Coautora: Aldara Martina Lopes Vieira Leite*
RESUMO: O presente trabalho internar-se no objetivo voltado a apresentar as principais inovações trazidas pela Lei nº. 12.433/2011 ao instituto da remição da pena, com a ampliação do estudo como forma de remir os dias de condenação, pondo fim as discussões existentes e preconizando o que já vinha sendo entendido pela maioria dos juízes e tribunais. O trabalho também faz referência à omissão deixada pelo legislador no que concerne a limitação temporal de perda dos dias remidos em razão do cometimento de falta grave e preconiza pela necessidade de estabelecimento legal visando a observância aos princípios da legalidade e da segurança jurídica aplicáveis também ao processo de execução penal.
Palavras-chave: Remição da pena. Omissão. Falta grave. Execução Penal.
1 INTRODUÇÃO
Não há que se negar que a Lei nº 12.433/2011, trouxe a baila jurídica de execução penal uma inovação impar de beneficio ao condenado que pretende voltar mais cedo ao mundo extra grade, uma vez que ampliou o instituto da remição da pena pelo estudo, dando oportunidade aqueles que não tendo trabalho pra desenvolver no cárcere, talvez pela falta de habilidade ou até mesmo de aptidão para algum oficio, possa ter sua pena diminuída em razão do estudo, na mesma proporção do trabalho, uma vez que se três dias de trabalho pode remir um de pena, três de estudo fracionado em quatro horas diárias, ou doze horas no total, também pode remir o mesmo tempo, ou seja, um dia de pena.
Essa inovação veio indubitavelmente aprimorar o interesse do Estado em ver os cárceres menos populoso, tendo em vista, que deu incentivo ao condenado a trabalhar ou estudar e até executar os dois cumulativamente, caso haja compatibilidade e todas essas ocupações podem remir a pena ao mesmo tempo, abrangendo, inclusive, os apenados que cumpre pena no regime aberto ou semiaberto e até mesmo, os que estejam em liberdade condicional, porém, para estas especialidades, a remição não se comunica com o trabalho, somente com o estudo, o que para nós, o instituto restou falho, por dar tratamento diferenciado a apenados que esteja na mesma situação. In verbis, art. 126, § 6º da LEP:
Art. 126 ...
§ 6º - O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011). Grifei.
Vê-se, portanto, que mesmo não incluindo o trabalho como fator de remição para condenado na situação mencionada dos regimes aberto, semiaberto ou no período de prova condicional, se percebe um avanço no processo de execução da pena privativa de liberdade, uma vez, que o tempo remido, será considerado como pena cumprida para todos os efeitos.
Destarte, mesmo com toda essa “benevolência” do legislador em facilitar ou proporcionar a disciplina do apenado na busca de ressocialização, com tais concessões, em razão dos diversos princípios que norteiam a execução da pena e o estudo do instituto da remição, é peculiar apresentar as alterações feitas ao referido instituto por meio da Lei nº. 12.433/2011 além de mostrar a omissão deixada pelo legislador no art. 127 da LEP no que tange ao limite temporal da aplicação da sanção de perda dos dias remidos em virtude do cometimento de faltas graves pelo sentenciado.
O instituto da remição da pena presente na lei nº. 7.210/1984, Lei de Execução Penal, quando implantado tinha por escopo a redução do cumprimento de pena do condenado apenas através do trabalho com o fim de reinseri-lo socialmente, onde, a cada três dias trabalhados o condenado diminuía um dia de sua pena.
Entretanto, essa possibilidade de remição de pena era muito restrita, tendo em vista que o legislador permitia unicamente a remição por meio do trabalho, o que gerava muitas divergências doutrinárias e jurisprudenciais, pois se questionava sobre a possibilidade de haver a remição por meio do estudo.
As opiniões que se diziam contrárias à aplicação da remição por meio do estudo, fundamentavam seus pensamentos na justificativa de que se o legislador realmente tivesse pretendido estender a remição por meio do estudo, o teria feito quando da confecção da LEP. Já as opiniões que eram a favor, baseavam-se no fundamento de que a Lei de Execução Penal não proibia expressamente a remição da pena através do estudo e, portanto, sendo esta omissa seria possível a aplicação da analogia in bonam partem, fazendo-se uma interpretação extensiva que apenas beneficiaria o condenado, já que no Direito Penal é impossível apenas a analogia que agrave a situação do apenado.
