RESUMO: Este artigo visa abordar o ativismo judicial, face às inúmeras mudanças nos modelos constitucionais atuais onde a leitura clássica do principio da separação de poderes estabelecida por Montesquieu, que impunha limites rígidos à atuação do Poder Judiciário vem cedendo espaço a outras visões mais favoráveis atuação efetiva dos Poderes em defesa de valores constitucionais. Foi o grande marco da ampliação os direitos e garantias individuais, bem como a supremacia da Constituição o fim da Segunda Guerra Mundial que propiciou a redemocratização em diversos países, bem como surgimento do Constitucionalismo que resultou na atual supremacia da Constituição. O poder judiciário brasileiro sofreu grande influência dos debates que surgiram na Europa e nos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial. A Constituição Federal de 1988 introduziu duas importantes novidades no direito brasileiro, prevendo a ação de inconstitucionalidade por omissão e o mandado de injunção, instrumentos que visam impedir o desprestígio da própria Constituição em face da inércia legislativa. A atualidade tem a discussão acerca da omissão inconstitucional do legislativo como um dos grandes temas, bem como os instrumentos possíveis para supri-la. Por fim, abordar-se-á a repercussão desse fenômeno jurídico no direito brasileiro, sobretudo perante atuação do Supremo Tribunal Federal face da inércia do Poder Legislativo, visando assegurar a proteção da ordem constitucional contra omissões inconstitucionais, a supremacia da Constituição e dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos que devem ser sempre protegidos face a arbitrariedades e omissões inconstitucionais, bem como as críticas feitas a expansão do poder judiciário em substituição ao legislador nas lacunas existentes no ordenamento jurídico.
Palavras-chave: Constitucionalismo; Separação de poderes; Direitos Fundamentais; Poder Legislativo; Poder Judiciário; Ativismo Judicial; Omissões Inconstitucionais.
1 INTRODUÇÃO
A interpretação jurídica tradicional desenvolveu-se sobre duas premissas, a primeira quanto ao papel da norma, a qual cabe oferecer em seu corpo a solução para os problemas jurídicos e a segunda quanto ao papel do juiz, ao qual cabe identificar a norma a ser aplicada ao problema a ser resolvido e revelar a solução encontrada.
Atualmente a interpretação das normas constitucionais é um conjunto de métodos e princípios, e em razão da variedade de meios hermenêuticos, inexistem critérios que possam estabelecer um único método ou princípio correto a ser utilizado. Não existe atualmente uma teoria dos métodos de interpretação da constituição que esclareça se é necessário adotar um método previamente estabelecido, ou qual é o método que mostre o caminho a ser percorrido para alcançar a verdade.
Na atualidade, ocorre inevitavelmente a criação judicial do direito, e somente por meio de parâmetros objetivos e critérios firmes que será possível a manutenção da segurança jurídica, bem como se deve sempre dar preferência as sentenças interpretativas e a diminuição das sentenças normativas que alargam o texto da lei e permite ao juiz agir como legislador positivo.
Diante da omissão de medida para tornar efetiva uma norma constitucional que prevê garantias e direitos fundamentais, a Constituição Federal passou a prever a ação direta de inconstitucionalidade por omissão e o mandado de injunção. Esse dois remédios visam combater a inefetividade das normas constitucionais de eficácia limitada, sendo a concessão do Mandado de Injunção um modo de viabilizar o direito demonstrado na própria ação para a integração de prerrogativas e direitos constitucionais sem que se tenha que aguardar a superveniência de uma norma regulamentadora. Assim, se busca que o Poder Judiciário integre a norma jurídica constitutiva ou declaratória de direito.
2 O JUDICIÁRIO COMO FORMA DE CONCRETIZAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS
2.1 A TAREFA INTERPRETATIVA DA JURISPRUDÊNCIA
Luis Roberto Barroso (2012) afirma que o novo marco direito constitucional é o pós-positivismo, estando sua caracterização situada entre duas grandes correntes de pensamento que oferecem paradigmas opostos para o Direito: o jusnaturalismo e o positivismo.
Para o juspositivismo a atividade jurisdicional é “puramente declarativa ou reprodutiva de um direito preexistente”, é voltada para reproduzir o direito, para expor o conteúdo de normas jurídicas já existentes e não consiste numa atividade que é criativa ou produtiva de um novo direito (BOBBIO, 2006, p. 211-212). Explica ainda, que a interpretar é remontar do signo a coisa significada, isto é, compreender o significado do signo, individualizando a coisa por ele indicada, e como complexo de signos, a linguagem exige interpretação:
A interpretação é uma atividade muito complexa que pode ser concebida de diversos modos. Baseia-se na relação entre dois termos, o signo e o significado do próprio signo, e assim, assume sombreamentos diversos, segundo os quais tende a gravitar para um ou para outro desses dois polos: a interpretação pode ser ligada principalmente ao signo enquanto tal e tender a fazê-lo prevalecer sobre a coisa significada; ou ainda pode ser mais sensível à coisa significada e tender a fazê-la prevalecer sobre o signo puro; fala-se neste sentido respectivamente de interpretação segundo a letra e de interpretação segundo o espírito [...]. (BOBBIO, 2006, p. 213-214)
A linguagem jurídica utiliza-se de alguns signos que possuem determinados sentidos consensuais ou de baixo grau de controvérsia, outros, possuem cláusulas abertas, que incluem conceitos jurídicos indeterminados, que necessitam de interpretação e valoração. Em relação aos conceitos jurídicos indeterminados e princípios, embora possam existir certezas sobre o que significam ou deixam de significar, é indiscutível que há uma ampla área que se presta a valorações que não poderão fugir a algum grau de subjetividade.
