INTRODUÇÃO
Questão polêmica no seio jurídico e causadora de grandes debates doutrinários e jurisprudenciais refere-se à nomeação de aprovados em concursos públicos, quanto mais quando realizados ou homologados em ano de eleições.
DESENVOLVIMENTO
Antes de adentrar nas particularidades das restrições previstas na legislação eleitoral, cabe uma parte a respeito do posicionamento jurisprudencial acerca do ato administrativo de nomeação de concurso público, considerado em seu sentido amplo.
Sob esse aspecto, o entendimento quase unânime nos tribunais era no sentido de que aprovação em concurso público gerava simples expectativa de direito. Todavia, hoje em dia, tal posicionamento encontra-se superado, como adiante a verificará.
Não havia, portanto, obrigação por parte da Administração em nomear os interessados e aprovados em seus certames. De outro lado, havia direito em caso de descumprimento da classificação no concurso para o preenchimento do cargo.
Seguindo essa linha, o Supremo Tribunal Federal proferiu diversos julgados, a exemplo do MS nº 16.182.
Todavia, posteriormente a esse momento, passaram a surgir decisões do Superior Tribunal de Justiça que reconheciam o direito subjetivo à nomeação a candidatos aprovados dentro do número de vagas previsto nos editais.
Nessa esteira, o STJ foi firmando entendimento, como se observa do julgamento do RMS nº 25.957, dentre vários outros.
Em sede doutrinária, essa tese também foi ganhando força. A respeito do tema, Dirley da Cunha Júnior ensina:
Com efeito, não é legítimo que a Administração Pública, após desgastante concurso público, frustre as justas expectativas de candidato aprovado dentro das vagas previstas no edital. Os princípios da legalidade, da razoabilidade e da moralidade administrativa impõem a nomeação de candidato aprovado dentro das vagas previstas no edital, não podendo na hipótese se falar em conveniência e oportunidade da Administração. A nova dogmática constitucional dos direitos fundamentais, com a sua centralidade no sistema jurídico, tem exigido maior respeito aos direitos dos candidatos aprovados em concurso público, não havendo muito espaço para as opções discricionárias da Administração Pública. Nesse passo, deve ser entendida como superada a ideia, fruto do ranço autoritário, de que o candidato aprovado em concurso público, dentro das vagas previstas em edital, tem mera expectativa de direito à nomeação, tendo a Administração a liberdade discricionária de decidir se nomeia ou não (CUNHA JÚNIOR, 2012, p. 283).
Seguindo a evolução doutrinária e jurisprudencial, o Supremo Tribunal Federal, em emblemático julgamento proferido em agosto de 2011, no julgamento do RE n° 598.099/MS, relatado pelo Ministro Gilmar Mendes, pacificou a questão ao dispor que o candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas do edital possui direito subjetivo de ser nomeado.
Mais ainda, a Corte Suprema estendeu o direito subjetivo à nomeação aos candidatos aprovados fora do número de vagas previstas no edital, mas que passasse a figurar entre as vagas em decorrência da desistência de candidatos classificados em colocação superior.
Confira-se, nesse sentido excerto do Aresto proferido no bojo do Recurso Extraordinário com Agravo ARE 675202 AgR/PB, relatado pelo Ministro Ricardo Lewandowski, em 06/08/2013:
EMENTA
(...)
II – O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 598.099/MS, Rel. Min Gilmar Mendes, firmou jurisprudência no sentido do direito subjetivo à nomeação de candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital de concurso público. Tal direito também se estende ao candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital, mas que passe a figurar entre as vagas em decorrência da desistência de candidatos classificados em colocação superior.
Em outras palavras, significa dizer que com a alteração do entendimento pela Corte Constitucional, restou evidenciado que dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderia optar pelo momento no qual efetivaria a nomeação. De outro lado, não poderia dispor sobre o ato administrativo da nomeação prevista no corpo do edital, passando a consubstanciar um direito do concursando aprovado e, mais ainda, em uma obrigação imposta ao poder público.
Vale dizer, portanto, que, com base no princípio de vinculação aos termos do edital, o qual passa a valer como lei entre as partes, publicado o certame com determinado número de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados cria um dever de nomeação para a Administração e, paralelamente, um direito à nomeação do candidato.
A respeito do tema, traz-se à baila a lição de Paulo e Alexandrino:
Por outras palavras, quando a administração pública fixa no edital de um concurso o número certo de vagas a serem preenchidas pelos aprovados, ela tem a obrigação – passível de ser exigida judicialmente, se não cumprida de forma espontânea – de nomear os aprovados, obedecida a ordem de classificação, até o preenchimento completo das vagas previstas (desde que haja suficientes candidatos aprovados, é claro). Ela não é obrigada a nomear imediatamente, nem de uma só vez. Pode efetuar fracionadamente as nomeações, dentro do prazo de validade do concurso, em tantas parcelas quantas julgue convenientes ao interesse público. Não obstante, é certo que, até terminar o prazo de validade previsto no edital – que pode ser prorrogado por uma única vez –, a administração tem a obrigação de nomear os aprovados, até preencher o número de vagas estipulado nesse mesmo edital (ou até acabarem os aprovados, caso haja menos aprovados do que o número previsto de vagas) (PAULO e ALEXANDRINO, 2012, p. 277).
