Resumo: O presente artigo não tem a pretensão de esgotar o assunto Responsabilidade Civil no Trânsito devido a sua abrangência, mas tem como objetivo principal abordar, de maneira predominantemente conceitual, os institutos do ordenamento jurídicos relacionados ao tema em questão, como por exemplo, os tipos de danos causados em decorrência dos acidentes nas vias terrestres, bem como os requisitos e desdobramentos da Responsabilidade Civil, sempre tomando como base as relações no cenário do Trânsito.
1. Introdução
Maria Helena Diniz (2006), sintetizando a conceituação de responsabilidade civil aduz que se pode defini-la como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).
O fundamento da responsabilidade baseia-se no desequilíbrio jurídico-econômico promovido pelo prejuízo.
A responsabilidade civil consiste em especialidade do Direito obrigacional, que por sua vez, engloba as complexas relações entre os agentes do trânsito no cenário nacional das vias terrestres, desencadeando conflitos que resultam, muitas vezes, em danos materiais, morais, psicofísico, estético, social, trabalhista, acidentário e ambiental, entre outros. Qualquer um destes danos tem alcance em matéria de responsabilidade civil.
O jurista Alvino Lima (2000, p.19-20), apoiando-se no mestre francês Josserand, reconhece, em sua obra A responsabilidade Civil pelo Fato de Outrem que:
Proclamam os autores, em geral, que não há assunto mais complexo e mais vivo, como observa Josserand, do que o estudo da responsabilidade aquiliana, centro do Direito Civil, ponto nevrálgico de todas as instituições, ora em plena evolução revolucionária, num verdadeiro período de crise, em estado de ebolição. A sua importância não se revela apenas nos debates teóricos, no contraste das doutrinas, procurando dar solução às variadas e inúmeras questões que o problema sugere e impõe; um conflito de ideias, de ideologias atinge esta matéria numa intensidade sem par, de sorte que ela fere o coração do direito, a base moral, a alma da vida social.
O autor salienta, ainda, que, o dano decorre, em geral, do fato humano, direta ou indiretamente; é uma consequência da atuação pessoal direta do autor do dano, ou de um fato alheio, cujos efeitos jurídicos recaem sobre outrem.
O cientista do direito, Pontes de Miranda (1972, p.06), com a autoridade de seu saber alinha com clareza, em sua doutrina Tratado de Direito Privado, que:
As regras jurídicas são abstratas: para que se apliquem, são de mister os suportes fáticos, que se compõem de fatos concretos; mas todas as relações, ainda que exteriores, são relações entre termos: não se concebe a sanção penal, sem o indivíduo a que se imponha, nem a indenização, sem o ser que deva indenizar, nem a recompensa, sem aquele que deva receber o benefício ou prêmio. Trata-se, sociologicamente, de simples ponto de aplicação, posto que, individualmente, seja isso o que mais interessa ao individuo punido, indenizado ou recompensado.
A responsabilidade civil assume importante papel na realidade social e demonstra o dever de indenizar os danos produzidos pelo sujeito ofensor da lei.
A convivência e harmonia social exigem respeito às normas de Direito quem impõem a linha de comportamento de cada pessoa, perfeita sintonia com as normas jurídicas de trânsito.
Para se caracterizar a responsabilidade civil é necessário que se coadunem quatro elementos, a saber: a ação ou omissão do agente, a culpa ou o dolo do agente, a relação ou o nexo de causalidade e o dano.
A Responsabilidade Civil Contratual, como o nome mesmo já sugere, ocorre pela presença de um contrato existente entre as partes envolvidas, agente e vítima.
Em relação à Responsabilidade Civil Extracontratual, também conhecida como aquiliana, o agente não tem vínculo contratual com a vítima, mas, tem vínculo legal, uma vez que, por conta do descumprimento de um dever legal, o agente por ação ou omissão, com nexo de causalidade e culpa ou dolo, causará à vítima um dano.
Essa responsabilidade tem por fonte a inobservância da lei, traduzindo-se numa lesão a um direito, sem que preexista qualquer relação jurídica entre o agente e a vítima, como por exemplo, se alguém atropelar outrem, causando-lhe lesão corporal, deverá o causador do dano repará-lo.
