1- O advogado deve recusar o patrocínio de pleitos contrários à justiça, ao decoro ou à própria consciência.
Fazendo uma rápida busca no interior de nossos princípios internos de conduta moral profissional, qual seria a sua conduta caso uma das situações acima ocorresse? Qual seria a SUA reflexão para consigo mesmo?
Certamente muitos diriam que se enquadram nos dizeres expostos sem nenhuma dúvida. Mas não podemos esquecer que falar, até papagaio fala.
Quantos profissionais estão no mercado recusando o patrocínio de pleitos contrários à justiça se, perguntados de forma clara e simples o que é a justiça poucos saberiam responder (mesmo que conceituadamente)?!
A questão abordada aqui é pura e simplesmente de ordem anterior ao exercício da advocacia, ou seja, é de ordem social.
Não podemos recusar (ou aceitar) algo que não sabemos exatamente o que é. Certamente, se o fizermos será prejudicial ao próximo e até a nós mesmos.
Quanto ao decoro, que no sentido literal da palavra significa: ”respeito de si mesmo e dos outros; decência, dignidade, vergonha”, não ser contrário a isso se tornou uma virtude quando, na verdade, deveria ser inerente de qualquer ser humano.
Recusar pleitos contrários ao exposto nos dias atuais, diante da concorrência (muitas vezes desleal) entre os profissionais, é uma tarefa árdua, eu sei, mas não podemos deixar apagar a “chama da mudança” de quando começamos a cursar o mágico curso de DIREITO, onde enfrentamos vendavais de modelos pessimistas para nos desencorajar. Seja você nos seus ideais, pois como disse o Dr. Ranulfo de Mello Freire: “Perder o idealismo com a idade é falta de caráter”.
A consciência do ser humano é o motor da sua conduta, seja ela moral, ética ou profissional, consciente ou não. A consciência “inconsciente” é, na minha visão, mais forte do que a própria consciência “consciente”, pois esta você percebe e a “vê”, enquanto aquela é a que reflete quem você é. Trair a sua consciência, seja por qual motivo for, é trair, antes de mais nada, o seu DNA social/moral.
Em síntese: seja, antes de mais nada, humano consigo mesmo e para com seu cliente, pois animais irracionais erram por não terem o discernimento de pensar. Nós, ainda, temos a escolha.
2- Deve poupar aos clientes gastos excessivamente supérfluos.
Um bom profissional sabe o que faz! Pelo menos penso dessa forma.
O cliente quando procura um advogado é porque já não tem mais pra onde correr para resolver alguma questão de sua vida. Todas as possibilidades que ele tinha por conta própria extinguiram-se.
Dessa forma, na busca por um profissional ele busca, basicamente, três coisas. Confiança, Cumplicidade e Valor.
Confiança para poder ter no advogado seu cúmplice e, decorrente disso, saber o valor do serviço a ser contratado. É deste último que o tópico se refere.
Aqui não está em pauta o valor que o advogado cobra, pois cada um tem seu “preço”, mas sim aquilo que ele faz o cliente pagar sem ter a necessidade de fazê-lo.
Um bom planejamento para a causa aceita, raramente faz o cliente ter gastos desnecessários que vão gerar um desgaste profissional. Imagine-se no lugar do seu cliente se a cada hora fosse solicitado (e cobrado dele) alguma coisa por não ter sido prevista no início da demanda (o que vai suscitar dúvidas acerca do profissional) ou, por muitas vezes, por capricho do profissional.
Evitar querer mostrar (falsa) competência com ônus ao cliente, pode ser a garantia de mantê-lo fiel aos seus serviços e, também, adquirir outros por ele indicados.
Costumo trabalhar em parceria com o cliente fazendo com que ele, também, participe do processo de sua demanda. Muitas coisas que seriam “supérfluas” e gerariam custas para ele, ele mesmo faz sem nada pagar.
É assim que se constrói uma relação profissional sólida.
3- Não deve utilizar, nos processos sob seu amparo, meios ilícitos ou injustos.
“A injustiça que se faz a um, é uma ameaça que se faz a todos!” (Montesquieu)
Nenhuma outra definição para este tópico é mais cristalina do que a citação acima. O famoso “jeitinho brasileiro”, que muitos aplicam no cotidiano, jamais pode ser usado para a prática advocatícia.
Somos operadores do Direito!
Para os leigos, direito significa: correto; moral; aquilo que não é errado; justo! É esta a visão de quem nos contrata para representá-lo.
Por mais que tenhamos algum privilégio em alguma situação que nos permita levar vantagem de forma ilícita ou injusta, uma reflexão de tudo que aprendemos na universidade, desde o primeiro semestre quando uma revolução de ideais nos é apresentada, deve ser feita.
