Resumo: O presente trabalho se propõe a abordar o tema da soberania dos Estados na sociedade pós-moderna, a partir da premissa de que fenômenos político-econômicos diversos, cada um em sua devida proporção de influencia no cenário mundial, compõem um rol de causas desencadeantes para tal flexibilização na soberania das nações. Embora não constitua tema novo, a doutrina jurídica,bem como outras áreas do saber, permanece em frequente produção teórica para divulgação dos efeitos da globalização econômica; dos conflitos bélicos geridos pelas grandes potencias econômicas e tantos outros fenômenos político-sociais, tecendo uma vasta rede de informações que, em sua grande parte, buscam explicar a relativização dos Estados Modernos.
Palavras-chaves: Soberania. Estados Modernos. Tratado de Westfalia. Comunidade Internacional.
Abstract: This paper proposes to address the issue of sovereignty of States in postmodern society, from the premise that political-economic phenomena different, each in its proper proportion of influence on the world stage, compose a list of triggering causes for such flexibility in the sovereignty of nations. Although not new topic, the legal doctrine, as well as other areas of knowledge, theoretical work remains to frequent disclosure of the effects of economic globalization, the military conflicts managed by major economic powers and many other political and social phenomena, weaving a vast network information that for the most part seek to explain the relativization of Modern States.
Keywords: Sovereignty. Modern States. Treaty of Westphalia. International Community.
Sumário. Introdução 1.Desenvolvimento 1.2. Paradigma Westfaliano 1.2. Crise e Soberania 3. Considerações finais. 4. Referências bibliográficas.
Introdução.
O conceito de soberania exige uma releitura diante das evidências de que um processo de flexibilização da soberania nacional começou a ocorrer com o processo de internacionalização de fatores econômicos, jurídicos e tecnológicos, em regra, relevantes para a sociedade pós-moderna, pluralista em sua essência .
Dalmo de Abreu Dallari identifica a soberania através de três parâmetros: a soberania no sentido genuinamente político, definida em seu caráter ilimitado e absoluto; “não admitindo confrontações, e que tenha meios para impor suas determinações”; a soberania jurídica nos termos de “poder de decidir em última instância sobre a atributividade das normas, vale dizer, sobre a eficácia do direito” e a soberania culturalista, que diz respeito ao poder estatal de organização política dentro de sua realidade territorial, “uma vez que os fenômenos do Estado são, indissoluvelmente, sociais, jurídicos e políticos”[1].
Nessa perspectiva, a soberania constitui um dos pilares para a existência do Estado. No contexto pátrio, é elevada a fundamento da República Federativa do Brasil, sendo consagrada, nos termos do artigo 1º e artigo 4º e seus incisos, ambos da Constituição Federal de 1988. No contexto internacional é afirmada na Carta dos Estados Americanos (1948) pelo reconhecimento da independência e personalidade soberana dos Estados.
1. DESENVOLVIMENTO.
1.1. Paradigma Westfaliano.
Dentre as diversas formas pelas quais se pode ler o significado de soberania na doutrina- soberania legal internacional, soberania interna, soberania interdependente, soberania Westfaliana[2] - esta última é a mais apropriada para refletir seu sentido clássico.
Isso é dito por que com a consumação do Tratado de Westfália em 1648, a sociedade europeia conheceu um novo período na política internacional. Os Estados se fortaleceram como entidades indivisas com vontade própria, ávidos pela consolidação do monopólio legislativo, delimitação de fronteiras geográficas e com pretensão de exercer ação autônoma em seus respectivos territórios.
Tal conjuntura favoreceu a configuração de uma comunidade internacional, a partir da qual se forjou um acordo constitucional calcado na soberania Westfaliana, isto é, sob influência do pensamento predominante à época da assinatura da Paz de Westfália, o Estado soberano era aquele que indivisível, inalienável, gozava de plena e perpétua liberdade para governar seu território.
Nesses moldes, a soberania no sentido westfaliano seria um modelo de soberania absoluta e incondicionada, exclusiva do Estado, praticada sobre seus cidadãos e seu espaço nacional.