Da responsabilidade extracontratual, então, surgem duas subespécies: a responsabilidade delitual ou por ato ilícito, que resulta da existência deste fora do contrato, baseada na ideia de culpa, e a responsabilidade sem culpa, fundada no risco. Para que se configure a culpa, genericamente considerada, indaga-se se o sujeito, autor do dano, agiu dolosa ou culposamente. Tratando-se da responsabilidade caracterizada pelo risco, os doutrinadores a tipificam como objetiva, pois, basta a ocorrência, objetivamente, de alguns dos fatos previstos em lei para que ela se manifeste.
Conforme ensinamentos do mestre Álvaro Villaça Azevedo (1990, p.256), “é requisito essencial da iliceidade a atuação dolosa ou culposa do agente lesionário, pois, como sabem, existem ocorrências danosas, de que não derivam responsabilidade, tal em face do caso fortuito ou da força maior.”
Desse modo, pode-se verificar que a única diferença entre as duas figuras de responsabilidade civil encontra-se no fato de a primeira existir em razão de um contrato que vincula as partes e, a segunda surge a partir do descumprimento de um dever legal.
2. Teoria objetiva da Responsabilidade Civil
A Teoria da Responsabilidade objetiva não procura na conduta culposa ou dolosa do agente ofensor da lei e causador do dano, estabelecer o vínculo do dever de indenizar; mas o que cria o vínculo obrigacional é a relação de causalidade entre o dano produzido pelo agente causador à vítima. É esta a relação de causa e efeito que estabelece o dever de indenizar.
O ilustre doutrinador Sílvio Rodrigues (1991, p.10), de forma clara, afirma:
Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente. A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo esta teoria, aquele que, através de sua atividade, cria um risco de dano para terceiros, deve ser obrigado a repará-los ainda que sua atividade e o seu comportamento sejam isentos de culpa.
Como ressalta Roberto Senise Lisboa, em sua obra Manual de Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil, a teoria objetiva fundamenta-se na causalidade extrínseca, desprezando a intenção do agente, pois aquele que obtém vantagens pelos riscos criados, deve responder pelas consequências da atividade exercida, cuja periculosidade é a ela inerente ou fixada em lei. (LISBOA, 2002, p.227).
3. Responsabilidade Civil Subjetiva
O ordenamento jurídico brasileiro trabalha como regra geral com a Responsabilidade Civil Subjetiva, devendo ser comprovada a existência de culpa para que possa surgir a necessidade de qualquer ressarcimento.
Percebe-se que a ação do agente deve ser voluntária, negligente ou imprudente, portanto necessário se faz a comprovação da culpa.
A responsabilidade subjetiva, portanto, funda-se na ideia de culpa e de dolo, sendo que com relação a este último, sempre haverá responsabilidade.
Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o Dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente.
Na presente teoria deve-se demonstrar se o agente tinha a intenção de praticar o ato danoso ou, ainda se a sua conduta foi imprudente, negligente ou imperita. Tal comprovação somente é dispensável quando a lei expressamente presumir a culpa do agente, ainda que for fato de terceiro.
4. Princípio Informador da Responsabilidade Civil
O Princípio Informador da responsabilidade Civil é o dever de ressarcir o dano causado.
Sílvio Rodrigues (1991, p.13), tratando acerca da regra geral da responsabilidade civil, destaca:
Princípio geral de direito, informador de toda a teoria da responsabilidade, encontradiço no ordenamento jurídico de todos os povos civilizados e sem o qual a vida social é quase inconcebível, é aquele que impõe, a quem causar dano a outrem, o dever de o reparar.
Assim, verifica-se que o princípio informador do instituto da responsabilidade está em sintonia com o Código Civil, em seu art.186 e 927, que estabelece que quem, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.
5. Pressupostos da responsabilidade no Direito Civil
O Direito Civil do Trânsito adota os mesmos pressupostos da responsabilidade no Direito Civil. Preocupa-se com o estudo da convivência e harmonia social nas vias terrestres. Procura prevenir a destruição da vida e mutilação da integridade psicofísica do ser humano. Se isso não produzir seus efeitos e ocorrer o dano de qualquer natureza, por ação ou omissão voluntária ou não, o causador do respectivo dano fica obrigado a reparar o prejuízo causado.
Os pressupostos essenciais do instituto da responsabilidade civil são: a conduta humana (ação ou omissão), o nexo de causalidade, o dano e a culpa. Segundo lições de Altamiro J. dos Santos (2003, p.67), trata-se do alinhamento que aponta os caminhos do complexo universo que cerca os protagonistas da controvérsia produtora do dano e o dever de sua reparação.