Não podemos perder, com o decorrer do tempo, valores básicos inerentes à nossa profissão. Não devemos sucumbir a um modelo de obtenção de êxito a qualquer custo, hoje (e sempre), tido como irreversível. Não é assim que se opera o direito e, muito menos, se obtém a justiça.
Se levarmos um pouco ao pé da letra o brocardo de Ulpiano conceituando a justiça
“Viver honestamente, não lesar a ninguém e dar a cada um aquilo que é seu por direito”
podemos fazer com que o Direito seja “direito” e que o título deste tópico seja, apenas, uma suposição inexequível.
4- Tratar das causas como se fossem suas.
Este é um ponto de suma importância.
Vamos, antes de mais nada, relembrar o que está expresso no artigo 5º, inciso I da nossa Lei Suprema: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”;
Pois bem, vivemos em uma época, utilizando o título de um livro de Norberto Bobbio, na “Era dos direitos” onde, só olhamos para aquilo que nos interessa.
Buscamos sempre os nossos direitos nos esquecendo de nossas obrigações, constitucionalmente, estabelecidas na mesma proporção.
O título deste tópico é a maior prova, na minha modesta visão, de amor à profissão. Quando alguém procura um advogado é porque todas as formas que tal pessoa tinha para resolver a questão, seja ela qual for, esgotaram-se.
Muitas vezes o advogado é a única esperança para a solução do que aflige aquela pessoa, família, empresa...antes, até mesmo, da justiça. Dai a importância de dar à causa a ”real importância” que ela merece. Pode ser apenas mais uma para você, porém é a única para quem lhe procura.
O sucesso ou o fracasso de uma demanda andam na mesma linha, mas, apesar disso, nunca andam juntos. Tratar o cliente como você gostaria (e porque não, gosta) de ser tratado, se empenhar na causa dele como gostaria que se empenhassem na sua independentemente do valor cobrado; esfera ajuizada; da comparação com outras demandas que possui é, literalmente, colocar em prática a máxima de “fazer para o próximo aquilo que faz para você”.
Devemos buscar sempre os nossos direitos e, também, as nossas obrigações. E para que possamos exteriorizá-los, devemos começar pelas nossas obrigações inerentes ao nosso “Eu”, ou seja, valores morais e éticos.
5- Não poupar trabalho nem tempo para obter a vitória da causa sob seus cuidados.
Este tópico deveria estar invertido com o tópico 6, pois, na minha visão, você só pode dispender tempo e esforço em um trabalho se o aceitar.
Observação feita, passemos agora para uma questão muito corriqueira no cotidiano do profissional. O trabalho e o tempo para cada demanda.
Sempre é pertinente lembrar que para o advogado, a cada causa que pega, é mais uma no curriculum, porém, para aquele que contrata, muitas vezes, é a única.
Em muitos casos é cobrado um valor que nem sempre é um valor que mereça destaque, mas foi cobrado. É aquilo o que foi acordado e o compromisso foi firmado com o cliente. Ele não tem culpa. E é ai que reside um grande problema que, inevitavelmente, originam-se os dois substantivos deste tópico: trabalho e tempo.
Não poupar trabalho e nem tempo para cada demanda, nada mais é do que tratar todas as causas de forma isonômica, ou seja, com o mesmo profissionalismo e dedicação independentemente do valor cobrado ou complexidade do caso (o que é subjetivo), pois a vitória, por mais que os caminhos para ela sejam diversos, é sempre única.
Separar o joio do trigo, neste caso, na minha visão, não é a melhor saída. Só podemos alcançar a busca plena de nossa trajetória profissional (e porque não pessoal) se tratarmos a nós mesmos de forma igual em nossas condutas.
Muita gente que lê o que aqui escrevo pode estar pensando em Aristóteles: “Tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual”, porém, a questão aqui é taxativa: para um profissional que se preze, no sentindo amplo da coisa, todos os clientes (que aceitou) são iguais!
6- Não aceitar trabalhos além dos que seu tempo lhe permita.
Como já exposto no tópico anterior, este deveria ser o “5”.
Pois bem, se não tem tempo para dedicar-se como o cliente espera que se dedique, não aceite mais trabalhos. Tempo é dinheiro. Se alguém ganha, tem outro alguém que o perde.
A questão aqui é fazer com que esse outro alguém, no caso o cliente, não o perca sem justa causa. E o advogado quando não aceita o trabalho por não ter possibilidades de se dedicar com afinco na causa, mostra-se, antes de mais nada, um ser humano justo (moralmente).
7- Amar a justiça e a honra como a menina dos seus olhos.
