Índice: Resumo. I. Apresentação: preclusões para o Estado-juiz e matérias de ordem pública. II. Condições da ação e pressupostos processuais. III. Juízo de admissibilidade recursal. IV. Nulidades absolutas. V. Direito probatório. VI. Erro material. VII. Prescrição. VIII. Referências conclusivas.
Palavras-chave: Preclusão. Matérias não preclusivas. Preclusão consumativa. Matérias de ordem pública. Matérias reconhecíveis de ofício.
RESUMO: O presente trabalho se propõe a discorrer a respeito do fenômeno da preclusão dirigida ao Estado-juiz, com o foco no estudo das hipóteses, previstas no Código Processual, em que se reconhece a não aplicação do fenômeno para o diretor do processo – quando então estaria o magistrado excepcionalmente autorizado a voltar atrás, de ofício, em uma decisão por ele proferida em razão da importância daquela matéria para o processo por ele conduzido, desde que mantida a jurisdição no feito.
I – APRESENTAÇÃO: PRECLUSÕES PARA O ESTADO-JUIZ E MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA
1. Avançando nos estudos do processo civil e do instituto da preclusão, chega-se a oportunidade de investigarmos a atuação do fenômeno preclusivo diante do Estado-juiz, tratando especialmente de apontar as principais matérias não sujeitas à preclusão para o magistrado, como as condições da ação e os pressupostos processuais, o juízo de admissibilidade recursal, as nulidades absolutas, o direito probatório, o erro material e ainda a prescrição[1].
É de se dizer, propedeuticamente, que embora o julgador não tenha prazo peremptório para tomar determinada medida no processo – não restando sujeito, portanto, à preclusão temporal –reconhece-se, por regra, a impossibilidade de o julgador reapreciar oficiosamente uma decisão, final ou interlocutória, uma vez publicada – campo específico este da preclusão consumativa.
O magistrado sujeita-se à preclusão consumativa, sendo que cabe à parte supostamente prejudicada com a decisão, recorrer adequadamente à instância competente – que pode ser o próprio Juízo “a quo”, na tradicional hipótese, v.g., de apresentação de embargos de declaração.
No que toca à preclusão consumativa para o magistrado, resta deduzido que tendo emitido pronunciamento através do qual julgou alguma questão, está exaurido, por regra, seu poder de voltar ao assunto – impedindo a preclusão consumativa que reconsidere, o juiz, o ato de ofício ou através de provocação da parte prejudicada. Esse é o teor do art. 471, caput, do CPC, a determinar, como regra, que “nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide”.
2. Este regramento tradicional abre as portas para discussão importante sobre os limites da preclusão para o juiz, a fim de se estabelecer uma orientação em relação às raras hipóteses em que caberia ao magistrado, mesmo ex officio, reapreciar antes da decisão final, decisões interlocutórias já tomadas.
Tratamos necessariamente das decisões interlocutórias porque só podemos reconhecer a possibilidade de o Estado-juiz voltar atrás em uma decisão já proferida, na hipótese de manter jurisdição no feito. A seu turno, quando profere sentença, não poderia mais modificar de ofício a sua decisão, já que justamente encerrada a sua jurisdição, conforme preconiza o art. 463 do CPC.
Ademais, há de se reconhecer como absolutamente excepcional essa possibilidade de reversão oficiosa de uma decisão judicial tomada, já que o instituto da preclusão faz-se ordinariamente necessário justamente por estabelecer ordem e previsibilidade ao rito – sendo evidente que na grande maioria dos casos uma decisão judicial ao se tornar pública não poderá ser alterada ao bel prazer do próprio prolator do despacho (ou eventualmente de um magistrado substituto com jurisdição provisória na comarca).
3. A discussão, nesse contexto, cinge-se, notadamente, ao que se tem como matérias de ordem pública, que estariam, logicamente, em grau de importância, acima das matérias de ordem particular ou privada, de mero interesse inter partes[2] – sendo difundido neste trabalho, para facilitar a explanação, o uso das expressões “matérias de ordem pública” e “matérias reconhecíveis de ofício” como se sinônimas fossem.[3]
Deixemos bem claro que a ressalva quanto à possibilidade de reexame da decisão no que diz respeito às matérias de ordem pública (como o art. 267, § 3°, CPC e outras, a serem mais à frente encaradas), seja pelo mesmo julgador (quando mantém jurisdição), seja pela instância superior (em caso de recurso, com efeito devolutivo), reside na impossibilidade de, nesses casos, se operar a preclusão, tendo-se em conta que as referidas matérias imperativas, por serem notadamente de interesse suprapartes (para usarmos a concepção consagrada por Galeno Lacerda[4]), podem ser reavaliadas ulteriormente.
II – CONDIÇÕES DA AÇÃO E PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
4. Grandes processualistas pátrios travaram discussão a respeito da não preclusividade de matérias de ordem pública ao se posicionarem quanto à polêmica atinente à preclusão da decisão saneadora – especialmente no que toca às condições da ação e aos pressupostos processuais (CPC, art. 267, IV e VI, respectivamente).
A grande dúvida prática do tema restringe-se à viabilidade de o julgador, de ofício ou a requerimento da parte, vir a decretar a extinção do processo com base no art. 267, IV ou VI, do CPC (sentença terminativa), se antes, em fase de saneamento, tinha entendido expressamente pela existência das mesmas condições e pressupostos.
De antemão, há de se ter presente que a fase de saneamento do processo, que não necessariamente se concentra em um único despacho do juiz (o que se tinha pelo momento ímpar do despacho saneador[5]), tem como fundamento reconhecer, sempre que possível e o quanto antes, a existência de matérias preliminares e/ou prejudiciais que possam efetivamente obstar a análise meritória propriamente dita, tudo em nome da economia e da celeridade processual.[6] Por outro lado, o saneador provoca a concentração do material de conhecimento neste ato do processo, e habilita o juiz a dirigi-lo com perfeito domínio da causa, o que, sem dúvida, representa para a sentença uma garantia de segurança e de justiça.[7]
Nesse contexto, o art. 329 CPC determina que, encerrada a fase postulatória – estabelecido o contraditório e já sendo conhecidos os contornos da causa de pedir e pedido – pode o juiz adequadamente analisar a existência das condições da ação e dos pressupostos processuais, extinguindo o processo sem julgamento de mérito caso não os visualize (isso é claro se não firmar tal convicção antes, já que pode o juiz, como é sabido, declarar a petição inepta antes mesmo de determinar a citação[8]).
Embora reconheçamos que o pronunciamento judicial, quando encerrada a fase postulatória e ainda não iniciada a fase instrutória (art. 331, § 2°, do CPC), possa ser um oportuno momento para se reconhecer a existência dessas preliminares, certo é que o juiz não está obrigado a se manifestar quanto à existência delas nesse exato período, podendo a qualquer tempo posterior as invocar, como diz a lei – e mesmo que não as invoque poderia a parte prejudicada, até em ação rescisória, vir a discutir a suposta grave falta de um desses elementos que deveria ter impedido o pronunciamento do mérito.[9]
Daí a impossibilidade de se falar em reconhecimento da presença das condições e pressupostos em razão do julgador, mesmo diante de requerimento da parte ré em contestação, não ter se manifestado expressamente no saneamento quanto à inexistência delas (não preclusividade de questões implícitas).[10]
Mesmo na vigência do CPC/1939, art. 294, em que o juiz estava obrigado a se manifestar no despacho saneador quanto à inexistência das condições e pressupostos, a mais abalizada doutrina já entendia que “seria desatender à finalidade do processo pretender que ele opere preclusão de uma questão que não decidiu”.[11] Já, no que toca ao atual modelo de 1973, com ainda mais razão então não há de se falar na hipótese, não só pelo fato de inexistir regra legal semelhante ao do anterior sistema, mas também, e principalmente, pela razão do contemporâneo eixo processual-constitucional exigir das decisões judiciais expressa e adequada fundamentação, nos termos do art. 165 do CPC c/c art. 93, IX, da CF/88.[12]
Em termos jurisprudenciais, o tema parece bem encaminhado a partir da Súmula n° 424 do próprio Pretório Excelso, que dispunha: “transita em julgado[13] o despacho saneador de que não houve recurso, excluídas as questões deixadas, explícita ou implicitamente, para a sentença”.[14]
Portanto, a questão “implícita” no despacho saneador, não se coadunando com o espírito da atual (e da anterior) legislação processual (como também do texto constitucional), não deve acarretar a incidência do fenômeno preclusivo.
5. Ainda, de início, temos o dever de brevemente externar quais são realmente as matérias processuais que podem ser compreendidas nos macrogrupos “condições da ação” e “pressupostos processuais” – enfatizando, ademais, a abrangência de cada uma dessas grandes esferas, integrantes dos temas preliminares a serem analisados pelo diretor do processo antes do ingresso no julgamento do mérito da demanda (“condições de admissibilidade do julgamento da lide”[15]).
De maneira abrangente, no nosso sistema processual, o art. 301, com seus incisos e parágrafos, trata de anunciar os pressupostos processuais e as condições da ação, e principalmente os caracterizar como temas vitais e prejudiciais ao processo conduzido pelo Estado-juiz. Ali encontra-se regulado expressamente que o réu deve antes de discutir o mérito, alegar tais matérias para fins de preliminar extinção do feito (defesa peremptória) ou correção dos rumos da demanda (defesa dilatória); nada obstante a importante previsão de que o magistrado poderá conhecer delas de ofício.[16]
Os pressupostos processuais são matérias de ordem eminentemente processual que devem estar presentes para se passar ao exame meritório; não ensejam, portanto, perquirição sobre qualquer ponto da relação de direito material afirmada nos autos.[17] São os primeiros requisitos de admissibilidade a serem analisados.[18]
O nosso próprio Código, no art. 267, IV, os diferencia em pressupostos processuais de existência e pressupostos processuais de validade. No primeiro, estão os consagrados requisitos necessários à instauração do processo: a petição inicial protocolada pelo autor, o encaminhamento desta a um juiz investido de jurisdição, e por fim a citação do réu. No segundo, estão os requisitos fundamentais para se atingir o objetivo do processo (qual seja, o provimento meritório), uma vez estabelecida a relação jurídica processual: a petição inicial apta, a citação válida do réu (esses seriam os pressupostos processuais positivos objetivos); a competência (e aqui se encontra o espaço dos fenômenos da conexão/continência), bem como a imparcialidade do juiz investido de jurisdição, a capacidade de ser parte, a capacidade processual de se fazer presente em juízo em nome próprio ou alheio e a capacidade postulatória delegada em geral ao causídico com instrumento de mandato (esses seriam os pressupostos processuais positivos subjetivos[19]); bem como a litispendência, a coisa julgada, a perempção e a convenção de arbitragem (esses seriam os pressupostos processuais negativos, já que a sua presença justamente impede a prolação de sentença definitiva[20]).
Por sua vez, as condições da ação são matérias de ordem eminentemente material que devem estar presentes ao tempo do ingresso com a demanda para que não venha o feito a ser extinto imediatamente pela via da sentença terminativa. Trata-se de investigação preliminar do julgador, sucedida após a verificação da existência dos pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.[21]
Fixa-se no sentido de perscrutar se o pleito possui alguma chance, no mérito e em tese, de ser acolhido, daí a razão de ponderar sobre a legitimidade das partes (que independe da capacidade processual de se fazer presente em juízo em nome próprio), o interesse em agir (entendida como a utilidade e a necessidade/adequação do provimento jurisdicional solicitado), e a possibilidade jurídica do pedido (a compreender a viabilidade de direito, mesmo que mínima, da causa de pedir próxima estabelecida, em detalhes, na peça vestibular).[22]
Feita essa análise inicial, identificando-se, respectivamente, a configuração dos pressupostos processuais de existência e de validade, bem como a presença das condições de ação, conclui o Estado-juiz que, à primeira vista, o processo tem condições de prosseguir e culminar com a prolação do provimento jurisdicional. Passará a proceder então à cognição completa da relação material, a fim de acolher ou rejeitar o pedido, pela aguardada via da sentença definitiva, com o exame do mérito propriamente dito.[23]
6. Tratemos, agora, de responder a grande dúvida prática do tema, antes anunciada, deixando consignado que a polêmica pertinente aflige os mais notáveis juristas desde os tempos mais remotos, como sugere a seguinte passagem da obra de Bülow (da segunda metade do século XIX): “Tão logo a falta de um pressuposto processual seja denunciado e confirmado no início do procedimento, este se malogra totalmente. Porém, o que ocorre se esta falta não é notada e o processo chega ao fim? Deve ser declarado sempre inválido, mesmo posteriormente?”.[24]
Em tempos mais atuais, e partindo de uma exegese restritiva do teor do art. 267, § 3°, do nosso CPC (in verbis: “o juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, enquanto não proferida sentença de mérito, da matéria constante nos incisos IV, V e VI”), entendendo que pelo seu texto não resta consignado que o magistrado, após ter apreciado a matéria, poderá apreciá-la novamente, e articulando o dispositivo supratranscrito com o art. 471 (“o juiz não decidirá novamente as questões já decididas”), parte da doutrina pátria[25] – seguindo os ensinamentos de Liebman e Chiovenda – desenvolvem a teoria de que o juiz se pronunciando expressamente sobre a matéria em despacho saneador, não pode reapreciar sua decisão, nada impedindo que o Tribunal quando da apelação, a pedido da parte ou de ofício, declare a ausência de pressuposto processual e condição da ação e extinga o processo sem julgamento de mérito. Agora, no despacho saneador permanecendo silente quanto a essas matérias, poderia sim o julgador, de ofício, para essa corrente, sobre elas se manifestar a qualquer tempo, mesmo assim em uma única e derradeira oportunidade.
De acordo, Renato de Lemos Maneschy[26] registra que as matérias constantes nos itens IV, V e VI do art. 267 do CPC só podem ser objeto de conhecimento pelo juiz, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, se não houverem sido expressamente decididas em pronunciamento irrecorrido. No entanto, o aludido jurista, de modo sui generis, entende que a devida articulação dos arts. 267, § 3°, 471, 515 e 516, todos do CPC, importa reconhecer que uma vez analisada a matéria pelo primeiro grau – e restando a decisão irrecorrida – não pode mais ser objeto de julgamento pelo próprio julgador e, inclusive, pela superior instância.
