RESUMO: O presente trabalho acadêmico visa estabelecer uma conexão interdisciplinar entre os temas indicados. faz abordagem sobre o tema Hierarquia normativa e hermenêutica jurídica a luz da Constituição Federal, relevando a supremacia da norma constitucional quanto a interpretação jurídica nos demais ramos do direito.
PALAVRAS-CHAVE: Hierarquia, Interpretação, direito: constitucional, privado, trabalho, penal.
1 – INTRODUÇÃO
O direito foi dividido em diversas áreas ou ramos para atender e tutelar as mais variadas situações, oriundas de uma sociedade pluralista que possui inúmeros interesses como os públicos, particulares e coletivos. Para tanto o poder legislativo teve que criar normas conforme a demanda exigiu-se, desenvolvendo separadamente cada ramo. Essa situação, no entanto pode acarretar um problema a todo o ordenamento jurídico que é a desconformidade entre normas, ou seja, a divergência entre duas ou mais leis que se chocam diante de uma mesma situação. O controle e harmonia dessas normas dentro de um ordenamento jurídico dependerão da teoria da hierarquia normativa e da hermenêutica constitucional.
2 – HIERARQUIA NORMATIVA.
A teoria da hierarquia do sistema normativo se dá quando colocamos ordem ou nível as leis e atos normativos dentro de um conjunto para que haja respeito e harmonia, de forma que se previna a desconformidade entre elas.
Dentro de um ordenamento jurídico nem todas as normas estão sobre um mesmo patamar ou nível de aplicabilidade. “As normas de um ordenamento são dispostas em ordem hierárquica.” (BOBBIO, 1995, p. 49). Estas se estruturam de forma hierárquica, partindo de uma norma superior genérica, abstrata e fundamental até chegar a uma norma inferior concreta e especifica.
A famosa pirâmide criada por Hans Kelsen é a maior referência sobre o tema, nos mostra uma pirâmide abstrata tendo em seu topo a norma fundamental, da qual as demais retiram seus fundamentos de validade. Temos uma escala normativa que torna as normas inferiores dependentes das superiores, até chegar a uma norma suprema que não depende de nenhuma outra.
Há normas superiores e normas inferiores. As inferiores dependem das superiores. Subindo das normas inferiores àquelas que se encontram mais acima, chega-se a uma norma suprema, que não depende de nenhuma outra norma superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. Essa norma suprema é a norma fundamental. (BOBBIO, 1995, p. 49)
Todas as normas estão inteiramente ligadas dentro de um ordenamento jurídico e sua organização vem através da hierarquia entre elas. As normas superiores tratam de assuntos gerais e as inferiores vão tratar de assuntos específicos sem contradizer as anteriores. Dentro desse ordenamento a norma maior seria a suprema (fundamental), sobre a qual repousa a sua unidade.
É mister entender que a teoria da hierarquia normativa deve ser observada tanto na elaboração legislativa (no ato de criação da norma), quanto na sua aplicabilidade (quando houver choque entre normas válidas). Em ambas torna-se essencial à utilização da hermenêutica jurídica constitucional no intuito de verificar a conformidade com a lei superior.
3 – HERMENEUTICA JURIDICA CONSTITUCIONAL.
Não se trata apenas de hermenêutica jurídica, mas sim de hermenêutica jurídica constitucional. Diz respeito à norma jurídica em relação a sua lei suprema.
O autor Peter Haberle coloca a hermenêutica como teoria da interpretação. Partindo dessa vertente podemos dizer que toda e qualquer norma jurídica deve ser interpretada à luz da Constituição Federal obedecendo todos os seus preceitos e princípios.
Não importa sobre qual área ou ramo do direito nós nos referimos, a norma sempre estará sujeita ao status de inconstitucional se for de desencontro com a Constituição. É claro que como se trata de interpretação, podemos ter uma grande diversidade de visões a depender dos interesses.
