RESUMO: O presente artigo põe em discussão o destino a ser dado ao recurso de agravo de instrumento quando, entre a decisão monocrática proferida pelo desembargador relator e o seu julgamento final pelo órgão colegiado, é prolatada a sentença no juízo de primeiro grau. A questão, embora já bastante discutida nos tribunais brasileiros, ainda não se pode dizer pacificada, havendo decisões que se firmam tanto pela perda de objeto do agravo quanto pela sua subsistência. Entende-se aqui que ambas as teses se afiguram defensáveis, sendo fundamental uma análise caso a caso, a fim de aferir se ainda há utilidade no recurso, mesmo após prolação da sentença, para então decidir pela concessão ou não de efeito ultra-ativo à decisão do agravo.
PALAVRAS-CHAVE: Processual Civil. Recursos. Agravo de Instrumento. Superveniência de sentença. Ultra-atividade.
SUMÁRIO: Introdução; 1 O agravo de instrumento e a decisão monocrática prevista no artigo 557, III, do CPC; 2 A celeuma em torno da possibilidade de conferir ultra-atividade aos efeitos da decisão do agravo; 3 A jurisprudência brasileira acerca do tema; 4 Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO
O agravo de instrumento é modalidade de recurso que comporta, antes de seu julgamento pelo órgão colegiado, uma espécie de decisão preliminar, prolatada de forma monocrática pelo desembargador relator. Ao receber o agravo, portanto, pode o relator, em seu decisum, adotar quaisquer das condutas previstas no artigo 557 do Código de Processo Civil, dentre as quais se inclui a possibilidade de atribuição de efeito suspensivo ou antecipação da tutela recursal.
Muitas vezes, contudo, no intervalo de tempo entre a prolação da sobredita decisão monocrática e o julgamento do agravo, vem a ser proferida a sentença no primeiro grau, fazendo surgir a indagação acerca da subsistência ou não do recurso. A doutrina brasileira vem debatendo o assunto, mas as opiniões ainda não se mostram uníssonas. Na jurisprudência, a seu turno, o que igualmente se vê é a divergência de opiniões, seja no Superior Tribunal de Justiça, seja nos Tribunais Regionais Federais.
Com efeito, o tema não é simples e a verdade é que ambas as teses são bastante defensáveis. A solução mais adequada, ao que parece, tem consistido em analisar cada caso com suas peculiaridades. Todo esse panorama é o que se procura minudenciar nos tópicos a seguir.
1 O AGRAVO DE INSTRUMENTO E A DECISÃO MONOCRÁTICA PREVISTA NO ARTIGO 557, III, DO CPC
Como bem se sabe, o agravo de instrumento é modalidade de recurso cabível em face de decisões interlocutórias, passível de manejo nas hipóteses precisamente delimitadas no artigo 522 do Código de Processo Civil, in verbis:
Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento.
Assim, uma vez irresignada com a decisão interlocutória proferida pelo juízo de primeiro grau, sendo esta suscetível de causar-lhe lesão grave e de difícil reparação, abre-se à parte a possibilidade de aviar recurso de agravo de instrumento dirigido ao respectivo Tribunal, no intuito de suspendê-la, cassá-la ou simplesmente reformá-la.
O agravo de instrumento, todavia, não é julgado de plano pelo órgão colegiado do Tribunal. Em uma primeira análise, ele é objeto de apreciação exclusiva do Desembargador Relator, que pode, dentre as possibilidades elencadas no artigo 527 do CPC, atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir total ou parcialmente a tutela antecipada recursal requerida, mediante decisão monocrática. É o que reza o inciso III do referido dispositivo legal, in verbis:
Art. 527. Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator:
[...]
III - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão
Frequentemente, contudo, no interregno de tempo entre a prolação da decisão monocrática que atribui efeito suspensivo ou concede tutela antecipada recursal ao agravo e o seu julgamento pelo órgão colegiado, o juiz de primeiro grau profere sentença no bojo do processo originário. Em casos que tais, surge então a celeuma em torno do destino a ser dado à decisão proferida no agravo, que suspendeu/cassou/reformou a decisão interlocutória objeto do recurso.
2 A CELEUMA EM TORNO DA POSSIBILIDADE DE CONFERIR ULTRA-ATIVIDADE AOS EFEITOS DA DECISÃO DO AGRAVO
Uma grande parte dos magistrados parte do pressuposto de que o agravo de instrumento perde o objeto face à prolação de sentença no primeiro grau, de modo que, via de regra, já no corpo do comando sentencial, já determinam que seja tal fato noticiado ao relator do agravo.