Nesse sentido, os magistrados e os tribunais vinham se posicionando, como pode se verificar pela concessão de um Habeas Corpus concedido pelo STJ por sua sexta turma em 2005, senão vejamos:
HABEAS CORPUS. FREQUÊNCIA A CURSO OFICIAL DE ALFABETIZAÇÃO. REMIÇAO PELO ESTUDO. POSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. Sendo um dos objetivos da lei, ao instituir a remição, incentivar o bom comportamento do sentenciado e a sua readaptação ao convívio social, a interpretação extensiva se impõe no presente caso, considerando-se que a educação formal é a mais eficaz forma de integração do indivíduo a sociedade. 2. Precedente. 3. Ordem concedida (STJ; HC 43. 668; Proc. 2005/0068885-9: SP; Sexta turma, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa; Julg. 08/11/05; DJE 28/11/05).
Em conseqüência desses posicionamentos e entendimentos, o STJ editou a súmula de nº. 341, assegurando que “a frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo da pena sob o regime fechado ou semiaberto”.
Nesse sentido, Távora e Alencar (2012, p. 1360), assim declara:
A atividade de estudo do apenado, objeto do reconhecimento do direito à remição da pena, deverá ser de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional. Tal possibilidade de remir a pena pelo estudo veio expressamente prevista na Lei de Execução Penal com a nova redação dada ao inciso I, do seu art. 126, pela Lei n.º 12. 433/2011, contemplando o que já preconizava a doutrina e a jurisprudência.
Portanto, apesar da existência da súmula sobre o tema e de os Tribunais e Magistrados seguirem tal entendimento, o legislador cuidou de modificar, através da lei nº. 12.433/2011, o art. 126 e seguintes da Lei de Execução Penal que tratam sobre o instituto da remição da pena, com a finalidade de tornar legal a possibilidade da remição da pena através do estudo. Nessa linha, faz-se necessário a análise das principais modificações.
De acordo com o art. 126 da LEP, “o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena”.
Sobre o instituto da remição, Capez (2011, p. 102) informa:
Remição é o direito que o condenado em regime fechado ou semiaberto tem de remir, pelo trabalho ou pelo estudo, parte do tempo de execução da pena. A lei 12.433, de 29 de junho de 2011, trouxe inúmeras inovações ao instituto da remição, ampliando o benefício para abarcar também a atividade estudantil.
Historicamente, a concepção de trabalho quando do cumprimento de uma pena estava relacionada à idéia de imposição de castigo aqueles que haviam cometido algum tipo de delito, sendo a forma mais grave e aflitiva de cumprir a pena imposta pelo Estado.
Entretanto, atualmente, em especial na Lei de Execução Penal Brasileira, o trabalho realizado pelo sentenciado não tem o caráter de punição, muito menos de castigo, mas sim é utilizado como uma das formas de se alcançar a finalidade da execução da pena, qual seja, o de reabilitá-lo e de reinseri-lo no seio da sociedade.
Sobre a remição pelo trabalho, eis a lição de Marcão (2012, p. 215):
Pelo trabalho pressupõe responsabilidade, organização e disciplina. Para fins de remição não é diferente, já que é preciso incutir tais valores na mente e na rotina do executado, como forma de readaptá-lo à vida ordeira, dentro dos conceitos de uma sociedade produtiva.
Nessa mesma linha de pensamento, Costa Jr. e Costa (2010, p. 219), assim expressam:
É notório o papel fundamental que a alfabetização e, sobretudo, a cultura desempenham na ressocialização do recluso. Proporcionando a consciência da ilicitude e reforçando os freios inibitórios, a cultura que venha o presidiário a adquirir irá contribuir substancialmente no combate ao crime e na recuperação do criminoso. O fato independe de demonstração estatística, por ser evidente.
Quanto à remição da pena pelo estudo, seu principal objetivo é incentivar a recuperação dos sentenciados por meio do seu desenvolvimento intelectual. Esse benefício é concedido aos apenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto, assim como dispõe o caput do art. 126 da LEP.