5.1 A conduta humana
A conduta humana seja ela ação ou omissão é o ato da pessoa que causa dano ou prejuízo a outrem. É o ato do agente ou de outro que está sob a responsabilidade do agente que produz resultado danoso seja por dolo, negligência, imprudência ou imperícia. Este ato gera a obrigação de reparação. A conduta humana pode ser no sentido da prática por parte do agente de ato que não deveria fazer, ou do fato de deixar de praticar ato que deveria ter feito. O doutrinador Sílvio Rodrigues (2002, pag. 16) em relação a conduta humana afirma que:
A responsabilidade do agente pode defluir de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob a responsabilidade do agente, e ainda de danos causados por coisas que estejam sob a guarda deste. A responsabilidade por ato próprio se justifica no próprio principio informador da teoria da reparação, pois se alguém, por sua ação, infringindo dever legal ou social, prejudica terceiro, é curial que deva reparar esse prejuízo.
Maria Helena Diniz (2003, pag. 37) define conduta humana como sendo "o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, (...) que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado”.
5.2 O nexo causal
O nexo causal ou a relação de causalidade é um dos pressupostos fundamentais para a configuração da responsabilidade civil e do dever de indenizar. A relação de causalidade é o liame entre o ato lesivo do agente e o dano ou prejuízo sofrido pela vítima. A obrigação de reparar o dano requer prova inequívoca da relação de causalidade entre a ação ou omissão culposa do ofensor da lei e o dano produzido contra a vítima. Sílvio de Salvo Venosa (2003, p. 39) ao definir nexo de causalidade ensina que:
O conceito de nexo causal, nexo etimológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida.
Portanto, não basta apenas que a vitima sofra dano, é preciso que esta lesão passe a existir a partir do ato do agressor para que haja o dever de compensação. Se a vítima experimentar um dano, mas não se evidenciar que o mesmo resultou do comportamento ou atitude do réu, o pedido de indenização, formulado por aquela, deverá ser julgado improcedente. É necessária relação entre o ato omissivo ou comissivo do agente e o dano e tal forma que o ato do agente seja considerado como causa do dano. Sem o dano não há que se falar em responsabilidade civil, pois sem ele não há o que reparar.
5.3 a Culpa
Nossa legislação civil admite a existência de responsabilidade civil com a culpa como pressuposto, no entanto pode haver sem culpa. O parágrafo único do artigo 927 do Código Civil afirma que haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa.
A lei declara que se alguém causou prejuízo a outrem através de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, fica obrigado a reparar. De modo que, nos termos da lei, para que a responsabilidade se caracterize, mister se faz a prova de que o comportamento do agente causador do dano tenha sido doloso ou pelo menos culposo.
O direito à indenização surge sempre que o prejuízo resulte da atuação do agente, voluntária ou não. Quando existe intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, há o dolo, isto é, pleno conhecimento do mal e direto propósito de o praticar. Se não houve esse intento deliberado, proposital, mas o prejuízo veio a surgir, por imprudência, negligência ou imperícia, existe a culpa.
A imprudência ocorre por precipitação, quando por falta de previdência, de atenção no cumprimento de determinado ato o agente causa dano ou lesão. Na imprudência, estão ausentes prática ou conhecimentos necessários para realização de ato. A imperícia ocorre quando aquele que acredita estar apto e possuir conhecimentos suficientes pratica ato para o qual não está preparado por falta de conhecimento aptidão capacidade e competência. A negligência se dá quando o agente não toma os devidos cuidados, não acompanha a realização do ato com a devida atenção e diligência, agindo com desmazelo.
Quando restar comprovada a presença de um dos três elementos: negligência, imperícia ou imprudência fica caracterizada a culpa do agente, surgindo o dever de reparação, pois mesmo sem intenção o agente causou dano.