Aqueles que se posicionam pela perda de objeto do agravo dão prevalência ao critério da cognição. De um lado, tem-se a sentença prolatada pelo magistrado a quo, em cognição exauriente. De outra banda, tem-se a decisão monocrática proferida pelo desembargador relator, suspendendo os efeitos de decisão interlocutória fundada em um juízo de cognição sumária. Assim, a sentença proferida, de cognição mais profunda, engloba a decisão agravada, acarretando a insubsistência de interesse no seguimento do agravo, que perde o seu objeto.
Embora seja bastante plausível a referida tese – de que o agravo de instrumento perde objeto ante a prolação de sentença pelo juízo a quo – tenho como igualmente defensável o entendimento que acredita na subsistência da decisão monocrática do agravo, mesmo diante da superveniência de sentença.
De acordo com essa linha, o efeito suspensivo inicialmente concedido pelo desembargador relator, ainda que a título precário, substitui integralmente a decisão agravada, nos termos do artigo 512 do CPC, motivo pelo qual a decisão monocrática do agravo deve manter a sua eficácia até ulterior deliberação do órgão colegiado, julgando o recurso em definitivo. Não pode a decisão do relator, portanto, simplesmente ser reformada pelo juiz a quo, ainda que através de sentença. Desse modo, a decisão monocrática proferida no bojo do agravo de instrumento deve prevalecer sobre a sentença, até pronunciamento definitivo da Seção/Turma julgadora acerca do caso.
Essa prevalência da decisão monocrática do agravo em detrimento da sentença se justifica, no caso, em virtude da aplicação do critério da hierarquia, segundo o qual a sentença, proferida por juízo singular, não pode prevalecer sobre a decisão final do agravo, proferida por órgão colegiado. Assim, o agravo não perde o objeto e a decisão monocrática permanece hígida mesmo ante a superveniência de sentença, que só produzirá efeitos caso se negue provimento ao agravo, confirmando-se a decisão agravada.
Os defensores dessa tese têm feito referência, portanto, à necessidade de conferir ultra-atividade aos efeitos da decisão prolatada em agravo de instrumento.
Assim, há de prevalecer, leia-se, ter ultra-atividade, a decisão de agravo de instrumento, toda vez que o juiz de segundo grau antever a necessidade da concessão da liminar (efeito suspensivo ativo), ou confirmá-la, a despeito do juízo de primeiro grau não mais reconhecê-la quando do encerramento de sua função, em primeira instância[1].
3 A JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA ACERCA DO TEMA
Pesquisando acerca do tema na jurisprudência brasileira, vê-se que as opiniões são bastante dissonantes, havendo entendimento majoritário no sentido da perda de objeto do agravo diante da prolação de sentença no primeiro grau. Nesse sentido, confiram-se os julgados do Superior Tribunal de Justiça, colacionados abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ORIUNDO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE NEGOU PROVIMENTO A AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU TUTELA ANTECIPADA. SENTENÇA SUPERVENIENTE QUE EXTINGUIU O PROCESSO POR ILEGITIMIDADE ATIVA. PERDA DE OBJETO DO ESPECIAL. PRECEDENTES.
AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido da perda de objeto do Agravo de Instrumento contra decisão concessiva ou denegatória de liminar com a superveniência da prolação de sentença, tendo em vista que esta absorve os efeitos do provimento liminar, por se tratar de juízo de cognição exauriente." (REsp 1.332.553/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 4/9/2012, DJe de 11/9/2012).
2. No presente feito, a situação é bem mais característica, pois a sentença reconheceu a ilegitimidade da parte autora, extinguindo o processo sem resolução do mérito. Não há mais, portanto, como se discutir, acerca de provimento perfunctório, antecipação de tutela de mérito, na medida em que, com a extinção da própria ação, não mais subsiste a decisão atacada no agravo de instrumento mencionado.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1208227/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 06/08/2013, DJe 15/08/2013)
(grifo nosso)
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PERDA DE OBJETO.
1. Cinge-se a demanda à sentença superveniente à ação principal que acarretou a perda de objeto do Agravo de Instrumento que tratava da antecipação dos efeitos da tutela.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido da perda de objeto do Agravo de Instrumento contra decisão concessiva ou denegatória de liminar com a superveniência da prolação de sentença, tendo em vista que esta absorve os efeitos do provimento liminar, por se tratar de juízo de cognição exauriente.
