RESUMO: Este presente trabalho visa analisar a aplicabilidade dos princípios constitucionais do contraditório e a ampla defesa no inquérito policial, como forma de garantir os direitos do acusado. Também aborda as características do inquérito policial e suas nuances.
PALAVRAS – CHAVE: Aplicabilidade; Princípios Constitucionais; Inquérito Policial; Contraditório e Ampla Defesa.
1 INTRODUÇÃO
Quando praticada uma infração penal, nasce para o Estado o direito de punir. Desta forma, o Processo Penal funciona no Estado de Direito como um instrumento imprescindível na garantia dos direitos do réu.
Portanto, não é apenas um mero instrumento de concretização do Direito Penal, mas, verdadeiramente, forma efetivadora de direitos humanos fundamentais e, especialmente, uma garantia contra o arbítrio do Estado.
Seguramente sem um processo penal efetivamente garantidor, fica inimaginável viver numa democracia. Um texto processual penal deve trazer ínsita a certeza de que ao acusado, apesar do crime supostamente praticado, deve ser garantida a fruição de seus direitos previstos especialmente na Constituição da República Federativa do Brasil.
Após ampla análise do processo penal, adentraremos na matéria do presente trabalho, o inquérito policial a ampla defesa e o contraditório. O estudo buscará o conhecimento histórico do procedimento Inquérito Policial, suas características serão demarcadas logo após, bem como a aplicabilidade dos preceitos basilares.
O Direito Romano exerceu grande influência sobre o direito pátrio, não obstante, uma das raízes mais distantes do inquérito policial é encontrada em Roma, local onde o acusador recebia do magistrado direito para proceder as diligências, podendo ir aos locais de infração, coletar dados, fazer buscas e apreensões, ouvir testemunhas e etc. Já na Europa na época das grandes navegações, destaca-se Portugal, que enquanto potência colonizadora tinha como principais regras jurídicas as denominadas Ordenações.
Destarte, foram elas que vigoraram durante o período do Brasil-Colônia, ou seja, as Ordenações Rurais, compostas pelas Ordenações Afonsinas (1446), Ordenações Manuelinas (1521) e Ordenações Filipinas (1603), sendo esta, fruto da união das Ordenações Manuelinas com as leis extravagantes em vigência.
Após a independência do Brasil, já não era conveniente a manutenção das Ordenações Filipinas, sendo necessária a criação do nosso sistema de leis. Portanto, algumas leis foram elaboradas, entre elas o Código de Processo Criminal, em 29 de novembro de 1832, alterando substancialmente o direito brasileiro, não só suprimindo a investigação criminal filipina, como também reestruturando o sistema jurídico.
No entanto não havia disciplina para o inquérito policial. Ao chefe de polícia e ao delegado cabiam, inclusive, atribuições próprias de juiz, como expedir mandados de busca, conceder fianças, julgar crimes comuns e, ainda, proceder à formação de culpa. Desde essa época a instrução criminal passou a ser matéria de polícia. Já o inquérito policial, só foi criado em 1871, pela lei n. 2.033, regulamentada pelo decreto n. 4.824, de 22 de novembro do mesmo ano, que separou justiça e polícia de uma mesma organização. Somente com a promulgação do Código de Processo Penal de 1941, onde o inquérito policial é previsto e disciplinado, é que o mesmo fica, de fato, consolidado.
2 INQUÉRITO POLICIAL E OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA
A investigação policial, classificada em linhas gerais como procedimento preparatório da ação penal, que deverá ser precedido por Autoridade Policial competente, seja Delegado de Polícia de carreira, conforme preceitua o art. 144, §4º da CF/88, tem por finalidade reunir elementos probatórios mínimos acerca de uma infração penal que possam justificar a propositura da ação penal competente.
“O inquérito policial consiste em todas as diligencias necessárias para o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e cúmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito” (NUCCI, 2009, p. 70). Em face de tal desiderato, o inquérito policial deve obrigatoriamente respeitar as liberdades e garantias fundamentais como expressões da dignidade da pessoa humana na busca de uma instrução processual justa, mesmo na fase inquisitorial em que se apresenta vez a exigência do Estado Democrático de Direito de uma leitura constitucional do direito processual penal.
O artigo 5º, inciso LV, da CF/88, dispõe que: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes”, é necessário o reconhecimento da paridade de armas entre acusação e defesa, equilibrando a balança da justiça na busca de uma responsabilização penal justa.
Nesse sentido, são dignas de referência, as palavras de Luigi Ferrajoli: “para que a disputa se desenvolva lealmente e com paridade de armas, é necessária, por outro lado, a perfeita igualdade entre as partes”, bem como que a defesa seja dotada das mesmas capacidades e dos mesmos poderes da acusação. O inquérito policial, como meio de extirpar, logo de início, dúvidas frágeis, mentiras construídas para prejudicar alguém, evitando-se julgamentos impróprios de publicidade enganosa, está inserido, em nosso sistema processual penal como uma de suas fases, a inquisitória, compondo, ainda nas palavras de Nucci, “um sistema misto de características inquisitórias garantistas e acusatória por imposição constitucional”.