Conforme explica Miguel Reale (2008, p. 580), a interpretação deve-se basear na experiência jurídica e não somente em critérios jurídicos e formais:
O juiz ou o advogado, que tem diante de si um sistema de Direito, não pode receber apenas como concatenação lógica de proposições. Deve sentir que nesse sistema existe algo de subjacente, que são os fatos sociais aos quais está ligado um sentido ou um significado que resulta dos valores, em um processo de integração dialética, que implica ir do fato à norma e da norma ao fato [...].
Defende Ronald Dworkin (2007, p. 306) uma ponderação entre as interpretações possíveis, buscando-se sempre a melhor decisão para a coletividade, refletindo a decisão não somente a sua convicção do justo, mas também outras convicções políticas e intrínsecas no magistrado:
Os casos difíceis se apresentam, para qualquer juiz, quando sua analise preliminar não fizer prevalecer uma entre duas ou mais interpretações de uma lei ou de um julgado. Ele então deve fazer uma escolha entre as interpretações aceitáveis, perguntando-se qual delas apresenta em sua melhor luz, do ponto de vista da moral política, a estrutura das instituições e decisões da comunidade – suas normas públicas como um todo. Suas próprias convicções morais e políticas estão agora diretamente engajadas. Mas o julgamento político que ele deve fazer é em si complexo e, às vezes, vai opor uma parte de sua moral política a outra: sua decisão vai refletir não apenas suas opiniões sobre a justiça e a equidade, mas suas convicções de ordem superior sobre possibilidade de acordo entre esses ideais quando competem entre si.
Hans Kelsen (2006) imagina as cláusulas abertas, como uma moldura de um quadro com várias possibilidades de interpretação dentro dela, sendo que a interpretação não leva a uma única decisão correta, mas a várias decisões possíveis. Assim, a interpretação torna-se essencial justamente pelo sistema de normas deixar abertas inúmeras possibilidades, não tendo nenhuma resolução sobre qual dos interesses é mais importante, sendo a determinação da hierarquia dos interesses um ato de produção normativa.
O sistema de interpretação tradicional deixou de ser integralmente satisfatório, quanto ao papel da norma, verificou-se que a solução dos problemas jurídicos nem sempre se encontram no relato abstrato do texto normativo e que o papel do juiz já não será apenas uma função de conhecimento técnico, voltado para revelar a solução contida no enunciado normativo, pois o intérprete tornou-se participante do processo de criação do direito, completando o trabalho do legislador, ao fazer valorações de sentido para as cláusulas abertas e ao realizar escolhas entre soluções possíveis, conforme expõe Ronald Dworkin (2006, p.350):
No caso da descrição positivista simples, os juízes devem aplicar regras criadas pelo poder legislativo na medida em que elas não sejam nem possam tornar-se ambíguas, mediante consulta à história legislativa e a outras fontes oficiais de intenção legislativa. Mas quando, como frequentemente acontece, as regras estabelecidas e interpretadas apenas nesse sentido são insuficientes para decidir o caso, então os juízes devem declarar que o direito não oferece nenhuma resposta e, a partir daí, legislar por conta própria para preencher a lacuna existente.
Norberto Bobbio (2006), afirma, que um dos campos que a interpretação mais se desenvolveu foi o do direito, que é constituído por um conjunto de textos que exprimem a vontade do legislador. A interpretação que para o positivismo constitui tarefa própria da jurisprudência seria somente na reconstrução pontual da vontade subjetiva do legislador, ao contrário da interpretação evolutiva, defendida atualmente, que se baseia em adaptar as normas as condições e exigências histórico-sociais variadas, sustentada pela corrente antipositivista.
2.2 A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL
Existe um escalonamento no ordenamento jurídico, em percebe-se entre “um grau mais alto e mais baixo no ordenamento jurídico, como entre Constituição e lei ou entre lei e sentença judicial, é uma relação de determinação ou de liame: a norma de grau superior regula [...] o ato pelo qual é produzida a norma de grau inferior.” (KELSEN, 2006, p.114).
Conforme entendimento de Hans Kelsen (2006, p.114-116) a norma superior deve sempre deixar um espaço de livre estimativa a norma inferior, de modo que a norma superior tenha uma moldura que preencha o ato de produção de norma ou execução a ser realizado pela norma inferior, mas deixando sempre uma parte indeterminada. Pode ser essa indeterminabilidade intencional, pelo fato da norma mais alta ser apenas uma norma geral, ou não intencional, pela pluralidade de significados que uma palavra ou frase podem apresentar ou pelo fato de duas normas contidas na mesma lei se contradizerem total ou parcialmente.
