Resumo: Um dos grandes obstáculos à tutela preventiva encontra-se na própria classificação trinária das sentenças, nenhuma dessas espécies (meramente declaratórias, constitutivas e condenatórias) tem a virtude de propiciá-la. O sistema clássico de tutela de direitos relega a segundo plano a tutela preventiva, no ponto em que entende que a tutela contra o ilícito se resume à reparação do dano. Até há bem pouco tempo, quando se cogitava pensar em tutelas preventivas, estas se resumiam quase sempre em termos de “tutela cautelar” e “tutela antecipatória”, cujo fim imediato era garantir a eficácia do provimento jurisdicional prestado posteriormente, e não especificamente a tutela do direito material invocado pela parte. Daí porque a processualística moderna invocando o princípio constitucional de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CR/88), e, ainda, com advento de algumas leis - como a Lei 8.952/1994, que deu nova redação ao art. 461 do CPC, Lei 8.078/1990, art. 84 e Lei 10.444/2002, que criou o art. 461-A do CPC e alterou a redação do art. 287 do mesmo diploma -, tornou-se possível viabilizar e dotar de fundamento jurídico a concessão da tutela inibitória, específica das obrigações positivas ou negativas, que protege o direito material em si e não o provimento jurisdicional, possibilitando não apenas uma atuação jurisdicional com fim repressivo, mas também uma tutela preventiva e definitiva de um direito ameaçado de violação.
Palavras-Chave: Tutela inibitória; Previsão no ordenamento jurídico; Tutela eminentemente preventiva; Desnecessidade de dano; Eficácia mandamental e executiva lato sensu da sentença. Direitos da Personalidade. Limites.
1 INTRODUÇÃO
No Estado de Direito subsiste a proibição da justiça privada (“olho por olho, dente por dente”), sendo esta cabível em raríssimas exceções. Todos os conflitos de interesses devem, então, como regra, ser resolvidos à luz do ordenamento jurídico, com observância do princípio da legalidade (Constituição e leis). Para tanto, o Estado cria órgãos estatais investidos de poder para solução dos conflitos (função jurisdicional), poder que deve assegurar, ao menos em tese, o direito em sua forma originária. A missão, portanto, do poder jurisdicional é de tornar real a disciplina das relações intersubjetivas previstas nas normas editadas pelo Estado.
Nesse sentido, e como forma de efetivar a tutela estatal, não pode o ordenamento jurídico ser visto e utilizado como um mero amontoado de princípios e regras. Estas devem ter atuação concreta, efetividade. Daí porque se falar em garantia constitucional de ação e acesso à justiça - art. 5º, XXXV da CR/88, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito.”
Existindo, assim, uma pretensão juridicamente protegida e exercido o direito de ação pelo seu titular, constatando, por conseguinte, o Estado-juiz a existência de lesão ou ameaça a direito, deve impor o cumprimento da ordem jurídica, o império da lei, com prestação da tutela jurisdicional. Deve-se assegurar à parte, na prática, e na medida do possível, o resultado pretendido pela norma jurídica de direito material.
A tutela/proteção do Estado não pode, portanto, ser tão somente formal, mas também e principalmente qualificada, ou seja, apta a atender e a realizar o interesse juridicamente pretendido. A tutela, nas lições de Joaquim Felipe Spadoni (2002), deve ser útil, adequada e eficaz, devendo se aproximar o máximo possível daquele resultado que seria obtido pelo respeito espontâneo do direito. Uma atividade jurisdicional inadequada/desqualificada significa denegação de justiça a quem a merece.
Nas palavras de Chiovenda, citado por Spadoni (2002), “o processo deve dar, quanto for possível praticamente, a quem tem direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir” (SPADONI, 2002, p. 23). E isso apenas se torna possível com a pré-ordenação de procedimentos específicos, além de formas de cognição, provimentos e meios executórios que permitam a concretização da tutela qualificada. Assim, para diferentes tipos de pretensões deverão existir diferentes formas de procedimento, correspondendo ao que se entende por devido processo legal.