Admitindo também a preclusão da decisão interlocutória, mesmo que se trate de questão de ordem pública, interessante registrar a peculiar opinião de J. Frederico Marques,[27] para o qual se o juiz decidir pela existência das condições da ação e pressupostos processuais, no saneador, de ofício, tal posição não preclui, mesmo que a parte prejudicada não interponha o competente recurso à superior instância. Agora, se o juiz decidir, nas mesmas condições, mas provocado pelo réu, que suscitou as matérias em preliminar na peça contestacional, a decisão judicial precluiria, mesmo que tacitamente (“questão implícita”) o magistrado admitisse as condições da ação e os pressupostos processuais.
No entanto, a melhor solução para o problema, no nosso entendimento, parece ser realmente a preconizada por Galeno Lacerda, seguido por outros tantos juristas pátrios.[28] Para o precitado jurista, a premissa para dissolver o imbróglio figura-se na concepção de que o problema da preclusão de decisões no curso do processo é substancialmente diverso do problema das decisões terminativas; enquanto diante destas o magistrado extingue a jurisdição, dando fim à relação processual, diante daquelas ele conserva a função jurisdicional, continuando preso à relação do processo. Assim, se o juiz conserva a jurisdição, para ele não preclui a faculdade de reexaminar a questão julgada, desde que ela escape à disposição da parte, por emanar de norma processual imperativa (ordem pública).[29]
Daí se conclui que a preclusão no curso do processo depende, em última análise, da disponibilidade da parte em relação à matéria decidida: caso indisponível, a falta de impugnação torna preclusa, desde já, a matéria para as partes, mas não para o juiz que pode (e deve) rever seu posicionamento, sob pena de decidir com afronta à norma imperativa e contrariando, inclusive sua própria (e atual) convicção.[30]
O próprio teor do art. 473 do CPC parece vir ao encontro desse entendimento, ao dispor que é (somente) defeso à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou à preclusão. Nesse enfoque, em ensaio que tratou de analisar as fundamentais estruturas do Código Buzaid, preleciona Arruda Alvim com correção: “De acordo com a informação universal a respeito do instituto da preclusão, é defeso à parte, em rigor às partes e ao juiz, também, rediscutir questões preclusas (...) no entanto, a redação do Código restringiu-a unicamente à(s) parte(s), o que se compadece com a sua estrutura, pois há matérias excepcionais que ficam em aberto para o juiz rediscutir e redecidir o que tenha sido decidido e esteja precluso para as partes”.[31]
Sob essa perspectiva, a aludida última corrente, com maior correção, interpreta extensivamente o que dispõe o art. 267, § 3°, do CPC, de acordo com o teor do art. 473, privilegiando a visão moderna do processo que confere poderes para ativamente o magistrado guiar o procedimento destituindo-o de formalidades exacerbadas, que prejudicam a celeridade da decisão que põe termo à demanda.[32]
No que toca ao posicionamento do STF, historicamente vem se consolidando a corrente que prega a não preclusividade para o juiz da matéria constante nos incisos IV e VI do art. 267 do CPC,[33] relativizando-se, assim, o teor do já anunciado verbete n° 424 do próprio Pretório Excelso: cite-se a Ação Cível Ordinária 267 (AgRg), onde lê-se o voto do Min. Alfredo Buzaid; além do RE 103949, do RE 92008, do RE 90668-1 e do RE 273791-7/SP.[34] No mesmo sentido, inclina-se a maior corte infraconstitucional também há um bom tempo, conforme decisão, dentre outros, no REsp 60110-0/GO (no qual se faz referência ao paradigmático REsp 24258/RJ[35]).
Somando-se a essas postulações, que se colocam a favor da não preclusividade das matérias elencadas nos incisos IV e VI do art. 267 e alcançam, como visto, as mais altas Cortes pátrias, José Rogério Cruz e Tucci traz mais um fundamento: “As condições de admissibilidade da ação, dentre elas o interesse de agir, devem coexistir ao ensejo do ajuizamento da demanda e devem, reunidas, subsistir até o momento de prolação da sentença; presentes quando da propositura mas, eventualmente ausentes à época da sentença, não é permitido ao juiz pronunciar-se sobre o objeto material do processo”.[36]
Ou seja, mesmo já se pronunciando sobre a presença das condições da ação, diante da importância do tema (de ordem pública) para o processo, o Estado-juiz deve estar atento, ao longo da tramitação do feito, para a verificação da manutenção da presença das condições da ação, sob pena de, em não as encontrando, ter de resolver a demanda com arrimo no art. 267, VI, do CPC.
III – JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL
7. A “construção jurídica” empregada para se estabelecer a não preclusividade para o juiz em relação às matérias de ordem pública, imperativas, que extrapolam a exclusiva alçada da discricionariedade das partes, além dos casos envolvendo as condições da ação e os pressupostos processuais, pode ser visualizada em outras grandes questões do processo, cabendo destaque a cinco delas, que passam agora a ser analisadas em pormenores – iniciando-se pelo juízo de admissibilidade recursal.
Em sede recursal (apelação, recurso ordinário e recursos excepcionais), antes de ser proferida qualquer decisão de mérito frente à irresignação interposta, necessário que o Judiciário examine a presença dos requisitos de admissibilidade do recurso – o que se dá por meio de dois diversos órgãos: o Juízo a quo pronuncia-se de maneira provisória, e depois, em caso de encaminhamento do recurso ao Juízo ad quem, nova investigação da admissibilidade é processada pelo Tribunal.
Na tradicional classificação das condições de admissibilidade dos recursos cíveis visualiza-se a presença não só dos requisitos intrínsecos – como o cabimento, legitimidade, interesse de recorrer e inexistência de fato impeditivo ou extintivo; mas também a dos requisitos extrínsecos – como a tempestividade, a regularidade formal e o preparo. Daí por que se diz, como ressalta Vicente Greco Filho[37] e Leonardo Castanhas Mendes,[38] que os requisitos de admissibilidade dos recursos são verdadeira extensão, perante a segunda instância, dos requisitos ou condições da ação, cuja presença condiciona, em primeiro grau, o exercício do ofício judicante, devendo ser reexaminados em fase recursal segundo as peculiaridades dessa etapa do processo; como também se assevera, nas palavras de Barbosa Moreira, que em relação ao recurso há de abrir-se ao órgão judicial – do mesmo modo que se abre quanto ao pedido originário – oportunidade para verificar se estão reunidos os pressupostos do pleno exercício da sua atividade.[39]
Vê-se, assim, com base em fragmentos de destacada doutrina pátria, que é sim viável uma firme aproximação do fenômeno das matérias preliminares de mérito no primeiro grau (condições da ação e pressupostos processuais) com os requisitos de admissibilidade do recurso manejado à superior instância. E, a partir dessa premissa, razoável se concluir, como vem apontando a melhor jurisprudência, que o juízo de admissibilidade recursal, a exemplo das matérias preliminares no primeiro grau, envolve tema de ordem pública, reconhecível de ofício pelo órgão judiciário, a qualquer tempo, desde que conserve este a sua jurisdição.[40]
Não há, assim, condições de ser avalizada posição de João Batista Lopes,[41] Teresa Arruda Alvim Wambier,[42] e do próprio citado Barbosa Moreira[43] no sentido de que mesmo após o despacho de recebimento do recurso, caso verifique o magistrado a intempestividade do mesmo (ou a falta de qualquer outro imprescindível requisito), não possa o agente político do Estado voltar atrás na sua decisão em face do impedimento imposto pela “preclusão pro judicato”. Em oportunas linhas, rebate Araken de Assis: “Nada impede ao juiz, após reputar admissível o recurso, posteriormente alterar sua convicção inicial, estimando-o inadmissível, porém antes do julgamento do mérito e desde que o possibilite seu estágio de processamento”.[44]
De fato, mesmo após o Juízo a quo julgar pela admissibilidade do recurso, poderia sim voltar atrás em ulterior estágio de processamento, após vista da irresignação à parte contrária (para fins de apresentação de contrarrazões), passando a entender pela necessidade de negativa de seguimento à irresignação. Nesse sentido Dinamarco bem frisa que o “juízo a quo tem o poder de desfazer o juízo positivo depois de oferecidas as contra-razões de apelação”,[45] como também Alcides de Mendonça Lima deixa consignado que, se o juiz, oficiosamente ou advertido pela parte interessada, “verifica que não era caso de apelação ou que errou no efeito recebido (se deveria ser no meramente devolutivo e admitiu em ambos, ou vice versa), nada obsta reconsiderar seu despacho, para adotar orientação certa e legal”.[46]
8. A propósito, a redação do art. 518 do CPC, determinada pela Lei n° 8.950/94,[47] indica para a correção do raciocínio supraexposto, in verbis: “Interposta a apelação, o juiz, declarando os efeitos em que a recebe, mandará dar vista ao apelado para responder. Parágrafo único: Apresentada a resposta, é facultado ao juiz o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso”. É bem verdade que a Lei n° 11.276/2006 alterou a redação do informado parágrafo único (passando o § 2° a dispor que: “Apresentada a resposta, é facultado ao juiz, em cinco dias, o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso”); no entanto, a nosso ver, tal alteração não modifica em nada o enquadramento do juízo de admissibilidade recursal como matéria de ordem pública, a ser reanalisada, se for o caso, pelo juiz dentro e mesmo após o prazo novel de cinco dias – já que estamos aqui diante de típico e genuíno prazo impróprio, a não inviabilizar que mesmo depois de superado o irrisório lapso temporal previsto na lei possa o julgador se retratar.
Ainda, há de se dizer, que mesmo havendo grave equívoco no conhecimento do recurso manifestamente inadmissível, e mesmo inexistindo recurso imediato contra essa decisão do Juízo a quo, que conhece e processa a irresignação, a instância superior, por força do efeito devolutivo, fará, antes de ingressar no mérito propriamente dito, o seu controle definitivo acerca da possibilidade de conhecimento do recurso – oportunidade em que a manifestação da parte recorrida na busca pelo não conhecimento do recurso pode obter perfeito trânsito. Aliás, mesmo a corrente, capitaneada por Barbosa Moreira, que entende pela impossibilidade de retratação do juízo positivo de admissibilidade recursal proferido pelo magistrado de primeira instância, não discorda que não resta por isso preclusa a reapreciação da matéria pelo órgão competente para julgar o recurso principal.[48]
9. Visto que pode haver retratação do juízo positivo de admissibilidade recursal, mas desde que o órgão judicial mantenha jurisdição no feito (ou seja, desde que os autos ainda não tenham sido encaminhados para a superior instância), conveniente nos deter, em maiores detalhes, à hipótese de juízo de admissibilidade negativo encaminhado pelo Juízo a quo.
Se a parte prejudicada deixa de interpor o competente recurso de agravo de instrumento, dá-se a preclusão (temporal) para ser revertida a gravosa decisão interlocutória, operando-se o consequente trânsito em julgado da demanda. Já interpondo o recurso legal, caberá ao Tribunal se pronunciar provisoriamente sobre a admissibilidade recursal, determinando com o eventual provimento do agravo, a subida dos autos principais (com o recurso) para ulterior julgamento. Foi dito que caberá à instância superior a pronúncia “provisória” da admissibilidade, já que mesmo tornando-se irrecorrível a decisão do agravo de instrumento, o Tribunal antes de ingressar no mérito do recurso principal, poderá reavaliar aquela decisão, vindo a não conhecer o apelo em face da formação de uma convicção mais recente, quanto à inexistência do já analisado requisito de admissibilidade recursal e/ou de qualquer outro.[49]
No entanto, devemos reconhecer que não há unanimidade de tratamento na matéria, existindo fundamentação em sentido contrário[50] justamente pregando que se o Tribunal já conhece de todos os elementos necessários e pode desde já exercer juízo seguro sobre a questão que motivou a não subida imediata do apelo, então não há cabimento em dizer-se que este juízo, assim exercido, seja, de alguma maneira, provisório.
Por outro lado, mesmo essa corrente contrária concorda, ao menos, que a solução seria outra se o fundamento utilizado para negar agora admissibilidade ao recurso principal fosse diverso daquele que se valeu o mesmo Tribunal para dar provimento ao agravo de instrumento, retificando o juízo de admissibilidade negativo pronunciado pela inferior instância.
Em termos práticos isso significa que se o não conhecimento de uma apelação pelo juízo sentenciante se deve à intempestividade do recurso, depois não reconhecida pelo Tribunal que deu provimento ao agravo de instrumento interposto pela parte apelante, para essa corrente dever-se-ia cogitar de preclusão para a instância superior, ao momento de julgar a apelação, quanto ao exame de admissibilidade recursal pertinente a esse requisito (intempestividade), mas não para qualquer outro, como a presença de preparo, por exemplo – hipótese em que o Tribunal antes do julgamento do mérito do recurso poderia julgar pelo não conhecimento da apelação em razão da deserção.
Fica então o registro desse ponto de convergência dos estudiosos na matéria, embora persistamos entendendo pela possibilidade mais ampla da ponderação oficiosa no juízo de admissibilidade recursal.
IV – NULIDADES ABSOLUTAS
10. O trato com a problemática das invalidades – especialmente com a categoria das nulidades absolutas (a englobar inúmeros vícios processuais ligados aos pressupostos processuais e as condições da ação) – irá nos apontar mais uma importante matéria não preclusiva para o julgador, a ser pronunciada mesmo que de ofício, a qualquer tempo, desde que mantida a sua jurisdição.
Cabe registrar inicialmente que as nulidades, em geral, são sanções processuais sempre decretáveis pelo Estado-juiz (não se operam ipso iure), decorrentes da violação de uma prescrição processual que se mostra substancial no feito (caso de atipicidade/inadequação relevante), passíveis de sanação mesmo que se trate de nulidades absolutas (em caso de atipicidade/inadequação irrelevante), e que atuam no plano da validade (plano anterior ao da eficácia/inadmissibilidade, e posterior ao da existência).[51]
A necessidade de progressão do estudo, nesta oportunidade, cinge-se precipuamente em identificar as espécies de nulidade (ou invalidades) que podem ser reconhecidas oficiosamente a qualquer momento procedimental (sendo, portanto, não preclusivas) – nominando as principais delas, a partir das disposições pertinentes do diploma processual.
