INTRODUÇÃO
Com origem no positivismo criminológico do século XIX, as penas alternativas à prisão, além dos pressupostos humanísticos da pena, são reflexos das alterações inerentes ao sistema penal brasileiro e os fins da pena numa sociedade complexa e cheia de variações. No entanto, as alternativas a pena privativa de liberdade, adquirem maior dimensão e aplicabilidade haja vista o modelo norte-americano de controle social sobre o delito.
O Brasil, atendendo aos anseios desse novo contexto de Política Criminal, cria, num primeiro momento a Reforma de 1984, onde adota medidas alternativas para as penas de prisão de curta duração: promulgou as chamadas penas restritivas de direitos e revitalizou as penas de multa, permanecendo a prisão como eixo principal do sistema de penas.
A superlotação carcerária é um antigo problema do sistema penal brasileiro, sendo que não há a previsão de penitenciárias, cadeias, colônias agrícolas, industriais e casas de albergado suficientes para abrigar toda a população de presos do país, apesar do disposto no art. 40 da Lei de Execução Penal.
A pena como restritiva de liberdade não é a única resposta do Estado quanto aos atos delitivos. Alguns crimes e as contravenções penais são punidos com as denominadas penas restritivas de direitos, as quais são objeto de estudo e análise aprofundada do presente artigo.
No rol das penas restritivas de direito estão a prestação de serviços à comunidade, a interdição temporária de direitos, bem como, a limitação de fim de semana, A rigor, as penas restritivas de direito não são aplicadas de imediato, mas sim em substituição às privativas de liberdade, o que implica dizer que, descumpridas tais condições ou as restrições, o condenado deverá ser recolhido ao cárcere.
A busca por alternativas à pena de prisão, ainda que baseado origináriamente em pressupostos reabilitadores e de direito penal minimo, faz parte da nova tendência mundial de expansão do direito penal.
O presente artigo não se propõe a identificar as possibilidades aplicáveis às melhorias do sistema penal brasileiro, mas proporcionar ao leitor uma breve contextualização acerca da aplicabilidade das penas restritivas de direito no Brasil.
1. ASPECTOS DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS
Pena é a privação total ou parcial de um bem jurídico imposto pelo Estado, por meio da ação penal, em retribuição ao autor de uma infração penal, cuja intenção é evitar novas violações. A pena dirige-se não apenas aquele que comete o ato delituoso, mas também a sociedade, com a finalidade de banir, de certa forma, que os eventuais infratores voltem a praticar novos delitos.
Trata-se, portanto, de uma pena alternativa consistente na restrição ao exercício de certos direitos. As penas restritivas de direitos são autônomas e não acessórias, e substitutivas, ou seja, não podem ser cumuladas com penas privativas de liberdade. As penas restritivas de direito foram paulatinamente introduzidas como uma substituição as Penas Privativas de Liberdade.
De acordo com o art. 59 do Código Penal, a pena tem dupla finalidade. A primeira refere-se á finalidade retribuitiva, ou seja, representando uma ideia de castigo, como forma do infrator responder pelo mal causado pelo crime. A segunda finalidade seria preventiva, a qual, busca a ressocialização do infrator e tem como objetivo principal evitar novos delitos, neste sentido cabe ressaltar os ensinamentos de Cesare Beccaria.
O legislador decidiu então instituir artigos no Código Penal Brasileiro que discorrem sobre essa alternativa de ressocialização através das Penas Restritivas de Direitos. O legislador pensando em novas possibilidades da ressocialização do infrator criou a Lei 9.714/98 que trouxe novas sanções alternativas para o Código Penal vigente.
Entre os objetivos da nova lei estão dar cumprimento ao disposto no inciso XLVI, art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que prevê a pena de prestação social de alternativa. Ao todo o rol de penas constitui cinco tipos de penas alternativas dividas através de restrições específicas.
O art. 43 do Código Penal Brasileiro dispõe sobre os tipos de penas restritivas de direitos elencadas em cinco, as quais são: I – prestação pecuniária; II – perda de bens e valores; III – (VetadoHYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/Mensagem_Veto/1998/Mv1447-98.htm"); IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; V – interdição temporária de direitos; VI – limitação de fim de semana.
I - PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA
Consiste no pagamento em dinheiro, á vista ou em parcelas, á vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo, nem superior a 360 salários mínimos.
O Poder Judiciário não pode ser o destinatário da prestação, pois, apesar de ter destinação social, não é entidade. O montante será fixado livremente pelo juiz, de acordo com o que for suficiente para a reprovação do delito, levando-se em conta a capacidade econômica do condenado e a extensão do prejuízo causado á vítima ou aos seus herdeiros.
Não será possível sair dos valores mínimos e máximos fixados em lei, não se admitindo, por exemplo, prestação em valor inferior a um salário mínimo, nem mesmo em caso de tentativa.