E aqui cumpre destacar que a CR/88 prevê não apenas um devido processo legal repressivo, mas também preventivo fundado na ameaça de lesão- art. 5º, XXXV da CR/88, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito” (grifos nossos).
2 FORMAS DE TUTELA PREVENTIVA
As tendências do Estado Liberal, principalmente no que tange à predominância da liberdade individual perante os poderes estatais e a existência de uma rígida separação dos poderes, sem a interferência do conhecido sistema de freios e contrapesos, refletiram-se na elaboração teórica do conceito de jurisdição da época, interpretado por muitos estudiosos e juristas como uma atividade de reintegração ou reparação do direito. Excluía-se a idéia de prevenção do ilícito por parte do poder jurisdicional, pois que contrário à liberdade do regime.
Com o advento do Estado Social e a previsão de garantias processuais nas Constituições, assumindo o Estado novas preocupações sociais, como a proteção do meio ambiente, da saúde, da educação e da posição do consumidor no mercado, além da importância dada aos direitos da personalidade diante da evolução das técnicas de comunicação, passaram a surgir formas de tutelas outras, de caráter preventivo, que atuam antes da violação do direito, impedindo-se, portanto, o ilícito.
Desse modo, a doutrina - que antes associava o ato contrário ao direito à responsabilidade civil, partindo do pressuposto que lesão a direito sempre poderia ser reparada com seu equivalente em pecúnia (caráter patrimonialista, preocupação voltada à repercussão danosa do ilícito) -, é substituída pela idéia de que a simples violação da norma já é causadora de um ilícito, preocupando-se com a observância da legalidade e não tão somente com os efeitos concretos que de sua violação poderão advir. Confere-se, assim, prevenção aos direitos, estimulando a não agressão.
Dentre essas formas de prevenção do ilícito há a cautelar, a antecipatória e a inibitória, esta última, objeto deste trabalho. E, aqui, uma breve distinção faz-se necessária.
A cautelar, como tutela preventiva que é, tem por fim assegurar a efetividade do processo principal. É, portanto, auxiliar deste. Busca impedir, de forma direta, a lesão de um direito processual do litigante, ou seja, garantir um processo adequado e eficaz – devido processo legal, através de meios que conservem o estado de pessoas ou coisas, que podem vir a se perder por decorrência do decurso do tempo.
A antecipatória, por sua vez, visa antecipar os efeitos práticos do julgamento, satisfazendo, total ou parcialmente, em momento anterior ao regularmente previsto, o direito pleiteado (art. 273, CPC). Entrega, antecipadamente, o próprio direito requerido em juízo. Tem como requisitos cumulativos a prova inequívoca e a verossimilhança da alegação, e exige a demonstração alternativa do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (inc. I) ou abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (inc. II). Equivale à efetividade e adequação da atividade jurisdicional. Por fim, apresenta-se a inibitória.
3 DA TUTELA INIBITÓRIA
Nas sábias palavras de Spadoni (2002), esta é a genuína forma de tutela preventiva. Destina-se a impedir, de forma direta e principal, a violação do próprio direito material da parte, daí se distinguir das duas espécies de tutela preventivas anteriormente reportadas. A inibitória procura garantir à parte o gozo do direito in natura, voltando-se contra a possibilidade de um ilícito, entendido como conduta contrária ao direito, ato violador de um dever estabelecido por uma norma jurídica originada em lei ou contrato.[1] O seu objetivo é evitar o ilícito, seja ele comissivo ou omissivo, razão pela qual pode exigir um não-fazer ou um fazer, conforme o caso. Atua não após, mas antes de se ter violado o direito material (lesão e ilicitude), impedindo que o ato ilícito se concretize.
