INTRODUÇÃO
Com a Constituição Federal de 1988 formou-se um complexo sistema de controle de constitucionalidade. Com ela foi mantida a existência da ação declaratória de inconstitucionalidade, bem como a da ação declaratória de inconstitucionalidade. Ela inovou, contudo, com a previsão da ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão, bem como pela ação de descumprimento de preceito fundamental.
O controle da constitucionalidade de leis e atos normativos tem por escopo manter a adequação do ordenamento jurídico como um todo à Lei Maior. Pedro Lenza (2012, p. 239) ressalta que são requisitos fundamentais e essenciais para esse controle “a existência de uma Constituição rígida e a atribuição de competência a um órgão para resolver os problemas de constitucionalidade, órgão este que variará de acordo com o sistema de controle adotado”.
O CONTROLE PRÉVIO DE CONSTITUCIONALIDADE E O PODER JUDICIÁRIO
Não se pode afastar a ideia de que o controle de constitucionalidade é a verificação de conformação das leis e atos normativos com o texto constitucional, de forma que reste preservada a supremacia da Constituição. Isto se dá em razão da posição hierárquica na qual a Constituição se encontra dentro do ordenamento jurídico, a qual se coloca como fundamento desta modalidade de controle. Pedro Lenza (2012, p. 239) aduz que “a ideia de controle, então, emana da rigidez, pressupõe a noção de um escalonamento normativo, ocupando a Constituição o grau máximo na aludida relação hierárquica, caracterizando-se como norma de validade para os demais atos normativos do sistema”, ou seja, o combate a quaisquer violações à constituição são postulados que, ao mesmo tempo em que protege, também ratifica a posição da Constituição dentro do ordenamento.
Assim como existem os momentos para ocorrer as violações ao texto constitucional (vício na fase de iniciativa ou vício nas fases posteriores de elaboração do ato), também momentos para exercício do controle da constitucionalidade. Esses momentos geram uma classificação do controle, de modo que ele pode ser prévio (durante o processo de formação do ato normativo, ou seja, sobre o projeto de lei) ou posterior (que ocorre sobre a lei que ingressou no ordenamento jurídico).
O controle posterior atuará sobre a lei ou ato normativo que já ingressou no ordenamento jurídico e que se encontra em conflito, formal ou materialmente, com a Constituição. Esse controle pode ser político (que é feito por órgãos de natureza política, como o Executivo e o Judiciário ou por órgãos criados especialmente para essa finalidade, o que é mais comum em Estados nos quais o controle é exercido por órgãos distintos dos três Poderes), jurídico (sistema no qual o controle jurisdicional dos atos normativos cabe ao Poder Judiciário, que o fará de modo difuso ou concentrado) e misto ou híbrido (que é o sistema através do qual algumas normas se submetem ao controle político e outras ao controle jurídico).
Já o controle prévio, que tem por objetivo impedir que a norma inconstitucional ingresse no ordenamento jurídico[1], pode ser realizado tanto pelo Poder Legislativo, como pelo Executivo. O controle feito pelo Legislativo é feito pelas comissões de constituição e justiça, bem como pelo próprio Plenário. O controle realizado pelo Executivo é exercido no momento do veto do projeto, através do chamado veto jurídico, que ocorre quando a lei aprovada pelo legislativo possuir vício quanto a sua constitucionalidade.
O controle prévio pode também ser exercido pelo Poder Judiciário, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal. Ele ocorre via mandado de segurança, o qual será impetrado exclusivamente por membro de Casa Legislativa para exigir que seja obedecido o devido processo legislativo.
Lenza (2012, p. 257), citando Araujo Nunes Júnior, após afirmar ser esta a única hipótese de controle preventivo de constitucionalidade a ser realizado pelo Judiciário e que ele só pode ocorrer por via de exceção ou defesa, de modo incidental, expõe a matéria do seguinte modo:
“O Supremo Tribunal Federal tem entendido que o controle preventivo pode ocorrer pela via jurisdicional quando existe vedação na própria Constituição ao trâmite da espécie normativa. Cuida-se, em outras palavras, de um ‘direito-função’ do parlamentar de participar de um processo legislativo juridicamente hígido. (...) O controle, nesse caso, é pela via de exceção, em defesa de direito de parlamentar”.
Tal prerrogativa do Poder Judiciário se trata de forma excepcional de controle de constitucionalidade e se dá exclusivamente em razão da “inobservância do devido processo legislativo constitucional, como ocorre no caso de deliberação de uma proposta de emenda tendente a abolir cláusula pétrea” [2]·, de modo que seja garantido ao parlamentar participar de procedimento contrário à Constituição. Marcelo Novelino (2014, p. 972) assim leciona sobre o tema:
“Os parlamentares têm direito público subjetivo à observância do devido processo legislativo constitucional. Por isso, apenas eles, e nunca terceiros estranhos à atividade parlamentar, têm legitimidade para impetrar o mandado de segurança nessa hipótese. A iniciativa somente poderá ser tomada por membros do órgão parlamentar perante o qual se achem em curso o projeto de lei ou a proposta de emenda. Trata-se de um controle concreto, uma vez que a impetração do mandamus surge a partir da suposta violação de um direito (ao devido processo legislativo)”.
