A fiscalização de um projeto de norma, ou seja, no seio do Processo Legislativo, restringe-se aos seus aspectos formais, já que, a priori, não poderá o Judiciário apreciar seu conteúdo, porquanto não se estará diante de qualquer lesão ou ameaça a direito passível de apreciação judicial. Se a inconstitucionalidade do projeto de lei ou de emenda constitucional está no seu conteúdo, só será possível sua argüição quando a lei for publicada. Com efeito, ela é tida como inexistente no mundo jurídico antes de sua publicação.
Questão interessante surge quando uma proposta de emenda constitucional desafia um limite material do Poder Constituinte Derivado. É certo que a jurisprudência do STF épacifica no sentido de que não ha possibilidade de controle de projeto de lei, fora os casos de mandado de seguranca de parlamentar, mas algumas considerações se fazem pertinentes.
Aqui se fará uma breve análise sobre tal possibilidade, ainda que, em tese, em umestudo perfunctória da jurisprudência da Corte Constitucional, possa se dizer que nãosejaadmitida.
Das clausulas pétreas
A tramitação da proposta de emenda que viole uma cláusula pétrea, estar-se-áviolando os preceitos da Constituição. Reza o art. 60, § 4º, da CRFB, que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais.
Em torno das cláusulas pétreas circundam três correntes, as quais foram sintetizadas por GILMAR FERREIRA MENDES, INOCÊNCIO COELHO E e PAULO GUSTAVO BRANCO:
Os argumentos dos que sustentam ser juridicamente inaceitável as cláusulas pétreas (Loewenstein e Joseph Barthélemy) apega-se à idéia de que não haveria uma diferença de substância entre o poder constituinte de revisão e o originário, sendo ambas formas de expressão da soberania do Estado. Ambos são exercidos, num regime democrático, por representantes do povo, por ele eleitos. Não haveria por que considerar o poder constituinte exercido num certo momento como superior à vontade do poder de revisão expressa posteriormente. Diz-se desarrazoado supor a existência de uma autolimitação da vontade nacional operada pelo constituinte originário. A declaração de intangibilidade, por isso, teria uma função política, mas não força jurídica.
Outros entendem que as normas que impedem a revisão de certos preceitos básicos são juridicamente vinculantes, mas não seriam ellas próprias imunes a alterações e à revogação. Se forem suprimidas, num primeiro momento, abre-se o caminho para, em seguida, serem removidos os princípios petrificados. Esse procedimento ganha o nome de dupla revisão.
(...)
O argumento dos que têm a limitação como absolutamente vinculante e imprescindível ao sistema parte do pressuposto de que o poder de revisão, criado pela Constituição, deve conter-se dentro do parâmetro das opções essenciais feitas pelo constituinte originário.
Aponta-se que se o poder revisional enfrenta a lógica da Constituição que o previu, e se desgarra do núcleo essencial dos princípios que a inspiraram e que lhe dão unidade, ocorreria um desvio de poder.
Lembra-se que o propósito do poder de revisão não é criar uma nova Constituição, mas ajustá-la – mantendo sua identidade – às novas conjunturas.
(...)
As cláusulas pétreas, portanto, além de assegurarem a imutabilidade de certos valores, além de preservarem a identidade do projeto do constituinte originário, participam, elas próprias, como tais, também da essência inalterável do projeto do constituinte originário garatidos por ela.
Predominam, no Brasil, o entendimento propugnado pela última das correntes acima vista.[1]
Partindo-se da posição majoritária, acima esposada, existe uma absoluta limitação material do Poder Constituinte Derivado Reformador, no que toca aos princípios insculpidos no § 4° do art. 60 da CRFB, considerados como um núcleo essencial que deverá ser preservado. Destarte, as cláusulas pétreas configuram os princípios constitucionais imutáveis do ordenamento. Na verdade, não tem por escopo as cláusulas pétreas impedir a modificação da redação de uma norma constitucional. Busca-se proibir a deliberação de uma proposta que mitigue, reduza ou desnature o significado e a eficácia que lhe são dadas pelo Constituinte Originário. O STF já assinalou que as limitações materiais ao Poder Constituinte de reforma não significa a intangibilidade literal dos preceitos estabelecidos pelo Constituinte Originário, mas a proteção do núcleo essencial dos princípios instituidos cuja preservação nelas se protege.[2]
Quis o Constiuinte Originário, consoante se depreende da leitura do § 4° do art. 60 da Constituição vigente, acima transcrita, que sequer a deliberação da proposta de emenda constitucional que desafie os preceitos petrificados fosse possível.