Distingamos, pois, as nulidades em absolutas e relativas, nos moldes objetivos anunciados pelo CPC no art. 245, in verbis: “nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão. Parágrafo único: Não se aplica esta disposição às nulidades que o juiz deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão, provando a parte legítimo impedimento”.
Há de se explicar, em relevante parêntese, que a classificação das nulidades desenvolvida por Galeno Lacerda, em seu célebre “Despacho Saneador”,[52] foi, de fato, muito difundido na doutrina pátria, como reconhecem, dentre outros, Rui Portanova,[53] Arruda Alvim,[54] Daniel Mitidiero[55] e Antônio Janyr Dall’Agnol Jr.[56]
Em laboriosa subdivisão entende Galeno Lacerda que se poderia falar em quatro espécies de invalidades, a saber: nulidade absoluta – vício insanável que viola norma imperativa protetora de interesse público; nulidade relativa – vício sanável que protege interesse da parte, advindo de norma imperativa; anulabilidade – vício sanável que protege interesse da parte, mas a ofensa verificável é de norma dispositiva; e irregularidades – vício de menor gravidade, cujo defeito não provoca sequer a ineficácia do ato ou da relação processual.
No entanto, sem desprestigiar a importância do estudo proposto por Galeno Lacerda, parece-nos suficiente a mera divisão das nulidades em absolutas (interesse suprapartes) e relativas (interesse das partes), notadamente em função da posição adotada pelo Código Buzaid – que entrou em vigor aproximadamente duas décadas depois da publicação da obra de Lacerda.[57] Para tanto, seria o caso de agregar à concepção das “nulidades relativas” o conceito de “anulabilidades”, além de desfavorecer a ênfase concedida às “irregularidades” – mantendo na íntegra somente a dimensão e peso concedida às “nulidades absolutas”[58].
11. Acolhida a divisão das nulidades em absolutas e relativas, fecha-se o esquema inicial com uma conceituação mais próxima dessas modalidades – ressalvado, neste ensaio, o efeito prático da distinção, “na possibilidade, ou não, de o juiz, porque presumido o prejuízo, poder reconhecer de ofício a irregularidade e decretar a nulidade do ato”.[59]
As últimas, diversamente das primeiras, não podem ser conhecidas de ofício pelo julgador; incidindo o fenômeno preclusivo caso não sejam as nulidades relativas arguidas pelas partes de imediato, na primeira oportunidade em que tiverem se de manifestar nos autos.
Daí a razão para José Maria Tesheiner utilizar a expressão “vícios preclusivos” para identificá-las.[60] Humberto Theodoro Jr. explica que são configuradas as nulidades relativas por exclusão: “os atos viciados, que não sejam por violação de pressupostos processuais ou condições da ação, e para os quais não exista cominação expressa de nulidade na lei, são atos processuais relativamente nulos”.[61]
E especialmente tratando da alegação das nulidades relativas em sede contestatória, sob pena de preclusão (sanatória do vício), diante do posterior despacho saneador a ser lavrado pelo Estado-juiz, leciona J. Frederico Marques: “Quando o juiz não teve de resolver questão alguma daquelas resultantes dos arts. 267 e 301, limitando-se a declarar simpliciter o processo em ordem, inexiste preclusão pro judicato. Poderá registrar-se apenas preclusão temporal, com base no art. 245, para as nulidades relativas que o réu não invocou, com o seu respectivo e conseqüente saneamento”.[62]
Por sua vez, as nulidades absolutas, embora devam ser arguidas pela parte na primeira oportunidade que tiverem para se manifestar nos autos, em face de sua gravidade, podem ser invocadas em ulterior momento no feito, mesmo por petição simples, caso não sejam objeto de atividade oficiosa do próprio magistrado, o qual identificando a presença de uma nulidade absoluta insanável deve, de plano, tratar de reconhecê-la.
Dentro dessa conjectura, enquadram-se, a contento, as palavras de Teresa Arruda Alvim Wambier: “as nulidades (absolutas) podem ser alegadas pelas partes, a qualquer tempo, e decretadas pelo juiz de ofício, inexistindo, pois, para aquelas e para este, preclusão. São vícios insanáveis, pois que maculam irremediavelmente o processo”.[63] Humberto Theodoro Jr. traz em destaque a relevância dos pressupostos processuais e das condições da ação, os quais denomina de “vícios profundos”: “não se sujeitam à preclusão, nem deixam de macular o processo só pela errônea conduta do juiz que decide a lide, sem atentar para a inexistência de condições jurídicas para a sentença de mérito”.[64]
Não poderíamos deixar de registrar que, em uma das principais obras a respeito do tema escrito no País, Calmon de Passos critica ferozmente a distinção das nulidades em absolutas e relativas, entendendo que não há espaço para se falar nas últimas, supostamente sujeitas ao regime da preclusão processual: “até esta data ainda não consegui identificar uma forma processual que tenha sido estabelecida no exclusivo interesse de uma das partes do processo, daí afirmar que, entre nós, a preclusão não ocorre. A oponibilidade perdura”.[65]
Por certo, maiores digressões nessa problemática certamente refogem à área de abrangência deste ensaio; mesmo assim, inclusive a partir desse esboço de uma teoria de nulidades proposto por Calmon de Passos, fica claro que há uma extensa (senão uma plena) área de atuação oficiosa do magistrado em matéria de nulidades (ou invalidades), ratificando-se assim a extrema importância do tema no macroestudo das não preclusividades concernentes à atividade jurisdicional.
Tratemos, pois, de expormos as principais nulidades absolutas que comportam exame oficioso a qualquer tempo – destacando-se os vícios referentes às citações, às intimações, às sentenças e aos cerceamentos de defesa em matéria probatória.
12. Em nota às disposições referentes às nulidades absolutas, Theotonio Negrão[66] identifica vícios cominados nos seguintes dispositivos do Código Buzaid: art. 11, parágrafo único (autorização ou outorga necessária do cônjuge, não suprida pelo juiz); art. 13, I (incapacidade processual ou a irregularidade da representação, não suprida pelo autor); art. 84 (falta de intimação do Ministério Público, quando obrigatória); art. 113, § 2° (declaração de incompetência absoluta); art. 214 (nulidade de citação no rito de conhecimento); art. 236, § 1° (nulidade da intimação, na qual constem os nomes das partes e de seus advogados, suficientes para sua identificação); art. 246 (nova referência à nulidade do processo por ausência do Parquet, quando deva intervir no feito); art. 247 (menção conjunta às nulidades de citações e às intimações, quando feitas sem observância das prescrições legais); art. 618 (hipóteses de nulidade da execução, se o título executivo extrajudicial não corresponder à obrigação certa, líquida e exigível – art. 586, se o devedor não for regularmente citado, e se instaurada antes de se verificar a condição ou de ocorrido o termo, nos casos do art. 572); e, finalmente, art. 1.105 (ao tratar dos feitos de jurisdição voluntária, regula que serão citados, sob pena de nulidade, todos os interessados, bem como o Ministério Público).
Vê-se do rol de nulidades cominadas (absolutas) sobreditas, que as referências às ausências dos pressupostos processuais são significativas, notadamente no que pertine à falta de citação válida (pressuposto positivo objetivo) – a ser exigido, por expressa disposição do CPC, não só no rito de conhecimento, mas também na execução, e mesmo nos procedimentos de jurisdição voluntária. Não é por acaso, sem dúvida, que Chiovenda teve como umas das suas célebres máximas, a que registra ser o maior vício processual “a falta de comunicação ao réu”.[67]
Quanto à citação válida do réu/executado: há normativo (art. 214, § 1°, do CPC) prevendo que se o réu comparece em juízo mesmo estando configurado vício na citação, não deve ser declarado já que a finalidade foi obtida (comparecimento do demandado ao feito) – aplicando-se assim, à espécie, os princípios gerais da instrumentalidade das formas e do não prejuízo específico à parte (art. 244 c/c 249, § 1°, do CPC).[68] Em sentido oposto, a mais tênue imperfeição é relevante quando o objetivo não foi alcançado.[69]
O nosso diploma processual, de fato, trata a citação com enfoque especialíssimo. As invalidades que cercam o ato de chamar o réu ao processo, angularizando a relação jurídica processual, é tema de destaque e ferrenha defesa mesmo após o trânsito em julgado da demanda. Há possibilidade de o demandado, prejudicado, opor embargos à execução, ou mesmo ingressar com novel processo para declaração de ineficácia da sentença ainda que decorrido o prazo para a propositura de ação rescisória – daí falar-se em caso de “vícios transrescisórios”, na circunstância de processo que corre à revelia do demandado por defeito na citação do réu.[70]
A doutrina trata com destaque particular a ocasião das nulidades que envolvem a citação por edital do réu/executado.[71] De fato, este remédio excepcional deve ser utilizado tão somente quando esgotados todos os meios possíveis para a localização da parte demandada, sendo por isso descabido se utilizar do edital em caso de infrutífera notificação do réu/executado na primeira tentativa levada a cabo pelo oficial de justiça – até porque não é raro se dar o equívoco, na célere citação do demandado, por culpa do próprio autor/exequente (a quem compete fornecer o endereço correto e atualizado do ex adverso).
13. Quanto à intimação dos atos processuais: a lei reclama a mesma segurança exigida para a citação e de seus defeitos resultam as mesmas consequências, só diferentes em termos de repercussão sobre os atos do processo.[72]
Realmente, a regularidade exigida para o chamamento do demandado ao processo na primeira oportunidade deve ser mantida ao longo da tramitação do feito, a fim de que seja proferida decisão final legítima – sendo pressuposto da sentença, o encadeamento válido de todos os anteriores atos do processo (dos quais necessariamente devem ter ciência as partes, para efeitos de defesa e consolidação de suas posições na relação processual estabelecida).
Assim sendo, o vício referente à ausência de intimação da parte processual é também matéria não preclusiva, podendo ser reconhecida de ofício, mesmo em segundo grau, dependendo da gravidade/relevância da infração. O tema é interessante, já que, na prática forense, bem se pode verificar a presença de vício na intimação de um importante ato processual no primeiro grau, e mesmo assim a parte prejudicada e sucumbente (diante de prolatada sentença definitiva), pode não vir a expor em razões de apelação a ocorrência na nulidade (em sede de preliminar recursal), vindo tão somente a discutir no apelo o mérito.
A questão foi objeto de estudo específico na Itália por Antonella Parisi, tendo a jurista peninsular apontado conclusão, com que não pactuamos, no sentido de que vício na intimação de ato, em meio à instrução, que venha a trazer prejuízo ao estabelecimento do contraditório entre as partes, não alegada em apelação, determina preclusão ao segundo grau para exame da questão.[73] Também é essa a posição, dentre nós, defendida por José Maria Tesheiner, apresentando o seguinte caso concreto: “Suponha-se que uma das partes seja intimada da juntada de documento nos autos por intimação nula, nos termos do art. 236, § 1°. Faltou, por exemplo, o nome de seu advogado. Realiza-se a audiência. A parte é vencida e apela, pedindo a reforma da sentença, sem jamais aludir à nulidade daquela intimação. Evidentemente, não poderá o tribunal decretá-la de ofício, ainda que cominada”.[74]
Por estarmos claramente diante de vício não preclusivo importante para o deslinde da causa (nulidade absoluta, cominada), não há como avalizarmos este entendimento. Pensamos, portanto, que mesmo de ofício pode, in casu, o Tribunal ad quem decretar a nulidade da sentença (em face do vício de intimação), remetendo os autos à instância a quo para regular processamento da instrução a partir do marco inicial maculado pela nulidade absoluta verificada – no caso concreto apresentado por Tesheiner, da atípica intimação de juntada de documento aos autos, ressalvada a possibilidade de não anulação da audiência, em caso de o seu resultado ser independente do teor do documento juntado (arts. 248 e 249, caput, do CPC). Obviamente, foi dito que o Tribunal “poderá” e não “deverá” decretar a nulidade absoluta, já que há de ser feito uma ponderação no caso concreto sobre a gravidade da infração (arts. 244 e 249, § 1°, do CPC), justamente para efeitos de se determinar a relevância da atipicidade, a fixar ou não a invalidade da sentença de mérito proferida.
14. Especificamente quanto às nulidades da sentença: há de se levar em conta ao menos dois macroaspectos: deficiência no relatório e/ou na fundamentação sentencial; como também a presença de julgamento extra petita, ultra petita e citra/infra petita.
Depois da citação, provavelmente o mais importante ato do processo no primeiro grau seja a prolação da sentença, em que o julgador, pela via preferencial definitiva ou, subsidiariamente, terminativa, presta a devida e esperada tutela jurisdicional.[75] Trata-se de “ato jurisdicional magno”;[76] é a resposta do Estado-juiz ao problema de direito trazido pelos jurisdicionados, ávidos por justiça e paz social. É a sentença, em suma, “a síntese da função jurisdicional”.[77]
Daí a importância de a decisão final ser a mais completa possível, seja na apresentação do histórico da demanda (relatório – art. 458, I, do CPC), seja na fundamentação de fato e de direito que encaminhe o julgamento a favor do autor ou do réu (art. 458, II, do CPC), seja na confecção de dispositivo sentencial (art. 458, III, do CPC) que contemple toda a discussão trazida ao judiciário, sem passar a conceder o magistrado coisa além, e/ou coisa diversa da perseguida.
Quando a sentença contemple alguma imperfeição nesses comandos, passível então de ser declarada nula, a fim de novo decisum ser produzido.
O problema da fundamentação sentencial é notoriamente mais grave do que as possíveis irregularidades constantes no relatório da decisão, que em geral não vão influir no julgamento da causa, a ponto de por si só representarem motivo suficiente para a interposição de recurso à superior instância. No entanto, a fundamentação é essencial, no nosso Estado Democrático de Direito, para legitimar a decisão final proferida, razão pela qual a matéria pode ser tema de debate até nas instâncias extraordinárias, tendo em vista suposta violação do que dispõem os já nominados arts. 165 do CPC e 93, IX, da CF/88.