6. Ato ilícito
O conceito de ato ilícito é de suma importância para a responsabilidade civil, vez que este faz nascer a obrigação de reparar o dano. O ilícito repercute na esfera do Direito produzindo efeitos jurídicos não pretendidos pelo agente, mas impostos pelo ordenamento. Em vez de direitos, criam deveres. Ato ilícito é, assim, a ação ou omissão culposa com a qual se infringe, direta e imediatamente, um preceito jurídico do direito privado, causando-se dano a outrem. É o que acontece quando, por exemplo, motorista de um caminhão que trafega sem a atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito e, ao convergir, atropela um garoto que andava de bicicleta. A primeira das consequências que decorrem do ato ilícito é o dever de reparar.
Somente por razão a uma pretendida menção genérica é que admite-se considerar o ilícito como desconformidade pura e simples, isto é, que se o possa ter tão só como ato contrário à lei. Não fosse assim, por certo que de toda e qualquer infração exsurgiria o dever de reparar, o que de fato não acontece. Por conta disso, costuma-se enunciar que o ato ilícito constitui uma ação comissiva ou omissiva, imputável ao agente, danosa ao lesado e contrária à ordem jurídica.
7. a Importância do Direito obrigacional para os Atores Sociais do Trânsito
O Direito das obrigações, também chamado de Direito Pessoal, é um conjunto de normas que regem as relações jurídicas de ordem patrimonial, onde um sujeito tem o dever de prestar e o outro tem o direito de exigir essa prestação, ou seja, um deve fazer algo e o outro deve receber esse algo.
O mestre Sílvio Rodrigues (1991, p.8) conceitua:
O Direito das Obrigações cuida dos direitos pessoais, isto é, do vinculo ligando um sujeito ativo (credor) a um sujeito passivo (devedor) por força do qual o primeiro pode exigir do segundo o fornecimento de uma prestação consistente em dar, fazer ou não fazer alguma coisa.
O Direito Obrigacional é de grande importância nas dimensões da vida: pessoal, familiar, profissional, econômica, social, educacional, cultural e científica dos atores sociais do trânsito e dos sujeitos da relação de emprego.
Orlando Gomes destaca que: “O Direito das Obrigações exerce grande influência na vida econômica, uma vez que regula relações da infra-estrutura social, dentre as quais se salientam, por sua relevância política, as de produção e as de troca. É através de relações obrigacionais que se estrutura o regime econômico, sob formas definidas de atividade produtiva e permuta de bens. Tanto basta para atestar sua importância no conjunto das normas constitutivas da ordem jurídica”.
Todo homem é capaz de direito e obrigações na ordem civil. Para o bom relacionamento de todos os homens, é necessário que algumas regras sejam seguidas; são os deveres e direitos que cada um tem em relação a si mesmo, em relação à sociedade em que vive e a sua pátria.
O trânsito nas vias terrestres pode criar em qualquer esquina de seu caminho, grandes complicações.
Altamiro J. dos Santos (2003, p.53) em seu livro Direito Civil do Trânsito esclarece que:
O relacionamento no trânsito deve harmonizar-se entre os interesses dos atores sociais do cenário nacional das vias terrestres, exatamente em sintonia com o Direito de Trânsito, que aponta as normas de deveres que se deve cumprir nas vias terrestres.
O direito pessoal caracteriza-se por uma relação jurídica entre duas pessoas, em razão da qual uma (sujeito passivo) está imediatamente vinculada à outra (sujeito ativo), tendo para com esta uma obrigação, devendo a esta uma prestação, que poderá ser positiva ou negativa. Dessa maneira, o exercício do direito pessoal necessita da atuação de outra pessoa determinada, ou de algumas pessoas determinadas.
O sujeito ativo exerce seu poderio ou opõe seu direito, contra o sujeito passivo, que lhe está a dever uma prestação. Esta prestação poderá consistir numa coisa, o que determina que a exigência do sujeito ativo a ela se refira, mediata e indiretamente.
O ilustre doutrinador Orlando Gomes (1968, p.24) esclarece que os dois sujeitos, o ativo e o passivo, são, pois, elementos estruturais da relação obrigacional.
As fontes das obrigações são aqueles atos ou fatos nos quais estas encontram nascedouro. O Código Civil Brasileiro contempla declaradamente três fontes de obrigações, a saber: o contrato, a declaração unilateral da vontade e o ato ilícito.