Se o juiz atribuir o benefício da prestação pecuniária a alguma entidade, no lugar da vítima ou os seus herdeiros, não haverá dedução do valor na futura ação indenizatória, porquanto não coincidentes os beneficiários. Admite-se que o pagamento seja feito em ouro, joias, títulos mobiliários e imóveis, ao invés da moeda corrente.
No caso de prestação inominada, a aceitação pelo beneficiário, poderá consistir em prestação de outra natureza, como, por exemplo, entrega de cestas básicas a carentes, em entidades públicas ou privadas.
Vale ressaltar que a pena inominada não pode consistir em pagamento em dinheiro, para que haja distinção com a prestação pecuniária, assim como a prestação de trabalho, afinal, já existe a prestação de serviços á comunidade. Outra informação importante refere-se aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, instituído no art. 17 da Lei 11.340/2006, é vedada a aplicação de pena de cesta básica.
II - PERDA DE BENS E VALORES
Trata-se da decretação de perda de bens móveis, imóveis ou de valores, tais como títulos de crédito, ações, entre outros. Não pode alcançar bens de terceiros, mas apenas do condenado, afinal, a pena não pode passar de sua pessoa, conforme previsão disposta no inciso XLV, art. 5º da CRFB/88. Essa pena consiste no confisco generalizado do patrimônio lícito do condenado, imposto como pena principal substitutiva da privativa de liberdade imposta.
A perda de bens e valores pertencentes aos condenados, ressalvada a legislação especial, dar-se á em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e o seu valor terá como teto o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou terceiro, em consequência da prática do crime, decidindo-se, na dúvida, pelo valor mais elevado.
O Fundo Penitenciário Nacional foi instituído pela Lei Complementar nº. 79, de 07 de janeiro de 1994, e está regulamentado pelo Decreto nº. 1093, de março de 1994, que tem por finalidade proporcionar recursos e meios destinados a financiar e apoiar as atividades e os programas de modernização do Sistema Penitenciário Brasileiro. O Fundo Penitenciário Nacional - FUNPEN pode repassar recursos para os Estados para a realização de seus fins.
III - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS Á COMUNIDADE OU A ENTIDADES PÚBLICAS
Tal prestação consiste na atribuição de tarefas ao condenado, junto às entidades assistenciais, hospitais, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, ou em benefício de entidades públicas.
Estes serviços á comunidade ou a entidades públicas são aplicáveis as condenações superiores a seis meses de privação de liberdade. As tarefas não serão remuneradas, uma vez que se trata do cumprimento de pena principal, e não existe pena remunerada.
As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, a carga horária de trabalho será de uma hora por dia de condenação, fixada de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, conforme dispõe o § 3º do art.46 do Código Penal Brasileiro.
Caberá ao magistrado designar a entidade credenciada junto á qual o condenado deverá trabalhar, de acordo com o inciso I, art. 149 da LEP. A entidade comunicará mensalmente ao juiz da execução penal, mediante relatório circunstanciado, sobre as atividades e o aproveitamento do condenado.
Se a pena substituída for superior a um ano, é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em tempo inferior ao da pena privativa, nunca inferior a metade da pena privativa de liberdade fixada. Por entidades públicas devemos entender tanto as pertencentes a administração direta quanto a indireta passíveis de serem beneficiadas pela prestação de serviços, como as empresas públicas, as sociedades de economia mista, as autarquias, as entidades subvencionadas pelo Poder Público.
IV- INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS
Entre as penas de Interdição Temporária de direitos estão, a proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo. Trata-se de pena específica, uma vez que só pode ser aplicada ao crime cometido no exercício do cargo ou função, com violação de deveres a estes inerentes e desde que preenchidos os requisitos legais para a substituição. Quando a lei fala de cargo, está se referindo ao efetivo, e não ao eventual.
No que se refere á suspenção de mandato eletivo, a condenação criminal transitada em julgado acarreta a suspensão dos direitos políticos, enquanto durarem de eficácia plena. Há também a previsão da proibição de exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial ou licença do Poder Público.
Trata-se de restritiva específica, pois só aplica aos crimes cometidos no exercício da profissão ou atividade e se houver violação de deveres a estes relativos, conforme disposto no art. 56 do Código Penal Brasileiro.
A Suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículos é assim como as outras penas citadas anteriormente, específica, só aplicável aos delitos culposos de trânsito, não vale para categoria de veículos movidos a tração animal e a propulsão humana.
Mesmo no caso da imposição dessa pena, o juiz deverá comunicar a autoridade de trânsito a ocorrência do acidente, para apreensão da CNH e sujeição do motorista a novos exames, pois se trata de medida meramente administrativa. O Código Penal Brasileiro não obriga que, nos crimes culposos de trânsito, se aplique sempre a interdição temporária da habilitação para dirigir veículos, podendo ser aplicada outra pena restritiva de direitos.