Não foi de outra maneira que com o advento dos Estados Constitucionais Modernos, o atributo de soberania vincula-se a ideia de nação, “a proclamação da soberania como independência ante qualquer poder externo torna-se característica essencial dos Estados Constitucionais Modernos desde o inicio; a consolidação do principio democrático supôs a reafirmação da soberania no exterior (...)” [3].
Em torno desse paradigma Westfaliano de independência irrestrita, não cooperação entre os Estado e soberania absoluta de cada Estado, que a doutrina contemporânea aponta surgir certa tensão, “sobre esta idealizacion de las relaciones entre les nacionales como sujetos de derecho aislados, es que se hace referencia, hoy em día de la pretendida crisis del concepto de soberania” [4].
Ao longo da história, a soberania do Estado nos moldes Westfaliano se modificou. Passa a exibir a forma de uma soberania mias partilhada com outros Estados, forjada por uma conjuntura na qual coexistem uma multiplicidade de centros decisórios e de produção normativas supranacionais .A constitucionalização das normas de direito internacional público pelos Estados Modernos é uma das expressões dessa soberania partilhada.
1.2. Crise e Soberania.
Só o fato da constitucionalização das normas de direito internacional não serve, isoladamente, para caracterizar a modificação na dimensão clássica da soberania estatal. Mister se faz considerar que o desenho do que seria a sociedade pós-moderna sustentou-se, solidamente, na necessidade de construção de uma nova ordem econômica.
A racionalidade desse projeto exigiu emancipações culturais, estéticas, enfim novos contratos sociais que transcendem o Estado- Nação, conforme se cristalizou com a globalização capitalista no último século [5].
Nesse enfoque, vê-se que com a globalização a difusão de informações de toda sorte, graças à revolução tecnológica nas telecomunicações, transporte, sistema bancário e outros setores, teve o condão de gerar padrões de consumo que se consolidaram nos espaços nacionais, “o capital intelectual, a inteligência humana, constituem mercado importante e tem-se demonstrado intolerantes as restrições nacionalistas” [6].
De fato, a posição dos Estados na rede de globalização econômica depende, dentre muitas coisas, da aceitação do intercambio universal de conhecimento e tecnologia impostos extraterritorialmente, que significa disponibilizar aos seus nacionais padrões de consumo mundial, como produções intelectuais, prestações de serviço e etc.
Compreende-se, por outro lado, que a internacionalização do capital e de fatores de produção impele crescentemente os Estados para a integração, pela necessidade mesmo de cooperação social no estabelecimento de políticas comuns e regimes de regulação comercial.
Na interdependência e inter-relação que se formam, os Estados compartilham sua soberania para que decisões e normas comuns produzidas sejam uniformizadas, além de cumpridas pelos Estados-Membros. Por outro lado, muitas das decisões políticas e econômicas deixam de ser de competência privativa dos Estados isoladamente, como antes.
Nessa medida, ao transferir para as organizações supranacionais a competência para deliberar sobre assuntos, que antes eram de sua exclusiva atribuição, a soberania nacional demonstra - se não só alienável, mas, também, relativamente divisível em sua titularidade.
Nessa breve incursão, observa-se que se descortina uma redefinição dos atributos da soberania, em que a autonomia, a independência não são completas, integrais ou absolutas, do mesmo modo a inalienabilidade e a indivisibilidade. O Estado soberano assume nova feição, sujeitando-se a parâmetros ditados pela esfera internacional. Destarte, “(...) deixou de ser ator unitário para converte-se num marco a mais. A ação coletiva cada vez mais escapa da jurisdição do Estado Constitucional Moderno”[7] .
Pode-se conferir que na esfera do processo de internacionalização dos Direitos Humanos, a capacidade normativa estatal sobre a matéria não é plenamente autônoma, pois se vincula aos Tratados, Convenções firmadas nas relações exteriores e com as organizações internacionais.
Por requerer maior segurança jurídica, a tutela internacional de Direitos desse gênero se faz pautada numa jurisdição internacional, legitimada para impor e intervir junto às jurisdições nacionais sempre que se configura violação ou ameaça dos Direitos Humanos pelo aparelho Estatal.
A rigor, invoca-se a potestade de terceiros Estados ou de entidades supranacionais para a regulamentação de normas cogentes, que passarão a disciplinar as relações dos Estados com seus nacionais, bem como para aferir a responsabilidade pelo não cumprimento do acordado pelos Estados-Membros.
