da sociedade que sentirá os efeitos de tal recuperação, os índices de violência irão baixar e a qualidade de vida irá melhorar. No entanto, é preciso que se recorra à pena privativa de liberdade apenas em casos extremos,ou seja, quando o indivíduo necessita de tratamento ressocializante. Existem casos em que o melhor caminho a ser seguido não é a reclusão e sim penas alternativas como prestação de serviços à comunidade, doação de alimentos aos necessitados, enfim, penas que não retiram o condenado do meio social.
Em Pernambuco existe um programa que também trata essa questão do egresso, a Chefia de Apoio a Egressos e Liberados (CAEL). O objetivo do programa é prestar assistência social, psicológica e jurídica aos reeducandos e egressos do sistema penitenciário, contribuindo para o resgate da cidadania e reinserção à sociedade. As ações produzidas pelo programa são, acompanhamento psicossocial e jurídico aos reeducandos e seus familiares, investigação diagnóstica (perfil psicossocial), visitas domiciliares e institucionais, elaboração de parecer psicossocial, seleção e acompanhamento dos reeducandos que desenvolvem atividades produtivas nas instituições conveniadas, encaminhamentos para Rede de Saúde Pública, Agência de Microcrédito, Agência da Previdência Social, Instituto de Identificação Tavares Buril e outros serviços públicos, participação nas Cerimônias do Livramento Condicional realizadas pelo Conselho Penitenciário, análise das pastas carcerárias para requerimento de benefícios, acompanhamento dos processos jurídicos junto ao Fórum, Ministério Público, Comarcas da capital e interior, controle cadastral dos reeducandos e outras atividade demandas pelas necessidades dos egressos.
4. Conclusão
Diante da falta de estrutura das penitenciárias em ressocializar o condenado e ajudá-lo na estruturação da sua vida pós prisão, chegamos à conclusão da falta do caráter educativo da pena privativa de liberdade e percebemos meramente sua capacidade punitiva. Essa ideia de pensar que somente a detenção proporcionaria transformação aos indivíduos enclausurados e que estes refizessem suas existências dentro da prisão para depois serem levados de volta à sociedade torna-se insustentável diante da realidade das prisões. Os índices de criminalidade e reincidência dos crimes não diminuíram e os presos em sua maioria não se transformam. O Sistema Penitenciário Brasileiro não consegue atingir o objetivo que da ressocialização dos seus internos.
O Estado vem demonstrando através das políticas sociais de inclusão do egresso que está ciente da incapacidade das prisões em reeducar seus detentos. E percebemos que o estado que pune é o mesmo que propicia sua reintegração. Pôde-se perceber que por meio desses programas surgem as oportunidades que os egressos não encontraram quando estavam na prisão. A oportunidade de se integrarem na sociedade, como ser humano que cumpria sua pena, e agora deseja uma nova oportunidade de inserção. Encontram uma oportunidade de qualificação profissional e ajudas no âmbito psicossocial. É tudo que esses homens precisam para retirar o estigma e a falta de perspectiva conquistada no tempo do cárcere. Ressocializar ou punir continua sendo uma dúvida para a sociedade. É preciso romper o medo, estabelecer a segurança social e ai sim discutir formas que permitam a sociedade, entender a necessidade de recuperar os nossos semelhantes de uma forma humana. O que irá diminuir a violência e os conflitos sociais não é a intensidade ou o agravo da pena, e sim a certeza que não passará impune; penas alternativas, menores e com uma certeza que será aplicada inibirá com maior eficácia a prática delituosa; evitando que um criminoso com um grau de periculosidade, relativamente pequena, se torne um elemento de alta periculosidade, perdendo assim a oportunidade de ressocializá-lo.
5. Referências
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 16. ed. Petrópolis: Vozes, 1997.
KLOOS,Vanderlei. Ressocializar versus retribuir. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1209/Ressocializar-versus-retribuir>. Acesso em: 15 junho 2011
MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de Direito Penal. Vol. 1. 13 ed., São Paulo: Ed. Atlas. 2007.
Secretaria da Administração Penitenciária. Pró-egresso.<http://www.reintegracaosocial.sp.gov.br/pro_egresso.php >. Acesso em: 17 de junho 2011.
Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos. Apoio a Egressos e Liberados. <http://200.238.107.83/web/sedsdh/servicos/apoio-a-egressos-e-liberados>. Acesso em 17 de junho de 2011.
Secretaria de Estado de Defesa Social. Programa de Reintegração Social De Egressos Do Sistema Prisional. <https://www.seds.mg.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=282&Itemid=115>. Acesso em: 17 de junho 2011.
Acadêmica de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros-MG. Estagiária do Programa de inclusão dos egressos do sistema prisional de Montes Claros.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Dália Maria Maia. A reintegração dos egressos do sistema prisional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 jun 2011, 00:03. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/24864/a-reintegracao-dos-egressos-do-sistema-prisional. Acesso em: 26 dez 2024.
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