Quando ocorre a indeterminação intencional ou não no ordenamento, pode se aplicar a norma qualquer um dos significados extraídos da norma, desde que não contrarie o legislador, se apresentando para Kelsen (2006) moldura dentro da qual, diversas possibilidades de interpretação são possíveis, sempre de acordo com a norma superior e nunca contrariando-a. Assim, a interpretação conforme a constituição, como norma superior do nosso ordenamento jurídico, deve sempre ser observada pelas normas inferiores, sejam infraconstitucionais ou pelas sentenças judiciais.
O papel do Judiciário na interpretação e na efetivação da Constituição assumiu diversas faces nas discussões pelo mundo, dos quais podemos citar o ativismo versus contenção judicial ou interpretativismo versus não-interpretativismo. Nos Estados Unidos a discussão em torno do problema da interpretação constitucional, tem-se que o interpretativismo relaciona-se à postura segundo a qual, os limites de liberdade de conformação do interprete devem se dar nos limites do texto escrito, os juízes, portanto, devem se limitar ao texto da Constituição, não podendo criar ou inovar. Enquanto os adeptos da corrente não-interpretativista postulam uma espécie de política constitucional, defendendo a possibilidade dos juízes invocarem e aplicarem os princípios da liberdade e justiça, contra atos da responsabilidade do legislativo em desconformidade com a constituição. Conforme leciona José Joaquim Gomes Canotilho (2003, p. 1195):
As correntes interpretativistas consideram que os juízes, ao interpretarem a constituição, devem limitar-se a captar o sentido dos preceitos expressos na constituição, ou, pelo menos, nela claramente implícitos. O interpretativismo, embora não se confunda com literalismo – a competência interpretativa dos juízes vai apenas até onde o texto claro da interpretação lhes permite-, aponta como limites de competência interpretativa a textura semântica e a vontade do legislador. Estes limites são postulados pelo princípio democrático – a decisão judicial não deve substituir a decisão política legislativa da maioria democrática.
Assim, enquanto a corrente interpretativista, defende a limitação da decisão judicial a constituição e a vontade do poder político democrático, a corrente não interpretativista defende um papel mais criativo da jurisprudência na interpretação constitucional, mais ativista portanto, na medida que não se limitam a atuação jurisdicional ao texto escrito da constituição e à vontade do legislador. Para estes, defensores do sentido substancial da constituição deve apelar-se para os valores da justiça, igualdade e liberdade, e não apenas e prevalentemente para o princípio democrático, a fim de permitir aos juízes uma competência interpretativa.
A corrente não interpretativista segue o entendimento justamente que a constituição como norma jurídica superior é soberana no ordenamento jurídico, não sendo está supremacia perturbada pelo fato dos juízes recorrem aos princípios da justiça, da liberdade e da igualdade, pois a interpretação da constituição faz-se sempre tendo em conta o texto, a história, os precedentes, pois o direito não é apenas o conteúdo de regras jurídicas concretas, mas também é formado por princípios jurídicos abertos como justiça, igualdade e liberdade. O papel especial reservado a interpretação constitucional, muitas vezes para preenchimento de lacunas jurídicas, pela inexistência uma norma válida, aplicável ao caso concreto, quando o legislador deixa de normatizar o que deveria estar normatizado, faz o judiciário intervir, deixando a decisão para o aplicador do direito.
A teoria da interpretação constitucional, segundo Peter Haberle (1997) deve abranger um circulo amplo de participantes, e não se reduzir a uma sociedade fechada de interpretes, devendo todos os órgãos, grupos e cidadãos participar, sendo que os critérios de interpretação devem ser mais abertos quanto mais pluralista for a sociedade, subsistindo sempre a responsabilidade da jurisdição constitucional, que fornece em regra, a última palavra sobre a interpretação. Afirma ainda, que essas reflexões levam a uma relativização da hermenêutica constitucional jurídica, pois o juiz já não interpreta mais de forma isolada, tendo em vista existirem diversos participantes.
A ampliação do circulo de interpretes visado por Peter Haberle objetiva, uma integração da realidade no processo de interpretação. Defende este ilustre doutrinador, que a unidade da constituição não se perderia, pois deve-se observar que das regras básicas de interpretação resultam diferentes interpretes da Constituição no exercício de suas funções específicas, pois a unidade da Constituição surge do processo e das funções dos diferentes interpretes. Conforme explica o Peter Haberle (1997, p. 48):
Devem ser desenvolvidas novas formas de participação das potências públicas pluralistas enquanto intérpretes em sentido amplo da Constituição. O direito processual constitucional torna-se parte do direito de participação democrática. A interpretação constitucional realizada pelos juízes pode-se tornar, correspondentemente, mais elástica e ampliativa sem que se deva ou possa chegara a uma identidade de posições com a interpretação do legislador. Igualmente flexível há de ser a aplicação do direito processual constitucional pela Corte Constitucional, tendo em vista a questão jurídico-material e as partes materialmente afetadas (atingidos).
Assim, na busca por ideais de justiça, liberdade e da igualdade, não se deve reduzir a interpretação constitucional a uma sociedade fechada de interpretes, conforme defende Peter Haberle, ou um único sentido possível encontrado, pois o ordenamento é formado por princípios jurídicos abertos, e a norma muitas vezes oferece apenas a moldura dentro da qual se apresentam diversas possibilidades de interpretação.
