1. INTRODUÇÃO
O estatuto de Roma contém um catálogo das defesas nos artigos 31-33. O termo "defesa" deriva do direito anglo-americano e é um conceito bastante amplo e indiferenciado, o que constitui obstáculo, tanto material como processual, para a punibilidade e para a ação penal. A maioria dos sistemas de direito civil abstem-se de dispor sobre os dois tipos de atenuação. Assim, a incapacidade mental como forma de defesa representa um desafio multifacetado para a Promotoria intenational do Tribunal Penal Internacional.
A área de assunto de defesas é extremamente instável. Dessa forma, os juristas permanecem indecisos sobre a conveniência de formular defesas separadas, o que tem sido objeto de desacordo na defesa, conforme definido pelo sistema jurídico. Nos sistemas internacionais de acusação, o réu tem o direito de apresentar o seu próprio depoimento, além da opinião de especialistas e relatos de testemunhas sobre o assunto.
A defesa de incapacidade mental deriva do direito penal nacional, no qual tem sido aceito por muitos séculos. Ele desempenhou um papel limitado no processo de Nuremberg e só recentemente tem sido reconhecido no direito penal internacional.
O Tribunal de Nuremberg parece ter reconhecido que a insanidade pode afetar a responsabilidade penal: incapacidade mental de defesa vem da falta de culpa mental. Para o Direito penal internacional, a responsabilidade criminal individual requer um certo “estado de espírito” por parte do agressor, que deve acompanhar o ato ou omissão, como especificado na definição do crime, a exigência de um elemento mental é geralmente reconhecida no direito consuetudinário (Fletcher, 1978, pp. 440-441) (Smith Hogan, 1996, pp. 58-59).
O artigo 30 do Estatuto do TPI, agora, fornece uma regra geral, aplicável a todos os crimes sob a égide do direito internacional. Esse artigo divide-se em três subseções. A primeira delas refere-se aos requisitos relacionados com a conduta e consequências, somente quando o conhecimento relacionado à circunstância se dê apenas pelo elemento material, que deve ser coberto por intenção e conhecimento sobre a consequência de um crime.
Intenção e conhecimento tem significados diferentes, dependendo do elemento material em questão. A terceira parte do artigo 30 do Estatuto do TPI permite a utilização de regras diferentes ou complementares, que tem precedência sobre o elemento mental, tal como estabelecido no artigo próprio artigo 30. A defesa do erro de fato é reconhecida no artigo 32 (1) do Estatuto de Roma, segundo o qual um erro de fato deve constituir fundamento para excluir a responsabilidade penal somente se ele nega o elemento mental exigido pelo crime.
De acordo com o Estatuto de Roma do TPI, a alegação de incapacidade mental exige a falta da capacidade do requerido para entender ou controlar sua conduta.
2. A INCAPACIDADE MENTAL NO DIREITO MATERIAL
A incapacidade mental, formulada como uma justificação, está codificada no 39 (a) (c) do Estatuto do TPI e também é encontrada nas regras de procedimentos e provas do TPI da Antiga Iugoslávia e o de Ruanda.
Visivelmente, o TPI da antiga Iugoslávia e seu Estatuto, reconhecem a defesa da doença mental ou defeito (Jones Powles, 2003, p. 448), no artigo 31 (1) (a) do Estatutos do TPI (1998), sob a justificativa de que uma pessoa não será criminalmente responsável se, no momento da conduta dessa pessoa, ele ou ela sofre de uma doença mental ou defeito que destrói essa capacidade de apreciar a natureza de sua própria conduta ou ilegalidade ou, ainda, capacidade para controlar seus atos em conformidade com os requisitos de direito e as regras processuais e probatórias dos Tribunais.
De acordo com as regras 45 (2) (a) (i) do Estatuto de Roma, as circunstâncias que constituem motivos de exclusão da responsabilidade, tais como incapacidade mental ou coação, como menciona o artigo 31 acima e artigo 145 não são claros sobre suas consequências.
Segundo o artigo 31, a incapacidade mental é aceita como justificativa e o acusado merece ser absolvido, já que não deveria ser criminalmente responsável pelo fato.