Deve-se ressaltar que o § 6º do citado art. 126 estabelece a possibilidade de remição pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, tanto para os que se encontram em regime aberto, semiaberto quanto para os que estão usufruindo da liberdade condicional observada as exigências da própria lei.
Sobre a remição através do estudo, assevera Machado (2012, p. 855):
Tais atividades escolares poderão ser desenvolvidas tanto na forma presencial quanto pela metodologia do ensino a distância, e deverão ser formalmente certificadas pelas autoridades educacionais. A remição, portanto, decorre do estudo formal, e o sentenciado deve comprovar mensalmente a sua frequência e também o seu aproveitamento escolar, isto é, o desempenho em provas e avaliações (art.129, §1º, LEP).
Ainda é importante frisar que o § 7º do art. 126 da LEP também estabelece a possibilidade de remição pelo estudo aos presos cautelares. Nesse caso, o abatimento ficará dependendo de eventual condenação.
A Lei de Execução Penal deixa expressamente previsto que a cada três dias de trabalho, o condenado terá direito a diminuir um dia de sua pena. E, no caso do estudo, a cada doze horas, será abonado um dia de sua condenação.
Nesse sentido, Távora e Alencar (2012, p. 1359), explicam:
A remição consiste no direito do condenado que cumpre pena no regime fechado ou semiaberto abater, pelo trabalho ou pelo estudo, parte do tempo da execução da pena, cuja contagem será feita à razão de:
(1) 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
(2) 1 (um) dia de pena por 3 (três) de trabalho (inciso II, § 1º, do art.126, da LEP, coma redação dada pela Lei 12. 433/2011).
Para fins de remição, o trabalho a ser exercido pelo condenado pode-se dá internamente ou externamente. Será interno o trabalho quando o apenado desempenhar suas funções laborais dentro do próprio estabelecimento prisional em que se encontra. Esses trabalhos geralmente são para a manutenção e funcionamento do próprio estabelecimento prisional, como os realizados na limpeza, na cozinha etc. Nessa senda aduz Capez (2011, p. 32):
O trabalho do condenado dentro do estabelecimento deve atender às suas aptidões físicas e mentais, evitando, assim, os possíveis antagonismos entre a obrigação de trabalhar e o princípio da individualização da pena (item 58, 1ª parte, da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal).
Quanto ao trabalho externo, esse pode ser desenvolvido em serviços ou obras públicas, como também em empresas particulares, dependendo, nestas hipóteses, da autorização da direção do estabelecimento e da verificação de aptidão do sentenciado, conforme a previsão do art. 36 da LEP.
Sobre o procedimento a ser observado quando da aquisição da remição por meio do estudo, a Lei nº. 12. 433/2011 veio pôr fim a celeuma existente sobre o tema, dirimindo as diversas dúvidas de como seria a contagem e aplicação desse instituto que até então causava insegurança jurídica e desigualdade de aplicação para os condenados. A respeito do tema, ensina Nucci (2011, p. 1040):
Em relação ao estudo, a carga é fixa por dia: quatro horas. Entretanto, nada impede que o preso estude por oito horas diárias, comprovadas por frequência a dois cursos simultaneamente desenvolvidos. Nesse caso, terá direito ao cálculo de dois dias de estudo a cada 24 horas, em que tiver a carga horária de oito horas diárias. Aliás, pode o preso trabalhar e estudar concomitantemente, desde que os horários sejam compatíveis (art. 126, § 3º, da LEP) e a remição será cumulada.
O legislador impôs um limite na distribuição das horas de estudo para que o sentenciado possa conseguir a remição. Para que o apenado consiga remir um dia de sua pena será necessário que esse obtenha doze horas de estudos adquiridas pelo menos em três dias de estudo.
É importante ressaltar a possibilidade trazida pela citada lei, da cumulação de remição pelo trabalho e pelo estudo para fins de abonação da pena, observando-se o que dispõe o § 3º do art. 126, da LEP estabelecendo que “para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem”, de forma que uma não se sobreponha a outra (4 horas diárias de estudo ou 8 horas de trabalho, ou seja, 1 hora de estudo equivale a duas horas de trabalho).