2.3 AS OMISSÕES INCONSTITUCIONAIS
Para garantir a supremacia da Constituição, contra inconstitucionalidades vindas dos próprios poderes estabelecidos nesta, a Constituição estabeleceu técnica de controle de constitucionalidade das leis onde o Supremo Tribunal Federal, órgão máximo do poder judiciário, analisa por meio de controle concentrado a conformidade ou não de leis em face da Constituição, bem como estabeleceu o controle difuso realizado por tribunais do poder judiciário.
A omissão legislativa não é um conceito que pode ser reduzido a um simples não fazer, “a omissão, em sentido jurídico-constitucional, significa não fazer aquilo a que estava constitucionalmente obrigado.” (CANOTILHO, 2003, p. 1033). Assim, para que se possa considerar uma omissão como inconstitucional, não basta ser tida como um eventual não fazer, mas sim, um não fazer aquilo a que estava obrigado, decorrente da inércia do Estado que não atende os preceitos da Constituição.
A lei 9.868/99 teve acrescentanda pela Lei nº 12.063/09 a regulamentação do trâmite da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, vindo esta norma a definir o objetivo deste novo instrumento de controle de constitucionalidade, qual seja: sanar omissões constitucionais quanto ao cumprimento de dever imposto pela Constituição de legislar, ou a adoção de providência de índole administrativa, destacou ainda, como um de suas inovações, a previsão expressa de que o Supremo Tribunal Federal poderá conceder medida cautelar para o fim de determinar a suspensão da aplicação da lei ou do ato normativo, conforme se verifica abaixo:
Art. 12-F. Em caso de excepcional urgência e relevância da matéria, o Tribunal, por decisão da maioria absoluta de seus membros, observado o disposto no art. 22, poderá conceder medida cautelar, após a audiência dos órgãos ou autoridades responsáveis pela omissão inconstitucional, que deverão pronunciar-se no prazo de 5 (cinco) dias. (Incluído pela Lei nº 12.063, de 2009).
§ 1o A medida cautelar poderá consistir na suspensão da aplicação da lei ou do ato normativo questionado, no caso de omissão parcial, bem como na suspensão de processos judiciais ou de procedimentos administrativos, ou ainda em outra providência a ser fixada pelo Tribunal. (Incluído pela Lei nº 12.063, de 2009).
No caso da falta de concretização da norma ser total, temos a falta absoluta de medidas legislativas ou outras para dar cumprimento a uma norma constitucional. Caso haja uma atuação insuficiente quanto ao dever de atender a uma norma constitucional, a omissão será parcial. Na omissão parcial, existe uma atuação positiva, sendo, portanto, possível à aferição da legitimidade na norma no controle abstrato de normas, por se tratar de uma norma inconstitucional em decorrência da sua incompletude (MENDES, 2009, p.1215). Assim, na omissão parcial ainda que norma esteja editada e em vigor, esta não tem efetividade plena.
Nesse sentido, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:
A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também compromete a eficácia da declaração constitucional de direitos e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental. - As situações configuradoras de omissão inconstitucional, ainda que se cuide de omissão parcial, refletem comportamento estatal que deve ser repelido, pois a inércia do Estado - além de gerar a erosão da própria consciência constitucional - qualifica-se, perigosamente, como um dos processos informais de mudança ilegítima da Constituição, expondo-se, por isso mesmo, à censura do Poder Judiciário. (ADI 1442 / DF - DISTRITO FEDERAL - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE; Relator(a): Min. CELSO DE MELLO; DJ 03/11/2004; Órgão Julgador: Tribunal Pleno)
Assim, a omissão legislativa decorre de comportamentos omissivos dos órgãos legiferantes que não editam medidas legislativas necessárias à efetividade das normas constitucionais, sendo neste caso a omissão absoluta, mas também ocorre a omissão quando se verifica que esse dever foi realizado de forma incompleta, sendo parcial a omissão.
Conforme leciona José Joaquim Gomes Canotilho (2003, p.1036-1037):
A inconstitucionalidade por omissão é um instituto que refecte [sic] as insuficiências resultantes da redução do Estado de direito democrático aos processos e instrumentos típicos dos ordenamentos liberais. Com efeito, a generalidade da doutrina não reconhece um direito subjectivo [sic] aos cidadãos à actividade [sic] legislativa. Embora haja um dever jurídico-constitucional do legislador no sentido de este adoptar [sic] as medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas da Constituição, a esse dever não corresponde automaticamente um direito fundamental a legislação.
Muitas vezes, normas constitucionais “requerem uma lei ou uma providência administrativa ulterior para que os direitos ou situações nelas previstos se efetivem na prática.” (SILVA, 2005, p. 47). Sendo necessária nesses casos, uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores constitucionais.
A concretização incompleta, pode ser contudo, a intenção do legislador concedendo garantias somente a um grupo determinado, como pode ser resultado de uma incompleta apreciação das situações de fato, havendo neste caso uma inconstitucionalidade por omissão (CANOTILHO, 2003, p. 1034). Desta forma, para que se configure a omissão inconstitucional deve-se, considerando o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, buscar nas formas de interpretações aquela que possibilite a aplicabilidade da norma constitucional e somente quando não seja possível por meio da interpretação essa aplicabilidade, é que se ter-se-á uma possível omissão inconstitucional.
O Ativismo judicial, “normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva” (BARROSO, 2013, p.06).