De acordo com 31 (a) do Estatuto do TPI, a capacidade mental, instituída neste Estatuto de Roma, inclui: a) a capacidade das pessoas e a ilegalidade ou a natureza de sua própria conduta (erro de fato); b. capacidade para a exigência da lei (erro de direito).
Somente as perturbações mentais que destruam a capacidade do autor para entender ou controlar sua conduta conduzem à exclusão da responsabilidade.
Quando for o caso, o acusado é absolvido com base na falta de capacidade mental. Entretanto, para caracterizar a absolvição, faz-se necessária a avaliação psiquiátrica e tratamento.
O artigo 31do Estatutos do TPI distingue três efeitos da doença mental e cada uma deles pode levar à exclusão de responsabilidade, inexistindo a capacidade de apreciar a ilegalidade de conduta. É notável que esse artigo requer a inexistência de capacidade, e não uma simples diminuição dela.
3. Definição de incapacidade mental na jurisprudência
No caso de Delalic, foi mencionada a falta de capacidade mental como fundamento da defesa. Se pode ser provado que o réu estava agindo sem razão devido à incapacidade mental, estaria ele inconsciente da natureza e da qualidade de sua ação.
É como requisito essencial da defesa de responsabilidade diminuída que a anormalidade do requerido deve prejudicar consideravelmente sua capacidade de controlar a sua acção; a questão da substancialidade da deficiência é subjetiva e é um dos fatos.
A capacidade de auto-controle em relação aos atos, que é relevante para a defesa da atenuação da responsabilidade, é distinta da capacidade de formar um julgamento racional que deve significar que é distinto do nível de inteligência dos acusados.
O réu levanta a questão da falta de capacidade mental – é um desafio a presunção de sanidade mental por um fundamento de insanidade. O réu tem o ônus de instituir um apelo que, se bem sucedido, é uma defesa completa que pode levar à absolvição. O Estatuto do TPI excluiu a simples diminuição da capacidade mental como uma defesa, mas incluiu insanidade ou falta de capacidade mental.
No caso Celelbic, o Tribunal entendeu que a defesa de doença mental para mitigar a responsabilidade só é admissível no caso de uma diminuição da capacidade do acusado para apreciar a ilegalidade da natureza da sua conduta. O mesmo critério é incorporado no artigo 31 (A) (a) do Estatutos do TPI.
4. Critérios de incapacidade Mental
A base da defesa, nesses casos, é limitada aos dois elementos comuns à definição geral de incapacidade mental no estatuto de TPI e no julgamento do caso Celebici.
1. Doença ou anormalidade mental – o desenvolvimento mental retardado, para se enquadrar nesta categoria, deve ter natureza permanente.
2. As causas inerentes a esta abrange todos os transtornos mentais que não tem um causa externa, inclusive distúrbios funcionais.
3. Induzir doenças ou lesões, incluindo-se transtorno mental orgânico e doenças cerebrais. Em contrapartida, a simples ingestão de pílulas medicamente prescritas não constitui uma doença (Herring, 2005, p. 263).
Assim, deve ser demonstrado que o réu era incapaz de controlar seu comportamento, através de avaliação probatória.
a) Avaliação clínica
A apresentação de provas é imprescindível para a caracterização do quadro de insanidade mental.
Por isso, o TPI expressamente autorizou a nomeação de um Tribunal de saúde mental, formado por profissionais, que possam realizar o exame psicológico dos acusados. Nesse caso, o escrivão deve confiar essa tarefa a um ou vários peritos cujos nomes aparecem em uma lista previamente elaborada, com o registro e aprovado pela Mesa. Uma delegação de uma autoridade semelhante é considerada pela Comissão preparatória para o TPI.
b) Prova testemunhal
O quadro probatório para a defesa de capacidade mental tem implicações para a eficácia judicial e administração da Justiça.
No entanto, o estatuto de TPI não contém nenhuma regra explícita sobre o testemunho dos especialistas, considerando-se presumida no artigo 48 (4) e 100 (1) (d).
5. Consequências da incapacidade mental
a) atenuação da pena
Atenuação de punição refere-se à noção de redução da capacidade de execução.
