Com a intensificação do comércio internacional, portanto, urge a necessidade de, paralelamente à estrutura estatal, utilizar instrumentos alternativos para a solução de litígios que eventualmente surjam de determinada relação jurídica.
Para tanto, a negociação, a conciliação, a mediação e a arbitragem desempenham importante papel nesse cenário. Contudo, dentre os mencionados mecanismos, o principal é a arbitragem, instituto por meio do qual se submete a terceira pessoa, neutra na relação jurídica, a solução de determinada controvérsia.
Huck esclarece que[1]:
Louvada como fórmula comercial para a solução de problemas eminentemente comerciais, a arbitragem tem sido apontada como dos mais eficientes instrumentos para a elaboração de uma nova lex mercatoria, desvinculada das legislações nacionais, fruto exclusivo da constante prática do comércio entre as nações.
A arbitragem, já muito utilizada na esfera internacional, constitui-se em um dos instrumentos mais antigos de resolução de controvérsias desde a antiga Grécia, envolvendo questões de limites entre as cidades-estados[2].
Para Rozas[3]:
Apoyado por la expansión del comercio y las inversiones transnacionales, así como por el cambio em los esquemas de crecimiento econômico, el arbitraje se há convertido en el método normal para resolver definitivamente litígios comerciales internacionales.
O seu desenvolvimento no âmbito internacional pode ser creditado ao intenso intercâmbio internacional provocado pela globalização, configurando-se numa realidade inconteste, tendo sido muito utilizada nas relações econômicas tanto nacionais como internacionais[4].
Nesse sentido, no âmbito do comércio internacional, a arbitragem precisou ultrapassar alguns obstáculos que a consolidaram e influenciaram a descortinar soluções específicas e a conduzir ao ponto máximo as consequências de seus princípios[5].
Klausner, por sua vez, afirma que a arbitragem evoluiu ao ponto de ser adotada por todos os países do mundo em suas legislações internas, viabilizando o reconhecimento, a homologação e a execução do laudo arbitral pela justiça estatal[6].
Segundo Rozas[7]:
En todos los Estados de América Latina se observa un considerable avance del arbitraje incluso en aquéllos donde há habido una hostilidad a la institución que no solo es fruto de un período periclitado, sino que ha conservado uma cierta continuidad.
A arbitragem traz como uma das principais características a capacidade de permitir uma verdadeira composição da lide, pois a partir do momento em que as partes decidem, espontaneamente, submeter uma questão sob discussão a um determinado meio alternativo de solução já demonstra, por si só, a predisposição em aceitar a decisão proferida pelo árbitro escolhido.
Um dos destaques da opção pela arbitragem está sedimentado no fato de que as partes são livres para escolher não apenas os julgadores, mas o próprio direito para dirimir o conflito.
Nesse sentido, Krauss afirma que o poder de dizer o direito não é prerrogativa exclusiva do Estado, sendo facultado às partes, segundo a autonomia da vontade, afastar o conflito do conhecimento do Poder Judiciário[8].
O principio da autonomia privada, portanto, caracteriza-se pelo poder de os particulares regularem, pelo exercício de sua própria vontade, as relações de que participam, estabelecendo-lhes o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica à qual queiram se submeter, limitando-se apenas por aspectos de ordem pública e leis impositivas[9].
De acordo com Strenger, duas características diferenciam essencialmente a arbitragem dos demais institutos, quais sejam, o poder de decidir que está afeto aos árbitros e o acordo de vontade das partes em submeter determinado problema ao Tribunal ou Juízo de Arbitragem, que poderá concretizar-se por meio da cláusula compromissória ou do compromisso arbitral[10].
O traço marcante que distingue a cláusula compromissória do compromisso arbitral toma por base o momento de surgimento do conflito, ou seja, para casos futuros ou presentes.
A cláusula compromissória será convencionada em determinado contrato para resolver eventuais divergências futuras, ao passo que o compromisso arbitral será estipulado para por fim a litígio atual e já existente, devendo ambos, porém, serem formalizados por escrito[11].