Outra questão polêmica e que recebe críticas por parte da doutrina, refere-se aos chamados cadastros de reserva, previstos no artigo 12 do Decreto nº 6.944, de 21 de agosto de 2009, o qual estabelece medidas organizacionais para o aprimoramento da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, dispõe sobre normas gerais relativas a concursos públicos, organiza sob a forma de sistema as atividades de organização e inovação institucional do Governo Federal, e dá outras providências, verbis:
Art. 12. Excepcionalmente o Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão poderá autorizar a realização de concurso público para formação de cadastro reserva para provimento futuro, de acordo com a necessidade, de cargos efetivos destinados a atividades de natureza administrativa, ou de apoio técnico ou operacional dos planos de cargos e carreiras do Poder Executivo federal.
Apesar disso, Paulo e Alexandrino demonstram preocupação com relação à utilização indevida dessa medida em face da orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal:
Posto isso, não podemos deixar de externar preocupação quanto a uma possibilidade – ao menos teórica – de fragilização desse direito assegurado de forma tão alvissareira, e veemente, pelo nosso Tribunal Supremo. A burla que antevemos – e esperamos seja rechaçada com firmeza pelo Poder Judiciário – consistiria na adoção, por parte de órgãos e entidades administrativos, em alguns entes federados, do expediente espúrio de sistematicamente elaborar editais, para concursos públicos que promovam, nos quais não seja estabelecido número certo de vagas. Esse modelo de edital, aliás, é bastante usual – e a verdade é que ele não surgiu com o objetivo de contornar a nova orientação jurisprudencial do STF, haja vista ser bem mais antigo do que ela. Geralmente é utilizado quando o órgão ou entidade administrativa deseja apenas formar os denominados 'cadastros de reserva' para futuras e eventuais nomeações, caso venham a ser necessárias (PAULO e ALEXANDRINO, 2012, p. 277).
No que se refere às particularidades referentes ao ano eleitoral, cumpre trazer à baila o 73, V, da Lei nº 9504/97, bem como o art. 50, V, da Resolução 23.191/TSE/2009, que estabelecem ser vedado, nos três meses que antecedem as eleições até a posse dos eleitos, nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvadas a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança; nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos Órgãos da Presidência da República; nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo; nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo; e a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários.
No que se refere às vedações impostas pelos dispositivos citados, cumpre destacar que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que para a configuração da conduta, não há necessidade de finalidade eleitoral, ou benefício de partido ou candidato ou coligação. Basta a prática dos atos no período de vedação. Destaco, ainda, que segundo a jurisprudência do Tribunal, a vedação é levada a cabo somente na circunscrição do pleito[1].
Ainda, a Corte Eleitoral Superior entende que a norma não proíbe a realização de concursos públicos, mas somente a nomeação de servidor, ou qualquer ato de investidura pública, não se levando em conta a posse, ato subseqüente à nomeação e que diz respeito à aceitação expressa pelo nomeado das atribuições, deveres e responsabilidades inerentes ao cargo, que fica autorizada no período de vedação. Nesse caso, a data limite para a posse dos novos servidores ocorrerá no prazo de 30 dias contados da publicação do ato de provimento, nos termos do art. 13, § 1º da Lei nº 8.112/90, desde que o concurso tenha sido homologado até três meses antes do pleito, conforme ressalva da alínea “c” do inciso V do art. 73 da Lei de Eleições. Do contrário, a posse dos aprovados somente poderá ocorrer após a posse dos eleitos[2].
CONCLUSÃO
Com base nas informações trazidas, nota-se que o entendimento acerca do direito à nomeação em concurso público evoluiu, passando a Corte Constitucional a considerá-la um direito subjetivo do concursando aprovado, quando dentro do número de vagas do edital.
No que se refere às restrições da legislação eleitoral, o TST entende que a norma não proíbe a realização de concursos públicos, mas somente a nomeação de servidor, ou qualquer ato de investidura pública, não se levando em conta a posse, ato subseqüente à nomeação e que diz respeito à aceitação expressa pelo nomeado das atribuições, deveres e responsabilidades inerentes ao cargo, que fica autorizada no período de vedação.
[1] Ac. de 02/05/2006 no RMS no 410, rel. Min. José Delgado.
[2] Nesse sentido, Res. Nº 21.806, de 04/06/2004, rel. Min. Fernando Neves.
Procurador-Chefe Nacional do DNIT. Pós-graduado em Direito Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Tiago Coutinho de. O direito à nomeação em concurso público e as restrições da legislação eleitoral Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 fev 2014, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38489/o-direito-a-nomeacao-em-concurso-publico-e-as-restricoes-da-legislacao-eleitoral. Acesso em: 23 dez 2024.
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