RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo de estudo a Defensoria Pública, como instrumento de materialização do direito fundamental ao acesso à justiça. Abordam-se as normas presentes na Constituição Federal, e nas Leis Complementares 80/94 e 132/09. Trata-se, ainda, sobre o direito fundamental à assistência jurídica gratuita, bem como da importância da Defensoria Pública na garantia do direito fundamental do acesso à justiça aos hipossuficientes econômicos.
Palavras-chave: Defensoria Pública. Acesso à justiça. Assistência Jurídica Gratuita.
SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Arcabouço constitucional e legal; 2.1 Do lineamento constitucional Da Defensoria Pública; 2.2 A Lei Complementar 80/94 E A Lei Complementar 132/09; 3 O Direito Fundamental de acesso à justiça; 4 Conclusão; Referências.
1.INTRODUÇÃO
Diante da realidade sócio-econômica do Brasil, a igualdade material perante a lei, direito contemplado pelo art. 5º, caput, é flagrantemente ameaçada pela diferença existente entre a capacidade econômica das partes ligantes em juízo.
Nesse contexto, na busca pela efetividade dos direitos fundamentais e realização da vontade do legislador ordinário constitucional, indaga-se qual a importância da Defensoria Pública para a garantia do direito fundamental do acesso à justiça aos hipossuficientes econômicos?
Nessa senda, à luz da ordem constitucional em vigor, o acesso à justiça não pode ser entendido como uma concessão estatal, mas como direito fundamental cuja eficácia plena e a aplicabilidade imediata encontram-se expostos no bojo da carta magna e cuja efetividade passa necessariamente pela atuação da Defensoria Pública, instituição que se manifesta como instrumento do regime democrático, através da promoção da assistência jurídica integral e gratuita e dos direitos humanos, em todos os graus, nos âmbitos judicial e extrajudicial, a todos que comprovarem hipossuficiência.
2. ARCABOUÇO CONSTITUCIONAL E LEGAL
2.1 DO LINEAMENTO CONSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA
A Defensoria Pública foi instituída pelo art. 134 da Constituição, na Seção intitulada “Das funções essenciais à justiça”, com o seguinte enunciado:
Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.)
§ 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.
§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º.
Nessa esteira, a função primacial da Defensoria Pública é a orientação jurídica e defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5, LXXIV, da Constituição, que estabelece:
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos
Da analise dos art. 5, LXXIV, e 134 da Constituição Federal, deflui-se que a assistência jurídica prestada pela Defensoria Pública pode ser qualificada como direito subjetivo fundamental do hipossuficiente econômico.
Entrementes, segundo o magistério de Frederico Rodrigues Viana de Lima:
A espeficidade deste requisito se restringe às funções típicas da Defensoria Pública. A comprovação da necessidade econômica não é reclamada para o exercício das funções atípicas, a exemplo das sempre lembradas curadoria especial e defesa técnica no processo penal. Nestes casos, o que legítima a Defensoria Pública é a necessidade jurídica, e não a econômica.”
Nesse prisma, a carência econômica é requisito apenas para a tutela individual, que deve ser obrigatoriamente comprovada para ensejar a atuação da Defensoria Pública.
Assim, a necessidade de comprovação prévia da insuficiência financeira é pressuposto primacial para deflagrar a atuação da Defensoria Pública em favor do cidadão economicamente hipossuficiente.
2.2 A LEI COMPLEMENTAR 80/94 e A LEI COMPLEMENTAR 132/09.
Em cumprimento ao mandamento constitucional previsto no § 1º do art. 134 da Carta da República foi publicada a Lei Complementar 80/94, a qual versa sobre a organização da Defensoria Pública da União e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como traça normas gerais para as Defensorias Públicas estaduais. A referida lei complementar foi alterada, em outubro de 2009, pela Lei Complementar 132.
No art. 1º do instrumento legal supracitado encontramos o conceito de Defensoria Pública, bem como a sua missão institucional, nos seguintes termos:
Art. 1º A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal.
Ademais disso, o Art. 3º-A da LC 80/94 estabeleceu os objetivos da Defensoria Publica, os quais são:
Art. 3º-A. São objetivos da Defensoria Pública:
I – a primazia da dignidade da pessoa humana e a redução das desigualdades
II – a afirmação do Estado Democrático de Direito;
III – a prevalência e efetividade dos direitos humanos; e
IV – a garantia dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Ainda, sobre a Lei Complementar 80/94, é importante mencionar que esta trouxe em seu art. 4 um rol exemplificativo das atribuições institucionais da Defensoria Públicas que se coadunam com os seus objetivos, entre principais funções podemos citar:
Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras:
I – prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus;
(...)
V – exercer, mediante o recebimento dos autos com vista, a ampla defesa e o contraditório em favor de pessoas naturais e jurídicas, em processos administrativos e judiciais, perante todos os órgãos e em todas as instâncias, ordinárias ou extraordinárias, utilizando todas as medidas capazes de propiciar a adequada e efetiva defesa de seus interesses;
VI – representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, postulando perante seus órgãos;
VII – promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes;
VIII – exercer a defesa dos direitos e interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e dos direitos do consumidor, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal;
IX – impetrar habeas corpus, mandado de injunção, habeas data e mandado de segurança ou qualquer outra ação em defesa das funções institucionais e prerrogativas de seus órgãos de execução;
X – promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela; ;
(...)
O exercício das funções institucionais e constitucionais da Defensoria Pública é toda norteada a partir das normas supracitadas, sendo que atuação dessa instituição só legítima na medida em que se dá efetividade aos objetivos previstos no Art. 3º-A da LC 80/94.