Seu fundamento substancial tem, pois, respaldo no direito do credor de exigir o cumprimento específico da obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa a cargo do devedor, direito possibilitado pela introdução dos arts. 461 e 461-A do CPC e 84 do CDC. A possibilidade de cumprimento específico, coagindo o devedor a um fazer, não fazer, ou entregar coisa devida, afasta a antiga idéia de ter ele, o credor, de se contentar com opções outras como cumprimento da obrigação por terceiro, desfazimento de ato ilicitamente praticado ou o ressarcimento em perdas e danos, opções que não refletem o interesse daquele que detém o direito objeto de lei ou contrato, ficando relegadas a segundo plano. São meios não satisfatórios e, porque não, configuradores de uma “monetarização dos bens e valores humanos”. O que se pretende é garantir a integridade e o respeito ao direito afirmado.
A tutela inibitória surge, então, em meio a essas possibilidades de se coagir o devedor a cumprir o que realmente fora pactuado ou o que por lei tem direito o credor, para permitir que essa tutela específica tão almejada seja então alcançada, coibindo a prática de ato lesivo quando ainda de sua mera ameaça. Visa, assim, a ação inibitória, impedir que um ilícito seja praticado, ou ainda fazer cessar uma conduta ilícita já iniciada, mas que continua ou que pode vir a se repetir.
Nessa linha de raciocínio:
Estando uma pessoa obrigada a fazer ou não fazer algo, ou entregar coisa, em virtude de lei ou de contrato, em momento único ou contínuo, a essa obrigação segue anexo o dever de não colocar em prática atos que ameacem o cumprimento da prestação devida. Segue o dever de não ameaçar, por qualquer forma, a satisfação do direito conferido ao titular da posição ativa da relação jurídica, sob pena de sofrer afetação em sua esfera jurídica, sendo coagido ao adimplemento, ou sofrendo a atuação de medidas sub-rogatórias, inclusive com a modificação da obrigação de conduta originária, a fim de que seja garantido o atingimento da fruição in natura do bem tutelado juridicamente.
[...]
Assim, em síntese, pode-se afirmar que o fundamento substancial da tutela inibitória genérica, no direito brasileiro, reside no direito ao cumprimento específico da obrigação de fazer, não fazer ou de entrega de coisa, que tem por consectário o direito à inibição do ilícito, estando consagrado no art. 461 e 461-A do CPC, normas estas que são tanto de direito processual quanto de direito material (SPADONI, 2002, p. 42 / 43).
Como raciocínio lógico, portanto, tem-se como pressuposto para a concessão de uma tutela inibitória a demonstração da ameaça de prática de ato lesivo. E, aqui, como bem explica Spadoni (2002), “para a concessão da inibitória em sentença, não é necessário que o perigo seja iminente” (SPADONI, 2002, p. 48). Segundo o autor, a brevidade da prática do ato ilícito é requisito para concessão de medida liminar ou tutela antecipada. Para a inibitória, basta que a concreta ameaça de violação seja atual, satisfazendo-se com a probabilidade, não sendo necessária a demonstração da possibilidade. Não basta o mero receio (julgamento subjetivo do autor). É preciso a existência de fatos exteriores quanto à prática de ato ilícito futuro, ou seja, que o réu tenha realizado ou esteja realizando atos que indiquem, de forma razoável, uma futura violação.
A tutela inibitória, é importante dizer, encontra previsão constitucional no art. 5º, XXXV da CR/88, já citado: “nenhuma lei excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (grifos nossos), de sorte a não restar qualquer dúvida de que o direito de acesso à justiça tem como corolário o direito à tutela efetivamente capaz de impedir a violação do direito. Nas palavras de Mauro Cappelletti, citado por Luiz Guilherme Marinoni (2003), “o direito de acesso à justiça, atualmente, é reconhecido como o direito que deve garantir a tutela efetiva de todos os demais direitos” (MARINONI, 2003, p. 79). Não é por outra razão que os processualistas modernos abandonaram a idéia de que direito de acesso à justiça ou direito de ação significa apenas direito a uma sentença de mérito. Assim é que a tutela inibitória não se resume às hipóteses tipificadas, tais como, o interdito proibitório e o mandado de segurança, formas bastante efetivas de tutela inibitória no direito brasileiro.
