RESUMO: Com o advento da Constituição da República de 1988, o sindicalismo brasileiro passou a ter maior liberdade de atuação. Todavia, o mesmo conteúdo constitucional que trouxe importantes conquistas prevê também algumas normas que não condizem com o real sentido de sindicalismo, como a unicidade sindical e a contribuição sindical obrigatória. Tais exemplos constituem verdadeiras contradições, as quais limitam alguns direitos trabalhistas de ordem fundamental.
PALAVRAS-CHAVE: liberdade sindical; contribuição sindical; Constituição da República; Consolidação das Leis do Trabalho.
1 INTRODUÇÃO
A liberdade sindical no Brasil sempre foi alvo de muitas discussões. Desde a forma como foi inserida ao jeito como é exercida nos dias atuais, a noção prática do sindicalismo brasileiro constitui verdadeira celeuma de críticas.
Apesar das inovações trazidas ao longo dos tempos por normas de cunho legal e constitucional, a liberdade sindical ainda não é exercida como deveria, tendo em vista as várias incongruências ainda existentes.
2 O SINDICALISMO INSTITUÍDO NO BRASIL
A sistematização conferida pela Consolidação das Leis do Trabalho dotou o Brasil de uma estrutura sindical baseada na concepção fascista italiana. Contudo, ao ser introduzida no país foram-lhe feitas alterações para viabilizar sua compatibilidade junto ao ordenamento jurídico, bem como com o nosso perfil sócio-político de acordo com as relações existentes entre a sociedade civil e o governo do Presidente Getúlio Vargas diante do autoritarismo do Estado Novo.
A partir da vigência da Constituição da República de 1988 e de seu regime democrático, o sindicalismo brasileiro obteve maior liberdade, passando a ser vedado que o Estado interferisse na organização e administração sindical, embora preveja que a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente.
Ademais, outras importantes conquistas foram incorporadas a legislação brasileira pertinente aos direitos trabalhistas, mas, no que diz respeito à questão sindical, o resultado não foi o mais esperado, levando em conta suas contradições com o real sentido de liberdade sindical, a qual se passa a analisar.
3 DA LIBERDADE SINDICAL
A Carta Magna de 1988 estabelece em seu artigo 8.º que “é livre a associação profissional ou sindical” [1]. Estabeleceu o legislador constituinte o princípio da autonomia sindical quanto à sua criação, organização e funcionamento. Entretanto, o inciso II do mesmo artigo proíbe a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo, porém, ser inferior à área de um município.
Ocorre que não se pode confundir liberdade social com liberdade da escolha. Se a lei impedir o exercício da liberdade sindical por meio de limitações excessivas impostas pelo legislador ordinário, a liberdade conferida pelo Texto Constitucional passa a ser uma não-liberdade sindical. Na verdade, no real sentido de liberdade sindical não deve existir nenhuma interferência estatal, pois essa, segundo Martins [2]:
É uma espécie de liberdade de associação. É o direito de os trabalhadores se organizarem e constituírem livremente as agremiações que desejarem, no número por eles idealizado, sem que sofram qualquer interferência ou intervenção do Estado, nem uns em relação aos outros, visando à promoção de seus interesses ou dos grupos que irão representar. Essa liberdade sindical também compreende o direito de ingressar e retirar-se dos sindicatos.
