O estudo do direito divide-se em ramos para atender a necessidades práticas e didáticas. Entretanto, o direito é um só, compreendido como uma ciência única. Há uma Teoria Geral do Direito, a qual fornece os conceitos jurídicos fundamentais, aplicáveis a todos os ramos, a qualquer ordenamento jurídico, independente do direito positivo. Todavia, cada ramo do Direito possui suas regras próprias, em razão de suas peculiaridades, mas os conceitos são gerais, invariáveis. Há uma Teoria Geral do Processo, a qual traz a definição de conceitos lógico-jurídicos dos institutos fundamentais do processo, como jurisdição, ação, processo, etc. Os ramos do processo são autônomos, operando com categorias jurídicas gerais.
Quanto aos conceitos de processo e procedimento, Marinoni e Arenhart esclarecem que:
Se a jurisdição é apenas uma das manifestações do poder do Estado, é lógico que ela deve ser exercida por alguém e por meio de algo, isto é, do processo.
A jurisdição é exercida pelo juiz, devidamente investido no poder do Estado, e por meio do processo. Em outras palavras, o processo é o instrumento pelo qual o Estado exerce a jurisdição.
Se o processo é um instrumento, e se para o exercício da jurisdição por meio do processo são traçados, pela lei, vários procedimentos – que devem estar de acordo com as normas e os valores constitucionais -, o processo pode ser definido como o procedimento que, atendendo aos ditames da Constituição Federal, permite que o juiz exerça sua função jurisdicional.
O procedimento deve, em primeiro lugar, observar as chamadas garantias de justiça contidas na Constituição, como, por exemplo, o direito à fundamentação das decisões do juiz. Nesse aspecto, aliás, e de fundamental importância o direito ao contraditório.
O poder do Estado, que é uno, é exercido através de procedimentos, como o procedimento legislativo e o procedimento jurisdicional. Entretanto, tais procedimentos, que culminam na edição de um ato de poder, como a lei e a decisão do juiz devem ser legítimos, ou melhor, devem legitimar o exercício do poder.
Como o poder, nas democracias, é legitimado pela participação daqueles que são atingidos pelo seu exercício, a participação no procedimento que culmina na criação da lei dá-se através da eleição de representantes capazes de criá-la, isto é, através da chamada democracia representativa. Como o juiz não é eleito, a pergunta que deve surgir é no sentido de como o exercício do poder jurisdicional é legitimado. O exercício do poder jurisdicional somente é legítimo quando participam do procedimento que terminará na edição da decisão aqueles que serão por ela atingidos. Em outros termos, somente existirá procedimento legítimo e, portanto, processo, quando dele participarem aqueles que serão atingidos pela decisão do juiz.
Se o que importa é o princípio político da participação, no processo jurisdicional essa necessidade de participação é representada pelo instituto do contraditório.[1]
O direito processual é um complexo de normas e princípios que regem o exercício da jurisdição pelo Estado-juiz, da ação pelo demandante e da defesa pelo demandado. O direito material é o conjunto de normas que disciplinam as relações jurídicas referentes a bens e utilidades da vida. Assim, a função jurídica do direito processual é ser um instrumento a serviço do direito material, ou seja, todos os seus institutos básicos são concebidos e justificam-se no quadro das instituições do Estado pela necessidade de garantir a autoridade do ordenamento jurídico.[2]
Todo o direito processual, como ramo do direito público, tem suas linhas fundamentais traçadas pelo direito constitucional. Os princípios do direito processual estão em sua maioria na Constituição Federal, sob a forma de princípios fundamentais. Citamos, como exemplo, princípio do juiz natural, do contraditório. Todos os princípios constitucionais do processo que servem para construir um processo devido derivam do devido processo legal.
Boa parte destes princípios processuais possuem previsão expressa na constituição. Porém, existem outros princípios derivados do devido processo legal que são implícitos, ou seja, ainda não possuem texto legal expresso. Exemplo disso é o princípio da adequação e da efetividade.
O Direito fundamental a um processo devido, ou devido processo legal, é o postulado fundamental do processo. Trata-se do princípio base, sobre o qual todos os outros se sustentam. Aplica-se o princípio genericamente a tudo que disser respeito à vida, ao patrimônio e a àliberdade, inclusive na formação da lei. Processo é uma palavra gênero, que engloba legislativo, judicial, administrativo e negocial, aplicando-se também às relações privadas.[3]
Dessa forma, o devido processo legal é um princípio da atuação do Estado, e não um princípio exclusivo do processo civil ou penal.
Como exemplo de processo privado pode-se citar o poder de uma escola em punir disciplinarmente um aluno, ou o condomínio que aplica as regras contidas na convenção de condomínio ao condômino que as desobedece. Trata-se da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Processo significa método de criação de normas. Toda norma jurídica se produz após o desenvolvimento de um processo. Desse modo, é possível falar em um devido processo legislativo. Uma norma administrativa se produz após um processo administrativo, porquanto, é possível falar em um devido processo legal administrativo. Como exemplo, um funcionário público não pode ser demitido sem o contraditório, para haver contratação, deve haver um processo licitatório. Uma decisão judicial também é uma norma, individual, criada em razão do caso concreto. É o devido processo legal jurisdicional. Devido processo legal não se confundo com o devido processo legal jurisdicional, pois o princípio é mais abrangente.
O direito processual, inclusive por meio de disposições contidas no próprio texto constitucional, cria e regula o exercício dos remédios jurídicos que tornam efetivo todo o ordenamento jurídico, com o objetivo precípuo de dirimir conflitos interindividuais em casos concretos. Como a jurisdição é una, expressão do poder estatal uno, o direito processual também é uno, decorre dos grandes princípios e garantias constitucionais pertinentes e as bifurcações existentes correspondem apenas a exigências pragmáticas relacionadas com o tipo de normas jurídico-substanciais a atuar.[4]
O processo é uma relação jurídica que se desenvolve entre as partes de um lado e o juiz de outro. O procedimento surge como o modo pela qual essa relação se efetiva, ou seja, o modo pelo qual os atos processuais são realizados, ou exteriorizados, o modo em que se executam esses atos processuais.
Assim, o procedimento é a forma pela qual o processo se exterioriza, pode ser entendido como o meio, o instrumento através do qual se obtém a prestação jurisdicional, o caminho formado por atos processuais que obedecem a uma regra e que vão culminar em uma sentença ou decisão interlocutória.
Tal distinção é válida na medida em que se entende o procedimento como o modo, a espécie, já o processo é o caminho, o meio, para se obter a prestação jurisdicional, com todas as garantias.
[1] MARINONI. Luiz Guilherme, ARENHART. Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. 6.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, Vol. 2, 2007, p. 54/55.
[2] CINTRA. Antonio Carlos Araújo, GRINOVER. Ada Pelegrini, DINAMARCO. Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 17.ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 40.
[3] DIDIER JR. Fredir, Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do processo de conhecimento. Vol. 1, 7. ed., Salvador: Jus Podium, p. 27.
[4] CINTRA, GRINOVER, DINAMARCO, p. 47/48.
Procuradora Federal. Especialista em Direito Previdenciário pela Universidade Anhanguera-Uniderp.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SARTURI, Claudia Adriele. Processo e procedimento Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 dez 2012, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33094/processo-e-procedimento. Acesso em: 23 dez 2024.
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