Uma importante observação a ser feita reside no fato de que, caso exista autorização legislativa válida para a prática do ato contrário ao direito, não poderá ser concedida a tutela inibitória, pois que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei” (art. 5º, II da CR/88 – princípio da legalidade).
Assim é que:
Para a concessão do provimento inibitório não basta, então, ficar revelada a existência de um interesse juridicamente protegido. Torna-se necessário ficar revelado que a proteção jurídica conferida a esse interesse impõe ao réu o dever de cumprimento específico da obrigação, e que esta conduta corre o risco de não ser praticada na forma prevista, prejudicando a integridade do direito do autor (SPADONI, 2002, p. 64).
A inibitória não prescinde de dano. Tutela-se a mera ameaça a direito legitimamente protegido. Assim, a reparação do dano passa a ter caráter subsidiário e residual, conforme preleciona o parágrafo 1º do art. 461: “a obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente.”
Cabe ainda mencionar que ato já consumado não desafia inibitória, só havendo, neste caso, direito à indenização ou reintegração (tutelas ressarcitórias). Apenas tem cabimento a inibitória, se anterior à ocorrência do ilícito - seja ele instantâneo, continuado ou repetitivo. Se o direito é violado tão logo se ajuíze a ação, perde-se o objeto, mas com sucumbência pelo réu – princípio da causalidade. Excetuam-se os casos de atos ilícitos continuados ou repetitivos, quando, mesmo já tendo ocorrido violação anterior ao processo, permite-se seja concedida a tutela inibitória e específica para evitar a continuação ou repetição.
4 ASPECTOS INTERESSANTES DA SENTENÇA PROFERIDA EM SEDE DE AÇÃO INIBITÓRIA
Pelo caput do art. 461 do CPC[2], fundamento da tutela inibitória[3] individual (pois que a tutela inibitória coletiva é tratada no art. 84 do CDC e no art. 11 da Lei de Ação Civil Pública), viável se tornou a obtenção de uma tutela preventiva – inibitória, com a propositura de uma única ação, sem necessidade de propor ação cautelar, ação principal de conhecimento e ação de execução. Soma-se, ainda, a possibilidade conferida pelo parágrafo 3º desse artigo de se conferir antecipação de tutela – liminar, demonstrando-se a relevância do fundamento da demanda e o justificado receio de ineficácia do provimento final. E aqui se encontra o primeiro ponto interessante no que tange à decisão a ser proferida em sede desta preventiva: tendo em vista a cumulação em uma única ação das funções de cautelar, conhecimento e execução, ação inibitória enseja como provimento final uma sentença de natureza dúplice, de caráter mandamental e executiva lato sensu, misturando conhecimento e execução.
A sentença inibitória possui eficácia mandamental e executiva lato sensu. A mandamental caracteriza-se pela ordem de cumprimento da decisão judicial, representativa de uma obrigação processual, cuja violação acarreta a imposição de sanções processuais e penais. A executiva lato sensu caracteriza-se pela determinação de adoção de medidas sub-rogatórias independentemente da instauração de um ulterior processo de execução, satisfazendo-se o direito, assim, no mesmo processo originado pela ação inibitória.
Assim, conforme conclui Marinone (2003), “o art. 461 permite ao cidadão buscar o Judiciário através de ação que lhe dá oportunidade de obter não só a antecipação da tutela, mas também a sentença e o meio de execução capazes de impedir a violação do direito” (MARINONE, 2003, p.87).
O mesmo pode-se afirmar quanto ao art. 287 do CPC[4], com redação dada pela Lei n. 11.444/2002. Esse artigo, com a nova redação que lhe foi dada, possui grande valor teórico:
[...] quebra a idéia de que existem somente três sentenças; torna clara a possibilidade de atividade cognitiva e executiva em razão de uma única ação; evidencia que a tutela preventiva não deve ser prestada por meio de ação cautelar; e admite o uso de multa para compelir a um fazer que pode ser prestado por terceiro (MARINONI, 2003, p. 90).