Quanto as formas de estudo abrangidas, o art. 126, § 1º, I e § 2º da LEP estabelecem que o estudo pode ser em ensino fundamental, médio, até mesmo o profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional. Esses estudos podem ser desempenhados pela forma tradicional que é a presencial, ou a distância, onde, em ambas as formas deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.
Complementando as disposições sobre a remição pelo estudo, o § 5º do art.126 da LEP, acrescido pela lei reformadora, criou uma espécie de bônus ofertado ao sentenciado caso este, durante o tempo de cumprimento da pena, alcance a conclusão de ensino fundamental, médio ou superior, o que lhe dará direito a acrescer 1/3 (um terço) a mais do tempo remido.
Nesse sentido, diz Távora e Alencar (2012, p.1360):
O tempo a ser remido em função das horas de estudo será incrementado com um acréscimo de 1/3 (um terço) na hipótese do apenado concluir com aproveitamento o ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena. Como condição para a aplicação dessa remição bonificada, a lei exige que a conclusão do ensino aludido seja certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
Essa medida é conhecida como remição formatura, remição acrescida ou remição da remição e visou dar um maior estímulo ao sentenciado para que esse se dedique mais aos estudos e, consequentemente, tenha maior facilidade de ser reinserido socialmente.
Vislumbrando a possibilidade de acontecimento de acidente o legislador previu que caso o sentenciado fique impossibilitando, em razão do acidente, de trabalhar e/ou estudar, estando esse desempenhando uma dessas atividades, “continuará a beneficiar-se com a remição”, assim dispõe o § 4º do art. 126 da Lei de Execução Penal.
Trata-se, pois, de um fato justificador, onde o apenado em virtude de circunstâncias não desejadas encontra-se impossibilitado de exercer seja a atividade laborativa ou de estudo, então o legislador prevendo essas situações imprevisíveis entende não ser razoável a aplicação da suspensão da contagem do tempo de remição.
A remição da pena seja pelo trabalho ou pelo estudo é assegurada ao condenado que esteja cumprindo pena em regime fechado ou semiaberto (caput, art. 126, LEP).
Outra possibilidade, e, nesse caso ampliação trazida com a edição da lei reformadora, foi a possibilidade de remição, pelo estudo, aqueles que se encontram em regime aberto ou em liberdade condicional (art. 126, § 6º, LEP).
Estendeu-se a possibilidade de remição durante a prisão cautelar, devendo-se ressaltar que esse desconto somente haverá caso o acusado seja condenado posteriormente (art. 126, § 7º, da LEP c/c art. 42 do CP).
Sabendo-se que a remição é um direito público subjetivo do sentenciado, quando este preencher todos os requisitos exigidos legalmente para a concessão da remição, o órgão julgador deverá declarar os dias remidos, assim como estabelece o art. 126, § 8º da Lei de Execução Penal.
A comprovação dos dias remidos deve ser feita através da declaração pela autoridade competente, onde o art. 129 da LEP institui que “a autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando”.
Estando o juízo de execuções penais abastado da documentação necessária expedida pela autoridade administrativa competente, seguirá para análise desta, onde, após manifestação do Ministério público e da defesa, fará a declaração dos dias remidos. No que se refere a essa declaração, ao citado artigo, foi inserido a participação do defensor do apenado quando da comprovação dos dias remidos, fazendo com que se torne de forma mais expressiva a existência do princípio do contraditório e da ampla defesa além de garantir uma maior fiscalização na realização do cômputo.
No que se refere a contagem do tempo remido havia, antes da edição da Lei nº. 12.433/2011, divergência quanto a forma a ser utilizada para o abatimento dos dias remidos. Os cálculos eram feitos por meio de duas posições que geravam insegurança jurídica e feria o princípio da igualdade que deve ser garantido a todos os sentenciados.
A primeira delas estabelecia que o tempo remido deveria ser somado ao tempo da pena cumprida, através da sentença prolatada pelo juiz competente, onde o número de dias cumpridos até o momento eram somados juntamente com os dias remidos para que fosse considerada como pena cumprida, de forma que do resultado do abatimento poderia ser utilizado para ulterior requerimento de benefícios.