Ao mesmo tempo em que não se nega a importância do ativismo judicial no comando da marcha do processo, ressalta-se a importância da (1) motivação das decisões (tanto mais elevada quanto for a importância da medida a ser adotada pelo Estado-juiz), ao lado da presença constante do (2) contraditório e da figura do (3) duplo grau de jurisdição.[78] São com esses (três) elementos essenciais, integrantes de um “sistema de legalidade”, corporificador do due process, que se combate o arbítrio jurisdicional (desvios decorrentes da necessária conduta ativa do julgador), lavrando-se decisum final mais próximo da legitimidade exigida pela sociedade política.[79]
Ainda quanto às peculiaridades pertinentes à necessidade de motivação plena/completa, importante ainda se consignar que em caso de ser interposto recurso de apelação em razão de vícios presentes no relatório e/ou na fundamentação sentencial, deve o julgador ter presente especialmente o contido no art. 249, § 2°, do CPC – passando, sempre que possível, a proferir decisão de mérito favorável à parte que se beneficiaria com a decretação da nulidade.[80]
Já sobre a presença de julgamento destoante do pedido encaminhado pela parte autora, temos a posição de que somente o julgamento ultra petita (coisa além do pedido), autoriza o segundo grau a não invalidar o ato, vindo a tão só reduzir (adequar) o comando sentencial ao âmbito do que permitido ser concedido judicialmente, em face do pleito dirigido pela parte demandante.[81]
Por outro lado, proferida sentença citra/infra petita (não analisado algum dos pedidos)[82] ou extra petita (julgado coisa diversa da pedida),[83] normalmente o acórdão deve se postar para a decretação da nulidade, com o retorno dos autos para novo julgamento pelo primeiro grau, atentando-se para o fenômeno de supressão de instância[84] – a não ser em caso de ser possível a aplicação do anunciado art. 249, § 2°, do CPC.
Em certos casos, porém, ponderam a doutrina[85] e a jurisprudência,[86] que se pode, quando materialmente possível, reduzir a sentença aos limites correspondentes ao pedido, ainda quando se trate de sentença extra petita, desde que, além da decisão que desborda os limites do pedido, tenha o magistrado decidido também o pedido propriamente dito.
Por óbvio, complemente-se, a sentença que analisando todos os pedidos, mas acaba concedendo coisa menor do que a pedida, é distinta sobremaneira do contexto de classificação das outras modalidades; já que aqui não há de se cogitar de nulidade. Constitui-se, na verdade, essa hipótese em exata matéria de fundo, a ser objeto de recurso de apelação e próprio cerne do julgamento de mérito, superada a verificação de qualquer matéria (preliminar) de nulidade absoluta.
15. Por derradeiro, no que pertine aos cerceamentos de defesa em matéria probatória: façamos, aqui, uma ponte com a próxima matéria não preclusiva a ser trabalhada (o direito probatório), deixando para esse momento oportuno os desenvolvimentos e as análises específicas pertinentes.
Por ora, a lembrança que não poderia deixar de restar firmada se situa na devida compreensão de que o agir do Estado-juiz arbitrariamente limitador do contraditório pleno entre as partes, a partir da inviabilização da produção dos meios probantes requeridos, pode sim responder pela nulidade dos atos posteriores do rito que se seguirem à ilegal atitude comissiva.
O devido processo legal, tendo o contraditório como vital corolário, impõe que as partes tenham garantidas todas as possibilidades, lícitas e legítimas, de convencimento do julgador; sendo nulo o processo em que constatada supressão à parte do amplo direito de provar a sua versão dos fatos (previsão expressa no art. 5°, LIV, LV, e LVI, da CF/88).
Não obstante a falta de vinculação expressa no texto da lei processual a respeito desta nulidade absoluta (vício não cominado pelo CPC), a previsão constitucional supera com tranquilidade a imprecisão do Código, sendo certo que a gravidade imposta pelo cerceamento de defesa é vício tão grave (senão maior) quanto aquele que pode recair sobre a citação, a intimação, e o próprio corpo da sentença.
Bem adverte Calmon de Passos que a temática envolve especialmente a nulidade do processo decorrente do julgamento antecipado da lide (art. 330 do CPC).[87] Eis aqui momento processual ímpar, em que o Estado-juiz optando pelo precipitado julgamento da causa, pode sim dar vazão à nulidade da sentença, com a decretação do vício pelo acolhimento de preliminar recursal postada na direção da necessidade de prosseguimento da instrução, para serem oferecidos melhores fundamentos, de fato e de direito, ao enfrentamento do meritum causae.[88] No entanto, como já defendido neste trabalho, mesmo não sendo dirigida a preliminar recursal, em caso de apelo exclusivo ao ponto de fundo, nada impede o Tribunal de decretar de ofício a nulidade absoluta, desconstituindo a sentença, e remetendo os autos para melhor instrução na origem.
V – DIREITO PROBATÓRIO
16. Avancemos para a averiguação da não preclusividade, ao magistrado, das matérias referentes ao direito de provar.
O código de processo brasileiro, especialmente no art. 130, articulado com os incisos I e II do art. 125, reconhece a possibilidade de o juiz, não só a requerimento das partes, mas também de ofício, determinar a realização de provas necessárias à melhor instrução do processo. Especificamente quanto às espécies de provas típicas previstas no CPC, destacam-se as referências expressas às provas ex officio nos arts. 342 (interrogatório para esclarecimento), 355 (exibição de documento ou coisa), 399 (requisição de documentos às repartições públicas), 418 (inquirição de testemunhas referidas), 437 (nova perícia), e 440 (inspeção judicial).
Está assim, o Código, relativizando o princípio dispositivo em sentido impróprio ou processual e o próprio brocardo latino mihi factum, dabo tibi ius, ao passo que admite a necessidade de, no processo moderno, o magistrado ter maior liberdade no impulsionamento do feito, não o deixando à livre intervenção das partes interessadas.
Essa atual concepção de cooperação do Estado-juiz com a atividade probatória originariamente exclusiva das partes, vinculada à exigência contemporânea de o julgador obter suficientes meios hábeis de atingir a verdade processual, impõe, por outro lado, que mantenha o magistrado a necessária imparcialidade que dele se espera (vedado o abuso de autoridade, tão ilegítimo quanto o abuso de liberdade das partes) para que, enfim, possa, em sentença, julgar com responsabilidade e se aproximar, tanto quanto possível, da solução justa no caso concreto.[89]
Tecnicamente mais preciso, segundo Fritz Baur, seria dizer que na instrução a tarefa do juiz, do ponto de vista da pesquisa da verdade processual, é corretiva (se as partes expõem fatos inverídicos) e especialmente supletiva (se lacunosa a exposição e a produção de provas pelas partes, e por isso se faz necessário colher os meios de prova de ofício).[90] Daí por que, agora, na esteira dos ensinamentos de Liebman, não se pode dizer que haja na instrução espaço próprio para aplicação absoluta do princípio inquisitório, ao passo que se admite, nessa seara, uma participação cooperativa do julgador (com as partes litigantes), nunca de forma a ser aceito modelo que relativize completamente o princípio dispositivo (em sentido processual ou impróprio).[91]
Portanto, das lições retiradas da melhor doutrina, extrai-se que em processo atualmente subordinado ao “princípio dispositivo atenuado”,[92] em que a atividade probatória deve sim ser exercida pelo juiz (no entanto, não em substituição das partes, mas juntamente com elas[93]), é flagrantemente descabido se falar em preclusão para o juiz.[94]
17. Inexistindo, como costurado, preclusão para o juiz determinar as provas que entenda cabíveis, certo é que pode a qualquer tempo, antes de proferir decisão final, vir a reconsiderar um despacho que entendia incabível a produção de determinada prova (v.g., pericial), a fim de que agora se faça.[95] Tal raciocínio, acreditamos, vale inclusive para a hipótese de o magistrado ter indeferido a produção de provas, decidindo, a priori, julgar antecipadamente o mérito (art. 330, I, CPC); mas, posteriormente, compulsando os autos conclusos para sentença, decide por bem converter o julgamento em diligência para sanar dúvida quanto à veracidade/extensão de determinados fatos vitais para o deslinde da problemática levada a ele.[96]
Do exposto resultam, a nosso ver, três máximas processuais correlatas, as quais merecem a devida sistematização: 1°) não será possível, ao juiz, conhecer diretamente do pedido se isso não resultar de o processo estar maduro para ser julgado, sendo que qualquer dúvida a esse respeito deve ser solucionada contra o julgamento antecipado da lide – exegese restritiva da hipótese consagrada no art. 330, I, do CPC;[97] 2°) uma separação clara do momento da admissibilidade da prova (juízo de pertinência e relevância) com o da sua valoração (próprio da oportunidade derradeira de os autos serem remetidos à conclusão para julgamento),[98] impõe uma não precipitação no encerramento da instrução (como ilegal medida antecipatória de juízo de valor sobre o meritum causae[99]), a partir de indeferimento de meios probatórios lícitos requeridos/justificados – sendo, assim, aplicada com restrições a regra do art. 130, in fine, do CPC;[100] 3°) quando o processo se encontra concluso para julgamento, e o juiz possui sérias dúvidas quanto à existência/extensão dos fatos que irão influenciar diretamente no resultado do processo, e tendo meios hábeis para tanto (com arrimo no art. 130, ab initio, do CPC), não pode se escusar de tentar maior aproximação da verdade processual, utilizando-se das regras de julgamento do ônus da prova somente em último caso[101] – sendo pertinente uma reflexão mais detida na utilização (restritiva) dos comandos contidos no art. 333 do CPC.
Todos os cuidados supra-anunciados que se deve ter no trato com o material probatório a ser aportado aos autos, a fim de não se inviabilizar (precipitadamente) uma melhor instrução do feito, tem como pano de fundo o que chamaremos de “caráter excepcional da limitação ao direito (constitucionalmente resguardado) de provar”.
Na Itália, com boa profundidade, o ponto foi enfrentado por Luigi Paolo Comoglio, o qual justamente tratou de defender posição, por nós perfeitamente acolhida, no sentido de se “privilegiar a capacidade expansiva do direito a prova e o caráter excepcional de suas limitações”.[102] Por aqui, a preocupação foi adequadamente encampada por Eduardo Cambi, o qual trabalha com o conceito de direito prioritário e constitucional à prova, para efeitos de justificar a sua residual limitação.[103]
O defendido caráter excepcional da limitação ao direito de provar ganha mais um reforço argumentativo, se passarmos a refletir que o próprio sistema já trata de, previamente, dificultar a produção e o acolhimento de meios probantes no processo. De fato, além de ser vedada a utilização de provas ilícitas (nos termos do art. 332 do CPC articulado com o art. 5°, LVI, da CF/88), existem também restrições, de duas ordens, apresentadas pelo próprio código processual, a impor limites no manejo dos meios lícitos ali tipificados: uma determinada pelo próprio procedimento, a estabelecer a necessidade de produção das provas em oportuno momento processual, sob pena de preclusão;[104] e a outra corporificada em normas específicas sobre a utilização adequada e racional de cada meio probatório[105] – na prova testemunhal, v.g., tem-se a vedação da sua exclusividade como meio de prova limitado a certo valor do contrato em discussão (art. 401), a restrição de certas pessoas serem ouvidas em juízo (art. 405), a não obrigação de depor (art. 406), e a limitação ao número de pessoas a depor sobre o mesmo fato (art. 414, § 1°); na prova pericial, v.g., a restrição a sua utilização, dependendo da matéria sub judice (art. 420 e art. 427), e a possibilidade de o perito ser recusado por impedimento ou suspeição (art. 423); já na prova documental, v.g., a exclusão do dever da parte ou terceiro exibi-lo (art. 363), e a imprescindibilidade da forma: documento público, quando da substância do ato (art. 366).
18. Por derradeiro, cabe-nos destacar a seguinte discussão proposta por Manoel Caetano Ferreira Filho.[106] Embora o poder de iniciativa probatória do Estado-juiz inclui o de determinar a produção de prova anteriormente indeferida (mesmo que a parte interessada não tenha agravado – tendo deixado precluir o seu direito de exigir o meio probante), o contrário também poderia ser realizado pelo magistrado? Ou seja, poderia ele indeferir prova que já tenha determinado produzir, com base até na parte final do art. 130 CPC, que prega o indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias; e/ou mesmo no regulado pelo art. 125, II, do CPC, a estabelecer como dever do diretor do processo o de velar pela rápida solução do litígio?
A resposta, a partir desses fundamentos, é afirmativa para Eduardo Cambi, o qual alega que seria um contrassenso, se em face de outras provas produzidas, não pudesse o juiz reconsiderar a decisão anterior autorizadora da realização da prova, que no curso da instrução aos olhos do diretor do processo mostrou-se supérflua ou irrelevante: “assim, a inutilidade ou a desnecessidade da prova também podem ser supervenientes, quando um fato já estiver sido provado por outras provas, devendo-se aplicar, neste caso, o princípio da economia processual”.[107]
No entanto, de acordo com a manifestação de Manoel Caetano Ferreira Filho, cremos, a priori, que não possui esse poder o juiz, a não ser que excepcionalmente a parte a quem aproveite a prova expressamente concorde com a sua não realização (diante do que Cambi denomina de uma superveniente verificação da inutilidade de sua produção).
Temos, como regra geral, que se a parte exerceu regularmente a faculdade de requerer oportunamente a prova que entendia como necessária para o resguardo dos seus interesses, e teve seu pedido acatado pelo magistrado, o posterior indeferimento da prova implicaria ofensa ao direito de licitamente provar. Além disso, a preclusão tem por finalidade assegurar a estabilidade das situações jurídicas processuais, e a situação de quem teve a prova admitida seria profundamente alterada com o posterior indeferimento.
Esta também é a posição de Daniel Amorim Assumpção Neves (criticando posição contrária defendida por Vicente Miranda), explicitando que não se pode admitir que o juiz monocrático, que tão somente dá a primeira, e quase nunca definitiva decisão na demanda, possa dar-se por convencido no meio da fase instrutória, encerrando-a prematuramente e decidindo o mérito: “Tal atitude configuraria indubitavelmente nulidade da decisão por flagrante cerceamento de defesa da parte prejudicada”. Complementa, o anunciado jurista, que o indeferimento posterior de meio probante já autorizado encontra óbice mesmo se a produção de prova tenha sido determinada oficiosamente: “os efeitos do deferimento pelo juiz de uma prova requerida pela parte e de sua determinação ex officio são os mesmos: trazer para o processo uma prova a ser produzida, não importando, em absoluto, como surgiu o requerimento de sua produção em juízo”.[108]
VI – ERRO MATERIAL
19. A penúltima matéria não preclusiva a ser abordada serão os erros materiais, tratados no art. 463, I, do CPC a partir de duas modalidades: inexatidões materiais e erros de cálculo.