Certos ordenamentos, como o do Paraguai, por exemplo, não diferenciam a cláusula compromissória do compromisso arbitral, resumindo-se em estabelecer que a origem do processo arbitral pode ocorrer por meio de contrato ou ato posterior[12].
A arbitragem comercial internacional está regulada por um verdadeiro aparato transnacional, incluindo-se convenções internacionais, leis internas, usos e costumes, bem assim instituições sólidas e respeitadas[13].
Dentre as inúmeras normas sobre arbitragem existentes, por exemplo, destacam-se: o Protocolo de Genebra, de 1923; a Convenção de Nova Iorque, de 1958; a Convenção de Washington, de 1965; a Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional do Panamá, de 1975; a Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros de Montevidéu, de 1979; A Lei-modelo sobre Arbitragem Comercial da UNCITRAL.
A Comissão das Nações Unidas para o Desenvolvimento do Direito Comercial Internacional (UNCITRAL), a propósito, desenvolveu uma Lei Modelo sobre Arbitragem, no intuito de harmonizar as legislações de vários países[14].
Após definir a arbitragem como a técnica que tem por fim a solução de controvérsias por um ou mais árbitros eleitos mediante acordo de vontade das partes envolvidas, não pairam dúvidas acerca da sua natureza de pacificação social, sem interveniência do Estado, passando-se a tecer agora algumas considerações sobre as distinções das modalidades existentes.
[1] HUCK, Hermes Marcelo. Contratos com o Estado. Aspectos de direito internacional. São Paulo: Aquarela, 1989, p. 122.
[2] CRETELLA NETO, José. Curso de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 6.
[3] ROZAS, José Carlos Fernandes. América Latina y el arbitraje de inversions: ¿Matrimonio de amor o matrimonio de conveniencia? Revista de la Corte Española de Arbitraje, vol. 24, 2009, p. 17. Disponível em: <http://eprints.ucm.es/9260/1/RCEA_2009__MATRIMONIO_DE_AMOR.pdf.>. Acesso em: 17 jan. 2011.
[4] STRENGER, Irineu. Arbitragem comercial internacional. São Paulo: LTr, 1996. p. 128.
[5] LOBO, Carlos Augusto da Silveira; ALMEIDA, Ricardo Ramalho (Coord.). Arbitragem interna e internacional: questões de doutrina e da prática. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 09.
[6] KLAUSNER, Eduardo Antônio. A arbitragem na solução de conflitos decorrentes de contratos nacionais e internacionais de consumo. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 646, 15 abr. 2005. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/6564.>. Acesso em: 1 maio 2011.
[7] ROZAS, 2009, p. 17.
[8] KRAUSS, Merly Lysett. Reconocimento y execucion del laudo arbitral internacional en el Mercosur. Revista Brasileira de Direito Internacional, Curitiba, v. 2, jul./dez. 2005.
[9] STRENGER, 1996, p. 25.
[10] STRENGER, Irineu. Comentários à Lei Brasileira de Arbitragem. São Paulo: LTr, 1998. p. 22.
[11] PAULA, Adriano Perácio de. Da Arbitragem nas Relações de Consumo. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 32, 1999.
[12] PUCCI, Adriana Noemi. A arbitragem nos países do Mercosul. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 86, v. 738, p. 41-55, abr. 1997.
[13] LOBO, Carlos Augusto da Silveira; ALMEIDA, Ricardo Ramalho (Coord.). Arbitragem interna e internacional: questões de doutrina e da prática. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 05
[14] LEMES, Selma M. Ferreira e al. Aspectos fundamentais da lei de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.103.
Procurador Federal. Mestre em Direito Internacional pela Universidade Católica de Brasília. Chefe de Licitações, Contratos Administrativos e Matéria de Pessoal da Procuradoria Federal junto à Agência Nacional de Transportes Aquaviários em Brasília/DF. Ex-Chefe da Seção de Consultoria e Assessoramento da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS em São Luís/MA. Ex-Chefe da Divisão de Patrimônio Imobiliário da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS em Brasília/DF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TARCíSIO GUEDES BASíLIO, . Os métodos alternativos de solução de conflitos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 jul 2013, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35855/os-metodos-alternativos-de-solucao-de-conflitos. Acesso em: 23 dez 2024.
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