A segunda posição estabelecia que o tempo remido deveria ser abatido do total da pena aplicada na sentença penal condenatória, ou seja, o tempo fixado na sentença seria diminuído como desconto feito do abatimento dos dias considerados remidos. Como diminuía da pena total, esse cômputo não serviria de base para o requerimento de benefícios, apenas formaria uma nova quantidade de tempo que o condenado deveria continuar a cumprir e, por meio desse resultado seria feito um novo cálculo para que o condenado cumprisse o estabelecido, então, somente a partir daí requerer a concessão de um benefício.
“A primeira posição apontada é a correta e se revela mais benéfica ao sentenciado, mas na prática judiciária não prevalecia, o que terminava por ensejar a interposição de recursos evitáveis”. (MARCÃO; 2012, p. 221).
Pondo fim a essa celeuma existente, a Lei nº. 12.433/2011 estabeleceu no art. 128 da Lei de Execução Penal que “o tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos”. Portanto, fora escolhido pelo legislador a posição mais benéfica aos sentenciados.
O art. 127 da Lei de Execução preconiza que “em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar”.
Entende-se por falta grave aquelas estabelecidas no art. 50 da Lei de Execução Penal, in verbis:
Art.50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:
I – Incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina;
II – fugir;
III – possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem;
IV – provocar acidente de trabalho;
V – descumprir, no regime aberto, as condições impostas;
VI – inobservar os deveres previstos nos incisos II e V do art. 39 desta Lei;
VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao preso provisório.
Estando as possibilidades de falta grave estabelecidas expressamente no referido artigo, tem-se que esse rol é taxativo, não cabendo sua ampliação sob pena de ofensa aos princípios da legalidade e da anterioridade da lei. Entretanto, algumas de suas especificações são verdadeiros vazios, por possuírem conceituações genéricas, que se deixa ao alvedrio da autoridade que determinará o enquadramento da falta cometida pelo sentenciado, como por exemplo a de “subverter a ordem”.
A perda dos dias remidos ocorrerá caso o condenado cometa qualquer das faltas graves, dispostas no art. 50 da LEP, conforme parâmetros que foram estabelecidos pela lei nº. 12.433/2011, onde, antes da edição desta, caso o condenado cometesse alguma falta grave perderia a totalidade dos dias remidos. Sobre o tema, lecionam Távora e Alencar (2012, p.1361):
Caso o apenado seja punido por falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, levando em conta a natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar (art. 127, da LEP, com redação conferida pela Lei nº. 12.433/2011).
Com isso, tem-se que o legislador veio estabelecer o teto de 1/3 (um terço) dos dias remidos, preconizando, assim, uma maior humanização das penas aplicadas aos condenados.
Cumpre ressaltar que a perda por cometimento de falta grave poderá se dar também quando o condenado estiver adquirindo a remição por meio do estudo, sendo uma inovação trazida pela alteração legislativa, já que antes era previsto apenas no caso de trabalho. Pois a função primordial da remição da pena não é a simples redução da pena, mas a readaptação do sentenciado ao convívio social.
Apenas as faltas que forem apuradas de forma devida, observando os princípios do contraditório e da ampla defesa, tanto no procedimento administrativo, quanto no processo judicial, é que poderão ser consideradas como fundamento para a declaração dos dias remidos, sob pena de nulidade. Nesse sentido, Marcão (2012, p. 225), ensina que:
Noticiada nos autos da execução criminal a prática de falta grave, cumpre ao juiz competente designar data para a oitiva do executado, intimando-o para o necessário comparecimento. Embora assegurado o direito ao silêncio constitucional, será essa a oportunidade de justificar-se perante aquele que irá decidir sobre os reflexos de seu comportamento nos destinos do processo executivo. Da audiência de justificação também serão cientificados o representante do Ministério público e o defensor, que deverão pronunciar-se nos autos antes da decisão do juízo.
O procedimento acima indicado não pode ser substituído pela simples valoração judicial da sindicância realizada pela direção do estabelecimento prisional visando a apuração da falta.
Quando o juiz competente for declarar a perda dos dias remidos, além de observar os princípios constitucionais devidos ao processo, será preciso levar “em conta a natureza, os motivos, as circunstâncias e as conseqüências do fato, bem como a pessoa do faltoso e o seu tempo de prisão consideradas as condições pessoais do condenado”. (art. 57, LEP).
