RESUMO: A teoria sobre a força normativa dos princípios sofreu influência das escolas Jusnaturalista, Positivista e Pós Positivista. Para a primeira, os princípios não possuíam qualquer força normativa. Para a segunda, os princípios são normas de natureza abstrata que apenas complementam o conteúdo das regras. Para a terceira, os princípios possuem conteúdo normativo com consequências jurídicas definidas em sua aplicação pela técnica da ponderação de interesses.
PALAVRAS-CHAVE: Princípios. Força Normativa. Jusnaturalismo. Positivismo. Pós Positivismo. Técnica de Ponderação de Interesses. Proporcionalidade. Aplicabilidade das normas constitucionais.
INTRODUÇÃO
Muito se debate sobre a força normativa dos princípios, especialmente tendo em conta a natureza da Constituição Federal de 1988. A teoria sobre a força normativa dos princípios sofreu influência das escolas Jusnaturalista, Positivista e Pós Positivista, ganhando maior aplicabilidade com o passar do tempo.
A EVOLUÇÃO DA TEORIA DOS PRINCÍPIOS
A evolução doutrinária sobre a força normativa dos princípios passou por três fases: Jusnaturalista, Juspositivista e Pós Positivista. A primeira delas, Jusnaturalista, considerava que os princípios não possuíam força normativa, representando meras ideias ou conceitos filosóficos, cujo conteúdo dependia da concretização por regras expressas do ordenamento jurídico (FERRAZ, 2010, p. 5884).
A segunda delas, Juspositivista, afirmava que os princípios são normas de natureza mais abstrata, utilizados para suplementar as leis. A teoria foi adotada pela Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 4°. Nesse sentido, Nery Júnior (2003) afirma que o princípio não é regra, mas norma “que têm conteúdo normativo e que são fonte criadora de direitos e obrigações”.
Como visto, alguns juristas, durante certo tempo, defendiam a necessidade de regulamentação de normas constitucionais mais abstratas para que adquirissem força vinculante. O debate fundamentou a publicação da obra de Silva (2002, 81), inspirada na teoria de Crisafulli, sobre a Aplicabilidade das Normas Constitucionais:
Não há norma constitucional alguma destituída de eficácia. Todas elas irradiam efeitos jurídicos, importando sempre uma inovação na ordem jurídica preexistente à entrada em vigor da constituição com a que aderem e a nova ordenação instaurada. O que se pode admitir é que a eficácia de certas normas constitucionais não se manifesta na plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo constituinte enquanto não se emitir uma normação jurídica ordinária ou complementar executória, prevista ou requerida.
A esse respeito, esclarece Bonavides (2012, p.282) que Crisafulli é o jurista que mais contribuiu para a teoria da normatividade dos princípios, registrando que possuem eficácia imediata e mediata. O autor menciona, ainda, que os princípios são normas e são aplicáveis como as regras.
O Positivismo foi, também, duramente criticado pelo estudo de Dworkin, como cita Ávila (2004, p. 28):
A finalidade do estudo de Dworikin foi fazer um ataque geral ao Positivismo (general attack on Postivism), sobretudo no que se refere ao modo aberto de argumentação permitido pela aplicação do que ele viria a definir como princípios (principels). Para ele as regras são aplicadas ao modo tudo ou nada (all-or-nothing), no sentido de que, se a hipótese de incidência de uma regra é preenchida, ou é a regra válida. No caso de colisão entre regras, uma delas deve ser considerada válida. Os princípios, ao contrário, não determinam absolutamente a decisão, mas somente contêm fundamentos, os quais devem ser conjugados com outros fundamentos provenientes de outros princípios.
Assim, a terceira fase evolutiva dos princípios, o Pós Positivismo, é marcada pela constitucionalização dos princípios. Começam a ser desenvolvidas as técnicas de ponderação de interesses, como forma de compatibilizar a aplicação imediata de mais de um princípio que estejam, aparentemente, em conflito. Sobre a fase pós positivista, a doutrina explica (FERRAZ, 2010, p. 5885):
Com a postura humanística e teleológica do direito, advém a perspectiva pós – positivista, a partir da segunda metade do século XX, que é a chamada fase de constitucionalização dos princípios, em que sua aplicação não ocorre somente quando houver lacunas no ordenamento, mas, a partir de então, sua previsão consta no texto constitucional, incidindo como fonte para qualquer tipo de julgamento.