O Direito Civil do Trânsito para estabelecer a obrigação na responsabilidade pela reparação do dano pode buscar, como fonte formal ou informal, a violação de dever em outros ramos ou normas do Direito. A fonte geradora de responsabilidade civil pode ser derivada da violação de uma norma de conduta definida no Direito de Trânsito, como o CTB, e sua regulamentação; assim como provir de normas formais: abertas ou em branco como as do Direito Penal e Direito Penal do Trânsito, Direito do Trabalho e Direito Penal do Trabalho, estes em relação aos sujeitos da relação de emprego, condutores de veículos automotores.
Ariosvaldo de Campos Pires e Sheila Jorge Selim de Sales salientam que:
As regras que impõem dever de cuidado objetivo podem derivar ou provir de fontes não escritas, sociais, hipóteses em que são extraídas da experiência: São aquelas condutas socialmente difundidas, que sugerem os instrumentos ou os cuidados a serem adotados para prevenir consequências danosas de determinadas condutas. Trata-se, pois, de regras práticas de diligência, de prudência e de perícia. (PIRES; SALES, 1998, p. 67).
O douto Caio Mário da Silva Pereira (1991, vol I, p.452) esclarece que o indivíduo na sua conduta anti-social, pode agir intencionalmente ou não, pode proceder por comissão ou por omissão, pode ser apenas descuidado ou imprudente. Não importa. A ilicitude da conduta está no procedimento contrário a um dever preexistente.
Os atores sociais do trânsito devem ter presente, sempre, que a convivência entre eles no cenário das vias terrestres não será possível se não respeitarem às normas de circulação e de conduta bem como as demais definidas no CTB, que devem estar sempre acima dos instintos pessoais, porque do contrário tornar-se-ia insuportável o convívio, que por si só, já é de hostilidade e provocante.
Para evitar tudo isso e possibilitar uma convivência em equilíbrio social diante da dignidade humana, cada interlocutor social deverá observar com a máxima cautela as regras de circulação e conduta: fonte do dever no cenário das vias terrestres. Deve-se cumprir a lei e as normas que estabelecem dever.
Pode-se ver com clareza que nenhum interlocutor social do trânsito poderá esquecer de que a violação de um dever definido no Código Brasileiro de Trânsito pode caracterizar fonte da culpa e originar responsabilidade civil, e, em consequência, a obrigação de indenizar o dano que der causa.
É evidente que não resta qualquer dúvida de que as normas definidas como deveres no CTB constituem verdadeiras fontes de responsabilidade civil.
É indispensável que se mude o gerenciamento da conduta dos agentes do trânsito, que não observam os deveres legais definidos no CTB e seu Regulamento como fontes de obrigação.
8. A violação das Normas do CTB como fonte geradora de Responsabilidade
É assustador observar a quantidade de condutores de veículos motorizados e a conduta de pedestres que, mesmo sabendo das graves consequências, ainda sim preferem voluntariamente violar as normas de trânsito como se tal fato fosse uma conquista elevada em transformar-se em infrator da lei.
Antônio Lindbergh C. Montenegro (1986, p.119), estudioso da responsabilidade civil automobilística, com propriedade, ensina:
À medida que aumentam os acidentes de trânsito, por força de inúmeros fatores, dentre os quais avultam as péssimas condições das estradas e a manifesta imprevidência dos nossos motoristas, as questões aparecem com maior complexidade, com vistas ao triângulo: motorista, vítima e responsável pela reparação civil.
O fenômeno da circulação, pela sua gravidade, se impôs a atenção do governo, do legislador, do técnico, do jurista e é objeto de continua discussão nos congressos e nos jornais. A sua importância rompeu as fronteiras do Estado, para se projetar nas relações internacionais, ressalte-se, no entanto, que o caráter internacional da matéria não decorre apenas da gravidade crescente que cerca o problema dos acidentes de trânsito.
O número dos ofensores da norma jurídica não é pequeno. Contudo, há que se ressalvar que o cenário brasileiro das vias terrestres conta com excelentes motoristas, pedestres e passageiros, cujo exemplo de dignidade é paradigma de cidadania no Estado democrático de Direito.
9. Dever como Fonte do mal decorrente dos acidentes de trânsito
A não observação do dever de atuar em sintonia com as normas do Direito de trânsito resulta num mal com tal magnitude que preocupa autoridades e operadores do SNT – Sistema nacional de Transito, bem como, técnicos juristas, sociólogos, engenheiros de tráfego, psicólogos, psiquiatras, economistas, administradores, comunicadores, médicos, odontólogos e outros cientistas, todos na árdua procura de um remédio para prevenir ou resolver o mal dos acidentes de trânsito no Brasil.