3. Recurso Especial não provido.
(REsp 1332553/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2012, DJe 11/09/2012)
(grifo nosso)
A verdade, contudo, é que o tema é motivo de celeumas no próprio STJ, cuja Corte Especial, em sede de Embargos de Divergência, firmou entendimento no sentido de que a prolação de sentença no juízo de primeiro grau não prejudica o agravo de instrumento. Convém transcrever a ementa do julgado:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE CONCEDE TUTELA ANTECIPADA.
SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE MÉRITO CONFIRMANDO A TUTELA. PERDA DO OBJETO. INOCORRÊNCIA.
1. A superveniência da sentença de procedência do pedido não prejudica o recurso interposto contra a decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela.
2. Embargos de divergência rejeitados.
(EREsp 765105/TO, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/03/2010, DJe 25/08/2010)
(grifo nosso)
Oportuno transcrever, nesse ponto, trecho do voto do relator, Ministro Hamilton Carvalhido, que bem elucida o impasse, in verbis:
É que, enquanto a Terceira Turma decidiu que "A sentença de mérito superveniente não prejudica o agravo de instrumento interposto contra a tutela antecipada", a Segunda Turma decidiu que o recurso relativo à antecipação da tutela perde o objeto com a superveniência da sentença de procedência, que absorve os seus efeitos, por se tratar de decisão proferida em cognição exauriente.
Numa palavra, situa-se a divergência em se a sentença de procedência torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que defere antecipação de tutela.
Isso estabelecido, tenho que a superveniência da sentença de procedência do pedido não torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela. É que a antecipação da tutela não antecipa a sentença de mérito, mas sim a própria execução do julgado que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela antecipada.
O Ministro Aldir Passarinho, que acompanhou o relator, fez as seguintes ponderações em seu voto, a saber:
Sabemos que inúmeros exemplos existem de decisões de 1º grau dadas em tutela francamente contrárias à jurisprudência não só da Corte de 2º grau, como muitas vezes do STJ ou STF. E, quando vem o agravo de instrumento dirigido à Corte de 2º Grau, simplesmente o juiz julga por sentença em sentido oposto, e frustra-se aquela proteção dada pela instância superior.
Mas, no caso da tutela antecipada, dando-se a cobertura da Corte Superior em relação a isso - e a Corte Superior que eu digo é de 2º Grau ou uma Corte
Nacional - penso que merece tal proteção. Ela não fica frustrada por uma decisão monocrática que tenha sido contrária. Então, penso que o agravo, realmente, mantém viva a matéria, e não fica prejudicado.
Nos tribunais regionais federais, a questão não é pacífica. É crescente, todavia, o número de precedentes a esposar entendimento no sentido da subsistência do agravo, senão vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR.
1. Em respeito ao princípio da ultratividade, o presente agravo de instrumento não se apresenta prejudicado, porquanto a decisão substitutiva de 2º grau prevalece sobre a decisão monocrática do juízo de origem, ainda que se trate de sentença, até que o Tribunal aprecie a respectiva apelação;
2. Se o procedimento administrativo fiscal oportunizou a notificação ao contribuinte, considerando o seu domicílio fiscal, para impugnar o respectivo auto de infração, tendo o contribuinte quedado inerte, em princípio, inexiste direito líquido e certo do contribuinte à apreciação do pedido de revisão do débito, tampouco de análise da respectiva documentação, porque ultrapassada a fase oportuna;
3. De resto, é impertinente a invocação do art. 65 da lei 9.784/99, porquanto o princípio da especialidade impõe a obediência, no caso, ao Decreto nº 70.235/72;
4. Ausente a plausibilidade do direito material deduzido na ação mandamental, impõe-se considerar a relevância dos argumentos da União agravante;
5. Agravo de instrumento provido.
(TRF 5ª Região, AG nº 00037412320104050000, Rel. Des. Paulo Roberto de Oliveira Lima, Terceira Turma, DJE 19/08/2010, p. 539).
(grifo nosso)
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA RECURSAL. DEFERIMENTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA MANDADMENTAL. SUPERVENIENTE PROLAÇÃO DE SENTENÇA EM SENTIDO CONTRÁRIO. PREJUDICIALIDADE DO AGRAVO NÃO CARACTERIZADA. EFICÁCIA DO JULGADO PROFERIDO PELO JUÍZO AD QUEM.