Sérgio Gilberto Porto foi um dos que melhor sistematizou a (conflituosa) conceituação do erro material,[109] fazendo nos seguintes aproximados termos: “A inexatidão material, ou, na linguagem da lei, o erro material passível de retificação, diz respeito àquele equívoco involuntário, completamente desvinculado da vontade do subscritor da decisão e, portanto, perceptível ‘primo ictu oculi’ da simples leitura da sentença. Assim, por exemplo, o erro de digitação, o erro na data do nascimento de determinada parte, o nome errado do autor ou do réu, a identificação do número do processo (...). Igual tratamento recebe o erro de cálculo, o qual, ultima ratio, se constitui em erro material. Desta forma, a decisão que fixa a condenação em 100 e divide, como forma de implemento, em três parcelas de 30”.[110]
O objeto da correção, destaca Moniz de Aragão, há de ser nada mais do que um equívoco, um erro “notório” como dizem as leis alemã e austríaca; “manifesto” como diz o CPC português; “evidente” como diz a lei polonesa. A notoriedade, a evidência, advém de tratar-se de erro que não gera dúvida, “erros de cópia, de referência”, como diz a lei chilena, “erro puramente aritmético”, como diz o CPC colombiano. Em suma: “inexatidões tais que a seu respeito não pode surgir a mínima hesitação, porque se alguma puder elevar-se, caso não é de correção pela via prevista no inc. I da disposição comentada (art. 463) e sim através de embargos de declaração, ou recurso”.[111]
Giovanni Torregrossa, estudando as disposições do CPC italiano a respeito do tema (arts. 287/289), fixa uma coerente distinção entre erro material e erro lógico. Destaca o processualista que o atributo “material” indicado para caracterizar o erro corrigível em estudo, serve a significar que, mesmo que o equívoco seja evidente e essencial, se for gerado pela adoção de um particular processo lógico do Estado-juiz, não pode ser compreendido na mesma classificação. Exemplifica, a partir daí, que o clássico “dois mais dois é igual a cinco” pode derivar de um notório engano do agente (erro material); ou, diferentemente, até de uma demonstração matemática, mesmo que errônea (sofisma), que apontasse o procedimento técnico adotado para se obter o resultado (erro lógico).[112]
Bem se pode dizer, então, que o erro material (não equiparável ao erro lógico) configura-se um determinado vício na exteriorização (expressão) do julgamento, não no teor do julgamento em si (âmbito de cognição do Estado-juiz), daí a razão pela qual se diz que pode ser auferível numa vista de olhos. É, sem dúvida, regra que deita raízes no direito romano e tem validade universal (tanto é que presente nos mais diversos ordenamentos alienígenas), atendendo a um “princípio” elementar e de razoabilidade, pois “não se compadece com o senso comum a ideia de que, contendo uma sentença ou acórdão lapso manifesto, não possa este ser eliminado”.[113] Eis aqui o interesse público que eleva o erro material ao patamar de matéria não preclusiva, destinada a permitir a correção até de decisão acobertada pela preclusão ou mesmo pela coisa julgada, “quando ela contiver erro diretamente verificável e que objetiva e inequivocadamente não tem como corresponder a finalidade da atuação do órgão jurisdicional”.[114]
O erro material pode ser objeto de análise judicial a qualquer tempo – seja na fase de conhecimento ou de execução, sem que daí resulte ofensa à coisa julgada; sendo matéria reconhecível de ofício, pode ser retificado pela iniciativa do próprio Estado-juiz ou de qualquer um que tenha interesse na correção, inclusive pelas vias recursais adequadas, como os embargos de declaração (art. 463, II, c/c art. 535, ambos do CPC).[115] Por sua vez, o erro de cálculo (ou de conta), como já pinçado, nada mais é do que uma espécie de erro material, específico da fase de execução, que não se confunde com o critério de cálculo, a envolver não mero erro aritmético, mas sim o próprio parâmetro da execução fixada em cognição judicial na fase anterior já transitada em julgado.[116]
Nada obstante o art. 463, I, do CPC tratar tão somente de erros materiais constantes de engano provocado pelo juiz e em exclusiva sede de decisão final de mérito (sentença definitiva), por certo os manifestos equívocos pronunciados pelo julgador em sentenças terminativas, em decisões interlocutórias e até em despachos de mero expediente podem ser retificados a qualquer tempo, mesmo ex officio; como também os erros materiais próprios das partes e/ou dos peritos das partes, a redundar especialmente no erro de cálculo (ou de conta) podem ser supridos imediatamente, assim que identificados.[117] É o caso, certamente, de utilizar versão dilatada do dispositivo infraconstitucional, a fim de serem abarcadas situações semelhantes, de lapso manifesto, que exigem reparação dentro do processo, independente do ator causador do equívoco e da circunstância procedimental que deu azo à incorreção.
20. Uma importante aplicação dos préstimos da noção de erro material pode-se dar quando do estudo do dispositivo sentencial, a fim de bem se cumprir o decisum, encontrando-se o processo já em fase de execução. É que pode acontecer que o julgador tenha, na fundamentação da sentença, exposto, v.g., a necessidade da condenação do réu em dois pedidos, e tenha externado no dispositivo, por manifesto lapso, somente um deles – a redundar, esta anômala circunstância, que no momento de cumprimento espontâneo do julgado, venha o demandado a efetivamente se negar a adimplir o pedido tão somente externado na fundamentação, sustentando que o dispositivo sentencial transitou em julgado com a fixação da obrigação de acertamento de um só pedido.[118]
Essa seria uma oportuna hipótese, a nosso ver, em que o julgador, a pedido da parte ora exequente, poderia corrigir o erro material, adequando o dispositivo à fundamentação sentencial, por estar-se diante de vício na exteriorização do julgado, perceptível primo ictu oculi da simples leitura da sentença. Sobre o tema, reforçando o nosso entendimento no caso enunciado, Vicente Greco Filho defende certo conteúdo dispositivo aos acertamentos contidos na fundamentação, mesmo que não constem na parte final da sentença: “É de observar-se que a parte dispositiva da sentença, em princípio, deve estar concentrada e resumida no final, mas pode ocorrer que o juiz, ao fazer a fundamentação, pode decidir algum ponto da lide principal, sem depois reproduzir, em resumo, no dispositivo. Tal decisão fará coisa julgada porque, apesar de formalmente não fazer parte do dispositivo, tem conteúdo dispositivo”.[119]
VII – PRESCRIÇÃO
21. Encerrando o nosso estudo, como mais uma recente matéria a se colocar no rol das não preclusivas para o juiz, afigura-se (com maior presença agora) a prescrição, a partir da sua regulamentação determinada pela Lei n° 11.280/2006.
O art. 219, § 5°, do CPC, na forma determinada pela Lei n° 5.925/73, dispunha que a prescrição poderia ser reconhecida e decretada de ofício caso se tratasse de direitos não patrimoniais. Com o advento do novo Código Civil, as regras de reconhecimento da prescrição ex officio tiveram relativa alteração, à medida que passou a poder ser reconhecida pelo julgador tão somente quando aproveitasse incapaz (art. 194); podendo, no entanto, toda e qualquer matéria prescricional ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveite (art. 193).
Agora, com a chegada da Lei n° 11.280/2006, alterando o § 5° do art. 219 CPC, o juiz pode reconhecer a prescrição, mesmo sem provocação da parte interessada, em qualquer situação – e para que não pairem dúvidas e eventuais conflitos aparentes entre as normas do Código Civil e do Código de Processo Civil, a Lei n° 11.280/2006 revogou expressamente o art. 194 do código civilista, que tratava diretamente da matéria sobre prescrição.
Ocorre que com o teor que tinha o art. 194 do Código Civil, quando da sua entrada em vigor, desde 2003, entendia a jurisprudência[120] e doutrina dominante,[121] articulando aquele dispositivo com o art. 193 do mesmo diploma civilista, que a prescrição poderia ser invocada a qualquer tempo pela parte, mas uma vez rejeitada, em decisão interlocutória, a ausência de recurso tempestivo, determinaria a preclusão, tanto para a parte (que perderia o direito de recorrer), quanto para o juiz e o tribunal (que ficariam impedidos de pronunciá-la, salvo para favorecer absolutamente incapaz).
Assim, tem-se que com a nova disposição legal, aumenta-se o poder de comando/mobilidade judicial, ao passo que o magistrado terá direito de reapreciar a questão prescricional, vindo a declarar a pretensão em juízo extinta com base no art. 269, IV, do CPC, mesmo que já tenha se manifestado anteriormente no processo, v.g. no saneador, pela inexistência da prescrição parcial ou total. O mesmo se dará para o Tribunal, em que a qualquer tempo, antes de eventual exame de recurso sobre o mérito, poderá o magistrado revisor, ex officio, vir a enfrentar a prejudicial de prescrição – extinguindo o feito, caso vislumbre prescrição do fundo de direito.
22. E o posicionamento atual do Superior Tribunal de Justiça, levando-se como parâmetro o paradigmático REsp n° 836.083/RS (Rel. Min. José Delgado, 1ª Turma, j. em 03/08/2006), inclina-se exatamente para o sentido de reconhecer a prescrição como típica matéria de ordem pública.[122]
São, no entanto, inúmeras as críticas de boa parte da doutrina pátria em relação à atual redação do § 5° do art. 219 CPC. Em linhas gerais, reconhece-se, ab initio, que “no afã de cumprir o preceito da efetividade, o legislador subverteu o sistema, dando-lhe inadequado tratamento”.[123]
Mais especificamente o descontentamento com a inovação processual recai sobre a viabilidade de o julgador, em matérias de direito patrimonial, vir a decretar a prescrição mesmo que a parte privilegiada (réu) desejasse ter apreciado o mérito da causa – o que o levou a não ter ventilado a matéria prescricional nas oportunidades processuais anteriores (especialmente em matéria preliminar contestacional). Sim, pois haveria um substrato ético (questão moral) que indicaria para o interesse do réu de ver analisado o mérito da causa pelo Poder Judiciário, a fim de ter publicada uma sentença de improcedência (art. 269, I, versus art. 269, IV, CPC).
Adroaldo Furtado Fabrício em instigante palestra proferida na Faculdade de Direito da UFGRS em 05/05/2006 alertou para esse ponto, bem como para a desestruturação histórica do instituto (moldada pela jurisprudência e doutrina) e incompatibilidade da malfadada novidade com as regras outras do código civilista ainda vigentes (v.g. arts. 191 e 882), as quais justamente mantêm a tradição da prescrição como matéria típica de defesa (exceção)[124] que pode interessar exclusivamente à parte (ré) invocá-la ou não – fato esse que indicaria para uma exegese restritiva do novo § 5° do art. 219 CPC.[125]
Do mesmo modo, estabelecendo uma linha nítida de diferenciação da prescrição perante a decadência (matéria reconhecidamente de ordem pública), Arruda Alvim em ensaio específico sobre as alterações incrementadas pela Lei n° 11.280/2006 comenta: “Em relação à modificação do § 5° do art. 219, parece não haver um genuíno interesse público que explique porque a prescrição deveria deixar de ser objeto de exceção. O interessado na prescrição pode não desejar que essa seja decretada, e, esse desejo deve ser respeitado pelo Direito. Diferentemente se passa com a decadência, reconhecidamente matéria de ordem pública, seja quanto à sua existência, seja quanto à atividade oficiosa do seu reconhecimento”.[126]
Também criticando a inovação legislativa, Alexandre Freitas Câmara destaca que outros ordenamentos jurídicos persistem vedando o reconhecimento ex officio da prescrição. Assim, por exemplo, o Código Civil italiano, no art. 2.938; o Código Civil francês trata do tema, em seu art. 2.223; o art. 142 do Código de Obrigações da Suíça tem redação análoga; e o Código Civil argentino dispõe sobre o tema em seu art. 3.964. Vale citar, ainda, o Código Civil português, cujo art. 303 estabelece, em maiores linhas, que “o tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo ministério público”. [127]
Voltando-se novamente os olhos a nossa estrutura processual, em outra interessante palestra proferida por Adroaldo Furtado Fabrício, desta vez em 04/07/2006,[128] acresceu-se que a decretação da prescrição ex officio pelo julgador, especialmente antes de ser estabelecido o contraditório (o que é devidamente permitido pela novel norma), poderia ser uma atitude temerária e contrária à própria efetividade na solução do litígio, à medida que poderiam existir causas suspensivas/extintivas da prescrição ainda não bem delineadas na demanda, diante da forma como proposta na exordial a conjectura fático-jurídica e em face da (in)existência de documentos acostados – em momento procedimental, é bom frisar, em que ainda ausente o pólo passivo.
23. De qualquer forma, por ora, em face da atual disciplina do nosso diploma processual civil e do posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (como no paradigmático decisum supraventilado), tem-se que a prescrição passa a se aproximar ainda mais do instituto da decadência, corporificando-se ambas como matérias prejudiciais do mérito, contempladas no art. 269, IV, do CPC (objeto, portanto, de sentença definitiva), e que podem ser reconhecíveis de ofício pelo diretor do processo a qualquer tempo.
A sedimentação dessa concepção, ao que parece, ainda está longe de se suceder (ainda mais pelas incompatibilidades evidentes entre a natureza do instituto da prescrição, como posto na codificação civilista, e sua visão como matéria de ordem pública, na forma como engendrada pela novel alteração processual), sendo vital para tanto as posições reiteradas da jurisprudência, especialmente do STJ, que venham a transitar em julgado num futuro próximo.
VIII – REFERÊNCIAS CONCLUSIVAS
24. Retome-se, em derradeira observação dos extensos tópicos analisados, a importante participação do instituto da preclusão como elemento necessário e integrante do formalismo no âmbito do processo civil – atuante também de maneira acentuada sobre a figura do magistrado (costurando-se, a partir daí, a regra da preclusividade das decisões judiciais). Nessa conjectura, sendo destacadas as situações (excepcionais, de interesse suprapartes) em que não ocorre a preclusão para o Estado-juiz, coloca-se em relevo novamente a máxima de que à medida que cresce e se intensifica o poder e o arbítrio do juiz, enfraquece-se o formalismo, correlativo elemento de contenção.[129]
Viu-se que mantendo o julgador jurisdição no feito, algumas matérias pela importância que possuem podem ser objeto de reanálise judicial antes de ser proferida sentença e ser justamente encerrada a sua jurisdição. Tal importância, portanto, determina a superação momentânea da necessidade de ordem e previsibilidade que se espera da aplicação da técnica preclusiva – nesse cenário justificadamente então mitigada.
