Plenamente consagrado no direito pátrio, o dano moral ainda encontra certos obstáculos em sua aplicação, principalmente em relação ao quantum de sua fixação, assim sendo, o presente artigo objetiva uma visão mais apurada sobre o tema, desmistificando equívocos e adequando sua real eficácia.
Antes da promulgação da atual Constituição, nosso ordenamento impôs várias resistências ao dano moral, tendo na jurisprudência um de seus maiores obstáculos, seguido pelo STF que o vetava quase por completo, questionando sua aplicação exclusiva.
Em contrapartida, o direito comparado aliado a doutrinadores com uma visão futurística, defendiam sua aplicação e já sinalizavam o fim desta obscuridade, assertiva esta confirmada no entendimento de Agostinho Alvim, antes da promulgação da carta magna de 1988.
“Em doutrina pura, quase ninguém sustenta hoje a irreparabilidade dos danos morais. E assim a obrigação de reparar tais danos vai se impondo as legislações, mais ousadamente aqui, mais timidamente ali, já admitindo-se a reparação, como regra, já, somente, nos casos expressamente previstos”. (ALVIM, 1980, p. 220-221)
Com o advento da Constituição de 1988, o dano moral ganhou seu justo e merecido respaldo, sendo consagrado no artigo 5º, incisos V e X da referida carta, posteriormente pelo Novo Código Civil e de Proteção ao Consumidor, os quais encaram novos obstáculos atualmente, em face de uma suposta banalização, a qual por sua vez, poderia dar ensejo a uma “indústria” do mesmo.
Quando me refiro a esta suposta banalização, de forma alguma estou concordando com sua aplicação limitada, em relação ao quantum de sua majoração, pelo contrário, estou afirmando que esta banalização ocorre quando sua aplicação se dá através de valores ínfimos, baseados em conceitos e idéias absurdas, as quais dão margem a impunidade e descrédito do judiciário, em face de uma sociedade injustiçada e refém, principalmente das grandes corporações.
É inaceitável que certos resquícios do passado, ainda estejam afetando a plena e eficaz aplicação deste instituto atualmente, porém, tal incoerência se verifica nas indagações processuais, influenciando e norteando a linha de raciocínio do judiciário, uma vez que, na presente fase, segundo Youssef S. Cahali, todas as contradições reais e aparentes sobre este instituto, já foram completamente superadas pelo texto constitucional e entendimento sumular. (CAHALI, 2011, p.19).
Desta forma, a aplicação plena e eficaz dos danos morais, jamais se dará enquanto sua majoração for limitada, tendo por base uma suposta banalização do mesmo, antes, será banalizado pelo judiciário em face da sociedade, seguindo esta falaciosa e infundada idéia de “indústria do dano moral”, oriunda das cortes americanas, as quais por sua vez, possuem uma estrutura e sistemática jurídica diferenciada, que em nada se assemelha ao nosso sistema e realidade social.
Os defensores da suposta “indústria do dano moral”, expõem argumentos e alertam sobre esta ameaça, porém, não explicam a sistemática jurídica em que estão se baseando, simplesmente compararam sistemas jurídicos diferentes, entendendo que os resultados serão os mesmos; ledo engano.
Neste sentido, de forma breve e exemplificativa, vale lembrar que o sistema jurídico Anglo-Americano - Common Law, tem como característica principal o conjunto de decisões sobre vários casos análogos, as quais dão origem a regras gerais, diferente de preceitos normativos fixados antecipadamente, como ocorre em nosso sistema, como também, que as questões que envolvem matéria de ordem civil, são julgadas por júri popular, fato este que não ocorre por aqui. [1]
Outro equívoco imperioso a salientar, refere-se a comparação feita com os danos punitivos do sistema americano - punitive damages, com o dano moral de nosso ordenamento, uma vez que, aqueles não visam indenizar danos morais e materiais sofridos, antes, segundo leciona Maria Celina B. de Moraes, possuem caráter punitivo e exemplar, criando uma atmosfera de desestímulo a novas práticas ilícitas, como também, cumprir objetivos de pacificação de acordo com a cultura local. (MORAES, 2003, p.33).
Diferenciado dos danos punitivos do sistema anglo-saxônico, o dano moral de nosso ordenamento possui características próprias, segundo Aguiar Dias ele se caracteriza pelo “efeito não patrimonial da lesão de direito e não a própria lesão, abstratamente considerada” (DIAS, 1987, p.852), ou seja, relaciona-se aos efeitos causados e não somente na lesão em si, portanto, não pode ser mesurado ou majorado de forma ínfima, antes, contemplando o principio da dignidade da pessoa humana, deve estar a altura de todos os aspectos abstratos envolvidos, como também, disciplinando e coibindo novas práticas ilícitas.
Neste sentido, vale ressaltar o descaso que os consumidores enfrentam junto a empresas e grandes corporações, as quais visando somente o lucro, não temem a legislação em vigor, visto que nem todos os lesados procuram seus direitos, como também, pelas irrisórias indenizações, as quais já estão devidamente embutidas no custo final.
Seguindo esta linha de raciocínio, segundo artigo publicado no site da uol em 19/02/2013, as empresas de telefonia receberam várias multas pela inobservância de metas, ou seja, não respeitam as exigências da concessão, quanto mais a consumidores hipossuficientes e reféns deste sistema, porém, só de uma das empresas a ANATEL recebeu R$ 34,2 milhões, mas não repassou um centavo aos consumidores lesados, como também, não houve manifestação alguma dos autores da suposta “indústria” do dano moral, em relação ao valor da multa. [2]
Refletindo sobre isso, se os danos punitivos deram origem a tal “indústria” das indenizações nos USA, por sua vez trouxeram certos benefícios também, fazendo com que empresas e grandes corporações assumissem uma postura de compromisso, respeito e qualidade em relação a seus produtos e serviços, fato este que não ocorre por aqui, devido a limitada importância atribuída ao dano moral de nosso ordenamento.
Fazer conjecturas entre nosso ordenamento e o sistema anglo-saxônico, ignorando o contexto sócio-econômico e cultural, limitando a majoração das indenizações de ordem moral, significa dizer que temos um conjunto de normas para “inglês ver”, ou seja, existe para demonstrar nossas nobres intenções, porém, não é aplicada em sua íntegra visando produzir os efeitos almejados, a não ser para a Administração Pública, a qual recebe elevadas multas as custas da insatisfação e reclamação dos consumidores.
Dentre os poderes da República, o Judiciário vem se destacando em relação à confiança e respaldo junto a população, portanto, de forma alguma pode se omitir em dar uma resposta a altura, em face das lesões que se caracterizam sob o aspecto moral, antes, deve agir visando a justiça social, com base na dignidade da pessoa humana.
Referências Bibliográficas:
ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. São Paulo. Saraiva, 1980.
CAHALI, Yussef Said. Dano moral. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2011.
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, v. 2.
MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à Pessoa Humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
Referências:
1. Common Law e Civil Law. Disponível em: http://direitoelegal.wordpress.com/2008/02/28/common-law-e-civil-law/
2. Disponível em:
http://ne10.uol.com.br/canal/cotidiano/tecnologia/noticia/2013/02/19/anatel-multa-operadoras-por-descumprimento-de-metas-na-telefonia-fixa-399996.php
Bacharel em Adm de Empresas. Bacharel em Direito. Técnico em Transações Imobiliárias;<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VACCARI, Pompilio Isidio. Dano moral, indústria e banalização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jul 2013, 06:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36021/dano-moral-industria-e-banalizacao. Acesso em: 23 dez 2024.
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