I – Encontrando-se a controvérsia instaurada, em sede de medida liminar, devolvida à Corte Revisora e tendo esta, como no caso, examinado e deferido a antecipação da tutela recursal, o julgado recorrido, por via de agravo de instrumento, encontra-se integralmente substituído pelo decisum do Tribunal, nos termos do art. 512 do CPC, devendo, por isso, manter a sua eficácia, até ulterior deliberação judicial da Turma julgadora, eis que não pode ser reformada, pelo juízo monocrático, mesmo que por ato sentencial, mormente em se tratando de tutela de natureza mandamental, como na espécie em comento.
II – Agravo regimental desprovido.
(AGRAVO REGIMENTAL NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 2007.38.15.000285-1/MG, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, Sexta Turma, julgado em 15/12/2008).
(grifo nosso)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA NO PROCESSO PRINCIPAL. PERDA DO OBJETO. INOCORRÊNCIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DO AGTR.
1. O presente Agravo de Instrumento está de acordo com a linha de entendimento adotada por esta Corte, segundo a qual a decisão proferida no AGTR em favor do requerente se sobrepõe à eficácia da sentença prolatada no primeiro grau, não perdendo, assim, o recurso o seu objeto, quando a decisão desta Corte, mesmo monocrática, houver sido proferida em sentido contrário ao adotado pela sentença de primeiro grau. Precedentes do TRF5. AGTR 28.434, Rel. Des. Federal RIDALVO COSTA, DJU 26.10.07; AGTC 33.187-AL, Rel. Des. Federal CASTRO MEIRA, DJU 02.08.01, p. 637; AGTR 66.412, Des. Federal MANOEL ERHARDT, DJU 12.11.07.
2. Embargos de Declaração improvidos.
(PJE: 08002081820134050000, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL ERHARDT, Primeira Turma, JULGAMENTO: 01/08/2013)
(grifo nosso)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SENTENÇA PROLATADA NA PRIMEIRA INSTÂNCIA EM SENTIDO DIAMETRALMENTE OPOSTO À DECISÃO EMBARGADA. PERDA DO OBJETO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. INOCORRÊNCIA.
1. A despeito de ter sido prolatada sentença de mérito nos autos da ação originária, julgando improcedente o pleito autoral, não restou prejudicado o agravo de instrumento, haja vista que o posicionamento expresso na sentença encontra-se em sentido diametralmente oposto ao entendimento firmado por este Tribunal, permanecendo, assim, o interesse da parte autora no julgamento de seu pedido por esta Corte, tendo, inclusive, interposto recurso de apelação, não havendo, portanto, que se falar em perda de objeto.
2. Pelo não provimento dos embargos declaratórios da União.
(PROCESSO: 0013777272010405000001, EDAG109864/01/RN, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 01/12/2011, PUBLICAÇÃO: DJE 09/12/2011 - Página 135)
(grifo nosso)
5 DA NECESSIDADE DE UMA ANÁLISE CASO A CASO
A polêmica em torno do assunto se explica em grande parte, na verdade, em virtude do fato de que ambas as teses são defensáveis. Com efeito, em muitos casos, não parece adequado – e tampouco justo – fadar à perda de objeto todos os agravos de instrumento ante a prolação de sentença. “O destino que deve ser dado ao agravo, depois de proferida a sentença, depende do conteúdo da decisão impugnada”. [2] Há quem vá além, afirmando que “a resposta a essa questão depende da natureza da decisão interlocutória recorrida por agravo de instrumento e também do fato de a sentença ter ou não transitado em julgado”.[3]
Acredito que a melhor baliza, nesses casos, consiste simplesmente em lançar um olhar sobre os contornos do caso posto à apreciação, de modo a aferir se o agravo de instrumento ainda tem utilidade para o recorrente.
A sorte do agravo de instrumento pendente de julgamento dependerá sempre da análise do caso concreto, não se podendo dizer abstratamente que a só superveniência da sentença vai gerar, ipso facto, a perda de objeto do referido recurso.[4]
O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, já esposou posicionamento bastante atento a essa necessidade de observar o caso concreto para decidir o destino a ser dado ao agravo, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM PROCESSO CAUTELAR JULGADO POSTERIORMENTE À SENTENÇA. DÚVIDA QUANTO Á PERDA DE OBJETO. ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO ULTRA PETITA. AUSÊNCIA.