Sobre o Pós Positivismo, Bonavides (2012, p. 285-286) esclarece que o passo decisivo para o juspublicismo foram as intervenções dos juristas Friedrich Muller e Ronal Dworkin.
Com efeito, ambos já se colocam na faixa histórica do pós-positivismo, cujas teses mais fecundas e representativas encabeçam verdadeiramente; Müller, com o normativismo de sua teoria estruturante do Direito, intentando ultrapassar pelas vias conceituais de uma concepção material o formalismo normativista de Kelsen;Dworkin, com a conexidade Direito/Moral, buscando a balar e desterrar da Ciência Jurídica o positivismo de Hart.
Assim como Müller, na Alemanha, rompe com a tradição de Kelsen, Jellinek, Laband e Gerber, já Dworkin, no mundo anglo-americano, levanta a cátedra de Harvard contra a de Oxford, onde até então a filosofia jurídica de Hartconservava intangível a inspiração positivista de Bentham e Austin.
São momentos culminantes de uma reviravolta na região da doutrina, de que resultam para a compreensão dos princípios jurídicos importantes mudanças e variações acerca do entendimento de sua natureza: admitidos definitivamente por normas, são normas-valores com positividade maior nas Constituições do que nos Códigos; e por isso mesmo providos, nos sistemas jurídicos, do mais alto peso, por constituírem norma de eficácia suprema. Essa norma não pode deixar de ser o princípio.
Mas aqui fica para trás, já de todo anacrônica, a dualidade, ou, mais precisamente, o confronto princípio versus norma, uma vez que pelo novo discurso metodológico a norma é conceitualmente elevada à categoria de gênero, do qual as espécies vêm a ser o princípio e a regra.
Assim, a partir do Pós Positivismo, as normas passam a ser consideradas como gênero, do qual são espécies os princípios e as regras. Ávila (2004, p. 70) diferencia o conceito de princípios e regras, esclarecendo que as regras são descritivas e aplicáveis através de mecanismo de subsunção, sempre respeitando os princípios que lhes são sobrejacentes. Menciona o autor, ainda, que os princípios são normas finalísticas, cuja aplicação depende de uma interpretação de seu conteúdo em face do caso concreto e, assim, a definição de seus efeitos.
Os princípios são, assim, dimensões de peso, podendo ser aplicados imediatamente. É que, no caso dos princípios, suas consequências jurídicas são determinadas mediante sua concretização no caso concreto. São, nos dizeres de Ávila (2004, p. 29), deveres de otimização em graus variados segundo “as possibilidades normativas e fáticas”.
Para o autor, a variação normativa decorre do fato de que os princípios, muitas vezes, se contrapõe a outros princípios e regras. Nesse conflito aparente, sua aplicação será variável de acordo com a ponderação de interesses efetuada para o caso concreto. A segunda delas, porque “o conteúdo dos princípios como normas de conduta só pode ser determinado quando diante dos fatos” (ÁVILA, 2004, p. 29).
Já as regras se aplicam de forma diversa. Elas “são normas, que podem ou não podem ser realizadas. Quando uma regra vale, então é determinado fazer exatamente o que ela exige, nada mais e nada menos” (ÁVILA, 2004, p. 29).
Bonavides (2012, p. 281-282) subdivide os princípios em princípios abertos e normativos, a depender de sua força normativa:
Repartem-se os princípios, numa certa fase da elaboração doutrinária, em duas categorias: a dos que assumem o caráter de idéias jurídicas norteadoras, postulando concretização na lei e na jurisprudência, e a dos que, não sendo apenas ratio legis, mas, também, lex, se cristalizam desse modo, consoante Larenz assinala, numa regra jurídica de aplicação imediata.