25. O grande objetivo do presente ensaio foi exatamente de discorrer a respeito dessas matérias não sujeitas à preclusão para o Estado-Juiz. Embora sejam excepcionais, e por isso devam constar expressamente no Código Processual, há possibilidade de alargamento do rol, como se deu com a matéria prescricional, tornada não preclusiva a partir das alterações legais incrementadas em 2006 (Lei n° 11.280).
No mais, muito há ainda a ser construído em relação ao conceito e dimensões das condições da ação e pressupostos processuais, juízo de admissibilidade recursal e nulidades – todas essas matérias não preclusivas importantes e que não possuem unânime conformação por parte da doutrina e jurisprudência pátrias.
Por fim, o erro material é histórica matéria não sujeita as regras da preclusão consumativa para o Estado-juiz, o que faz com que possa ser alegada inclusive em fase executiva, pós trânsito em julgado; sendo que atualmente ainda nos parece mais relevante discutir o direito probatório nessa perspectiva, já que a sua colocação como matéria não preclusiva vai ao encontro das disposições constitucionais de preservação de um direito (que entendemos ser) prioritário à prova, favorecendo a aproximação do julgador da verdade formal e tornando assim mais legítima a decisão final de mérito.
Em todos esses cenários, finaliza-se, se cabe ao julgador reexaminar oficiosamente a medida tomada, a fim de que novos e melhores rumos à demanda sejam estabelecidos, por certo viável à parte interessada que apresente, sem demasiada formalidade, solicitação a respeito (petição simples), mesmo que não tenha mais prazo para apresentação de formal recurso à instância competente. Isto porque a preclusão temporal para a parte interessada não tem diretamente relação com a (inexistência) de preclusão consumativa para o julgador em torno das excepcionais matérias trabalhadas, sendo razoável a construção jurídica de que toda a medida que possa ser tomada de ofício pelo Estado-juiz, possa ser passível de alegação pela parte diretamente interessada[130].
[1] Trataremos, assim, de maneira mais detida a respeito de questões originariamente abordadas em: RUBIN, Fernando. A preclusão na dinâmica do processo civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 133/196, especialmente.
[2] Grinover exterioriza a ressalva pertinente de que não se pode identificar, em toda e qualquer hipótese, o interesse da Fazenda Pública com o interesse público, isto é, não se pode dizer que o interesse jurídico da União Federal seja sempre uma questão de ordem pública, sobre a qual não recairia a preclusão e que poderia ser revista a qualquer momento (GRINOVER, Ada Pellegrini. “Interesse da União, preclusão. A preclusão e o órgão judicial” in A Marcha do Processo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000, p. 237).
[3] Especifica Wambier que nem todas as matérias apreciáveis ex officio são necessariamente matérias de ordem pública, já que a lei processual, excepcionalmente, pode estabelecer que determinadas matérias de ordem privada sejam apreciadas de ofício. Eis a passagem de Teresa Arruda Alvim Wambier que bem complementa a explicação: “Numa imagem matemática, dir-se-ia que o conjunto de matérias examináveis de ofício é maior do que o das matérias de ordem pública. Portanto toda matéria de ordem pública é examinável de ofício, mas nem tudo o que pode ser examinado de ofício consiste em matéria de ordem pública” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4ª ed. São Paulo: RT, 1998, p. 137).
[4] LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953, p. 57, 106/107.
[5] Quanto à história do despacho saneador e do que hoje se prefere reconhecer, estendendo o conceito, de uma verdadeira fase de saneamento do processo, indicamos para aprofundamento: LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953, p. 5/55, 139/140 e 179/187; FABRICIO, Adroaldo Furtado. “Extinção do processo e mérito da causa” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 15/57; TUCCI, Rogério Lauria. “A nova fase saneadora do processo civil brasileiro” in Reforma do Código de Processo Civil, coordenador Min. Sálvio Figueiredo Teixeira. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 347/369; ARAGÃO, E. D. Moniz de. “O julgamento conforme o estado do processo” in Revista dos Tribunais 502 (1977):11/19; LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1976, p. 100/107.
[6] SILVA, Flávio Pâncaro. “O saneamento do processo” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Fabris, 1989, p. 233.
[7] LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953, p. 178.
[8] LIMA, Alcides Mendonça. “Do saneamento do processo” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 59/71.
[9] ALVIM, Arruda. “Pressupostos processuais e condições da ação” in Coleção estudos e pareceres direito processual civil. Vol. 1. São Paulo: RT, 1995, p. 11/28.
[10] LOPES, João Batista. “Breves considerações sobre o instituto da preclusão” in Revista de Processo n° 23 (1981): 45/60.
[11] BARBOSA, Antônio Alberto Alves. “Da preclusão processual civil”. São Paulo: RT, 1955, p. 210. Da mesma forma, Galeno Lacerda, criticando Liebman , deixou clara sua ressalva: “não se faça do despacho saneador a panacéia preclusiva de todos os males do processo; seria visão exagerada e irreal do seu alcance” (LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953, p. 6 e 171/172).
[12] Além da obrigatoriedade da motivação, é preciso Daniel Amorim Assumpção Neves ao frisar que não se pode admitir que o silêncio do juiz seja entendido como decisão favorável à presença na demanda judicial das condições da ação ou pressupostos processuais, já que não há qualquer determinação legal nesse sentido e é certo que na ciência do Direito nunca se admitiu o silêncio como apto a produzir efeitos jurídicos sem expressa previsão legal: “o ditado popular de que ‘quem cala consente’ nunca foi admitido em sua plenitude pelo direito pátrio” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Preclusões para o juiz: preclusão pro iudicato e preclusão judicial no processo civil. São Paulo: Método, 2004, p. 237/238).
[13] Ressalta-se a impropriedade terminológica da expressão “transita em julgado”, já que o melhor seria utilizar a palavra “preclui”, tendo em vista as diferenciações existentes entre o instituto da preclusão (endoprocessual) e o da coisa julgada (panprocessual).
[14] A respeito, Arruda Alvim, em ensaio específico, teceu oportunas críticas à posição adotada pelo Tribunal de Justiça de Goiás, na Apelação Cível n° 18.417, que entendeu pleclusa a análise das condições da ação no saneador, mesmo que na verdade tenha o juízo a quo implicitamente abordado a existência das matérias (ALVIM, Arruda. “Pressupostos processuais e condições da ação” in Coleção estudos e pareceres direito processual civil. Vol. 1. São Paulo: RT, 1995, p. 11/28).
[15] BUZAID, Alfredo. Do agravo de petição no sistema do código de processo civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1956, p. 115.
[16] Zanzucchi é um dos clássicos juristas peninsulares que destacaram a diferença entre as condições da ação e dos pressupostos processuais tratando os primeiros como “condizioni di fondatezza della domanda” e os segundos como “i requisiti del processo” (ZANZUCCHI, Marco Tullio. Diritto processuale civile. Vol. 1. 4ª ed. Milão: Giuffrè, 1947, p. 59/68). Ainda que seja plenamente possível distinguir com precisão as condições da ação dos pressupostos processuais, constituindo ambos matéria preliminar, existe tendência na doutrina moderna, seguindo o modelo alemão, no sentido de unificação de tratamento. Nesse sentido, consultar: BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 162 e 346.
[17] GOMES, Fábio. Comentários ao código de processo civil. Vol. 3, arts. 243 a 269. São Paulo: RT, 2000, p. 326.
[18] “Antes do juiz decidir o mérito da pretensão, terá que verificar se coexistem os pressupostos processuais, isto é, se o processo é válido. Decidindo pela invalidade do processo, põe termo a este, sem entrar no exame do direito da ação e, muito menos, da pretensão” (SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. Vol. 1. 19ª ed. São Paulo: RT, 1997, p. 169); “ao juiz não é dado, efetivamente, entrar numa relação jurídica a que faleçam condições de validez” (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Vol. II, notas de Enrico Tullio Liebman. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 356).
[19] Por certo, não há uma perfeita identidade entre os doutrinadores a respeito da classificação dos pressupostos processuais, especialmente quando tratamos da diferenciação entre pressupostos de existência e de validade: Marinoni, v.g., entende que a capacidade postulatória deve ser tratada como pressuposto processual de existência, e não como pressuposto processual de validade positivo subjetivo (MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria geral do processo. Vol. 1São Paulo: RT, 2006, p. 468/470).
[20] Boa parte da doutrina (como Teresa Arruda Alvim Wambier, Humberto Theodoro Jr, e Calmon de Passos), no nosso entender, trata, sem razão, de excluir a perempção como pressuposto processual negativo, o que não é feito por Heitor Vitor Mendonça Sica (SICA, Heitor Vitor Mendonça. “Preclusão processual civil”. São Paulo: Atlas, 2006, p. 143). Da mesma forma, cite-se José Maria Rosa Tesheiner, que informa rol até mais extensivo dos pressupostos negativos ou objetivos extrínsecos: “São pressupostos extrínsecos o compromisso, a perempção, a litispendência, a coisa julgada, a caução e o depósito prévio das custas” (TESHEINER, José Maria Rosa. Elementos para uma teoria geral do processo. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 109); mantendo o jurista gaúcho, em obra posterior, o mesmo posicionamento, com exceção feita ao compromisso/convenção de arbitragem (TESHEINER, José Maria Rosa. Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 30/31).
[21] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Vol. I, notas de Enrico Tullio Liebman. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 66/71.
[22] Sobre as condições da ação, pela objetividade e clareza, merece transcrição a passagem de Frederico Marques: “interesse em agir significa existência da pretensão objetivamente razoável; enquanto que a legitimatio ad causam, a existência da pretensão subjetivamente razoável. A falta de possibilidade jurídica do pedido constitui indício macroscópico da inexistência da pretensão razoável” (MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. Vol. 1. 2ª ed. Campinas: Millenium, 2000, p. 304/305).
[23] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. “Pressupostos processuais e condições da ação” in Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo n° 35 (1991): 183/211.
[24] BÜLOW, Oskar. Teoria das exceções e dos pressupostos processuais. 2ª ed. Trad. por Ricardo Rodrigues Gama. Campinas: LZN, 2005, p. 12.
[25] Citem-se Manoel Caetano Ferreira Filho, Barbosa Moreira, Calmon de Passos, Rogério Lauria Tucci, João Batista Lopes e Fábio Gomes. A linha de argumentação dessa corrente, com as passagens pertinentes dos juristas sobreditos pode ser melhor consultada em: FERREIRA FILHO, Manoel Caetano. A preclusão no direito processual civil. Curitiba: Juruá, 1991, p. 93/115.
[26] MANESCHY, Renato de Lemos. “Extinção do processo, preclusão” in Revista Forense n° 269 (1980): 153/155.
[27] MARQUES, José Frederico. “Instituições de direito processual civil”. Campinas: Millenium, 2000. Vol.2, p. 353.
[28] Dentre eles: José Rogério Cruz e Tucci, Arruda Alvim, Moniz de Aragão, Humberto Theodoro Jr., Edson Ribas Malachini, Flávio Pâncaro da Silva. A linha de argumentação dessa corrente, com as passagens pertinentes dos juristas sobreditos pode ser consultada em: CRUZ E TUCCI, José Rogério. “Sobre a eficácia preclusiva da decisão declaratória de saneamento” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989.
[29] Interessante que Galeno Lacerda, discorrendo sobre sua teoria, agrupa as condições da ação e os pressupostos processuais naquilo que denominou “requisitos de legitimidade da relação processual”, como na seguinte passagem da sua obra: “(...) considerando o caráter público das normas processuais e tendo em vista o poder judicial de direção do processo, pode-se afirmar, em princípio, que verificar a legitimidade da relação processual foge da disposição das partes para pertencer, exclusivamente, à atividade inquisitória do juiz” (LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953, p. 161 e ss.).
[30] De acordo, Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, já escreveu, em linhas gerais, que a disponibilidade sobre o bem jurídico material objeto do processo “repercute gradativamente nos direitos e deveres processuais das partes, nos efeitos da aquiescência, na natureza da preclusão e da coisa julgada, nos vícios do ato processual e em tantos outros aspectos” (ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 117).
[31] ALVIM, Arruda. “Dogmática jurídica e o novo código de processo civil” in Revista de Processo n° 1 (1976): 85/133. Especialmente p. 128/129.
[32] Essa atual orientação, acrescenta Leandro Martins Zanitelli, expressa a adoção, pelo direito processual brasileiro – ao menos no que se refere às matérias que não se encontram sob o poder de disposição das partes – de um “modelo de concentração moderado”, no qual, ao mesmo tempo em que se reserva determinado momento processual para a atividade de saneamento, permite-se o exame (ou reexame) judicial de certas questões a ela atinentes em etapas posteriores do procedimento (ZANITELLI, Leandro Martins. “Atividade saneadora do juiz” in Elementos para uma nova teoria geral do processo. Organizador: Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Livraria do advogado, 1997, p. 235/247).
[33] Llewellyn Medina, em ensaio breve sobre o tema, comenta o Mandado de Segurança n° 791, analisado pelo STF, em que se assentou que por ser matéria de ordem pública as condições da ação não estão sujeitas à preclusão e por isso são suscetíveis de serem examinadas em qualquer fase do processo (MEDINA, Llewellyn. “Processo civil – preclusão – mandado de segurança – pressupostos processuais e condições da ação” in Repertório Autorizado da Jurisprudência do STF n° 137 (1984): 20/25).
[34] Contra: RE 90668-1 (constante na RT 546/247 – j. em 29/06/1983), em que o Min. Mariz de Oliveira cita inclusive a tese aqui exposta por J. Frederico Marques, atentando ainda para o caráter punitivo da determinação da preclusão do juiz: “é induvidosa a responsabilidade exclusiva da apelante, posto que, desde o início da ação desapropriatória, agiu desacertadamente, não sendo admissível que agora queira transferi-la para a Municipalidade de São Paulo ou para o Magistrado daquela demanda”.