Portanto, no que diz respeito à possibilidade de aplicação dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, durante o indiciamento em inquérito policial, é de fácil percepção que a doutrina pátria não tem criado discussões controvertidas, contudo, a realidade prática de se reconhecer tal direito ao indiciado em procedimento investigativo, dando acesso aos advogados às peças já documentadas, como direito de consulta dos autos e atendimento de pedidos de produção de provas, ainda é de pouca expressividade. O problema reside mais, na realidade, na própria aceitação do direito ao contraditório pelos profissionais que laboram na área investigativa.
Assim, para Marta Saad:
Para alguns operadores jurídicos que lidam diariamente com a investigação criminal, a admissão do contraditório nesse procedimento significaria uma burocratização exacerbada da investigação criminal, pois o investigado faria jus às garantias do acusado em processo criminal. Entendemos de maneira diversa. É perfeitamente possível a aplicação do contraditório, de forma mitigada, na fase inquisitorial (2004, p. 26).
Em verdade, careceria de justiça, se o acesso ao inquérito policial fosse restringido tão somente ao membro de acusação, vez que nesta fase há produção probatória, ainda que seu valor seja relativo, mas que não voltará a ser construída na fase de instrução processual, como é o caso de provas periciais ou antecipadas, quando apenas são submetidas ao contraditório diferido durante a judicialização dos autos do inquérito policial. Nesta esteira, podemos conceituar o contraditório com a garantia de bilateralidade nos autos e termos do processo, com a possibilidade de contrariedade, ou seja, permitindo a implementação de esforço das partes na formação do livre convencimento do julgador.
No entanto, há opiniões que defendem a inaplicabilidade do contraditório no inquérito policial. Para Alexandre de Moraes: “o contraditório nos procedimentos penais não se aplica aos inquéritos policiais, pois a fase investigatória é preparatória da acusação, inexistindo, ainda, acusado, constituindo, pois, mero procedimento administrativo, de caráter investigatório, destinado a subsidiar a atuação do titular da ação penal, o Ministério Público”. Assim, a grande maioria da doutrina e das jurisprudências brasileiras, não aceita a presença do contraditório e ampla defesa no inquérito policial.
Enfim, vale lembrar que o inquérito policial, além de ser meio preparatório para a propositura da ação penal, também é instrumento hábil a concluir sobre a existência ou não de crime ou de apurar os indícios de autoria que justificam o início do processo penal, podendo através dele o Ministério Público competente ou a própria defesa provocarem judicialmente a absolvição sumária do acusado.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o exposto, a evolução e alcance da efetivação dos princípios do contraditório e ampla defesa já a partir da fase de inquérito, num sistema processual penal que ainda conserva características inquisitórias, como exemplo, a possibilidade de determinação ex oficio de diligências e medidas cautelares de restrição de liberdade pelo próprio juiz, que possui por ordem constitucional dever de imparcialidade no julgamento e condução processual, às vezes se mostra difícil na realidade prática, mesmo com o apoio do entendimento dos Tribunais Superiores, pois ainda está incutido no meio policial fortes tendências inquisitivas, fruto da formação e história das instituições policias no país.
Assim, a tarefa de buscar a verdade real ou processual, de forma proporcional e justa, desde a fase de inquérito é dever que se impõe aos profissionais que estão na atividade de polícia judiciária, os quais precisam amadurecer a sensibilidade eo respeito aos princípios garantistas explícitos ou implícitos na ordem constitucional vigente, em especifico, os do contraditório e ampla defesa.
Por fim, o que não pode ocorrer é uma evolução no combate à criminalidade organizada por meio de medidas arbitrárias como justificativa de alcançar a responsabilização penal a qualquer custo, apenas para efeito de resposta a sociedade.
Não é isso que o Estado Democrático de Direito almeja. Não se pode voltar ao tempo em que o processo criminal era inteiramente inquisitório. O povo moderno exige maior respeito as suas garantias constitucionais, e para acompanhar a evolução social, as instituições policiais precisam também crescer e acompanhar esta evolução social, se adequando as exigências e garantias inerentes aos direitos do homem, positivadas constitucionalmente como direitos fundamentais.
4 REFERÊNCIAS
BARBOSA, M.M; Inquérito Policial, Política, Jurisprudência. 2 ed: Universitária de Direito.
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: RT, 2002.
MARQUES, J.F. Elementos de Direito Processual Penal. 1 ed: Bookseller.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18 ed: Atlas.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
SAAD, Marta. O direito de defesa no inquérito policial. São Paulo: ERT, 2004.
Bacharelando do Curso de Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais-AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTANA, Adalberto Santos. Pode-se admitir a ampla defesa e o contraditório no inquérito policial? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 set 2013, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36709/pode-se-admitir-a-ampla-defesa-e-o-contraditorio-no-inquerito-policial. Acesso em: 23 dez 2024.
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