A previsão legal garante que somente o juiz poderá aplicar a pena de suspensão de habilitação para os crimes culposos de trânsito, ou seja, não poderá impor essa restritiva para nenhum crime. Os crimes culposos de trânsito não são, contudo, punidos obrigatoriamente com essa pena, podendo o juiz escolher outra pena restritiva.
Sendo assim, toda suspensão pune um crime culposo de trânsito, mas nem todo crime culposo de trânsito é punido com a suspensão. Com o novo Código de Trânsito Nacional, a suspensão ou proibição relativa à obtenção da habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imposta como pena principal, isolada ou cumulativamente com outras penalidades.
Há ainda a aplicação da pena de proibição de frequentar determinados lugares, desta forma o infrator ficará proibido de frequentar determinados lugares fixados por determinação legal do magistrado.
V - LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA
E por fim, esta limitação consiste na obrigação do condenado de permanecer aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, na Casa do Albergado ou outro estabelecimento adequado.
O estabelecimento encaminhará mensalmente ao juiz da execução penal o relatório sobre o aproveitamento do condenado.
2. A APLICABILIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS Á COMUNIDADE OU AS ENTIDADES PÚBLICAS
A pena restritiva de direitos da modalidade prestação de serviços à comunidade pode ser considerada mais educativa das penas, pois, consiste em trabalho voluntário do condenado à comunidade ou entidades publicas é também aquela que contribui para certa ressocialização do apenado já que coloca o individuo junto da comunidade.
Em nosso ordenamento jurídico, inexiste disposição sobre a questão. É possível a celebração de convênios com entidades privadas com fins lucrativos na execução de medidas não privativas de liberdade, as denominadas penas alternativas, como a prestação de serviços à comunidade, em determinadas condições, sem que a parceria resulte em exploração de mão-de-obra, em relação empregatícia ou, ainda, em enriquecimento ilícito.
O art. 46, § 2° do Código Penal, quando faz menção às entidades nas quais pode haver eventual prestação de serviços à comunidade, refere-se não apenas a hospitais, estabelecimentos assistenciais, escolas, entre outras, mas também a outras que, porventura, o Juízo da Execução venha a designar para o cumprimento do trabalho.
Trata-se de um rol exemplificativo, que não descarta a participação de empresas privadas, ainda que de fins lucrativos, no processo de ressocialização do reeducando. Nada impede que se destine um apenado a prestar serviços em programas sociais desenvolvidos por entidades privadas. Pode ser um hospital, rede de ensino ou, até mesmo, estabelecimento de grande porte.
CONCLUSÃO
A presente pesquisa buscou a efetiva análise quanto as Penas Alternativas de Direito. Observou-se que as penas restritivas de direitos chamadas penas alternativas poderão oferecer uma real perspectiva ao autor de atos delituosos, propiciando uma reparação à sociedade principalmente através das penas de prestação de serviços à comunidade.
Cabe ressaltar as vantagens da aplicação de tais penas alternativas conforme observado na pesquisa, como a redução dos gastos com o sistema penitenciário, a possibilidade de evitar o encarceramento dos condenados que praticam crimes de menor potencial ofensivo.
Vê-se ainda que o condenado não seja afastado do ceio de sua família, tal prática busca ainda o afastamento do sentenciado do convívio com outros detentos, permite ao magistrado adequar a pena às condições pessoais do condenado e à gravidade do fato, a possibilidade de redução de reincidência.
Estas medidas poderão evitar ainda as violências intrínsecas das prisões, os serviços prestados pelo sentenciado terão cunho social, medidas que visam garantir o bem estar da sociedade, eficiência na reeducação e possível ressocialização do condenado.
Cumpre observar, por fim, que a eficiência e o êxito da aplicabilidade das penas alternativas dependem de equilíbrio, além da sua execução e fiscalização adequada.
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Acadêmica do Curso de Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Tecnóloga em Transações Imobiliárias - Eixo Tecnológico em Gestão de Negócios, pelo Centro de Educação Tecnológica República - CETER. É responsável pela elaboração de projetos de lei, leis ordinárias, decretos, portarias e convênios na Assessoria Jurídica Legislativa do Município de Itapema - SC. Foi estagiária de Direito na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional atuando no núcleo dos Grandes Devedores da União na região do Vale do Itajaí (2011-2012), nas áreas de Direito Tributário e Administrativo. A acadêmica realiza estudos e pesquisas na área do Direito com ênfase nas matérias referentes ao Direito Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BATISTA, Quetilin de Oliveira. Breves considerações acerca da aplicabilidade das penas restritivas de direito no sistema penal brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jan 2014, 07:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38071/breves-consideracoes-acerca-da-aplicabilidade-das-penas-restritivas-de-direito-no-sistema-penal-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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