As disposições de condenação dos ordenamentos jurídicos incluem as circunstâncias individuais do ataque como um potencial fator atenuante, e penas mínimas obrigatórias estão ausentes.
É claro que o TPI tem autoridade para atenuar a pena devido à condição mental do ofensor e existe uma clara margem de discricionariedade nas disposições de condenação.
A defesa de incapacidade mental perante o TPI exige completa incapacidade do réu de entender ou controlar sua própria conduta. Ele não deixa lugar para a diminuição da responsabilidade. No entanto, como o TPI da Antiga Ioguslávia e o de Ruanda prevê a atenuação da responsabilidade no seu Regimento de Procedimento e Provas. Ele prevê os casos de considerável diminuição da capacidade mental, como circunstância atenuante para a determinação de uma sentença.
b) responsabilidade diminuída
Do ponto de vista anglo-americano, "diminuído" tem a ver com mens rea e actus reus. A punição reduzida, então, relaciona-se com um delito menor, por exemplo, homicídio culposo ao invés de doloso. A posição anglo-americana sobre a responsabilidade diminuída também incluiu a incapacidade mental como relevante para a condenação.
Nos sistemas de common law, considera-se a capacidade mental diminuída alter mens rea e actus reus, dando origem a um delito menor para a qual uma sanção menor é adequada.
Uma defesa feita sobre este aspecto, geralmente é chamada defesa da responsabilidade diminuída ou responsabilidade parcial.
O Tribunal do caso Celebici concordou com a defesa de incapacidade mental como causa de diminuição da responsabilidade, mas o artigo 31 do Estatuto do TPI não é o igual à “defesa especial” de responsabilidade mental diminuída estipulada no Regimento de procedimentos e provas do TPI da Antiga Iugoslávia. O artigo 31 (1) (a) do estatuto do TPI exige a perda total (e não meramente a diminuição) da capacidade do requerido para absolvição.
A diminuição da responsabilidade na lei inglesa é uma defesa apenas para a prática de homicídio doloso, não se aplicando à tentativa. Se, com êxito, o requerido provou a incapacidade mental, ele ou ela não será condenada por homicídio doloso, mas condenado por homicídio culposo em acordo com a seção 2 (1) d a Lei de Homicídios (1957).
Sempre que uma pessoa é autor ou partícipe em um homicídio, ele deve não ser condenado pela modalidade dolosa se estava sofrendo de tal anormalidade mental, decorrentes do seu desenvolvimento mental retardado ou quaisquer causas inerentes a doenças ou lesões que influenciem sua responsabilidade mental.
Somente essa prova da condição mental do réu (diferente de insanidade) não é admissível para mostrar sua falta de capacidade para os crimes praticados, mas é admissível para mostrar que ele não faziam na verdade uma intenção específica necessária.
6. Conclusão
Um aspecto lamentável do artigo 31 (1) (a) é sua falha para fornecer para um veredicto especial na eventualidade de uma pessoa ser absolvida devido à incapacidade mental.
Isso torna-se importante, uma vez que a pessoa que é absolvida de falta de capacidade mental é necessariamente susceptível de alguma outra forma de sanção, que prevê a avaliação psiquiátrica e tratamento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fletcher, G.P. Rethinking Criminal Law. Boston, 1978.
Hogan, Smith. Criminal Law. London, 1996.
Jones, John R.W.D. & Powles, Steven. International Criminal Practice, 2003.
Herring, Jonathan. Criminal Law. Oxford, 2005.
Schabas, William. Genocide in International Law. 2nd ed. Cambridge, 2008.
* Tradução autorizada do artigo “Critical Study on Mental Incapacity in International Criminal Court”.
Autor: Venus Ghareh Baghi.
PhD in progress, Faculty of Law in Islamic Azad Universit.
Advogada. Pós-graduanda em Direito Civil e Processual Civil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LAíSE NUNES MARIZ LEçA, . Estudo crítico acerca da Incapacidade Mental no Tribunal Penal Internacional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 mar 2012, 07:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/28300/estudo-critico-acerca-da-incapacidade-mental-no-tribunal-penal-internacional. Acesso em: 23 dez 2024.
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