Aqui vejo os profissionais que amam de verdade a profissão que escolheram, colherem os melhores resultados.
Tudo que é feito com amor, tem sabor diferente. É assim em tudo!
Basta percebermos nas pequenas coisas que, na maioria das vezes, passam por nós des(a)percebidas. Uma comida feita com amor, por mais simples que seja, tem sabor diferenciado; um beijo da amada, ou do amado, tem muito mais impacto do que um beijo momentâneo em alguém que não nos significa nada; uma conversa com um amigo de verdade tem muito mais “entrega” do que se fosse com um conhecido. É assim, também, na profissão.
Acordar pela manhã sabendo das grandes responsabilidades do dia e sorrir antes de levantar da cama, não há preço a ser estipulado! É a consagração da satisfação de exercer aquilo que escolheu e, com toda a certeza, milhares queriam estar exercendo em seu lugar.
Com total segurança posso afirmar que isso faz a diferença pra você e para seu cliente. Amor gera amor, seja ele da forma que for (até rimou).
Ame a justiça! Ame a honra! Por mais que não saibamos, exatamente, o conceito absoluto de justiça e honra, pois cada um tem o seu, vale a pena amar sua própria justiça e sua própria honra do que não amar coisa nenhuma.
8- Indenizar o cliente dos prejuízos que, por culpa sua, porventura, venha ele a sofrer.
Nada mais ético, moral e profissional do que reconhecer o erro e fazer valer o disposto no título deste tópico.
Devemos sempre exercer o nosso trabalho de forma impecável, porém, imprevistos acontecem. É nosso dever a cada dia saber mais e mais para dirimirmos as possibilidades de erros e, consequentemente, danos aos nossos clientes e a nós mesmos!
O profissional que pensa já saber tudo reconhece, implicitamente, que não sabe nada. Reaprender todo dia aquilo que pensa já saber é a pura demonstração da busca pela excelência, seja na vida profissional ou pessoal.
9- Ser sempre verdadeiro, sincero e lógico.
Quantas vezes no anseio de adquirir, captar ou fechar um negócio promete-se o que não se pode cumprir? Quantas causas “ganha-se” sem, ao menos, tê-las pego?
Este é um modelo de profissional que não podemos mais admitir no mercado.
Às vezes por falta de conhecimento, vivência técnica-jurídica ou, muitas vezes por má-fé consciente mesmo, o profissional promete o que não é capaz de ter a certeza de que pode cumprir, lesando o cliente não somente na esfera financeira mas, também, na esfera moral.
O tópico se refere à 03 (três) adjetivos intrínsecos de muita valia para o sucesso profissional e, porque não, para o pessoal?! Basta, somente, colocá-los em prática.
Ser verdadeiro (principalmente consigo) com seu cliente é, antes de mais nada, uma obrigação senão moral/profissional, sendo, portanto, o princípio de uma relação de sucesso independentemente do resultado final da demanda.
Dizer ao seu cliente a real situação dele quanto aos fatos que lhe são apresentados é, acima de tudo, uma demonstração de eticidade e moralidade muito além da esfera profissional, mesmo que os seus dizeres não sejam, exatamente, o que ele espera ouvir. Não se traia, pois traição de terceiros não podemos evitar, mas a nossa própria traição, esta sim, é evitável.
Ser lógico é ser racional, ou seja, não há nenhum tipo de magia jurídica que consiga o impossível. Não tem como ser um alquimista da Lei iludindo o cliente com coisas impossíveis ou, pior ainda, fazê-lo acreditar que além de advogado és, também, um mago.
Lembre-se: 2+2 será sempre 4. Tudo bem, sei que tal operação é uma ciência exata, porém a ciência humana é quem a opera.
10- Implorar a Deus ajuda para o êxito de suas demandas, pois ele é o primeiro protetor da justiça.
Como o Estado é laico, vou abster-me de comentar este último tópico.
Advogado; Consultor jurídico; Vice-Presidente da Comissão de Direito Penal e Direito Processual Penal da OAB/SP-Subseção Lapa; Membro da Comissão de Prerrogativas da OAB/SP-Subseção Lapa; Pós-graduando em Direito Penal e Direito Processual Penal; Pós-graduando em Direito Civil e Direito Processual Civil; Autor de diversos artigos jurídicos publicados em sites, revistas e jornais especializados; Colunista e orientador jurídico do projeto Prodigs - Ação Pró-dignidade sexual; Palestrante.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VENTURA, Denis Caramigo. Comentários ao decálogo do advogado: Ser diferente é ser normal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jan 2014, 07:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38088/comentarios-ao-decalogo-do-advogado-ser-diferente-e-ser-normal. Acesso em: 23 dez 2024.
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