Nesse rumo, abre-se uma exceção às regras antes trazidas, no sentido de não ser possível o controle prévio de constitucionalidade para verificação da adequação de projeto de lei ou emenda constitucional frente à Constituição, porquanto resultaria atacar lei em tese. Nos casos em que a tramitação de proposta de emenda vise desfigurar os princípios intangíveis da Constituição, parece viável o controle judicial. Com efeito, a proibição constitucional extende-se até mesmo na deliberação sobre proposta que atinja as chamadas cláusulas pétreas.
O caso foi apreciado pelo STF, na vigência da Constituição anterior, quando se buscou o Judiciário para sustar a deliberação de uma proposta de emenda constitucional em que se pretendia prorrogar o mandato dos cargos de prefeito e vereadores. Arguía-se, na oportunidade, que tais mudanças constitucionais feririam a cláusula pétrea do art. 47, § 1°, da Constituição de 67, segundo a qual, não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a Federação e a República.
Os impetrantes, os então senadores ITAMAR FRANCO e ANTÔNIO MENDES CANALE, em agosto de 1980, ingressaram com mandado de segurança, contra ato do Presidente do Senado Federal, alegando que a Emenda n° 03, acima referida, afrontava o princípio republicano representativo e a autonomia municipal. Ainda que a proposta de emenda já tivesse sido apreciada pela então Comissão Mista do Congresso Nacional, encarregada da aferição da constitucionalidade da proposição, pediam os impetrantes a sustação da tramitação da proposta.
O Procurador-Geral da República, FIRMÍNO FERREIRA PAZ, entendeu que os impetrantes não tinham direito líquido é certo ànão deliberação de proposta de emenda constitucional, opinando pela improcedência do pleito. Ainda: asseverou, ao defender a impossibilidade jurídica do pedido, que submeter à deliberação do plenário do Congresso Nacional proposição legislativa é ato de rotina, praticado de ofício, inerente às próprias funções da Mesa do Senado Federal. Não ofende direito a ninguém. Não cria direito. Não é ato jurídico ilícito. Nem abusivo. Nem ilegal.[3]
O relator, DÉCIO MIRANDA, julgou prejudicado o mandado de segurança, vez que, antes do julgamento, em 9 de setembro de 1980, restou promulgada a Emanda Constitucional n° 3. O julgamento se encaminhava nesse sentido, quando o voto vista do ministro MOREIRA ALVES, pedindo vênia aos colegas, mesmo julgando que a referida emenda não afrontava a República e a Federação, considerou cabível a ação de segurança para sustar, preventivamente, a votação de proposta de mudança constitucional tendente a abolir uma das cláusulas pétreas do país.
Assinalou, naquela oportunidade, que:
Cabível, portanto, no momento que o presente mandado de segurança foi impetrado, sua impetração preventiva, uma vez que visava ele a impedir que a Presidência do Congresso colocasse em votação a proposta de emenda. Aprovada esta, o mandado de segurança – como tem entendido esta Corte – se transforme de preventivo em restaurador da legalidade.[4]
Assim, embora improcedente o pedido em tela, formatava-se o leading case que permitiria o controle judicial durante a tramitação de um projeto de lei ou de emenda constitucional.[5]
Conforme exposto neste capítulo, bem como no capítulo precedente, são os parlamentares que possuem legitimidade ativa para ingressar no Judiciário, na via mandamental, porquanto detêm direito subjetivo à votação das proposições legislativas segundo os ditames da Constituição.
No caso de projetos de lei, vislumbra-se que, enquanto não publicada a norma, não há que se falar em direito ou ameaça a direito, já que, como já ditolinhas atrás, resultaria em possibilitar atacar a lei em tese, usurpando-se das competências do STF. De outro lado, firmou-se posicionamento no sentido de, na via da ação direta, está descartada a possibilidade de um controle preventivo de leis. Ocorre que, no caso de proposta de emenda constitucional que viole princípios constitucionais imutáveis, atinentes às cláusulas pétreas, a simples deliberação já ensejaria inconstitucionalidade.
Ainda que se possa afastar a possibilidade de ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade, vez que o controle preventivo de normas não integra o rol taxativo do art. 102, I, a, da CRFB[6], consoante jurisprudência assentada pelo Supremo[7], resta saber se a ação de descumprimento de preceito fundamental se presta a tal escopo, sendo o ponto que será abordado a seguir.
