Resumo: Prática ainda muito comum no nosso país é a agiotagem, que ocorre quando há um contrato de empréstimo entre pessoas físicas, com cobrança de juros excessivos. Tal prática gera implicações criminais e cíveis. Contudo, muito embora a agiotagem seja considerada um crime contra a economia popular, o valor original emprestado deve ser pago pelo tomador, sob pena de enriquecimento sem causa.
Sumário: 1. Introdução; 2. Aspectos criminais e cíveis da agiotagem; 3. Conclusão.
1 - Introdução:
Como é cediço, a agiotagem é prática mesquinha e aproveitadora praticada por algumas pessoas abusando da fragilidade e situação de vulnerabilidade de outras pessoas. Consiste no empréstimo de dinheiro a juros excessivos, porque contêm juros superiores àqueles legalmente permitidos em lei.
Tal prática é considerada crime contra a economia popular, ficando o sujeito ativo sujeito às penalidades do artigo 4º da Lei 1.521/51. Além disso, pode ainda ser configurado crime contra o Sistema Financeiro Nacional, posto que o agiota atua no mercado financeiro sem autorização pelo Banco Central para tanto.
Já na seara cível, a situação é diferente do que imagina a maioria das pessoas, já que o valor emprestado pelo agiota deve ser pago pela outra parte, tendo em vista ser inadmissível em nosso ordenamento jurídico o enriquecimento sem causa. Evidentemente que, o pagamento será sem a cobrança de juros ou no máximo a cobrança de juros de 12% ao ano, conforme prevê nossa Constituição Federal.
Nesse sentido, o presente artigo buscará demonstrar as implicações criminais e cíveis que estão atreladas à agiotagem.
2 - Aspectos criminais e cíveis da agiotagem:
Muito se fala da criminalização da prática de agiotagem, ou seja, do fato da agiotagem ser crime. Contudo, difícil é achar a capitulação legal de tal crime.
Tal prática realmente é crime contra a economia popular, mais precisamente enquadrada no artigo 4º da Lei 1.521/51. Senão vejamos:
Art. 4º. Constitui crime da mesma natureza a usura pecuniária ou real, assim se considerando:
a) cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre dívidas em dinheiro superiores à taxa permitida por lei; cobrar ágio superior à taxa oficial de câmbio, sobre quantia permutada por moeda estrangeira; ou, ainda, emprestar sob penhor que seja privativo de instituição oficial de crédito; (grifos nossos)
Como visto acima, fica clarividente na transcrição do caput e da alínea a do artigo supracitado que a usura refletida na cobrança de juros sobre dívidas em dinheiro superiores à taxa permitida por lei é crime, na verdade o famoso crime de agiotagem.
Ora, como já mencionado, a agiotagem se configura pela prática de empréstimo de dinheiro com juros excessivos, aproveitando-se muitas vezes da situação de vulnerabilidade do tomador do empréstimo.
Estabelece claramente a Constituição federal que as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não podem ser superior a 12% ao ano, e a cobrança acima deste limite é usura, portanto crime.
Ocorre que, a agiotagem pode caracterizar, ainda, crime contra o Sistema Financeiro Nacional eis que o agiota atua no mercado financeiro sem autorização para tanto. É o que dispõe o artigo 7º, inciso IV da Lei 7.492/86:
Art. 7º - Emitir, oferecer ou negociar, de qualquer modo, títulos ou valores mobiliários:
IV – sem autorização prévia da autoridade competente, quando legalmente exigida: (grifos nossos)
O agiota atua por conta própria, sem qualquer autorização do Banco Central, o que não é permitido e, além disso, é enquadrado como um dos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional.
O crime acima será julgado pela Justiça Federal, ao contrário do anteriormente mencionado que será pela Justiça Estadual.
Configurada a prática da agiotagem, cabe ao lesado denunciar o caso às autoridades competentes, para que as providências cabíveis sejam tomadas e o agiota responsabilizado pela sua conduta.
Ficando delineado o enquadramento penal da prática de agiotagem, cabe agora uma análise acerca da questão cível.
Muitos acham, erroneamente, que por ser o agiota sujeito ativo de crime, o valor por ele emprestado não pode ser cobrado, ou seja, não há a obrigação de pagamento daquele numerário.
Ocorre que, no nosso ordenamento jurídico não é permitido o enriquecimento ilícito ou sem causa. Com base nisso, fica claro que o valor emprestado pelo agiota deve ser devolvido/pago, porém, sem a incidência de juros excessivos, devendo ser devolvido somente o valor original ou no máximo com a incidência dos juros legalmente permitidos pela nossa Constituição Federal, ou seja, 12% ao ano. Juros superiores a isso são considerados ilegais e, portanto, incabíveis no pagamento ao agiota.
Assim, não pode o tomador do empréstimo se iludir achando que não tem o dever legal de pagar o agiota, pois tem, muito embora sem a incidência de juros excessivos. O fato do mesmo cometer o crime de agiotagem não impede a cobrança do valor civilmente, muito embora geralmente prefira não se socorrer do Judiciário, por motivos óbvios.
3 - Conclusão:
A agiotagem constitui crime de usura e contra o sistema Financeiro Nacional, sendo enquadrada em alguns desses crimes de acordo com a conduta praticada. É prática amplamente combatida pelo nosso ordenamento jurídico, tendo em vista resultar em lesão a diversas pessoas e muitas vezes gerar violência na cobrança das dívidas.
Não são raras as vezes que agiotas cobram seus créditos através do uso da força, com ameaça de morte, espancamentos e até mesmo o cometimento de homicídio, além de tomarem por conta própria bens dos lesados, como geladeiras, televisões e demais utensílio domésticos.
Sendo determinada pessoa vítima do crime, cabe à mesma denunciar a infração penal nos órgãos competentes, sendo que com isso o agiota irá sofrer a sanção penal estipulada, respondendo a processo criminal e podendo, ao final condenado, ser levado à prisão.
Entretanto, na seara cível, conforme ficou demonstrado, é devido o pagamento do valor emprestado pelo agiota, sob pena de ocorrência de enriquecimento sem causa. Evidentemente que, tal devolução será sem a cobrança de juros ou no máximo com estipulação de juros de 12% ao ano.
4 - Referências:
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2006.
GONZAGA, Vair. Do Cheque. 1ª ed. Livraria de Direito: São Paulo, 1995.
MARQUES, Adelson do Carmo. Cheque, Nota Promissória, Letra de Câmbio, Duplicata - Aspectos Práticos. Péritas Editora: São Paulo, 1996.
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