3 O DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO À JUSTIÇA
O legislador originário constitucional elevou a categoria de direito fundamental o direito de acesso à justiça, art. 5°, XXXV, o qual estabelece que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
O direito de acesso à justiça, igualmente conhecido como principio da inafastabilidade da apreciação jurisdicional, segundo Luiz Guilherme Marioni:
(...) é um direito à utilização de uma prestação estatal imprescindível para a efetivação do cidadão na social, e assim não pode ser visto como um direito forma e abstrato – ou como simples direito de propor ação e de apresentar defesa -, indiferente aos obstáculos sociais que possam inviabilizar o seu efetivo exercício. A questão do acesso à justiça, portanto, propõe a problematização do direito de ir a juízo – seja para pedir tutela do direito, seja para se defender – a partir da idea de que obstáculos econômicos e sociais não podem impedir o acesso à jurisdição, já que isso negaria o direito de usufruir de uma prestação social indispensável para o cidadão viver harmonicamente na sociedade”.
Com efeito, para conferir efetividade ao direito fundamental do acesso à justiça, por determinação constitucional, os hipossuficientes devem receber assistência jurídica integral do Estado (art. 5, LXXIV, da CF).
Nesse contexto, contexto surge a Defensoria Pública, como instituição cuja missão constitucional primordial é prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
Sobremais disso, a Defensoria Pública garante é a efetividade do postulado material da igualdade das partes perante o juízo, razão por que José Afonso da Silva ensina que “resta patente a relevância e importância institucional dos referidos órgãos como promotor da igualização das condições dos desiguais2perante a Justiça”.
Alçado pelo próprio ordenamento pátrio constitucional a direito fundamental do homem, o acesso à justiça é bem jurídico necessário e precípuo à viabilidade do Estado de Direito. Isto porque tal conceito ideológico não se materializa apenas amparado em normas positivadas. Não há que se falar em Estado de Direito apenas se levando em conta a igualdade de todos perante a lei. O estado de Direito se concretiza quando qualquer cidadão é capaz de postular um direito em juízo, em igualdade de condições de litígio para com a parte oponível.
Nesta perspectiva, a Defensoria Pública surge como instituição fundamental ao cumprimento da função jurisdicional do Estado, na medida em que possibilita a orientação jurídica integral e gratuita àqueles que não podem provê-la às próprias expensas sem que haja prejuízo da subsistência. Destarte, embora se trate de prestação de serviço público, esta não deve ser compreendida como mera concessão estatal, e sim como meio de viabilizar a materialização de um direito fundamental garantido constitucionalmente em norma de eficácia plena.
Assim, a instituição Defensoria Pública é instrumento de democratização do acesso à justiça, que tem como fim principal estabelecer um equilíbrio isonômico de fato onde o desequilíbrio se manifesta em virtude da diferença da capacidade econômica entre as partes litigantes.
Sobre o tema Defensoria Pública, expõe a Profa Cláudia Gonçalves:
Com a implantação integral das Defensorias Públicas, a assistência jurídica deixará de ser secundarizada, pois as suas atividades, finalmente, serão executadas por um órgão próprio, cuja atribuição maior será a defesa e a orientação dos seus usuários.
[...] A Defensoria cumpre, assim, dois grandes papéis: de um lado, destaca profissionais para prestarem precipuamente a defesa e a orientação jurídica; e de outro torna mais ativa a participação dos executores e dos usuários das mencionadas atividades.
Neste enfoque, a Defensoria Pública ela se revela como valioso instrumento estatal fundamental à distribuição de justiça social e estabelecimento de um Estado de Direito concreto.
4 CONCLUSÃO
A materialização do direito fundamental de acesso à justiça é condição precípua ao estabelecimento do Estado de Direito de fato.
No Brasil, devido às desigualdades materiais existentes na sociedade, tal direito é obstado tendo em vista a capacidade econômica do litigante.
Como forma de se tentar reduzir o descompasso existente entre a capacidade econômica e a igualdade formal perante a lei, as Defensorias Públicas Estaduais, do Distrito Federal e a Defensoria Pública da União em suas descentralizações, surgem no cenário jurídico pátrio como órgãos essenciais à função jurisdicional do Estado, bem como instrumentos imprescindíveis a democratização do acesso à justiça.
REFERÊNCIAS
GONÇALVES, Cláudia Maria da Costa. Assistência Jurídica Pública: direitos humanos e políticas sociais. 1a ed. 2a tir. Curitiba: Juruá Editora, 2008, ps. 86 e 87.
LIMA, Frederico Rodrigues Viana de. Defensoria Pública. 2ª ed. Bahia: JusPoivm, 2011, p. 239.
SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 615.
MARIONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. São Paulo: RT, 2006, p. 310.
_______. Lei Complementar 80 de 12.01.994. Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para a sua organização nos estados e dá outras providências. Disponível em: Acessado em 29 nov. 2011.
_______. Constituição da República Federal do Brasil de 05 de outubro de 1988.. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acessado em 29 nov. 2011.
Bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Maranhão, Pós-graduando em Direito Público, Ex-agente administrativo da Secretaria Municipal de Trânsito e Transportes de São Luís - SMTT, Ex-pregoeiro do Hospital Universitário Presidente Dutra - HUUFMA, Servidor Público Federal lotado na Defensoria Pública da União em São Luís/MA, Advogado pela Seccional-OAB/MA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PIRES, Emilio Eduardo Pereira. A Defensoria Pública e o direito fundamental ao acesso à justiça Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2011, 20:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27141/a-defensoria-publica-e-o-direito-fundamental-ao-acesso-a-justica. Acesso em: 23 dez 2024.
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