[35] Contra: REsp 61420-1/SP (j. em 03/05/1993), em que o Min. Assis Toledo, no corpo do julgado, assim explica as razões que entende justificadoras da preclusão para o juiz mesmo de matéria de ordem pública: “a regra do § 3° do art. 267, por uma questão lógica, refere-se, segundo me parece, a hipóteses em que haja omissão ou, no caso de decisão irrecorrida, deve estar endereçada ao órgão jurisdicional de instância superior, não ao próprio juiz ou tribunal que já tenha decidido a questão”.
[36] CRUZ e TUCCI, José Rogério. Tempo e processo. São Paulo: RT, 1997, p. 46.
[37] GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 2° Vol. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 50 e 254.
[38] MENDES, Leonardo Castanho. “O juízo de admissibilidade recursal e a preclusão” in Ajufe n° 63 (2000): 209/218.
[39] BARBORA MOREIRA, J. C. “O juízo de admissibilidade no sistema dos recursos civis”. Rio de Janeiro, 1968 (Tese de concurso para a docência livre de Direito Judiciário Civil, apresentada à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara), p. 32; BARBOSA MOREIRA, J. C. Comentários ao código de processo civil. Vol. 5, arts. 476 a 565”. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 290.
[40] Do entendimento jurisprudencial mais abalizado, a respeito do ponto, basta a seguinte definitiva referência do STJ, quando do julgamento do REsp n° 142.633⁄SP (1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, j. em 08/06/1998): “Os pressupostos (intrínsecos e extrínsecos) e, pacificamente, a tempestividade do recurso (especial), constituem requisitos de ordem pública e essencial à respectiva admissibilidade, devendo a sua existência ser verificada de ofício, ainda que não haja manifestação da parte”.
[41] LOPES, João Batista. “Breves considerações sobre o instituto da preclusão” in Revista de Processo n° 23 (1981): 45/60.
[42] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. O novo regime do agravo. 2ª ed. São Paulo: RT, 1996, p. 336/337.
[43] BARBORA MOREIRA, J. C. “O juízo de admissibilidade no sistema dos recursos civis”. Rio de Janeiro, 1968 (Tese de concurso para a docência livre de Direito Judiciário Civil, apresentada à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara), p. 133.
[44] ASSIS, Araken de. “Condições de admissibilidade dos recursos cíveis” in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei n° 9.756/98. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr. São Paulo: RT, 1999, p. 13.
[45] DINAMARCO, Cândido Rangel. “Os efeitos dos recursos” in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei n° 10.352/2001. Coordenação de Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr. São Paulo: RT, 2002, p. 57, especialmente.
[46] LIMA, Alcides de Mendonça. Introdução aos recursos cíveis. 2ª ed. São Paulo: RT, 1976, p. 300.
[47] Desenvolve Manoel Ferreira Filho, saudando a inovação legislativa de meados da década de 90, que antes da entrada em vigor da Lei n° 8.950/94, em face da lacuna normativa, os magistrados em geral não reconsideravam a decisão pela qual havia admitido a apelação; por isso muitas vezes eram remetidos aos tribunais recursos que a toda evidência não deveriam ter sido admitidos no juízo recorrido (FERREIRA FILHO, Manoel Caetano. Comentários ao código de processo civil. Vol. 7, arts. 496 a 565. São Paulo: RT, 2001, p. 151/152.
[48] BARBORA MOREIRA, J. C. “O juízo de admissibilidade no sistema dos recursos civis”. Rio de Janeiro, 1968 (Tese de concurso para a docência livre de Direito Judiciário Civil, apresentada à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara), p. 134; BARBOSA MOREIRA, J. C. Comentários ao código de processo civil. Vol. 5, arts. 476 a 565. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 263/266.
[49] A favor do entendimento ora defendido, as precisas linhas de Nelson Nery Jr. discorrendo a respeito de um caso comum no âmbito forense: “De uma sentença houve apelação. O juiz de primeiro grau profere juízo negativo de admissibilidade por entender ser a parte ilegítima para apelar. Desta decisão o então apelante interpõe agravo de instrumento, pretendendo que o tribunal, reformando a decisão negativa do juiz mande processar a apelação. O tribunal, apreciando o agravo, dá-lhe provimento, mandando processar o apelo. Esta decisão sobre o mérito do agravo constitui juízo de admissibilidade positivo provisório do recurso de apelação (...). Nada impede que, ao julgar a apelação, que ele mesmo determinara fosse processada, entenda o tribunal, agora proferindo juízo de admissibilidade definitivo, que falta o requisito da sucumbência ou, mesmo, que o apelante era realmente parte ilegítima como se supunha, não conhecendo do recurso de apelação (...). O tribunal pode agir assim porque os requisitos de admissibilidade constituem matéria de ordem pública, devendo ser examinados ex officio pelo juiz originário, provisoriamente, e pelo tribunal destinatário, de modo definitivo, independentemente do pedido do recorrido” (NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos. 6ª ed. São Paulo: RT, 2004, p. 265).
[50] BARBORA MOREIRA, J. C. “O juízo de admissibilidade no sistema dos recursos civis”. Rio de Janeiro, 1968 (Tese de concurso para a docência livre de Direito Judiciário Civil, apresentada à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara), p. 141/144.; MENDES, Leonardo Castanho. “O juízo de admissibilidade recursal e a preclusão” in Ajufe n° 63 (2000): 209/218, p. 215, especialmente.
[51] Em outros termos, estabeleceu-se, por ora, em síntese, que “a nulidade é sanção imponível como conseqüência de vício contido em ato jurídico; o ato processual nulo produz efeitos, se e enquanto não desconstituído, a desconstituição opera ex tunc. A decretação da nulidade pode ou não depender de provocação do interessado; pode ou não sujeitar-se a prazo preclusivo, conforme determine a lei” (TESHEINER, José Maria. Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 14).
[52] LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953, p. 158/161, especialmente.
[53] PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 184/197.
[54] ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. Vol. 1. 6ª ed. São Paulo: RT, 1997, p. 436/437.
[55] MITIDIERO, Daniel Francisco. “O problema da invalidade dos atos processuais no direito processual civil brasileiro contemporâneo” in Visões críticas do processo civil brasileiro. Coordenação de Guilherme Rizzo Amaral e Márcio Louzada Carpena. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 55/74.
[56] DALL’AGNOL JR., Antônio Janyr. “Para um conceito de irregularidade processual” in Revista de Processo n° 60 (1990): 15/30.
[57] THEODORO JR., Humberto. “As nulidades no código de processo civil” in Revista de Processo n° 30 (1983): 38/60.
[58] Nessa precisa direção, Fábio Gomes assevera expressamente que “não há lugar, dentro da sistemática do Código quanto ao tema, para a inclusão da categoria de anulabilidade ao lado da nulidade relativa”. GOMES, Fábio. Comentários ao código de processo civil. Vol. 3, arts. 243 a 269. São Paulo: RT, 2000, p. 45. E, em adequada complementação, Teresa Arruda Alvim Wambier sustenta, ao tratar do modelo originário de Galeno Lacerda, que: “(...) na nossa forma de conceber a sistematização dos vícios processuais, a segunda categoria aparece como sinônimo da terceira (nulidades relativas = anulabilidades). São nulidades absolutas vícios ligados aos pressupostos processuais (positivos de existência, positivos de validade, e negativos) e as condições da ação. Todos os outros defeitos, de que pode padecer o processo, serão vícios de forma e serão nulidades relativas ou anulabilidades, caso o sistema positivo não disponha expressamente em sentido inverso” WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. O novo regime do agravo. 2ª ed. São Paulo: RT, 1996, p. 300/301.
[59] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 445. No mesmo sentido, expressamente citado por Bedaque: THEODORO JR., Humberto. “As nulidades no código de processo civil” in Revista de Processo n° 30 (1983): 38/60. Especialmente p. 47/48.
[60] TESHEINER, José Maria. Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 281.
[61] THEODORO JR., Humberto. “As nulidades no código de processo civil” in Revista de Processo n° 30 (1983): 38/60. Especialmente, p. 43.
[62] MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Vol. 2. Campinas: Millenium, 2000, p. 352.
[63] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4ª ed. São Paulo: RT, 1998, p. 181.
[64] THEODORO JR., Humberto. “As nulidades no código de processo civil” in Revista de Processo n° 30 (1983): 38/60. Especialmente, p. 55.
[65] CALMON DE PASSOS, J. J. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 136.
[66] NEGRÃO, Theotonio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 36ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 184/197.
[67] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Vol. II, notas de Enrico Tullio Liebman. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 323.
[68] “O comparecimento (do citado) sana todas as nulidades; logo não se pode comparecer para excepcionar a nulidade” (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Vol. II, notas de Enrico Tullio Liebman. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 316/317).
[69] CALMON DE PASSOS, J. J. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 155.
[70] TESHEINER, José Maria. Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 284/285.
[71] MEDINA, José Miguel Garcia. “Execução. Nulidade. Inexistência de preclusão” in Revista de Processo n° 112 (2003): 187/195.
[72] CALMON DE PASSOS, J. J. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 156.
[73] PARISI, Antonella. “Figure di preclusione al rilievo delle nullità assolute” in Revista Trimestrale di Diritto e Procedura civile n° 56 (2002):1397/1421.
[74] TESHEINER, José Maria. Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 116.
[75] GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: AIDE, 1992, p. 109 e 188.
[76] DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 4ª ed. São Paulo: RT, 1994, p. 91 e 195.
[77] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4ª ed. São Paulo: RT, 1998, p. 236.
[78] BARBOSA MOREIRA, J. C. “A motivação das decisões judiciais como garantia inerente ao estado de direito” in Temas de direito processual. 2ª série. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 83/95.
[79] A questão é bem desenvolvida pela especializada doutrina do processo: DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 4ª ed. São Paulo: RT, 1994, p. 200; ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2003, 2ª ed, p. 151. Na teoria geral do direito, o ponto também é destacado, sendo pertinentes as colocações em: ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. Trad. por J. Baptista Machado. 7ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996, p. 254.
[80] Nessas linhas, merece transcrição a convicção de Calmon de Passos: “O que sustento é a impossibilidade, em face do nosso sistema de nulidades, que louvo sobremodo, de se invalidar a sentença por falta ou deficiência ou impropriedade da fundamentação quando o ‘ad quem’ verifica a inexistência de prejuízo, dado que entende possível decidir o mérito em favor de que arguiu a nulidade. Nesses termos, a irregularidade que deriva da falta ou deficiência de motivação será sanada com a motivação oferecida no segundo grau” (CALMON DE PASSOS, J. J. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 150).
[81] O Tribunal de Justiça gaúcho, nesse diapasão, já bem se manifestou: “a decisão de primeiro grau foi ultra petita, vício este que não resulta na nulidade do julgado, podendo ser sanado por este Colegiado com a exclusão da parte que excede os limites do pedido, mesmo de ofício” (Apelação Cível nº 70022711873, Quinta Câmara Cível, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 12/03/2008).
[82] Apelação Cível nº 70023630130, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, Julgado em 31/03/2008.
[83] Apelação Cível nº 70023359284, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ergio Roque Menine, Julgado em 02/04/2008.
[84] Das duas situações (sentença ultra e extra petita), bem anota Teresa Arruda Alvim Wambier, a mais grave é a concernente à segunda: “é que, rigorosamente, a sentença extra petita comporta, sob certo aspecto, a qualificação de sentença inexistente, uma vez que não corresponde a pedido algum. Falta, portanto, pressuposto processual de existência para que aquela sentença seja considerada juridicamente existente” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4ª ed.. São Paulo: RT, 1998, p. 240). No âmbito do direito alienígeno, Zanzucchi e Satta fazem menção expressa ao art. 112 do CPC italiano, que veda expressamente o julgamento citra petita e o ultra petita – ne eat iudex ulta petita partium, a partir da seguinte fórmula: “il giudice deve pronunciare su tutta la domanda e non oltre i limiti di essa” (ZANZUCCHI, Marco Tullio. Diritto processuale civile. Vol. 1. 4ª ed. Milão: Giuffrè, 1947, p. 357; SATTA, Salvatore. Diritto processuale civile. 2ª ed. Padova: CEDAM, 1950, p. 110).
[85] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4ª ed. São Paulo: RT, 1998, p. 244.
[86] Em decisum do Tribunal de Justiça Gaúcho deu-se provimento a recurso do réu para excluir condenação em danos morais do montante indenizatório concedido ao autor, em face da inexistência de pedido nesse sentido – julgamento extra petita. In verbis: “Acórdão que condenou o réu em importância por dano moral não pleiteada pelo autor na inicial. Julgamento extra petita. Impropriedade, na dicção do art. 460 do CPC, possibilidade de adequação. Exclusão do montante indenizatório não pedido. Efeito infringente ao recurso. Embargos providos. Unânime”. (Embargos de Declaração Nº 70021819107, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 08/11/2007).
[87] CALMON DE PASSOS, J. J. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 156/157.
[88] José Maria Tesheiner cita decisão do TJ/SP – Apelação Cível n° 247.458-2, 16ª Câmara Cível, Rel, pereira Calças, j. em 20/12/1994 – em que o Tribunal acolheu a alegação de cerceamento de defesa, porque proferida sentença conforme o estado do processo, dispensada a audiência de instrução e julgamento, não obstante produzida prova pericial. Destaque para o seguinte trecho do julgado: “Sendo a prova pericial realizada em medida cautelar, indispensável a realização de audiência de instrução e julgamento nos autos principais, ensejando às partes a oportunidade de solicitar esclarecimento dos peritos e debater a causa, a fim de se formar o correto convencimento a respeito dos fatos” (TESHEINER, José Maria. Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 222).
[89] Jones Figueiredo Alves nos traz importantes ensinamentos que se coadunam com o exposto: “a actus trium personarum – relação jurídica processual – sob o prima strictu sensu nos oferece uma noção de unidade em que os sujeitos principais do processo (juiz, autor e réu), em íntima relação contínua, vinculados entre si, com a característica da progressividade, marcham para a resolução do litígio, através do processo, cumprindo uma cooperação mútua para a atuação da lei (...). O grau de participação do juiz na realização do processo (ato de direito público) é estabelecida em medida de equilíbrio que não refletindo a indiferença do espectador também não tolera o arbítrio, ou seja, a tendência publicística do processo condena a passividade do juiz, posto que sujeito do processo, cabendo-lhe não ficar eqüidistante; todavia, limitado é o seu exercício ao ponto-limite de não constituir esse exercício em abuso de autoridade” (ALVES, Jones Figueiredo. Do poder “ex officio” no processo civil. Recife: TJ/PE, 1989, p. 12/17).