Afrânio Lyra (1979, p.129-130), tratando da responsabilidade automobilística, proclama que os técnicos de trânsito queimam as pestanas na procura difícil de um remédio pra o mal. Mas todos os esforços, seja pela magnitude do problema, seja pela incompetência dos técnicos, resulta em nada.
Informando as estatísticas que mais de 62% dos acidentes automobilísticos são ocasionados por falhas humanas, é compreensível que o problema não deva preocupar apenas os técnicos de trânsito. Há que coibir a fúria e punir adequadamente a imprudência dos motoristas e, portanto, que invocar o socorro indispensável do legislador.
A ineficiência automobilística apresenta como uma espécie de versão ou prolongamento da violência generalizada, que se agrava cada dia, em virtude da impunidade.
Não se pode esquecer de que todos os deveres definidos no Direito de Trânsito devem ser cumpridos.
Em matéria de responsabilidade civil, decorrente de transporte rodoviário, é fundamental o exame das regras de trânsito, bem como a violação específica das mesmas, para efeito de caracterização do fato gerador do evento danoso e identificação do respectivo agente, ou seja, o condutor do veículo ou o pedestre, conforme o caso.
Orlando Soares (1996, p.398), tratando da matéria em questão, com clareza declara:
Em suma, a obrigação de reparação do dano material, pessoal e moral, circulação dos veículos dessa natureza, com os quais convivemos de perto, nas calçadas, na via pública, nas garagens dos condomínios, nas praças e nos jardins, enfim, em toda parte, cumprindo lembrar que as condições psicológicas e a capacidade de raciocínio do pedestre para se defender duma possível agressão, estão muito aquém da rapidez, intensidade de movimentação, velocidade e potencialidade de dano desses veículos, cujos condutores estão também sujeitos às contingências psicológicas próprias, com profundas influências em seus reflexos, quando se encontram no volante.
Os acidentes de trânsito são causados por fatores variáveis que se constituem em fontes de responsabilidade civil.
É de conhecimento de diversos segmentos sociais que existem condutores, passageiros e pedestres que têm sua conduta em perfeita sintonia com as normas jurídicas que ditam as regras de comportamento no trânsito. Infelizmente, as estatísticas mostram que mesmo obedecendo rigorosamente os deveres regulamentares do trânsito, sujeitam-se a ser personagem do enredo trágico de acidentes, muitas vezes brutais e cruéis.
De um modo geral, pode-se afirmar que os acidentes de trânsito estão ligados ao fator humano. Na realidade devem-se à imprudência dos motoristas noventa por cento das tragédias que diariamente acontecem nas vias públicas. Embriaguez, delírio da velocidade, sono ao volante, distração, doença repentina, ultrapassagem precipitada, imperícia, eis as causas principais apresentadas nas estatísticas.
Por outro lado, o condutor de um veículo automotor está sujeito a provocar acidentes ainda quando se tenha conduzido em estrita obediência às normas regulamentares do trânsito. Assim, não é tarefa simples estabelecer a dinâmica de um acidente automobilístico, apontando com precisão o verdadeiro culpado. A tudo isso, somem-se as dificuldades em colher uma prova testemunhal satisfatória.
No Direito de trânsito se encontra o maior elenco de normas de deveres. È a inobservância desses deveres jurídicos de conduta que pode colocar em risco não só a própria vida, mas também a das vítimas, cujos danos muitas vezes revestem-se de forma cruel e dramática.
A vida moderna requer a observância do Direito de Trânsito no cenário nacional das vias terrestres para que se possa alcançar a garantia da inviolabilidade do direito à vida, da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da igualdade e da segurança, conforme os preceitos estabelecidos na Constituição Federal.
As causas primeiras dos acidentes automobilísticos podem ser buscadas não apenas no número excessivo dos veículos, como, ainda, no crescente índice de velocidade que podem desenvolver e, mais, na imprudência dos motoristas, muitos deles improvisados e desprovidos de qualidades específicas para o desempenho de uma profissão que reclama determinados predicados, como os da prudência e da atenção.
10. Danos no Direito Civil do Trânsito: espécies
10.1 Primeiras considerações
O Direito Civil do Trânsito é uma fonte inesgotável de produção de dano material, moral, psicofísico, estético, social, trabalhista. Acidentário e ambiental.