Em sede de liberdade sindical, não há espaço para intervenção ou interferência do Poder Público, já em ambiente de pluralidade sindical poderá ocorrer à interferência estatal como forma de regulamentar a atividade sindical. Enquanto a pluralidade sindical pode conviver com a intervenção estatal, a liberdade sindical não. Isto quer dizer que, pode haver pluralidade sindical com todas as suas regras de constituição, funcionamento, registro e atuação limitados pelo Estado, ou seja, “o Estado, mesmo em um ambiente de pluralidade sindical, pode ditar as regras para a existência de entidade sindical.” [3]
4 DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL PREVISTA EM LEI
Instituída com a finalidade de possibilitar às entidades sindicais obter maiores recursos financeiros para enfrentar o processo de negociação coletiva, a contribuição sindical distingue-se da contribuição confederativa, constituindo a grande fonte de sustentação financeira para algumas entidades sindicais brasileiras, sendo prevista no inciso IV do artigo 8.º da Constituição da República, e disciplinada nos artigos 578 a 610 da CLT. Tal contribuição é determinada pela assembleia geral, que a fixará e a descontará na folha de pagamento, cabendo aos trabalhadores definir o montante a ser descontado. Assim, “a contribuição sindical tem natureza jurídica tributária, fixada em lei, sendo, portanto, compulsória, independendo da vontade dos contribuintes de pagarem ou não o referido tributo, ou de a ele se oporem, enquanto a outra, em nosso modo de ver, é facultativa.” [4]
Nessa esteira, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a contribuição sindical também pode ser cobrada dos servidores públicos, pois estaria em consonância com o artigo 578 da CLT. [5]
Diante da noção de liberdade sindical, percebe-se não ser função do Estado assegurar receitas ao sindicato, principalmente por intermédio de contribuição imposta por lei. Nas palavras de Martins [6]:
As receitas do sindicato devem advir, porém, da contribuição dos associados e de contribuições extraordinárias decorrentes de a agremiação ter participado das negociações coletivas e de ter incorrido em custos em razão disso. O sindicato deve manter-se por conta própria, prestando bons serviços aos associados e não recebendo contribuições que são compulsórias ou preestabelecidas pelo Estado por intermédio de lei.
Para que realmente haja autonomia e liberdade sindical, é necessário que exista uma forma de custeio da atividade das entidades sindicais sem exigir que esta seja feita de maneira obrigatória pelos trabalhadores. Essa contribuição deve ser prestada de maneira espontânea pelos filiados e não por intermédio de contribuições compulsórias, uma vez que o Estado não deve garantir ou assegurar receita ao sindicato, mas a agremiação é que deve procurá-la por seus próprios meios, já que é uma entidade privada e não mais exerce função delegada de Poder Público.
O Estado deve apoiar o sindicato, reconhecendo a liberdade da criação dessa entidade, que tem importante função no que diz respeito às questões trabalhistas. Pois, se o Estado garante a receita do sindicato, interfere indiretamente a liberdade sindical, prejudicando sua autonomia sindical e independência.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sabe-se que a liberdade sindical tem como intento principal conferir o direito subjetivo de a sociedade civil se organizar livremente sem a interferência Estatal. Contudo, essa mesma liberdade conferida constitucionalmente é a mesma que restringe o poder de auto-organização sindical, já que assim como se permite a criação de sindicatos no Brasil, impõe-se a unicidade sindical; assim como se garante que os sindicatos devem ter recursos para se sustentar, estabelece-se a contribuição sindical obrigatória, ou seja, trata-se de verdadeiras contradições no que se refere à matéria sindical.
Dessa forma, apesar dos avanços em matéria sindical conferidos pelo Texto Constitucional de 1988, não se deve afirmar que esta permite a liberdade sindical plena, visto que mantêm resquícios da antiga estrutura corporativista implantada com a Consolidação das Leis do Trabalho de 1943.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998.
LOBATO, Marthius Sávio Cavalcante. O valor constitucional para efetividade dos direitos sociais nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2006.
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 26. ed. – São Paulo: Atlas, 2010.
[1] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado,
1998.
[2] MARTINS, Sérgio Pinto Martins. Direito do trabalho, p. 709.
[3] LOBATO, Marthius Sávio Cavalcante, p. 69.
[4] MARTINS, Sérgio Pinto Martins, p. 757.
[5] Ac. STF, Rec. em MS 21.758-1, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU I de 4-11-94, p. 29.831.
[6] MARTINS, Sérgio Pinto Martins, p. 709.
Acadêmico da: Faculdade de Ciências Humanas e Sociais - AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CURVELO, Hercílio Denisson Alves. As contradições do sindicalismo brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 set 2012, 08:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/30835/as-contradicoes-do-sindicalismo-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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