[90] BAUR, Fritz. “Transformações do processo civil em nosso tempo”, Trad. J. C. Barbosa Moreira, in Revista Brasileira de Direito Processual n° 7 (1976): 57/68.
[91] Liebman, quando formulou, na década de 60, estudo específico sobre o princípio dispositivo, claramente o fez preocupado que o julgador não se valesse excessivamente do poder oficioso na instrução, sob pena de interferência na imparcialidade que se espera dele como fundamental agente político estatal (LIEBMAN, Enrico Tulio. “Fondamento del principio dispositivo” in Rivista di Diritto Processuale n° 15 (1960): 551/565).
[92] ARAGÃO, E. D. Moniz. “Preclusão (processo civil)” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 151/152.
[93] DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 4ª ed. São Paulo: RT, 1994, p. 54, 129, 155, 164, 175, 233, 234, 249, 250, 287 e 288.
[94] O processo dos sistemas do Civil Law, em matéria probatória, é caracterizado por um work in progress, uma obra aberta, não existindo preclusões ao exercício dos poderes instrutórios do juiz (CRUZ e TUCCI, José Rogério. Tempo e processo. São Paulo: RT, 1997, p. 37). Da mesma forma, Carlos Alberto Alvaro de Oliveira expõe que o entendimento generalizado é no sentido de inexistência da preclusão no tocante à iniciativa judicial ex officio para a realização da prova, cuja única finalidade deve consistir em melhor formar a convicção do órgão julgador, matéria de ordem pública concernente à própria atividade jurisdicional (ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 152/153).
[95] BARBORA MOREIRA, J. C. O novo processo civil brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2006, 24ª ed, p. 57.
[96] ARAGÃO, E. D. Moniz. “Preclusão (processo civil)” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 154; ARAGÃO, E. D. Moniz de. “O julgamento conforme o estado do processo” in Revista dos Tribunais 502(1977):11/19.
[97] CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: RT, 2006, p. 266 e 443/444.
[98] “Los tres momentos del procedimiento probatorio son: (i) la proposición, (ii) el aporte y la producción, y (iii) la valoración. A esta última deberá seguir un cuarto momento, que forma parte de la génesis lógica de la sentencia; y que consiste en la inserción de los resultados de la valoración y de la distribución de la carga de la prueba en el esquema silogístico de la sentencia. Es habitual separar el tercer momento, la valoración (actividad teóricamente unitaria y predominantemente mental, que suele atribuirse, al tribunal) de los dos primeros (...)” (BARRIOS DE ANGELÍS, Dante. El proceso civil – Código General del proceso. Montevidéo: IDEA, 1989, p. 217).
[99] Danilo Knijnik adequadamente enfrentou o problema da antecipação ilegal da valoração dos meios probantes já aportados ao feito, com o fito de impedir a produção de outros meios lícitos e legítimos requeridos pelas partes em meio à instrução do feito: “(...) o princípio do livre convencimento nada tem a ver com a admissibilidade da prova. Tal princípio entra em operação somente após o processo de seleção do material que comporá o objeto de seu exercício; daí segue-se que, viciada a etapa preliminar, contamina-se seu resultado, sendo irrealizável a manutenção da valoração judicial exercida livremente, sob bases equivocadas, do que resulta a necessidade de distinguir os planos em questão, para um funcionamento adequado do princípio” (KNIJNIK, Danilo. A prova nos juízos cível, penal e tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 24).
[100] Aliás, com absoluta correção, já afirmava Barbosa Moreira que a precipitação cerceia de modo intolerável o exercício do direito de ação ou de defesa (BARBOSA MOREIRA, J. C. “Efetividade do processo e técnica processual” in Revista Ajuris (64):149/161).
[101] A concepção é bem sistetizada por Fabio Marelli: “(...) la causa non dovrebbe ritenersi matura per la decisione sulla base della sola regola dell’onere della prova quando sia ancora possibile esperire mezzi istruttori ufficiosi” (MARELLI, Fabio. La trattazione della causa nel regime delle preclusioni. Padova: CEDAM, 1996, p. 143/144). Veja-se, também o que revela, por aqui, Bedaque: “Os princípios estabelecidos no art. 333 só devem ser aplicados depois que tudo for feito no sentido de se obter a prova dos fatos. E quando isso ocorre, não importa sua origem, isto é, quem a trouxe para os autos (...). A razão de ser da regra (do art. 333) é, pois, evitar o non liquet” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 3ª ed. São Paulo: RT, 2001, p. 118/119).
[102] COMOGLIO, Luigi Paolo. “Preclusioni istruttorie e diritto alla prova” in Rivista di Diritto Processuale n° 53 (1998): 968/995. Especialmente p. 994/995.
[103] Cambi encerra o seu estudo com crítica a constatação bisonha, frequente na prática forense e repudiada pelo STJ no julgamento do REsp 7.267/RS (3ª Turma, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. em 20/03/1991): “o juiz não pode impedir a produção de provas, sob o pretexto de julgar antecipadamente o mérito, e rejeitar a pretensão ou a exceção, por falta de provas, quando a parte requereu a realização dessas provas” (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: RT, 2006, p. 450).
[104] MELERO, Valentín Silva. “La prueba procesal”. Revista de derecho privado, Tomo 1, Madrid, p. 71/74, 1963.
[105] Giuseppe Chiovenda, na Itália, e Ovídio Baptista, mais recentemente no Brasil, chegam a registrar que tais restrições específicas são sequelas do sistema da prova legal (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, Vol. 3, 1965, p. 93; SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de processo civil. 6ª ed. São Paulo: RT, 2003, Vol. 1, p. 345/350.
[106] FERREIRA FILHO, Manoel Caetano. A preclusão no direito processual civil. Curitiba: Juruá, 1991, p. 91/92.
[107] CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: RT, 2006, p. 267 e 444.
[108] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Preclusões para o juiz: preclusão pro iudicato e preclusão judicial no processo civil. São Paulo: Método, 2004, p. 271 e 267/268.
[109] O jurista italiano Giovanni Torregrossa é um dos que salienta o fato de ser “inexata” a construção do conceito de erro material, e entende que tal circunstância deriva “dalla erroneità del punto di partenza dell’indagine seguita: si sono voluti, cioè, trasportare, adattandoli, nel campo de diritto pubblico i risultati raggiunti dal diritto privato sul tema dell’errore” (TORREGROSSA, Giovanni. “Correzione e integrazione dei provvedimenti del giudice” in Enciclopédia del diritto n° X (1962): 717/728. Especialmente p. 718).
[110] PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil. Vol. 6 (arts. 444 a 495). São Paulo: RT, 2000, p. 132.
[111] ARAGÃO, E. D. Moniz. Sentença e coisa julgada. Rio de Janeiro: AIDE, 1992, p. 144.
[112] TORREGROSSA, Giovanni. “Correzione e integrazione dei provvedimenti del giudice” in Enciclopédia del diritto n° X (1962): 717/728. Especialmente p. 718/719.
[113] MATTE, Fabiano Tacachi; ARNECKE, Júnior Eduardo. “Erro material (comentários ao art. 463, I CPC)” extraído do site http://www.tex.pro.br/wwwroot/00/061023erromaterial.php. Acesso em 29 abril 2008.
[114] TALAMINI, Eduardo. “O erro material no processo civil” in Revista dialética de direito processual n° 30 (2005): 46/52.
[115] Veja-se, nesse diapasão, julgado do Pretório Excelso decidido em 12/09/1969 – ainda então sob a égide do anterior Código de Processo Civil: “Embargos de declaração – Devem ser conhecidos e recebidos quando houver êrro material evidente da decisão” (RE n° 67.593/MA, 1ª Turma, STF, Rel. Min. Aliomar Baleeiro, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência n° 53 (1970): 324/325).
[116] Na mesma direção, citando arestos do STJ (RSTJ 7/349 e RSTJ 655/198), Ada Pellegrini Grinover discorre que somente o erro de conta ou de cálculo, o erro aritmético, pode ser corrigido a qualquer tempo; já os elementos de cálculo, os critérios de cálculo, ficam encobertos pela autoridade da coisa julgada: “a questão sobre o termo ‘a quo’ da correção monetária (dos honorários de advogado) constitui critério de cálculo, e não mera questão aritmética” (GRINOVER, Ada Pellegrini. “Preclusão. Erro material e erro aritmético” in O processo – estudo e pareceres. São Paulo: DPJ, 2005, p. 445/459).
[117] THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. Vol. I. 38ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 463.
[118] Por certo, evitar-se-iam maiores inconvenientes na fase processual de execução, se dentro do lapso temporal de cinco dias da publicação da decisão gravosa contendo lapso manifesto – contradição entre fundamento e comando do decisum – a parte prejudicada interpusesse o recurso de embargos de declaração, como no caso que se cita: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ERRO MATERIAL. Art. 535, I, do CPC. Incorrendo o acórdão em erro material a evidenciar contradição entre a fundamentação e o comando final, é de se acolher os embargos declaratórios para efetivar a devida correção. Embargos acolhidos” (Embargos de Declaração nº 599242419, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elaine Harzheim Macedo, Julgado em 18/05/1999).
[119] GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 2° Vol. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 235.
[120] Cite-se dentre outros julgados REsp 37217-8/SP (4ª Turma, j. em 19/10/1993, Rel. Min. Dias Trindade) – em interessante passagem à luz da legislação até então de regência faz a distinção entre considerar as condições da ação e os pressupostos processuais como matéria de ordem pública e não assim a prescrição; REsp 57534/SP (1ª Turma, j. em 15/05/1995, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha) – citando inúmeros outros precedentes e bases doutrinárias que forçaram o julgador a modificar seu próprio convencimento quanto à possibilidade de a prescrição ser invocada em outro momento que não a contestação, inclusive em apelação, caso o magistrado ainda não tenha apreciado a questão (no mesmo sentido REsp 12402/DF, 2ª Turma, j. em 27/04/1994, Rel. Min. Américo Luz); REsp 15386/SP (4ª Turma, j, em 06/04/2000, Min. Cesar Asfor Rocha) – em que confirma seu posicionamento no sentido de se, ao proferir despacho saneador, o juiz rejeita o pedido formulado pela ré referente à preclusão da ação, e não havendo recurso desta decisão, opera-se preclusão quanto a tal matéria, por isso mesmo que não pode mais ser reaberta sua discussão em sede apelatória (no mesmo sentido REsp 432950/RN, 6ª Turma, j. em 19/09/2004, Rel. Min. Hamilton Carvalhido).
[121] GOMES JR., Luiz Manoel. “Prescrição – invocação a qualquer tempo art. 193 CC e a preclusão processual” extraído do site: http://www.prgo.mpf.gov.br/informativo/info75/corpo.htm. Acesso em: 20 out. 2007; BARBOSA MOREIRA, J. C. “Aspectos da extinção do processo conforme o art. 329 CPC” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 267/269.
[122] Senão vejamos os seguintes excertos do julgado: “(...) para ser declarada a prescrição de ofício pelo juiz, basta que se verifique a sua ocorrência, não mais importando se refere-se a direitos patrimoniais ou não (...)”; acrescentando-se que “por ser matéria de ordem pública, a prescrição há de ser declarada de imediato, mesmo que não tenha sido debatida nas instâncias ordinárias”.
[123] CIANCI, Mirna. “A prescrição na Lei n° 11.280/2006” in Revista de Processo n° 148 (2007): 32/45.
[124] Falando em tradição histórica da prescrição no nosso ordenamento, registrava o magistrado trabalhista Cláudio de Menezes, no início da década de 90, que a prescrição sempre foi enfrentada como matéria de defesa e elencada como questão de mérito, devendo ser invocada pelo réu com a contestação, sob pena de se tornar preclusa a arguição (MENEZES, Cláudio Armando Couce de. “A prescrição e os princípios da eventualidade e da efetividade” in Repertório IOB de Jurisprudência n° 40 (1993): 185/186).
[125] Realmente, criticando veementemente a inovação processual, o palestrante chega ao ponto de indicar como única solução devida, para o bem da harmonia do diploma processual com o civilista, a revogação imediata da Lei n° 11.270/2006 no que tange à genérica previsão da prescrição ex officio (FABRICIO, Adroaldo Furtado. “Prescrição e sua declaração ex officio pelo juiz (Lei n° 11.280/06)”, palestra proferida no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFRGS, em 05/05/2006, na II Jornada de Processo e Constituição – Reformas Processuais – em homenagem ao Ministro do STJ Athos Gusmão Carneiro).
[126] ALVIM, Arruda. “Lei n° 11.280, de 16.02.2006: análise dos arts. 112, 114 e 305 do CPC e do § 5° do art. 219 do CPC” in Revista de Processo n° 143 (2007): 13/25.
[127] CÂMARA, Alexandre Freitas. “Reconhecimento de ofício da prescrição: uma reforma descabeçada e inócua” Disponível em: http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigosf/Camara_presc.doc. Acesso em 18/11/2007.
[128] FABRICIO, Adroaldo Furtado. “Prescrição e decadência” palestra proferida no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFRGS, em 04/07/2006, para o curso de especialização em Direito Civil da UFRGS.
[129] ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 21.
[130] “(...) Nada impede que as partes representem ao magistrado sobre a conveniência de ele próprio rever, valendo-se do poder de fazê-lo de ofício, as decisões a cujo respeito tenha-se formado preclusão para os litigantes mas não para ele” (ARAGÃO, E. D. Moniz. “Preclusão (processo civil)” in Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda, coordenador Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 182/183).
Advogado do Escritório de Direito Social. Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica. Mestre em processo civil pela UFRGS. Professor da Graduação e Pós-graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis - UNIRITTER, Laureate International Universities. Professor Colaborador da Escola Superior de Advocacia - ESA/RS. Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul - CETRA-Imed. Professor convidado de cursos de Pós-graduação latu sensu. Colunista e Articulista de revistas especializadas em processo civil, previdenciário e trabalhista.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RUBIN, Fernando. As matérias não sujeitas à preclusão para o estado-juiz Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 maio 2013, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/34989/as-materias-nao-sujeitas-a-preclusao-para-o-estado-juiz. Acesso em: 23 dez 2024.
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