Assim, na problemática enfrentada com a omissão legislativa, encontra-se que a concretização das normas constitucionais como parte da construção do Estado Democrático de Direito carece de lei, lei está, que deve ser feita pelos órgãos constitucionalmente escolhidos para edita-las
2.4 AS OMISSÕES DE ÍNDOLE ADMINISTRATIVA
A omissão administrativa, ocorre quando a inércia do poder público manifesta-se por via da falta de ações concretas, necessárias ao cumprimento de deveres constitucionais.
Conforme leciona Gilmar Mendes (2009, p.1245), a omissão administrativa pode decorrer se do exercício do poder regulamentar, cabendo ao “Executivo diligenciar a regulamentação no prazo estabelecido ou, se julgá-lo exíguo, postular na Justiça contra a violação do seu direito-função.” Bem como, a omissão pode ocorrer na pratica de atos administrativos, quando a omissão da autoridade administrativa resultar na deficiência da providencia administrativa.
Verifica-se nos casos em que não sejam praticados atos legislativos ou administrativos requeridos para tornar plenamente aplicáveis normas constitucionais que muitas vezes, requerem uma lei ou providencia administrativa ulterior para que os direitos ou situações nelas previstos se efetivem na prática (SILVA, 2007, p. 47).
Quando se verifica omissão de órgãos administrativos que possa afetar direitos e garantias individuais, bem como impedir a efetividade das normas constitucionais, deve-se determinar que a Administração, em um prazo estipulado, empreenda as medidas necessárias ao cumprimento da Constituição em sua plenitude.
A decisão que verifica haver uma omissão inconstitucional determina que o legislador empreenda as medidas necessárias a suprir a lacuna inconstitucional. Uma das consequências da ação que venha a declarar a inconstitucionalidade por omissão é justamente o dever dos poderes constitucionais ou dos órgãos administrativa os de empreender esforços para dentro de um prazo proceder a eliminação da inconstitucionalidade.
Estabelece a Lei 9.868/99 em seu art. 12-H, acrescentado pela lei 12. 063/2009, o prazo de 30 dias para que o órgão administrativo tome providências:
Art. 12-H. Declarada a inconstitucionalidade por omissão, com observância do disposto no art. 22, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias. (Incluído pela Lei nº 12.063, de 2009).
§ 1o Em caso de omissão imputável a órgão administrativo, as providências deverão ser adotadas no prazo de 30 (trinta) dias, ou em prazo razoável a ser estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso e o interesse público envolvido. (Incluído pela Lei nº 12.063, de 2009).
Assim, as escolhas políticas devem ser no limite em que as mesmas estejam em conformidade com a ordem jurídica, não se admitindo omissões abusivas e ilegais, casos estes, em que o controle jurisdicional se torna necessário. A discricionariedade administrativa deve ser quanto ao modo adequado de adimplemento do dever, mas não quanto à obrigação de adimplir o dever imposto constitucionalmente.
2.5 AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
A Constituição Federal de 1988 incorporou diversos direitos e garantias fundamentais no ordenamento jurídico, havendo uma enorme preocupação do poder constituinte originário com as omissões existentes no ordenamento jurídico, tendo em vistas as normas de eficácia limitadas pendentes de regulamentação pelo Legislador. Conforme leciona o ilustre Gilmar Mendes (2009, p. 1229), a Constituição Federal de 1988 “emprestou significado impar ao controle de constitucionalidade da omissão com a instituição dos processos de mandado de injunção e da ação e da ação direta de inconstitucionalidade da omissão”.
Assim, o constituinte originário, objetivando dar efetividade à Constituição, dispôs dentre os instrumentos de controle concentrado a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, conforme se verifica abaixo:
Art. 103
§ 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.
A Ação de Inconstitucionalidade por Omissão prevista constitucionalmente importa no reconhecimento judicial do estado de inércia do Poder Público, conferindo ao Supremo Tribunal Federal o poder de cientificar o legislador inadimplente para que este adote as medidas necessárias à concretização do texto constitucional, conforme leciona Carlos Alberto Alves Pena (2013, p.01):
[...] a chamada inconstitucionalidade por omissão, através da qual o legislador constitucional incumbiu ao legislador ordinário ou complementar a edição de leis reguladoras de semelhantes normas e, por igual, aos órgãos administrativos a criação de atos administrativos, tais como: regulamentos, decretos, instruções etc, colimando-se, paralelamente, a regulamentação das normas constitucionais desprovidas de auto-executoriedade, desde que esses procedimentos sejam de natureza normativa, [...]
Ao Supremo Tribunal Federal, em face dos próprios limites fixados pela Carta Política em tema de inconstitucionalidade por omissão, não assiste a prerrogativa de expedir provimentos normativos com o objetivo de suprir a inatividade do órgão legislativo inadimplente.
O objeto do controle abstrato de inconstitucionalidade por omissão é a inércia legislativa, a omissão total ou parcial existente, tendo em vista a demora para que os órgãos responsáveis para concretizar normas constitucionais, concretizem direitos constitucionalmente garantidos.
Conforme leciona Gilmar Mendes (2009, p.1215) “configura-se a omissão legislativa não apenas quando órgão legislativo não cumpre seu dever, mas também quando o satisfaz de forma incompleta”. Sendo reconhecida a omissão legislativa total, parcial ou cumprimento parcial do dever de legislar deve a Corte Suprema declarar a Inconstitucionalidade por omissão, dando ciência ao órgão responsável pela edição da lei objeto de omissão para que se empreenda as medidas necessárias.