1. A superveniência da sentença no processo principal não conduz, necessariamente, à perda do objeto do agravo de instrumento. A conclusão depende tanto "do teor da decisão impugnada, ou seja, da matéria que será examinada pelo tribunal ao examinar o agravo, quanto do conteúdo da sentença" (O destino do agravo depois de proferida a sentença. Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e de Outros Meios de Impugnação às Decisões Judiciais. Série 7. Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier - coordenadores. São Paulo: RT, 2003).
2. A questão soluciona-se pela aplicação de dois critérios: a) o da hierarquia, segundo o qual a sentença não tem força para revogar a decisão do tribunal, razão por que o agravo não perde o objeto, devendo ser julgado; b) o da cognição, pelo qual a cognição exauriente da sentença absorve a cognição sumária da interlocutória.
Neste caso, o agravo perderia o objeto e não poderia ser julgado.
3. Se não houver alteração do quadro, mantendo-se os mesmos elementos de fato e de prova existentes quando da concessão da liminar pelo tribunal, a sentença não atinge o agravo, mantendo-se a liminar. Nesse caso, prevalece o critério da hierarquia. Se, entretanto, a sentença está fundada em elementos que não existiam ou em situação que afasta o quadro inicial levado em consideração pelo tribunal, então a sentença atinge o agravo, desfazendo-se a liminar.
4. Trata-se de medida cautelar no curso da qual não houve alteração do quadro probatório, nem qualquer fato novo, entre a concessão da liminar pelo tribunal e o julgamento de improcedência do pedido do autor. Prevalência do critério da hierarquia. Agravo de instrumento não prejudicado.
5. Ausência de julgamento ultra petita.
6. Recurso especial improvido.
(RESp nº 742.512/DF; Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 11/10/2005, DJ 21/11/2005, p. 206).
(grifo nosso)
4 CONCLUSÃO
Por tudo o que foi aqui exposto, vê-se que a questão acerca do destino a ser dado ao agravo de instrumento ante a superveniência da sentença no primeiro grau não é tema simples, ao qual se pode conferir um entendimento simples e universal. Ambas as teses – tanto a que defende a perda de objeto do agravo quanto a que entende pela necessidade de conferir ultra-atividade aos efeitos de sua decisão – apresentam pontos de vista claramente plausíveis e defensáveis juridicamente.
A jurisprudência brasileira, a propósito, após muitas discussões em torno do assunto, parece vir se atentando para esse fato de que não é adequado conferir uma solução apriorística única para a questão. Com efeito, é preciso analisar cada caso posto à apreciação, verificando o conteúdo da decisão agravada, bem como se o recurso ainda tem utilidade para o recorrente, dentre outros fatores, para então aí, e somente aí, decidir pela perda de objeto ou não do agravo de instrumento.
REFERÊNCIAS
DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. I. Salvador: Jus Podivm, 2007, p. 176/177.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 2ª ed., São Paulo: Método, 2010, p. 639.
TRENNEPOHL, Terence Dornelles. Ultra-atividade das decisões de agravo de instrumento após prolação da sentença em primeiro grau. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, recife, n. 5, p. 257-269, nov. 2003. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/29188>. Acesso em: 22 abr. 2012.
WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. O destino do agravo após a sentença. In: NERY JR., Nelson; ALVIM, Teresa Arruda (coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: RT, 2003, p. 689.
[1] TRENNEPOHL, Terence Dornelles. Ultra-atividade das decisões de agravo de instrumento após prolação da sentença em primeiro grau. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, recife, n. 5, p. 257-269, nov. 2003. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/29188>. Acesso em: 22 abr. 2012.
[2] WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. O destino do agravo após a sentença. In: NERY JR., Nelson; ALVIM, Teresa Arruda (coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: RT, 2003, p. 689.
[3] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 2ª ed., São Paulo: Método, 2010, p. 639.
[4] DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. I. Salvador: Jus Podivm, 2007, p. 176/177.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARROS, Larissa Suassuna Carvalho. Agravo de instrumento e a celeuma em torno da concessão de ultra-atividade aos efeitos de sua decisão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 fev 2014, 06:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38423/agravo-de-instrumento-e-a-celeuma-em-torno-da-concessao-de-ultra-atividade-aos-efeitos-de-sua-decisao. Acesso em: 23 dez 2024.
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