Há que se estabelecer os horizontes do Direito Civil do Trânsito sob a ótica de responsabilidade do ofensor da lei nas suas relações nas vias terrestres. Múltiplas são as repercussões nos acidentes de trânsito. Os danos causados, muitas vezes, suscitam complexas controvérsias jurídico-processuais para abrir caminho para uma solução justa.
A natureza jurídica da responsabilidade nas relações entre os atores do trânsito é complexa e resulta diversas consequências.
10.2 Dano material ou econômico
O dano é todo mal ou ofensa, que tenha uma pessoa causado a outrem, quer em razão da existência dum vínculo contratual, ou extracontratual (fora do contrato). Tanto num, como noutro caso, há um nexo psicológico entre autor ou agente, e o fato por ele praticado, que resultou no dano, o qual configura sempre um ilícito.
A ideia de seu interesse atende, no sistema da indenização, à noção do patrimônio como unidade de valor. O patrimônio estabelece mediante o confronto entre o patrimônio realmente existente após o dano e o que possivelmente existiria se o mesmo não tivesse sido produzido.
Antônio L. C. Montenegro (1986, p.243), tratando do campo de incidência do dano patrimonial, salienta que os danos materiais afetam bens corpóreos e incorpóreos que representam valores econômicos para determinado patrimônio e diz mais o mestre que “outras vezes, o dano material resulta de acontecimentos verificados no exercício de atividades normais do homem, de que constitui exemplo mais frisante na sociedade moderna o dano decorrente dos acidentes automobilísticos”.
O dano material, em regra, implica na obrigação de responder o ofensor pelo dano emergente e pelo lucro cessante.
10.3 Do dano moral e estético
A começar, importante dizer que dano estético possui diversas terminologias, como, por exemplo, dano corporal (pretium corporis), dano físico, dano deformidade, dano fisiológico, dano à saúde, dano biológico, não importando qual terminologia será utilizada para a proteção da integridade física da vítima.
É, portanto, a lesão à beleza física, ou seja, à harmonia das formas. São as marcas e os defeitos ainda que mínimos capazes de provocar, sob qualquer aspecto, um ‘afeamento’ da vítima ou que pudessem vir a se constituir para ela numa simples lesão ‘desgostante’ ou em permanente motivo de exposição ao ridículo ou de inferiorizantes complexos.
Conceituando o dano estético, recorre-se à lição de Maria Helena Diniz (1995, p. 61-63), para quem:
O dano estético é toda alteração morfológica do indivíduo, que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeiamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa. P. ex.: mutilações (ausência de membros - orelhas, nariz, braços ou pernas etc.); cicatrizes, mesmo acobertáveis pela barba ou cabeleira ou pela maquilagem; perda de cabelos, das sobrancelhas, dos cílios, dos dentes, da voz, dos olhos (RJTJSP, 39:75); feridas nauseabundas ou repulsivas etc., em consequência do evento lesivo.
Já os danos morais, são caracterizados por lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico.
Orlando Soares (1996, p.74-5), conceituando o dano moral, diz que se refere:
À ofensa ou violação que não fere propriamente os bens patrimoniais de uma pessoa - o ofendido -, mas os seus bens de ordem moral, tais como os que se referem à sua liberdade, honra (à sua pessoa ou à sua família), compreendendo-se na ideia de honra o que concerne à fama, reputação, conceito social, estima dos outros.
O objeto da ofensa é a estima e respeito que a pessoa goza ou a consciência desse valor diante da sociedade. Toda pessoa tem o direito de ver respeitada a sua honra, por menos representativa que seja de valores morais padrão.
Como o dano lesiona um bem pessoal, patrimonial ou moral, sobre o qual o lesado tinha um interesse, para que haja dano moral indenizável é necessário que concorram os seguintes requisitos: um interesse sobre um bem que haja sofrido diminuição ou destruição, pertencente a uma pessoa; a lesão ou sofrimento deve afetar um interesse próprio; deve haver certeza ou efetividade do dano e, por ultimo, o dano deve subsistir ao tempo de ressarcimento.