Kelsen (2007, p. 303) afirma que “o fato de uma órgão aplicador da lei declarar uma norma geral como inconstitucional e não aplicá-la num caso específico significa que o órgão esta autorizado a invalidar a norma geral a norma para aquele caso concreto; porém apenas para ele [...]”. A de ideia de Kelsen, que a norma continuaria válida para continuar a ser aplicada a outros casos, sendo decidido no caso concreto acerta da aplicação, pode trazer diversos problemas ao sistema devido as diferentes opiniões e interpretações que podem surgir quanto a constitucionalidade de uma lei, podendo a ausência de decisões uniformes quanto a constitucionalidade ou não das leis a serem aplicadas no caso concreto uma verdadeira ameaça a autoridade da Constituição, sendo por isso a necessidade de uma órgão Supremo decidir acerca da aplicação ou não do instituto de forma erga omnes evitando assim tratamentos diferenciados.
A inconstitucionalidade por omissão existe em outros países, como Portugal que no art. 283 de sua Constituição estabelece a competência do Tribunal Constitucional para apreciar e verificar o na cumprimento da Constituição por omissões legislativas necessárias. José Afonso da Silva (2006, p. 48) afirma que neste aspecto a Constituição Brasileira perdeu a chance de ir além, conforme se verifica:
Mas perdeu uma boa oportunidade de ir além. Ficou aquém, por não ter instituído o Tribunal Constitucional. Prevê as autoridades, pessoas e entidades que a podem propor, mas aí não incluiu o cidadão, oque é uma falha, pois a ação popular de inconstitucionalidade é conhecida em outros países (Alemanha, p. ex.) Foi tímida também a Constituição nas consequências da decretação de inconstitucionalidade por omissão. Não avançou muito mais que a Constituição portuguesa.
Assim, a ação de inconstitucionalidade por omissão é o instrumento disponibilizado às pessoas, órgãos e entidades constitucionalmente estabelecidas como legitimados, com vistas à regulamentação de norma constitucional, tendo por fim dar ciência ao poder competente acerca das providências necessárias, contudo sem suprir a carência legislativa existente, encontrando neste ponto sua diferença com o mandado de injunção que tem por fim tornar viável o exercício dos direitos constitucionais no caso concreto.
2.6 O MANDADO DE INJUNÇÃO
No combate a omissão inconstitucional, a Constituição Federal de 1988, conferiu além da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por omissão, outro instrumento no combate à síndrome de inefetividade das normas constitucionais, trata-se do mandado de injunção.
Conforme se verifica do Art. 5º da Constituição Federal, o referido instituto foi criado pelo constituinte em favor do cidadão que encontre óbice para a regular fruição dos direitos consagrados na Lei Maior, in verbis:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à soberania e à cidadania, nos seguintes termos:
[...]
LXXI – conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
José Afonso da Silva [2005, p. 449-450] destaca como pressupostos da do remédio constitucional a falta de norma regulamentadora, norma esta, que é prevista por muitas normas constitucionais de eficácia limitada que necessitam de regulamentação por uma outra norma para ser aplicada, ficando a aplicabilidade da norma constitucional pendente da elaboração de outra lei ou providência regulamentadora, cabendo neste caso o mandado de injunção.
Existe ainda, grande debate doutrinário e jurisprudencial acerca dos efeitos do mandado de injunção, defendendo alguns doutrinadores que a concessão do direito ao impetrante no caso concreto por meio de uma sentença judicial seria uma afronta ao princípio da separação dos poderes, cabendo ao magistrado apenas a tarefa de aplicar a lei existente ao caso concreto, cabendo ao poder judiciário somente a notificação do órgão responsável pela edição da lei omissa total ou parcial, tendo, portanto, o mandado de injunção e a ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão efeitos semelhantes. Uma segunda corrente defende que o mandado de injunção tem a função de concretização das cláusulas constitucionais frustradas pela inaceitável omissão do Poder Público, assim, caberia ao magistrado atuar em situações que necessitassem da intervenção concretizadora do legislador, que se manteve inerte.
O Supremo Tribunal Federal decidiu pela primeira vez questões suscitadas em mandado de injunção em 23 de novembro de 1989, em mandado de injunção proposto por Oficial do Exercito contra Presidente da República, ao qual se alegava pelo impetrante que seria passado a reserva quando completa-se 10 anos de serviço. O tribunal a época decidiu e firmou seu entendimento no sentido que deveria limitar-se a a constatar a inconstitucionalidade da omissão e a determinar que o legislador suprisse a omissão legislativa (MENDES, 2009, p. 1260-1261)
Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal equiparava o mandado de injunção à ação direta de inconstitucionalidade por omissão, porém, posteriormente, o Supremo alterou seu entendimento a cerca do alcance do Mandado de Injunção, em vista da insatisfação social gerada pela falta de norma regulamentadora, admitindo atualmente, que o Poder Judiciário integre a regra jurídica constitutiva ou assecuratória do direito na hipótese concreta, com os elementos faltam para que possa ter inteira aplicação, bom como os meios que faltam para que possa ser plenamente efetivada nos termos constitucionalmente previstos.