Essa reflexão sobre a interpretação constitucional demonstra que, de uma perspectiva funcional-processual, correção funcional da interpretação constitucional leva praticamente a uma diversidade da interpretação constitucional. A interpretação correta depende, pois, de cada órgão, do procedimento adotado, de sua função e de suas qualificações. (HABERLE, 2002, P.52)
Haberle nos mostra que existem várias interpretações sobre o texto constitucional, vindas das mais diversas partes e áreas do direito, no entanto, cabe aos órgãos competentes decidir sobre essa questão atendendo os interesses em geral sem perder a autoridade.
Conclui-se que o direito constitucional é a base de toda ordem normativa sendo os demais ramos do direito, meras ramificações que possuem caráter específico com um vinculo de dependência expresso e subjetivo a depender da interpretação. Em ambos os casos estando sujeitos à nulidade.
4 - QUANTO AO DIREITO PRIVADO.
A constituição não esta restrita apenas ao direito público, está bem acima de qualquer área, atua sobre todos dispositivos legais inclusive sobre o direito privado com vinculação direta.
O direito particular passa a ser vinculado ao direito público, a Constituição passa a condição de tutelar do direito civil, aproximando as duas esferas e colocando os direitos fundamentais no meio das relações particulares. “Conclui-se que a Constituição avoca à condição de tutelar a vida privada; o Código Civil passa a ter, também, caráter político; e a cátedra, de aproximar o direito público do privado, a sociedade do Estado e o direito civil da Constituição.” (CAGLIARI, 2007, p.93). O direito privado não depende apenas da vontade das partes, ele deve ser influenciado pelos princípios e valores constitucionais cumprindo todos seus preceitos fundamentais.
O direito Constitucional regula todas as relações sociais ainda que constituídas por sujeitos privados. “Dito de outro modo, o direito privado não pode entrar em colisão com a Constituição; e também a interpretação que dele se faz deve ser conforme à Constituição.” (CAGLIARI, 2007, p.96). A constitucionalização do direito civil se dá pela vinculação dos particulares aos direitos fundamentais que não constituem uma faculdade e sim uma imposição básica da CF. De tal forma a Constituição não vem no intuito de limitar o direito privado e sim de tratar de lei fundamental de todas as relações sociais sejam elas públicas ou privadas.
5 – QUANTO AS FUNÇÕES DO DIREITO PENAL.
Muito se questiona sobre o direito penal quanto a sua compatibilidade com a matéria constitucional, no entanto cumpre analisar que suas funções estão inteiramente ligadas.
Esse vínculo esta presente entre o direito penal e Estado democrático, em que suas funções, em ultima analise, são uma mesma função: possibilitar a convivência sócia, proporcionar o exercício de liberdade, condicionar e controlar a violência. “É uma teoria que pretende refundar o papel do direito penal, relegitimando- o a partir dos valores e princípios constitucionais, não pode desconhecer as funções reais que ele cumpre.” (QUEIROZ, 2008, p.114). As funções do direito penal vêm de certa forma para relegitimar as funções do direito constitucional, pois restringem a liberdade dos infratores no intuito de preservar garantir o exercício da liberdade coletiva além de proporcionar a segurança de todos.
6 – QUANTO A COMPETENCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.
A Constituição Federal como lei maior de um Estado também tem o papel de atribuir competência aos órgãos públicos delimitando seu campo de atuação, ou seja, atribuir aos órgãos à matéria que podem atuar e estabelecer os limites ao qual não podem transcender.
Temos como exemplo a justiça do trabalho que teve seus limites de competência ampliados pela Emenda Constitucional nº 45:
Portanto, antes da Emenda Constitucional nº 45, a legitimação do ministério público estava restrita apenas ao evento greve (suspensão do trabalho). Agora, a partir de 2004, os limites se ampliaram para os casos de greve em atividades essenciais com possibilidade de lesão ao interesse público, reduzindo sensivelmente as situações legitimastes. (FERNANDES, 2010, P. 131).