E mais. Na atuação da decisão inibitória, possui o magistrado, nas palavras de Spadoni (2002), um “poder geral de execução” semelhante ao “poder geral de cautela”, pois que pode agir de ofício, impondo desde medidas coercitivas pecuniárias (multa diária) como ainda determinar outras medidas coercitivas, executivas, constitutivas ou cautelares que se mostrem adequadas a alcançar o resultado prático equivalente ao adimplemento devido pelo réu. Possível é também a aplicação de multa por ato atentatório ao exercício da jurisdição e prisão pela prática de crime de desobediência.
Outro ponto que merece destaque, no que tange à decisão proferida em sede de inibitória, diz respeito à eficácia temporal da sentença que prevalece enquanto persistir a obrigação de conduta do réu nela reconhecida e declarada.
Assim, se ato instantâneo, a eficácia é efêmera. Se continuado ou repetitivo, a eficácia projeta-se para o futuro, como ocorre, por exemplo, nas ações de alimentos. Enquanto a sentença mantiver a sua eficácia, não há necessidade de nova ação. A sentença, portanto, como já afirmado alhures, não é meramente condenatória, mas mandamental e executiva lato sensu. A propositura de nova ação enseja ausência de interesse processual, já que já existe provimento jurisdicional no mesmo sentido. Se o réu, mesmo depois de certo tempo, voltar a praticar o ato a que estava impedido, por exemplo, se sujeitará às sanções previstas em lei (ex. ato atentatório à jurisdição e até prisão).
Havendo trânsito em julgado do comando que disciplina a relação jurídica levada a juízo, se for o caso de relação jurídica continuada, aplicável é a regra do art. 471, caput e inciso I do CPC.[5]
E um último ponto interessante. A decisão proferida em sede de ação inibitória traduz-se em uma exceção ao princípio da congruência entre pedido e sentença, estabelecidos pelos arts. 128 e 460 do CPC[6]. Tanto o art. 461 do CPC quanto o art. 84 do CDC autorizam que o magistrado, uma vez respeitados os limites da obrigação originária, imponha o fazer ou o não fazer mais adequado ao caso concreto apresentado em juízo, viabilizando a tutela da obrigação originária da forma mais adequada possível. É o que se pode extrair quando se admite que o juiz conceda a tutela específica ou o resultado prático equivalente.
Caberá, em razão dessa autorização legislativa, nas palavras de Ada Pellegrini Grinover, citada por Marinone (2003), “à sensibilidade do juiz optar entre a multa ou as medidas sub-rogatórias capazes de conduzir ao resultado prático equivalente ao adimplemento.” (MARINONI, 2003, p. 157) Não se pode, no entanto, esquecer a finalidade precípua da inibitória: propiciar ao credor a fruição do direito in natura. Logo, a possibilidade de o juiz converter uma obrigação em outra, usando da prerrogativa de buscar o resultado prático equivalente, tem seu limite ditado pela própria obrigação originária. Ou seja, não cabe ao juiz conceder uma tutela que implique resultado que não esteja incluído na própria obrigação originária.
5 DO ART. 12 DO CC – TUTELA INIBITÓRIA PARA DIREITOS DA PERSONALIDADE
O novo Código Civil, em seu art. 12, estabelece que “pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direitos da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”, elastecendo o campo de atuação da tutela inibitória aos direitos da personalidade, antes sujeitos à propositura de cautelar inominada, seguida de processo de conhecimento longo e dispendioso para sua proteção. Mais um ponto favorável ao ingresso da inibitória no mundo jurídico.
6 LIMITES NO USO DA TUTELA INIBITÓRIA
Estabelece o art. 620 do CPC que, “quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor.”