Conforme se verifica de julgado do Supremo Tribunal Federal abaixo transcrito:
[..]É tempo de se refletir sobre a timidez inicial do Supremo Tribunal quanto ao alcance do mandado de injunção, ao excesso de zelo, tendo em vista a separação e harmonia entre os Poderes. É tempo de se perceber a frustração gerada pela postura inicial, transformando o mandado de injunção em ação simplesmente declaratória do ato omissivo, resultando em algo que não interessa, em si, no tocante à prestação jurisdicional, tal como consta no inciso LXXI do art. 5º da Constituição Federal, ao cidadão. Impetra-se este mandado de injunção não para lograr-se simples certidão da omissão do Poder incumbido de regulamentar o direito a liberdades constitucionais, a prerrogativas inerentes a nacionalidade, à soberania e à cidadania. Busca-se o Judiciário na crença de lograr a supremacia da lei fundamental, a prestação jurisdicional que afaste as nefastas conseqüências da inércia do legislador. Conclamo, por isso, o Supremo, na composição atual, a rever a óptica inicialmente formalizada, [...]. Está-se diante de situação concreta em que o Diploma maior recepciona, mesmo assim de forma mitigada, em se tratando apenas do caso vertente, a separação dos Poderes que nos vem de Montesquieu. Tenha-se presente a frustração gerada pelo alcance emprestado pelo Supremo ao mandado de injunção. Embora sejam tantos os preceitos da Constituição de 1988, apesar de passados dezesseis anos ainda na dependência de regulamentação, mesmo assim não chegou à casa do milhar na interpretação dos mandados de injunção”. (Mandado de Injunção n.721; Relator: Min. Marco Aurelio. Brasília, DJ 30/08/2007. Tribunal Pleno.)
Essa omissão inconstitucional, derivada do inaceitável inadimplemento do dever estatal de encargo jurídico que não foi cumprido, encontra-se no mandado de injunção um poderoso fator de neutralização da inércia legiferante e da abstenção normatizadora do Estado. Buscando-se neutralizar as consequências lesivas decorrentes da ausência de regulamentação normativa de preceitos constitucionais de eficácia limitada, necessária ao exercício efetivo de determinados direitos neles diretamente fundados, e dependendo portanto, da intervenção concretizadora do legislador.
Conforme leciona Luis Roberto Barroso (2013, p.06), se verifica a postura ativista do judiciário na efetivação das normas constitucionais de diversas formas:
A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas.
Se busca no mandado de injunção que omissão inconstitucional seja tenazmente combatida, o que só se dará com a adoção de medidas eficazes do judiciário em detrimento da dessídia do órgão legiferante. Corroborando com tal entendimento, destaca-se o constitucionalista José Afonso da Silva (2005, p.450) o objetivo deste remédio constitucional:
O mandado de injunção tem, portanto, por finalidade realizar concretamente em favor do impetrante o direito, liberdade ou prerrogativa, sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o seu exercício. Não visa obter a regulamentação prevista na norma constitucional. Não é função do mandado de injunção pedir a expedição da norma regulamentadora, pois ele não é sucedâneo da ação de inconstitucionalidade por omissão (art.103, §2º). É equivocada, portanto data vênia, a tese daqueles que acham que o julgamento do mandado de injunção visa a expedição da norma regulamentadora do dispositivo constitucional dependente de regulamentação, dando a esse remédio o mesmo objeto da ação de inconstitucionalidade por omissão.
Verifica-se que diante da omissão legislativa “o magistrado recebe verdadeiro instrumento proativo, com capacidade efetiva de concretizar a função social do processo civil e, via de consequência, concretizando a efetividade das garantias fundamentais constitucionais” (PARODI; BATISTA, 2013, p.04). Deve assim, o mandado de injunção destinar-se a garantir os direitos constitucionalmente assegurados, pois caso não seja utilizado como meio adequado a realização de direitos constitucionais, os direitos e garantias fundamentais não ficaram sem qualquer aplicação.
José da Silva Pacheco, citado por Jacqueline Maria Cavalcante da Silva (2013, p.41), explicita cinco orientações interpretativas quanto ao mandado de injunção:
a) a primeira considera que a ação de mandado de injunção e a respectiva sentença favorável visaria criar norma legal omissa, substituindo, desse modo, a atividade do órgão competente para fazê-lo;
b) a segunda enfoca a ação e a sentença como tendo em vista obter ordem ou mandamento ao órgão competente para baixar a norma, inclusive ao Legislativo, a fim de que elabore e baixe o ato regulamentador;
c) a terceira focaliza o mandado de injunção como propiciatório de sentença declaratória da omissão ou condenatória de obrigação de fazer, sujeita à ação comum;
d) a quarta vê o mandado de injunção como instrumento para obter do juiz a decisão no sentido de, atendendo ao pedido, proteger o direito reclamado, levando em conta os fins sociais, as exigências do bem comum e os princípios constitucionais e gerais do direito;
e) a quinta hipótese combina a segunda e a quarta, que não se repelem entre si, ensejando que o órgão competente, que não se resume no Legislativo, baixe a norma em certo prazo, ciente de que, se não o fizer, o juiz julgará o caso concreto submetido à sua apreciação.