Acrescenta o mesmo jurista que os da primeira categoria, desprovidos do caráter de norma, são princípios "abertos"’ (offene Prinzipien), ao passo que os segundos se apresentam como "‘princípios normativos" (rechtssatzförmige Prizipien).
Sobre a força normativa dos princípios, há mencionar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, analisando a constitucionalidade de regras incertas em nosso ordenamento jurídico com base nos princípios:
AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE EM JULGAMENTO CONJUNTO. LEI COMPLEMENTAR Nº 135/10. HIPÓTESES DE INELEGIBILIDADE. ART. 14, § 9º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MORALIDADE PARA O EXERCÍCIO DE MANDATOS ELETIVOS. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À IRRETROATIVIDADE DAS LEIS: AGRAVAMENTO DO REGIME JURÍDICO ELEITORAL. ILEGITIMIDADE DA EXPECTATIVA DO INDIVÍDUO ENQUADRADO NAS HIPÓTESES LEGAIS DE INELEGIBILIDADE. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL): EXEGESE ANÁLOGA À REDUÇÃO TELEOLÓGICA, PARA LIMITAR SUA APLICABILIDADE AOS EFEITOS DA CONDENAÇÃO PENAL. ATENDIMENTO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO: FIDELIDADE POLÍTICA AOS CIDADÃOS. VIDA PREGRESSA: CONCEITO JURÍDICO INDETERMINADO. PRESTÍGIO DA SOLUÇÃO LEGISLATIVA NO PREENCHIMENTO DO CONCEITO. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI. AFASTAMENTO DE SUA INCIDÊNCIA PARA AS ELEIÇÕES JÁ OCORRIDAS EM 2010 E AS ANTERIORES, BEM COMO E PARA OS MANDATOS EM CURSO. 1. A elegibilidade é a adequação do indivíduo ao regime jurídico - constitucional e legal complementar - do processo eleitoral, razão pela qual a aplicação da Lei Complementar nº 135/10 com a consideração de fatos anteriores não pode ser capitulada na retroatividade vedada pelo art. 5º, XXXVI, da Constituição, mercê de incabível a invocação de direito adquirido ou de autoridade da coisa julgada (que opera sob o pálio da cláusula rebus sic stantibus) anteriormente ao pleito em oposição ao diploma legal retromencionado; subjaz a mera adequação ao sistema normativo pretérito (expectativa de direito). 2. A razoabilidade da expectativa de um indivíduo de concorrer a cargo público eletivo, à luz da exigência constitucional de moralidade para o exercício do mandato (art. 14, § 9º), resta afastada em face da condenação prolatada em segunda instância ou por um colegiado no exercício da competência de foro por prerrogativa de função, da rejeição de contas públicas, da perda de cargo público ou do impedimento do exercício de profissão por violação de dever ético-profissional. 3. A presunção de inocência consagrada no art. 5º, LVII, da Constituição Federal deve ser reconhecida como uma regra e interpretada com o recurso da metodologia análoga a uma redução teleológica, que reaproxime o enunciado normativo da sua própria literalidade, de modo a reconduzi-la aos efeitos próprios da condenação criminal (que podem incluir a perda ou a suspensão de direitos políticos, mas não a inelegibilidade), sob pena de frustrar o propósito moralizante do art. 14, § 9º, da Constituição Federal. 4. Não é violado pela Lei Complementar nº 135/10 o princípio constitucional da vedação de retrocesso, posto não vislumbrado o pressuposto de sua aplicabilidade concernente na existência de consenso básico, que tenha inserido na consciência jurídica geral a extensão da presunção de inocência para o âmbito eleitoral. 5. O direito político passivo (ius honorum) é possível de ser restringido pela lei, nas hipóteses que, in casu, não podem ser consideradas arbitrárias, porquanto se adequam à exigência constitucional da razoabilidade, revelando elevadíssima carga de reprovabilidade social, sob os enfoques da violação à moralidade ou denotativos de improbidade, de abuso de poder econômico ou de poder político. 