Insta salientar que, com a nova redação do art. 127 da LEP, a aplicação da sanção de perda dos dias remidos pelo magistrado deixou de ser uma aplicação automática passando a constituir uma faculdade do julgador, já que o dispositivo diz que o juiz “poderá” aplicar a sanção após analisar os parâmetros e as condições subjetivas estabelecidas no art. 57 do mesmo diploma legal.
Com efeito, não se deve negar que a alteração desse artigo, instituindo o limite de 1/3 (um terço) para a perda dos dias remidos, trouxe um avanço em relação ao que antes estava disposto, entretanto faz-se necessário salientar que o legislador deixou a desejar a partir do momento em que silenciou quando não definiu até que momento esse desconto será feito, se sobre todo o tempo anterior ao cometimento da falta grave, ou se estabelecerá um momento determinado limitado a meses, dias ou anos dependendo do quantum de dias remidos que tiver o apenado.
Das hipóteses possíveis, pode-se aferir que seria mais condizente o não estabelecimento de tempo, posto que o Poder Judiciário não tem a função legiferante para fazer as vezes do Poder Legislativo, sob pena de ingerência de um poder em outro e ferir o princípio da independência entre os poderes preconizados no art. 2º da nossa Carta Suprema. Então, entende-se que o julgador não poderá estabelecer um lapso temporal, apenas deverá observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade quando for aplicar a revogação dos dias remidos, até a edição de uma lei que venha a regulamentar a omissão.
Vislumbra-se, pois, uma lacuna que dá azo a existência de uma nova celeuma em cima da limitação temporal quando da aplicação da sentença, de forma que as divergências existentes e a falta de regulamentação deixará a cargo do juiz a função de estabelecer o limite.
Sobre essa limitação, vejamos o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:
AGRAVO EM EXECUÇÃO. FALTA GRAVE. REVOGAÇÃO DO TEMPO REMIDO. PARTE RECORRENTE QUE SE INSURGE CONTRA DECISÃO QUE LIMITOU A PERDA DE 1/3 (UM TERÇO) DOS DIAS REMIDOS AOS 12 (DOZE) MESES ANTERIORES À INFRAÇÃO DISCIPLINAR COMETIDA PELO APENADO. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. Agravado que tem contra si um extenso histórico de condenações por crimes praticados, que lhe rendeu uma pena de 13 (treze) anos de reclusão. Com o advento da Lei nº 12.433/2011, o artigo 127 da LEP teve a sua redação modificada, com a possibilidade do magistrado revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o artigo 57 da Lei nº 7.210/84, cujas disposições depõem contra o agravado. O limite estabelecido pelo legislador se resume à perda de até 1/3 da totalidade do tempo remido, não havendo, pois, nenhuma regra aplicável ao instituto da remição que determine a limitação temporal aplicada pela douta magistrada. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. (TJRJ; Agr. Exec. 007057089.2012.8.19.0000; proc. 013374640.1992.8.19.0001; RJ; Oitava câmara criminal; Rel. Des. Claudio de Tavares de Oliveira Júnior; Julg. 21/02/2013).
Aqui o Representante do Ministério Público interpôs um agravo de execução contestando a conduta da magistrada que estabeleceu um limite temporal de 12 meses anteriores ao cometimento da infração para que houvesse o desconto dos dias remidos.
Ainda em sede do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:
AGRAVO DE EXECUÇÃO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. COMETIMENTO DE FALTA GRAVE. DECISÃO DA VEP QUE DECLAROU A PERDA DE 1/3 DOS DIAS REMIDOS AOS ÚLTIMOS 12 MESES DA PENA DO CONDENADO. ILEGALIDADE. PROVIMENTO DO RECURSO. O processo de execução da pena deve ser dinâmico, sempre sujeito a mutações ditadas pela resposta do condenado ao tratamento penitenciário O instituto da remição encerra a caracterização de benefício legal, postado ao abreviamento, pelo trabalho ou estudo, do cumprimento da sanção penal imposta. A prática de falta grave enseja a perda de até 1/3 sobre a totalidade dos dias remidos (LEP, art. 127), sendo ilegal qualquer restrição temporal imposta ao objeto dessa perda. (TJRJ; AgE 0070183-74.2012.8.19.0000; Proc. 0139840-04.1992.8.19.0001; Terceira turma; Rel. Des. Carlos Eduardo Roboredo; Julg. 29/01/2013). (Destaque nosso)
Por esses julgados, é possível enxergar que nas decisões de primeiro grau os juízes estabeleceram um limite de tempo anterior à infração disciplinar cometida pelo sentenciado, e que, em sede de recurso interposto pelo Ministério Público questionando a impossibilidade de estabelecimento desse limite, o juízo ad quem entende pela falta de regulamentação legal do estabelecimento do tempo, e consequentemente pela ilegalidade desta, reformando, assim, a decisão proferida pelo juízo do primeiro grau.