A CLT previa legitimação ao procurador da justiça do trabalho para a promoção do dissídio coletivo sempre que ocorresse a hipótese de suspensão do trabalho, obedecendo aos limites estabelecidos pela Constituição antes da citada EC, com a reforma do texto os poderes ministério público foram ampliados.
Percebemos que a legislação trabalhista atua sobre sua área respeitando os limites estabelecidos pela Constituição, ressaltando que esses limites podem ser alterados desde que primeiramente a constituição possibilite.
7 – QUANTO A IDEOLOGIA DEMOCRATICA.
A teoria constitucional não veio apenas para causar um vinculo de subordinação normativa, mas também para mudar a ideologia democrática e ampliar os direitos e garantias do cidadão.
A incorporação de princípios constitucionais como o da dignidade da pessoa humana subjetivou direitos abrindo um leque interpretativo que ampliou a proteção a favor do cidadão.
“Trata-se de uma cidadania onde o sujeito/cidadão é concebido como um ser concreto, para além de uma abstração jurídica; a pessoa humana enquanto sujeito de direitos universais não pode mais ser reduzida somente a um ponto de convergência de normas estatais. Trata-se de viabilizar uma cidadania solidária, de apostar em práticas sociais aferidas na perspectiva da dignidade humana” (BERTASO, 2009, p. 20).
O cidadão não conta apenas com o conteúdo expresso diretamente nas normas e sim com princípios constitucionais e uma nova ideologia democrática que relativiza a interpretação ampliando a tutela sobre os direitos dos cidadãos, além de proporcionar uma cidadania solidária com maiores práticas sociais. Em um estado democrático de direito dotado de princípios constitucionais nenhuma lei ou ato normativo pode sobrepor seus preceitos fundamentais.
8 – CONCLUSÃO.
A abordagem consiste em analisar a obrigatoriedade direta e subjetiva da Constituição Federal quanto aos demais ramos e aspectos do direito. Chega-se a conclusão de que a norma constitucional esta indiscutivelmente acima de qualquer lei ou ato normativo presente no ordenamento jurídico, relativos: ao aspecto hierárquico material expresso e interpretativo; ao aspecto funcional; quanta atribuição de competência; ou quanto aos fundamentos democráticos.
A supremacia constitucional submeteu todo o conjunto normativo a sua apreciação com rigor absoluto à medida que qualquer contrariedade ou inobservância poderá até acarreta sua completa nulidade.
REFERENCIA:
BERTASO, João Martins. Cidadania, diversidade e reconhecimento: produção associada ao projeto de pesquisa “Cidadania em sociedades multiculturais: incluindo o reconhecimento” / Organização [de] João Martins Bertaso. – Santo Ângelo: FURI, 2009.
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Apresentação Tercio Sampaio Ferraz Junior. Trad. Maria Celeste C. J. Santos; rev. téc. Cláudio De Cicco. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 6ª ed, 1995.
CAGLIARI, Cláudia Taís Siqueira. A função social do contrato como forma de efetivação dos direitos fundamentais nas relações entre particulares. Santa Cruz do Sul/Roma - Itália, março de 2007.
FERNANDES, Reinaldo de Francisco. A legislação para as demandas coletivas no processo do trabalho: A legislação sindical privilegiada. São Paulo: USP. 2010.
HABERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Editora eletrônica: formatos artes gráficas. Porto Alegre. 1997. Reimpressão: 2002.
QUEIROZ, Paulo. Funções do direito penal: Legitimação versus deslegitimação do sistema penal/- 3.ed.rev e atual- São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2008.
Acadêmico do Curso de Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais (AGES).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MATOS, Francis Carlos Carvalho. Hierarquia normativa e hermenêutica jurídica a luz da Constituição Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 set 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36656/hierarquia-normativa-e-hermeneutica-juridica-a-luz-da-constituicao-federal. Acesso em: 23 dez 2024.
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