6. O princípio da proporcionalidade resta prestigiado pela Lei Complementar nº 135/10, na medida em que: (i) atende aos fins moralizadores a que se destina; (ii) estabelece requisitos qualificados de inelegibilidade e (iii) impõe sacrifício à liberdade individual de candidatar-se a cargo público eletivo que não supera os benefícios socialmente desejados em termos de moralidade e probidade para o exercício de referido munus publico. 7. O exercício do ius honorum (direito de concorrer a cargos eletivos), em um juízo de ponderação no caso das inelegibilidades previstas na Lei Complementar nº 135/10, opõe-se à própria democracia, que pressupõe a fidelidade política da atuação dos representantes populares. 8. A Lei Complementar nº 135/10 também não fere o núcleo essencial dos direitos políticos, na medida em que estabelece restrições temporárias aos direitos políticos passivos, sem prejuízo das situações políticas ativas. 9. O cognominado desacordo moral razoável impõe o prestígio da manifestação legítima do legislador democraticamente eleito acerca do conceito jurídico indeterminado de vida pregressa, constante do art. 14, § 9.º, da Constituição Federal. 10. O abuso de direito à renúncia é gerador de inelegibilidade dos detentores de mandato eletivo que renunciarem aos seus cargos, posto hipótese em perfeita compatibilidade com a repressão, constante do ordenamento jurídico brasileiro (v.g., o art. 55, § 4º, da Constituição Federal e o art. 187 do Código Civil), ao exercício de direito em manifesta transposição dos limites da boa-fé. 11. A inelegibilidade tem as suas causas previstas nos §§ 4º a 9º do art. 14 da Carta Magna de 1988, que se traduzem em condições objetivas cuja verificação impede o indivíduo de concorrer a cargos eletivos ou, acaso eleito, de os exercer, e não se confunde com a suspensão ou perda dos direitos políticos, cujas hipóteses são previstas no art. 15 da Constituição da República, e que importa restrição não apenas ao direito de concorrer a cargos eletivos (ius honorum), mas também ao direito de voto (ius sufragii). Por essa razão, não há inconstitucionalidade na cumulação entre a inelegibilidade e a suspensão de direitos políticos. 12. A extensão da inelegibilidade por oito anos após o cumprimento da pena, admissível à luz da disciplina legal anterior, viola a proporcionalidade numa sistemática em que a interdição política se põe já antes do trânsito em julgado, cumprindo, mediante interpretação conforme a Constituição, deduzir do prazo posterior ao cumprimento da pena o período de inelegibilidade decorrido entre a condenação e o trânsito em julgado. 13. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga improcedente. Ações declaratórias de constitucionalidade cujos pedidos se julgam procedentes, mediante a declaração de constitucionalidade das hipóteses de inelegibilidade instituídas pelas alíneas "c", "d", "f", "g", "h", "j", "m", "n", "o", "p" e "q" do art. 1º, inciso I, da Lei Complementar nº 64/90, introduzidas pela Lei Complementar nº 135/10, vencido o Relator em parte mínima, naquilo em que, em interpretação conforme a Constituição, admitia a subtração, do prazo de 8 (oito) anos de inelegibilidade posteriores ao cumprimento da pena, do prazo de inelegibilidade decorrido entre a condenação e o seu trânsito em julgado. 14. Inaplicabilidade das hipóteses de inelegibilidade às eleições de 2010 e anteriores, bem como para os mandatos em curso, à luz do disposto no art. 16 da Constituição. Precedente: RE 633.703, Rel. Min. GILMAR MENDES (repercussão geral).
(ADC 29, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 16/02/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127 DIVULG 28-06-2012 PUBLIC 29-06-2012 RTJ VOL-00221- PP-00011) (grifei e sublinhei).