Conquanto a existência dessa omissão, pelos julgados ora expostos, tem-se que o entendimento dos juízos de segundo grau tem sido no sentido da não existência de limite temporal.
Portanto, apesar de todas as inovações e modificações trazidas pela lei nº. 12.433/2011 ao instituto da remição da pena terem resolvido muitas das controvérsias e obscuridades que existiam, o legislador deixou uma omissão no art. 127 da LEP fazendo com que surgisse discussões quanto ao estabelecimento de um limite temporal para aplicação do desconto dos dias remidos. Ante essa omissão, torna-se cogente uma nova modificação desse dispositivo, para que esse limite seja estabelecido, tendo em vista a falta de disposição legal que ancore o estabelecimento de limite temporal e para que seja garantida a segurança jurídica e sejam respeitados os princípios da legalidade e da isonomia preconizados na execução penal.
8 CONCLUSÃO
O instituto da remição da pena, originária do direito penal espanhol, fora inserido na legislação brasileira através da Lei de Execuções Penais que previa a possibilidade de remição da pena por meio do estudo, como forma de instigar o sentenciado a participar das atividades desenvolvidas nos estabelecimento prisionais, com o fim de prepará-lo para o retorno ao convívio social.
Entretanto, esse instituto passou por significativa mudança com a edição da Lei nº. 12.433/2011, o que fora objeto desse estudo. A novel lei inseriu a possibilidade do estudo como forma de remição da pena, já que vinha sendo alvo de muitas discussões e controvérsias entre juízes e tribunais, pois apesar de a maioria deles entenderem pela possibilidade, outra parte não conseguia vislumbrar sob o fundamento da falta de previsão legal.
Assim, conclui-se que a remição da pena trata-se de um instituto de grande importância para a reinserção do sentenciado ao meio social, por proporcionar a este o desenvolvimento intelectual, social e ético proporcionando-lhe uma preparação para o reingresso na sociedade, além de acelerar a execução da sua pena. Finalizando ainda, tem-se que a lei 12.433/2011 veio por fim a muitas discussões e obscuridades que existiam no instituto da remição da pena, entretanto deixou a desejar no art. 127 por ter sido omisso quando da necessidade do estabelecimento de um limite temporal para o desconto dos dias remidos anteriores ao cometimento de falta grave, com isso, entende-se pela necessidade de uma nova alteração do art. 127 da LEP visando a solucionar a omissão existente, para que não haja tratamento disparitário de forma que não se permita o estabelecimento de tempo para uns sentenciados e pra outros não, sob pena de afrontar os princípios da legalidade, segurança jurídica e da isonomia, que também embasam a execução penal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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______. Lei nº. 12.433, de 29 de junho de 2011. Altera a Lei nº. 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12433.htm>. Acesso em: 14 mai. 2013.
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Nota:
Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Museu Social Argentino - UMSA - AR, (2013), Especialista lato sensu em Direito Fiscal e Tributário pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro - UCAM - RJ (2003). Possui graduação em nível de Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal da Paraíba (2001). Atualmente é Professor efetivo de Direito Penitenciário e Prática Jurídica da Universidade Federal de Campina Grande, Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais - CCJS/UFCG, Advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil e Sargento da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Estado da Paraíba.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Iranilton Trajano da. Inovações trazidas pela Lei N.º 12.433/2011 ao instituto da remição da pena e a omissão legislativa do Art. 127 da LEP Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jul 2013, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35974/inovacoes-trazidas-pela-lei-n-o-12-433-2011-ao-instituto-da-remicao-da-pena-e-a-omissao-legislativa-do-art-127-da-lep. Acesso em: 23 dez 2024.
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