RESUMO: A presente produção acadêmica em moldes de artigo tem o intento de mostrar a relação entre o livro Vigiar e Punir de Michel Foucault e o princípio da dignidade da pessoa humana. O referido livro teve uma repercussão muito grande por mostrar a forma como o modo de punir usado pelos diversos povos foi se desenvolvendo e chegou até a pena privativa de liberdade tal qual a conhecemos na atualidade.
Palavras Chave: Dignidade humana, prisão, Vigiar e punir, atualidade.
1. INTRODUÇÃO
A Europa sempre foi caracterizada pelo sofrimento infringido contra os seus acusados. A maioria dos países do Velho Continente trazia código muito firmes, recheados de punições desumanas.
O cerne dessa questão era certamente o suplício. Quando um crime cometido era de natureza mais grave, como um homicídio, o agente era submetido a inúmeras provas de sofrimento.
Seu corpo era desmembrado, queimado e torturado das mais diversas formas até que chegasse a óbito.
Como esse é um tema muito apaixonante Michel Foucault se dispôs a fazer uma análise bem rigorosa a respeito do que move a sociedade a tomar medidas correcionais contra indivíduos que não se adéquam ao modelo proposto de comportamento chegando a praticar crimes de toda natureza.
Diante do exposto estudaremos a prisão como uma forma de rescossialização, os suplícios e a posição da sociedade e de alguns doutrinadores interligando sempre esses temas com a dignidade humana e como se deu a evolução da pena ate a privativa de liberdade seguindo Michel Foucault.
2. FOUCAUL E A ANÁLISE DA BARBÁRIE EFETIVADA NO CORPO SUPLICIADO. A EVOLUÇAO DA PENA E A DIGNIDADE HUMANA.
Em seu livro Vigiar e Punir, Michel Foucault argumenta que a existência dos terríveis suplícios se devia ao fato de que a população acreditava que aquele sofrimento salvava a alma do condenado.
As leis penais variam de acordo com a época em que se vive, é lamentável mas é verdade.
Foucault explica que além de ser deliberadamente bruto o suplício ainda divergia de acordo com a classe social do indivíduo, e com a gravidade do crime:
“O suplício faz correlacionar o tipo de ferimento físico, a qualidade, a intensidade, o tempo dos sofrimentos com gravidade do crime, a pessoa do criminoso, o nível social de suas vítimas. Há um código jurídico da dor; a pena é calculada de acordo com o número de golpes, tempo de agonia na fogueira, localização do ferro em brasa.” (FOUCAULT, 2005).
As desculpas podiam ser as mais tocantes, no entanto, o que havia era uma verdadeira desgraça com o corpo da pessoa.
Muita gente se levantou contra esses abusos acreditando que o condenado por ser humano merecia uma punição menos degradante, a solução foi procurar outros meios de sanção.
A dignidade da pessoa humana não pode ser destruída desta maneira, haja vista, ser um princípio que solidifica o direito. Segundo a teoria de Hannah Arendt, atualmente mal se tornou banal e não se sabe mais ate aonde vai a dignidade humana. Sabe-se um conceito geral mais na verdade a dignidade humana hoje e mais que relativa pois só cada ser sabe o que e necessário para se viver dignamente e ter a essa dignidade.
Não seria possível na atualidade que uma prática punitiva como essa fosse efetuada porque a Constituição Federal disciplina a existência de um Estado democrático de Direito, fundamentado no princípio da dignidade humana (CF, artigo 1º, III).
Fernando Capez traz uma importante contribuição:
“ A dignidade humana, assim, orienta o legislador no momento de criar um novo delito e o operador no instante em que vai realizar a atividade de adequação típica. Com isso, pode-se afirmar que a norma penal em um Estado democrático de Direito não é somente aquela que formalmente descreve um fato como infração penal, pouco importando se ele ofende ou não o sentimento social de justiça” (CAPEZ, 2007)
A humanização é visível. É como se o processo penal saísse do inferno para o paraíso.
Os extremos dessas práticas levam a contradições de todo tipo. Por exemplo, o carrasco é amigo do supliciado, assim sendo, não o trata da mesma forma como faria com uma outra pessoa que o mesmo não tenha afinidade.
Existe a possibilidade de se aplicarem medidas diferentes para casos que são iguais.
Vigiar e Punir nos envolve quando diz que a evolução se deu de forma ascendente, deixou-se de punir o corpo da pessoa para que se passasse à sua alma. A solução foi a prisão.
Não é porque esse ato de prender é melhor do que a surra que a única medida punitiva tem por obrigação ser essa.