Nos dizeres de Cândido Rangel Dinamarco:
[...] é nos valores humanos e éticos alojados na base do sistema executivo que a lei busca o adequado equilíbrio entre os interesses das partes em conflito, para que a execução seja tão eficiente quanto possível, com o menor sacrifício possível ao patrimônio do devedor (DINAMARCO, 1997, p. 307).
Assim é que a tutela inibitória somente tem cabimento, podendo ser considerada “justa” quando o meio utilizado para a proteção do direito, além de necessário e útil, seja também o menos gravoso ao demandado.
Imperam-se, portanto, dentro do instituto da tutela inibitória, os princípios da necessidade (meio mais idôneo e menor restrição possível) e da proporcionalidade, este último de sorte a proibir o excesso.
7 CONCLUSÃO
O presente trabalho tentou demonstrar que existe hoje, no ordenamento jurídico brasileiro, amparada pelo princípio do acesso à justiça – art. 5º, XXXV da CR88, uma ação idônea à prevenção do ilícito, entendido como a tão só inobservância da norma – valorização, portanto, da legalidade jurídica. A inibitória se mostra como meio capaz de alcançar a efetividade dos direitos, estando de acordo com a nova ótica jurídica, que ampara direitos outros que não somente patrimoniais, mas também e principalmente, que envolvem o que se entende e defende como dignidade da pessoa humana. Pela inibitória, então, direitos da personalidade, o ambiente, a saúde, a educação e muitos outros direitos são passíveis de tutela quando ainda de uma mera ameaça de violação. O dano passa a ter caráter subsidiário, residual, assim como o ressarcimento in pecúnia passa a pertencer a um segundo plano, quando não mais é possível a proteção ou entrega específica e direta do direito juridicamente protegido.
É, pois, um grande avanço e uma vitória para as relações intersubjetivas.
8 REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1998) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 2008.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. São Paulo: Malheiros, 1997.
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Código de Processo Civil interpretado: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. São Paulo: Manole, 2006.
MARINONE, Luiz Guilherme. Tutela Inibitória (individual e coletiva). São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003.
SPADONI, Joaquim Felipe. Ação inibitória: a ação prevista no art. 461 do CPC. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002.
[1] Os autores Joaquim Felipe Spadoni, Luiz Guilherme Marinoni e Antunes Varela, que procuraram estudar mais profundamente a tutela inibitória, defendem que o ilícito que se procura afastar por meio da ação inibitória é o ato contrário ao direito, o qual independe da aferição de dolo ou culpa, elementos para aferição do dever de indenizar - responsabilidade civil (tutela ressarcitória), mas não para considerar determinada conduta como ilícita.
[2] “Art. 461_ Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.”
[3] Importante esclarecer que, “o art. 461 pode proporcionar diversos tipos de tutela, entre elas a inibitória” (MARINONI, 2003, p. 122).
[4] “Art. 287_ Se o autor pedir que seja imposta ao réu a abstenção da prática de algum ato, tolerar alguma atividade, prestar ato ou entregar coisa, poderá requerer cominação de pena pecuniária para o caso de descumprimento da sentença ou da sentença ou da decisão antecipatória de tutela (arts. 461, 4º, e 461-A).”
[5] Art. 471_ Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo: I. se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir revisão do que foi estatuído na sentença.
[6] “Art. 128_ O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.”
“Art. 460_ É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.”
Formada em Direito, em dezembro de 2004, pela Faculdade de Direito Milton Campos. Especialista em Direito Processual pela Universidade PUC-Minas. Especialista em Direito Público pela Universidade Newton Paiva. Analista Judiciária, área judiciária, no Ministério Público do Estado de Minas Gerais.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LAGE, Deborah Costa. Tutela inibitória: garantia de acesso à justiça e efetividade da prestação jurisdicional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jul 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40203/tutela-inibitoria-garantia-de-acesso-a-justica-e-efetividade-da-prestacao-jurisdicional. Acesso em: 23 dez 2024.
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