Da possibilidade de controle prévio pela ação de descumprimento de preceito fundamental – ADPF.
A Contituição prevê, em seu art. 102, § 1°, que a argüição de descumprimento de preceito fundamental dela decorrente será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. Trata-se de uma ação constitucional dependente de regulamentação infraconstitucional, aliás a única hipótese[8] de competência do STF cuja a eficácia é dita limitada.[9] Com efeito, o STF, em 1996, assentara que a ação de descumprimento de preceito fundamental, para garantir aplicabilidade, necessitava de legislação ulterior.[10]
Frente à lacuna legislativa, mormente porque legitima o legislador infraconstitucional a acrescentar competência à Corte Suprema do país, os juristas CELSO BASTOS, IVES GANDRA, ARNOLDO WALD, OSCAR DIAS CÔRREA e GILMAR FERREIRA MENDES, em julho de 1997, reuniram-se em uma comissão, cujo o fim específico era apresentar sugestões ao Poder Executivo para regulamentar o dispositivo constitucional que instituia a ação de descumprimento de preceito fundamental.[11] Naquela oportunidade, buscou-se criar um mecanismo processual de controle de constitucinalidade que pudesse abarcar lacunas do controle concentrado até então disponibilizado pelas ações constitucionais vigentes. Entre elas podemos citar a questão da inconstitucionalidade de leis municipais, leis anteriores à Constituição que não teriam sido recepcionadas pelo novo ordenamento constitucional e a possibilidade de um controle preventivo de constitucionalidade. Além disso, achou-se interessante ampliar a legitimidade para a apresentação da argüição a qualquer pessoa lesada ou ameaçada por ato do Poder Público, conferindo-se ampla legitimação, tal qual a dada à ação popular.
Com efeito, após discussões prévias na comissão acima comentada e dos trabalhos desenvolvidos pelo Congresso Nacional, restou aprovado os seguintes dispositivos, acerca das hipóteses de cabimento da ação e de seus legitimados ativos:
Art. 1° A argüição prevista no § 1° do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público.
Parágrafo único. Caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamental:
I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição;
II - em face de interpretação ou aplicação dos regimentos internos das respectivas Casas, ou regimento comum do Congresso Nacional, no processo legislativo de elaboração das normas previstas no art. 59 da Constituição Federal
Art. 2° Podem propor argüição de descumprimento de preceito fundamental:
I - os legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade;
II - qualquer pessoa lesada ou ameaçada por ato do Poder Público.
Ocorre que houve veto do Presidente da República no inciso II do parágrafo único do art. 1° e no inciso II do art. 2° do projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional. Achou por bem o Presidente da República darà ação de descumprimento de preceito fundamental um caráter mais conservador, afastando-se a ampla legitimação ativa, bem como a possibilidade de fiscalização preventiva da constitucionalidade das leis ou a observância dos regimentos internos das Casas do Congresso. Em relação a este último, afeto ao tema do presente trabalho, vale destacar que o argumento utilizado foi o da inconstitucionalidade do dispositivo. Assim, fazendo uso de sua legimação em fiscalizar a constitucionalidade dos projetos de lei, de forma preventiva, assentou o Presidente da República que as questões atinentes aos regimentos internos das Casas do Congresso contituem-se em questões interna corporis. Portanto permitir a interferência judicial nesse âmbito feriria a cláusula de independência dos poderes estatais, vez que somente a Constituição poderá legitimar as interferência de um poder sobre as funções de outro.[12]
Nesse rumo, não tendo o veto sido derrubado, aprovou-se o texto acima transcrito com as supressões destacadas. Destarte, com o advento da Lei 9.882/99, que regulamentou o art. 102, § 1°, da Constituição, a lacuna legislativa estava suprida, possibilitando o julgamento, pelo STF, de descumprimento de preceito fundamental.
Ainda que, em um primeiro momento, esteja descartado o controle constitucional durante o processo legislativo, em face do veto referido, algumas considerções devem ser feitas. Primeiramente, deve-se aferir os limites que devem ser dados ao termo preceito fundamental. Ademais, não se pode negar o caráter subsidiário da presente ação, mormente acerca do disposto no art. 4°, § 1°, da Lei 9.882/99: Não será admitida argüição de descumprimento de preceito fundamental quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.