Para José da Silva Pacheco citado por Jacqueline Maria Cavalcante da Silva (2013, p.41), não caber ao Poder Judiciário fazer normas gerais ou legislar, sim somente ser instrumento por meio do qual se busca pelo poder judiciário decisão protegendo o direito reclamado, não editando o Legislativo a norma regulamentadora em certo prazo, caberá ao juiz apreciar o caso.
Percebe-se que, sem assumir compromisso com o exercício de uma típica função legislativa, o Supremo Tribunal Federal afastou-se da orientação inicialmente perfilhada no que diz respeito ao mandado de injunção, pois decisões proferidas nos mandados de injunção sinalizam uma nova compreensão do instituto e a admissão de uma solução “normativa” para a decisão judicial.
O direito ao aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, foi um caso de constituição em mora do legislador pelo pode judiciário, que veio a resultar no posterior suprimento legislativo da mora, com edição da norma regulamentadora, conforme se verifica nos julgados abaixo:
Mandado de injunção: ausência de regulamentação do direito ao aviso prévio proporcional previsto no art. 7º, XXI, da Constituição da República. Mora legislativa: critério objetivo de sua verificação: procedência, para declarar a mora e comunicar a decisão ao Congresso Nacional para que a supra. (Mandado De Injunção- Mi 695 / Ma – Maranhão. Relator(A): Min. Sepúlveda Pertence; DJ 01/03/2007)
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE INJUNÇÃO. ALEGADA OMISSÃO DA NORMA REGULAMENTADORA DO ART. 7º, XXI, DA CONSTITUIÇÃO. SUPERVENIÊNCIA DA LEI 12.506/2011. PERDA DE OBJETO. AGRAVO DESPROVIDO. I - A orientação do Supremo Tribunal Federal é pela prejudicialidade do mandado de injunção com a edição da norma regulamentadora então ausente. II - Excede os limites da via eleita a pretensão de sanar a alegada lacuna normativa do período pretérito à edição da lei regulamentadora. III – Agravo a que se nega provimento. (MI 1011 AgR / SE - SERGIPE ; Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI; Julgamento: 10/05/2012 ;Órgão Julgador: Tribunal Pleno)
Outrossim, vale ressaltar, que no momento em que é editada a lei regulamentadora, a orientação do Supremo Tribunal Federal é pela prejudicialidade do mandado de injunção, como ocorreu na regulamentação do aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, que foi regulamentado na lei 12.506/2011.
3 CONCLUSÃO
No Estado constitucional democrático de direito em que vivemos a separação entre o direito e política tem sido considerada como essencial. Na política, deve vigorar a soberania popular e a vontade da maioria, enquanto no direito deve vigorar o disposto pela lei e pelos direitos fundamentais estabelecidos na Constituição, que possui supremacia sobre todo o ordenamento jurídico. A crença nessa distinção tem resistido ao tempo e até hoje se mantém a tradicional divisão entre a política e o direito. Contudo, a concretização da ordem fundamental e do estado democrático de direito estabelecido pela Carta Magna de 1988 depende da edição de leis, leis estas que dependem do poder político do país que ocupa os dois órgãos de representação do poder legislativo brasileiro, a câmara dos deputados e o senado federal.
Apesar da separação entre o direito e a política, é fato que a Constituição Federal não basta em si mesma, e toda a organização político-administrativa do Estado depende da edição de lei para sua organização e funcionamento. O problema começa a surgir, quando um dos poderes começa a não atuar como deveria, e outro poder fica obrigado a assumir sua função por uma atuação defeituosa.
A tripartição concebida por Aristóteles e aprimorada por Montesquieu, visava à contenção do poder, pois ao conter o poder e evitar a concentração do poder estatal em único órgão, encontrava-se a justiça e garantia do Estado Democrático. O fundamento da divisão era a proteção do cidadão, contudo, atualmente, a divisão rígida de poderes passou a ir contra os direitos mais fundamentais do cidadão, direitos garantidos constitucionalmente e que se tornaram inoperantes pela inércia legislativa. Assim, não se pode perder de vista que as escolhas políticas devem ser no limite em que as mesmas estejam em conformidade com a ordem jurídica, não se admitindo omissões abusivas e ilegais, casos em que o controle jurisdicional se torna necessário.
O modelo tripartite de Poderes deve ser conformado com os tempos atuais, impondo-se o controle de um poder sobre o outro como forma de concretização dos objetivos buscados pelo Estado Social em que vivemos, em vista da feição prestacional do Estado.
Restou claro ao longo dos anos, que se tornou de grande utilidade atuação do poder judiciário para à conservação da paz social, com a resolução de conflitos que estão em evidência em nossa sociedade, como o aborto, direito greve, liberdades públicas e crimes de corrupção ativa, passiva e peculato na gestão pública, que sempre geram grande comoção social e muitas vezes, não tem a carência legislativa suprida pelo poder legislativo, gerando uma grande insatisfação social.
REFERÊNCIAS:
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Advogada, formada pela Universidade Católica de Salvador - UCSAL, Pós-graduação em Direito do Estado pelo Juspodivm.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRUNA CARVALHO ALVES SIMõES, . O Poder Judiciário e a concretização das normas constitucionais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 mar 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38741/o-poder-judiciario-e-a-concretizacao-das-normas-constitucionais. Acesso em: 23 dez 2024.
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