Não é difícil para alguns autores identificar que a universalização no plano jurídico corrói as bases da soberania clássica ,“(...) Nos enfrentamos a uma crisis del concepto de soberania como producto de la cada vez más evidente globalization del derecho. Se visualizan problemas de caráter global y se pretende brindar, a través del derecho, soluciones también globales” [8].
Na verdade, o compromisso estatal com a ordem jurídica internacional de anuir com a aplicação de tratamentos normativos, dotados de pretensão de universal, constitui uma obrigação derivada e legítima com a qual os Estados se obrigaram , não raro, voluntariamente perante a comunidade internacional.
Num patamar atual que evita o ponto extremo de negar a destituição plena da soberania dos Estados ou de considerar apenas aspectos negativos advindos com o fenômeno de relativização, torna-se cada vez mais aceitável,modernamente, que a eclosão de crises em diversos setores das sociedades de um dado Estado, por exemplo, possa ser administrada com maior perspectiva de acerto, justamente, pela complementaridade de decisões globais e regionais.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS.
A relativização da soberania deixa aos poucos de ser um acontecimento obscuro, quando reflete seus raios para a realidade de que o poder estatal não se exauriu.
Ele transformou-se em face das circunstancias no mundo fático, fomentado pelas forças políticas que insurgem nos centros de internacionalização das decisões fundamentais no mundo jurídico, socioeconômico tecnológico, dentre outros.
A modificação na forma de constituição do poder do Estado Nacional imprimiu à soberania, enquanto base de poder, restrições em seu caráter absoluto e ilimitado na órbita interna e na externa.
À medida que a autonomia, a independência, a inalienabilidade, a indivisibilidade e outros aspectos da soberania nacional se tornam mitigados, no que tange a determinadas competências, a soberania nacional demonstra uma flexibilização que não a suplanta, mas a revigora para adequar-se a conjunturas especificas que emergem em seu espaço territorial .
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
BOBBIO, Noberto; MATTEUCI, Nicola; PASQUINO, Giafranco. Dicionário de política. 7ªed. Brasília:Universidade de Brasília,1995.
CRUZ, Paulo Marcio. Soberania e superação do Estado Constitucional Moderno. 2007.
Disponível em: http: /jus2. uol.com.br/doutrina/texto.asp?ed=9955.
MIRANDA, Napoleão. Globalização, soberania nacional e direito internacional. . Revista do Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, Brasília, nº27, p.86-94, out./dez.2004.
OLIVEIRA, Liziane Paixão Silva. O conceito de soberania perante a globalização. Revista do Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, Brasília, nº32, p.80-88, jan./mar.2006.
OTERO, Juan Manoel. Derecho Internacional, soberania e ilusíon. In: ARNAUD, A. Globalização e direito: Impactos nacionais, regionais e transnacionais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p.491.
PERINI, Raquel Frantantonio. A soberania e o mundo globalizado. Disponível em: htpp:/jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4325.
[1] DALLARI, Dalmo de Abreu,Elementos da teoria geral do Estado.27ªed., São Paulo: Saraiva,2007,p.80.
[2] OTERO, Juan Manoel. Derecho Internacional, soberania e ilusíon. In: ARNAUD, A. Globalização e direito: Impactos nacionais, regionais e transnacionais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p.487.
[3] CRUZ, Paulo Marcio. Soberania e superação do Estado Constitucional Moderno. 2007.
Disponível em: http:/jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?ed=9955.
[4] OTERO. Juan Manoel, Op.cit.,p.489.
[5] HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade.Tradução Tomas Tadeu da Silva ,Guaracira Lopes Louro.7ªed.Rio de Janeiro:DP&A, 2003.
[6] PERINI, Raquel Frantantonio. A soberania e o mundo globalizado. Disponível em: htpp:/jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4325
[7] CRUZ, Paulo Marcio. Soberania e superação do Estado Constitucional Moderno. 2007.
Disponível em: http:/jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?ed=9955.
[8] OTERO. Juan Manoel , Op. cit.,p.491
Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MACHADO, Simone. Soberania estatal na sociedade pós-moderna Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 jan 2013, 07:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33465/soberania-estatal-na-sociedade-pos-moderna. Acesso em: 23 dez 2024.
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