No acórdão acima mencionado, o STF enfrentou as alegações de contrárias à Lei Complementar n° 135/2010, utilizando a técnica de ponderação de interesses de Alexy e o princípio da razoabilidade para firmar posicionamento sobre a constitucionalidade da norma. Cita-se, ainda, nesse sentido:
E M E N T A: UNIÃO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO - ALTA RELEVÂNCIA SOCIAL E JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DA QUESTÃO PERTINENTE ÀS UNIÕES HOMOAFETIVAS - LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO RECONHECIMENTO E QUALIFICAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA COMO ENTIDADE FAMILIAR: POSIÇÃO CONSAGRADA NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (ADPF 132/RJ E ADI 4.277/DF) - O AFETO COMO VALOR JURÍDICO IMPREGNADO DE NATUREZA CONSTITUCIONAL: A VALORIZAÇÃO DESSE NOVO PARADIGMA COMO NÚCLEO CONFORMADOR DO CONCEITO DE FAMÍLIA - O DIREITO À BUSCA DA FELICIDADE, VERDADEIRO POSTULADO CONSTITUCIONAL IMPLÍCITO E EXPRESSÃO DE UMA IDÉIA-FORÇA QUE DERIVA DO PRINCÍPIO DA ESSENCIAL DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - ALGUNS PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DA SUPREMA CORTE AMERICANA SOBRE O DIREITO FUNDAMENTAL À BUSCA DA FELICIDADE - PRINCÍPIOS DE YOGYAKARTA (2006): DIREITO DE QUALQUER PESSOA DE CONSTITUIR FAMÍLIA, INDEPENDENTEMENTE DE SUA ORIENTAÇÃO SEXUAL OU IDENTIDADE DE GÊNERO - DIREITO DO COMPANHEIRO, NA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA, À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO DA PENSÃO POR MORTE DE SEU PARCEIRO, DESDE QUE OBSERVADOS OS REQUISITOS DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL - O ART. 226, § 3º, DA LEI FUNDAMENTAL CONSTITUI TÍPICA NORMA DE INCLUSÃO - A FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO - A PROTEÇÃO DAS MINORIAS ANALISADA NA PERSPECTIVA DE UMA CONCEPÇÃO MATERIAL DE DEMOCRACIA CONSTITUCIONAL - O DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO DE IMPEDIR (E, ATÉ MESMO, DE PUNIR) “QUALQUER DISCRIMINAÇÃO ATENTATÓRIA DOS DIREITOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS” (CF, ART. 5º, XLI) - A FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E O FORTALECIMENTO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: ELEMENTOS QUE COMPÕEM O MARCO DOUTRINÁRIO QUE CONFERE SUPORTE TEÓRICO AO NEOCONSTITUCIONALISMO - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. NINGUÉM PODE SER PRIVADO DE SEUS DIREITOS EM RAZÃO DE SUA ORIENTAÇÃO SEXUAL. - Ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual. Os homossexuais, por tal razão, têm direito de receber a igual proteção tanto das leis quanto do sistema político-jurídico instituído pela Constituição da República, mostrando-se arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que puna, que exclua, que discrimine, que fomente a intolerância, que estimule o desrespeito e que desiguale as pessoas em razão de sua orientação sexual. RECONHECIMENTO E QUALIFICAÇÃO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO ENTIDADE FAMILIAR. - O Supremo Tribunal Federal - apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva e invocando princípios essenciais (como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da autodeterminação, da igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não discriminação e da busca da felicidade) - reconhece assistir, a qualquer pessoa, o direito fundamental à orientação sexual, havendo proclamado, por isso mesmo, a plena legitimidade ético-jurídica da união homoafetiva como entidade familiar, atribuindo-lhe, em conseqüência, verdadeiro estatuto de cidadania, em ordem a permitir que se extraiam, em favor de parceiros homossexuais, relevantes conseqüências no plano do Direito, notadamente no campo previdenciário, e, também, na esfera das relações sociais e familiares. - A extensão, às uniões homoafetivas, do mesmo regime jurídico aplicável à união estável entre pessoas de gênero distinto justifica-se e legitima-se pela direta incidência, dentre outros, dos princípios constitucionais da igualdade, da liberdade, da dignidade, da segurança jurídica e do postulado constitucional implícito que consagra o direito à busca da felicidade, os quais configuram, numa estrita dimensão que privilegia o sentido de inclusão decorrente da própria Constituição da República (art. 1º, III, e art. 3º, IV), fundamentos autônomos e suficientes aptos a conferir suporte legitimador à qualificação das conjugalidades entre pessoas do mesmo sexo como espécie do gênero entidade familiar. - Toda pessoa tem o direito fundamental de constituir família, independentemente de sua orientação sexual ou de identidade de gênero. A família resultante da união homoafetiva não pode sofrer discriminação, cabendo-lhe os mesmos direitos, prerrogativas, benefícios e obrigações que se mostrem acessíveis a parceiros de sexo distinto que integrem uniões heteroafetivas. A DIMENSÃO CONSTITUCIONAL DO AFETO COMO UM DOS FUNDAMENTOS DA FAMÍLIA MODERNA. - O reconhecimento do afeto como valor jurídico impregnado de natureza constitucional: um novo paradigma que informa e inspira a formulação do próprio conceito de família. Doutrina. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E BUSCA DA FELICIDADE. - O postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País, traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo. Doutrina. - O princípio constitucional da busca da felicidade, que decorre, por implicitude, do núcleo de que se irradia o postulado da dignidade da pessoa humana, assume papel de extremo relevo no processo de afirmação, gozo e expansão dos direitos fundamentais, qualificando-se, em função de sua própria teleologia, como fator de neutralização de práticas ou de omissões lesivas cuja ocorrência possa comprometer, afetar ou, até mesmo, esterilizar direitos e franquias individuais. - Assiste, por isso mesmo, a todos, sem qualquer exclusão, o direito à busca da felicidade, verdadeiro postulado constitucional implícito, que se qualifica como expressão de uma idéia-força que deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa humana. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte americana. Positivação desse princípio no plano do direito comparado. A FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A PROTEÇÃO DAS MINORIAS. - A proteção das minorias e dos grupos vulneráveis qualifica-se como fundamento imprescindível à plena legitimação material do Estado Democrático de Direito. - Incumbe, por isso mesmo, ao Supremo Tribunal Federal, em sua condição institucional de guarda da Constituição (o que lhe confere “o monopólio da última palavra” em matéria de interpretação constitucional), desempenhar função contramajoritária, em ordem a dispensar efetiva proteção às minorias contra eventuais excessos (ou omissões) da maioria, eis que ninguém se sobrepõe, nem mesmo os grupos majoritários, à autoridade hierárquico-normativa e aos princípios superiores consagrados na Lei Fundamental do Estado. Precedentes. Doutrina.
(RE 477554 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 16/08/2011, DJe-164 DIVULG 25-08-2011 PUBLIC 26-08-2011 EMENT VOL-02574-02 PP-00287 RTJ VOL-00220- PP-00572) (grifei e subilinhei)
Embora, durante certo tempo, tenha acolhido a teoria adotada por Silva (2002) sobre a aplicabilidade das normas constitucionais, certo é que o STF, acompanhando a doutrina avalizada sobre o tema, tem reafirmado sua posição de reconhecer conteúdo normativo aos princípios.
CONCLUSÃO
Por todo o exposto, percebe-se que a doutrina e a jurisprudência conferem aos princípios força normativa e aplicação imediata, sendo as consequências jurídicas dos princípios determinadas pela sua concretização fática.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos Princípios. 4.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 138 p.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 27. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2012. 863 p.
FERRAZ, Danilo Santos. SOUSA, Thaís Cruz. Princípios constitucionais: do jusnaturalismo ao pós-positivismo à luz da hermenêutica constitucional. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3947.pdf. Acesso em: 23 nov. 2013.
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6.ed. São Paulo: Malheiros, 2002. 277 p.
Procuradora Federal, Coordenadora de Gerenciamento e Prevenção de Litígios e Coordenadora-Geral Substituta da Matéria de Benefícios da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS, Direção Central em Brasília/DF. Professora Tutora Professora Tutora do Curso Aspectos Práticos e Relevantes do Direito Previdenciário da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Conselho Nacional de Justiça (ENFAM/CNJ). Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais - Direito - pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Gabriela Koetz da. A evolução da teoria dos princípios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 nov 2013, 06:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37358/a-evolucao-da-teoria-dos-principios. Acesso em: 23 dez 2024.
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