Deve ser dito que tal legitimidade de se socorrer preventivamente ao Judiciário é conferida somente ao parlamentar, que só perde tal direito em razão da perda superveniente do mandato legislativo. Não se trata, todavia, de legitimidade conferida a qualquer parlamentar. Ela fica restrita aos parlamentares da casa legislativa onde tramita ao projeto de lei. É o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal no MS 24.667, conforme colacionado a seguir:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DE PROJETO DE LEI. INVIABILIDADE.
1. Não se admite, no sistema brasileiro, o controle jurisdicional de constitucionalidade material de projetos de lei (controle preventivo de normas em curso de formação). O que a jurisprudência do STF tem admitido, como exceção, é “a legitimidade do parlamentar – e somente do parlamentar – para impetrar mandado de segurança com a finalidade de coibir atos praticados no processo de aprovação de lei ou emenda constitucional incompatíveis com disposições constitucionais que disciplinam o processo legislativo” (MS 24.667, Pleno, Min. Carlos Velloso, DJ de 23.04.04). Nessas excepcionais situações, em que o vício de inconstitucionalidade está diretamente relacionado a aspectos formais e procedimentais da atuação legislativa, a impetração de segurança é admissível, segundo a jurisprudência do STF, porque visa a corrigir vício já efetivamente concretizado no próprio curso do processo de formação da norma, antes mesmo e independentemente de sua final aprovação ou não.
2. Sendo inadmissível o controle preventivo da constitucionalidade material das normas em curso de formação, não cabe atribuir a parlamentar, a quem a Constituição nega habilitação para provocar o controle abstrato repressivo, a prerrogativa, sob todos os aspectos mais abrangente e mais eficiente, de provocar esse mesmo controle antecipadamente, por via de mandado de segurança.
3. A prematura intervenção do Judiciário em domínio jurídico e político de formação dos atos normativos em curso no Parlamento, além de universalizar um sistema de controle preventivo não admitido pela Constituição, subtrairia dos outros Poderes da República, sem justificação plausível, a prerrogativa constitucional que detém de debater e aperfeiçoar os projetos, inclusive para sanar seus eventuais vícios de inconstitucionalidade. Quanto mais evidente e grotesca possa ser a inconstitucionalidade material de projetos de leis, menos ainda se deverá duvidar do exercício responsável do papel do Legislativo, de negar-lhe aprovação, e do Executivo, de apor-lhe veto, se for o caso. Partir da suposição contrária significaria menosprezar a seriedade e o senso de responsabilidade desses dois Poderes do Estado. E se, eventualmente, um projeto assim se transformar em lei, sempre haverá a possibilidade de provocar o controle repressivo pelo Judiciário, para negar-lhe validade, retirando-a do ordenamento jurídico.
4. Mandado de segurança indeferido.”[3]
CONCLUSÃO
Pelo exposto, pode-se concluir pela vedação de utilização de ação direta para discutir a constitucionalidade de projeto de lei. Assim, a apreciação por parte do Judiciário ficará restrita à adequação do procedimento legislativo às normas constitucionais. Tal medida representa uma expressão do princípio constitucional da separação dos poderes, de modo que o Poder Judiciário não interferirá no exercício da função típica do Legislativo, mas assegurará o respeito à Constituição Federal. Deste modo, por ser, como já afirmado, o devido processo legislativo, livre de qualquer mácula ou interferência, bem como o adequado exercício do mandato legislativo, direitos líquidos e certos dos representantes do povo, mostra-se o mandado de segurança como medida adequada para apreciar a matéria.
CARDOSO, Oscar Valente. O controle preventivo de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Mandado de Segurança nº 32.033. Disponível em http://jus.com.br/artigos/24916/o-controle-preventivo-de-constitucionalidade-pelo-supremo-tribunal-federal-no-julgamento-do-mandado-de-seguranca-n-32-033. Acesso em 03 de setembro de 2014.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado – 16. Ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012.
RUSSO, Luciana. Direito constitucional, 9; coordenação geral Fábio Vieira Figueiredo, Fernando Ferreira Castellani, Marcelo Tadeu Cometti. – 3. ed. – São Paulo: Saraiva, 2010
NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. – 9. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.
TAVARES, André Ramos. Curso de direito Constitucional. 5. ed. rev. e atual. –São Paulo: Saraiva, 2007.
[1] RUSSO, Luciana. Direito Constitucional, p. 55.
[2] NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional, p. 972.
[3] CARDOSO, Oscar Valente. O controle preventivo de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Mandado de Segurança nº 32.033. Disponível em http://jus.com.br/artigos/24916/o-controle-preventivo-de-constitucionalidade-pelo-supremo-tribunal-federal-no-julgamento-do-mandado-de-seguranca-n-32-033
Advogado, Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Piauí e pós graduando em Direito Constitucional pela Universidade Estadual do Piauí.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Thiago Francisco Borges de. O controle de constitucionalidade preventivo realizado pelo Poder Judiciário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 out 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41264/o-controle-de-constitucionalidade-preventivo-realizado-pelo-poder-judiciario. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: WALKER GONÇALVES
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Mirela Reis Caldas
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Precisa estar logado para fazer comentários.