Existem penas alternativas como o serviço prestado à comunidade, multas de ordem pecuniária, cessação temporária de direitos. Foram surgindo a partir da contestação do suplício e se estabeleceram.
A concretização do direito se dá de acordo com a norma criada e os princípios jurídicos.
Eros Roberto Grau em Ensaio e Discurso sobre a interpretação/aplicação do direito traz um importante posicionamento:
“ O fato é que a norma é construída, pelo intérprete, no decorrer do processo de concretização do direito. O texto, preceito jurídico, é, como diz Friedrich Müller, matéria que precisa ser trabalhada. Partindo do texto da norma e dos fatos, alcançamos a norma jurídica, para então caminharmos até a norma de decisão aquela que confere solução ao caso.” (GRAU, 2006)
3. A DIGNIDADE COMO NORTEAMENTO PENAL. E A SOCIEDADE COMO VIGIA.
Foucault diz que várias são as formas de punição. Até aquelas que não parecem tão agressivas. Para a defesa dos interesses particulares e públicos vivemos hoje em uma sociedade vigiada.
As pessoas não têm a liberdade plena porque segundo o autor estão sujeitas sempre ao olhar de todos. É a volta da guerra de todos contra todos, todavia, o direito penal não tem mais vergonha do que faz.
Chega até a ter orgulho afinal, zela pela sociedade.
Surgiram as instituições que segundo Foucault servem apenas para tomar o tempo dos condenados, fixá-los ao olhar dos vigilantes,que são as penitenciárias.
Com a codificação e a relevância dos princípios da dignidade, da legalidade e assim se realizaram.
O fato de nenhuma conduta ser considerada criminosa sem uma lei anterior que a defina como tal seria o sonho de uma infinidade de gerações que viveram na Idade Média.
Vigiar e Punir é um livro que mostra a todo tempo que a prisão não está servindo para ressocializar, punir a alma, está sendo apenas mais uma forma de castigo. Mais simples que o suplício e mais barata.
Hoje isso é fato. Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção do princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo o sistema de comandos.
Mais uma vez Fernando Capez se faz útil:
“Aplicar a justiça de forma plena, e não apenas formal, implica portanto, aliar o ordenamento jurídico positivo a interpretação evolutiva, calcada nos costumes e nas ordens normativas locais, erigidas sobre padrões culturais, morais e sociais de determinado grupo social sobretudo no tangente à dignidade humana” (CAPEZ, 2007)
Essa reflexão é importante por fazer o leitor perceber que o direito penal não pode se desvirtuar da legalidade e ser mais um ente abusivo utilizando ainda a crueldade e a vigilância como armas.
A execução da pena foi se tornando um setor autônomo em que um mecanismo administrativo desonera a justiça.
CONCLUSÃO
A relativa estabilidade da lei obrigou um jogo de substituições sutis e rápidas na aplicação das penas.
Vigiar e Punir enseja a visão de que punidas as condutas pelo castigo que se atribui ao criminoso surge não só o desejo de torná-lo capaz de viver respeitando a lei mas modifica-lhe a alma.
Nas palavras do próprio Foucault isso se traduz na sua visão analítica relativa à microfísica do poder:
“Analisar o investimento político do corpo e a microfísica do poder supõe então que se renuncie – no que se refere ao poder – à oposição violência/ideologia. Trata-se de ver o Estado como um corpo político, um conjunto de elementos materiais e das técnicas que servem de armas, de reforço, de vias de comunicação e de pontos de apoio para as relações de poder e de saber que investem os corpo humanos e os submetem fazendo deles objetos de saber.” (FOUCAULT, 2005)
Esse poder quando regido pela dignidade tem a função de fazer a punição de forma humana.
A história da violência humana rende muitos capítulos por ter proporções gigantescas.
Refletir sobre o problema é o primeiro passo na linha de solucioná-lo. Vigiar e Punir é um referencial de grande valor e não pode deixar de compor o âmbito reflexivo a respeito da prisão.
A dignidade é a maior das garantias e toda ação manifesta que lhe é contrária não tem respaldo legal muito menos fundamento ideológico.
REFERÊNCIAS
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 30ª ed. Petrópolis: Vozes,2005.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discuros sobre a interpretação/aplicação do Direito. 4ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2006.
Acadêmico de Direito no 3º período da Faculdade AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Tássio Ramilson Nolasco da. A dignidade da pessoa humana em vigiar e punir Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 dez 2012, 07:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33070/a-dignidade-da-pessoa-humana-em-vigiar-e-punir. Acesso em: 23 dez 2024.
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