O mestre S.J. de Assis Neto (1998, p.162-3), em sua obra Dano Moral e Aspectos Jurídicos, com poder de síntese, esclarece:
O dano moral pode emergir quando o fato fizer com que o lesado seja exposto a situação constrangedora, que afeta o equilíbrio emocional da pessoa. É o caso, por exemplo, do atropelamento, em que o lesado, ao lado dos eventuais danos físicos e patrimoniais sofridos, sente-se grandemente lesionado em sua dignidade, tranquilidade e segurança, atacadas pela negligência ou imprudência do ofensor, máxime de este não oferecer qualquer ajuda para o atropelado.
Neste sentido, é importante frisar que a fixação de indenização por danos morais tem o condão de reparar a dor, o sofrimento ou exposição indevida sofrida pela vítima em razão da situação constrangedora, além de servir para desestimular o ofensor a praticar novamente a conduta que deu origem ao dano.
10.4 Dano Psicofísico e Social
O dano psicofísico constitui-se da lesão física e da dor do sentimento psíquico, emocional, o trauma mental, o medo, todos comuns nos acidentes de trânsito.
Não se pode esquecer que além das consequências psicológicas o dano pode também alcançar a esfera social.
Portanto, os danos materiais, moral, estético, psicofísico e social deve merecer reparação quando violados. É certo que as consequências danosas lesionantes podem originar consequências que alcançam todas as esferas da vida de cada um. Cada dimensão pode sofrer dano a exigir sua composição, se não for possível em sua totalidade, pelo menos que reduza ao máximo o mal produzido pelo ofensor.
11. A Obrigação de reparar o dano no Direito de Trânsito
A palavra obrigação se apresenta com um sentido amplo e com um estrito, sendo que, naquele, obrigação equivale a qualquer tipo de dever, seja moral, social, religioso, dentre outros, incluindo o dever jurídico; já neste, o significado da palavra obrigação cinge-se ao âmbito do direito, correspondente à ideia esboçada no conceito de obrigação, segundo o qual de um lado, o credor aparece a exigir do devedor, do outro lado da relação jurídica, a prestação consistente num dar, fazer ou não fazer alguma coisa, cujo inadimplemento enseja a execução do patrimônio do devedor, pelo credor, para satisfação do interesse deste.
Sabe-se que o acidente de trânsito é um fato jurídico que gera consequência definidas pelo direito em face da violação de um dever que tem como fonte principal o Direito de Trânsito.
Conforme ensinamentos de Daniel Coelho de Souza (1977, p.435) o dever jurídico nasce de um fato. Nem todos os fatos, porém, acarretam deveres, somente aqueles aos quais o direito empresta uma consequência, e, por isso, são chamados de fatos jurídicos.
Portanto, aquele que, no trânsito, violar o dever definido no CTB ou qualquer outra norma regulamentar e regente da conduta no comando do veículo ou na condição de passageiro ou pedestre, enseja a fonte originária da obrigação de reparar o dano que der causa.
O ideal jurídico que se procura alcançar no equilíbrio da reparabilidade do dano é, a princípio, restaurar o estado originário; quando isso não for possível, a lógica deve aproximar ao máximo a reparação do estado anterior ao dano produzido pelo agente lesionário à vítima da ação ou omissão que ensejou o resultado do mal ocorrido.
12. Conclusão
Ao analisar o presente artigo, pode-se perceber a papel essencial que o instituto da Responsabilidade Civil e as suas ramificações desempenham no cenário do trânsito, principalmente no que se refere ao seu princípio informador: o dever de ressarcir o dano causado às vitimas.
Diante dos estudos realizados para a elaboração deste trabalho, conclui-se que os acidentes de trânsito ocorrem, em quase sua totalidade, por culpa ou dolo dos condutores. Observa-se que os acidentes de trânsito não acontecem por acaso, havendo, portanto sempre uma pessoa envolvida, seja o próprio condutor do veículo, o passageiro ou pedestre.
Diante do exposto, o que se tem a fazer, para reduzir os acidentes nas rodovias, é justamente educar, conscientizar os motoristas de que os veículos, sendo utilizado de maneira inadequada, tornam-se verdadeiras armas de destruição.
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Acadêmico do Curso de Direito - Universidade Estadual de Montes Claros-MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RUBEN LEONARDO NUNES LOURENçO, . Breves considerações sobre a responsabilidade civil no trânsito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 maio 2012, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/29158/breves-consideracoes-sobre-a-responsabilidade-civil-no-transito. Acesso em: 23 dez 2024.
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