No que toca ao termo preceito fundamental, JOSÉ AFONSO DA SILVAafirma que:
'Preceitos fundamentais' não é expressão sinônima de 'princípios fundamentais´. É mais ampla, abrange a estes e todas as prescrições que dão o sentido básico do regime constitucional, como são, por exemplo, as que apontam para a autonomia dos Estados, do Distrito Federal e especialmente as designativas de direitos e garantias fundamentais.[13]
Para DANIEL SARMENTO, preceito fundamental seria:
(...) os direitos fundamentais, as demais cláusulas pétreas inscritas no art. 60, § 4°, da Constituição da república, bem como os princípios fundamentais da República, previstos nos arts. 1° ao 5° do Texto Magno.[14]
O certo é que o Constituinte não conceituou o que é preceito fundamental, o que fez bem. Também o legislador infraconstitucional não arrolou taxativamente o que seria violação a preceito fundamental; ao contrário, conferiu maleabilidade ao instituto. Caberá ao STF limitar, por meio de sua jurisprudência, o conceito de preceito fundamental. O Ministro NÉRI DA SILVEIRA, relator da ADPF–QOn° 1, em seu voto, assentou o seguinte trecho, o qual traduz o pensamento acima ventilado:
Guarda da Constituição e seu intérprete último, ao Supremo Tribunal Federal compete o juízo acerca do que se há de compreender, no sistema constitucional brasileiro, como preceito fundamental, cujo o desrespeito pode ensejar a argüição regulada na Lei n° 9.882, de 03.12.99.[15]
Assim, caberá ao requerente apontar a lesão ou ameaça de ofensa a preceito fundamental, cabendo ao STF tal reconhecimento.[16]
Outro aspecto a ser considerado no presente estudo, conforme explicitado anteriormente, é o caráter subsidiário dado à ADPF. À falta de uma via adequada para sanear uma lesão ou ameaça de lesão aos princípios constitucionais considerados como preceitos fundamentais pelo STF, surge a argüição prevista no art. 102, § 1°, da CRFB, como o remédio adequado. Desta forma, enquanto houver meio eficaz para solver a controvérsia judicial, acerca de um preceito fundamental constitucional, não se poderá manejar o presente instituto. Por outro lado, não será a falta de um meio processual que obstará o STF de salvaguardar o ordenamento constitucional, evitando-se ou reparando-se os ditames violados na Constituição.
A doutrina e a jurisprudência do STF perfilham desse entendimento, o qual foi sintetizado nas palavras do ministro GILMAR FERRREIRA MENDES:
Uma leitura mais cuidadosa há de revelar, porém, que na análise sobre a eficácia da proteção do preceito fundamental nesse processo deve predominar um enfoque objetivo ou de proteção da ordem constitucional objetiva. Em outros termos, o princípio da subsidiariedade – inexistência de outro meio eficaz para sanar a lesão –, contido no § 1° do art. 4° da Lei n. 9882/99, há de ser compreendido no contexto da ordem constitucional global.[17]
Mais adiante conclui:
A própria aplicação do princípio da subsidiariedade está a indicar que a argüição de descumprimento de preceito fundamental há de ser aceita nos casos que envolva aplicação direta da Constituição (...)[18]
A partir do panorama esquematizado até então, no sentido de que o conceito de preceito fundamental permite certa maleabilidade, a qual será conferida pelo Judiciário, no caso o STF, evidenciando-se, senão uma cláusula aberta, um conceito indeterminado, somado ao caráter subsidiário da ação constitucional em tela, não há como descartar a possibilidade do controle preventivo de constitucionalidade. Aliás, já no art. 1° da Lei 9882/99, vislumbra-se um caráter preventivo do intituto, porquanto o legislador explicita que o objeto da ação é evitar lesão ou ameaça a preceito fundamental.[19]
UADI LAMMÊGO, no entanto, descarta tal hipótese:
(...) somente atos do Poder Público já concretizados comportam o mecanismo. Atos legislativos em fase de formação não podem ser submetidos, preventivamente, ao crivo da ADPF. É o caso das propostas de emenda constitucional e dos projetos de lei. Em tais hipóteses, o uso preventivo do instituto não se afigura idôneo porque o Supremo Tribunal Federal não detém competência para interferir em matérias interna corporis do Legislativo, sob pena de macular a cláusula da separação de poderes.[20]
Tal entendimento se coaduna ao pensamento já explicitado pelo STF, quando, por votação unânime, inadmitiu o ajuizamento de ADPF para análise de proposta de emenda constitucional, emfevereiro de 2004.[21]
Algumas vozes doutrinárias já sinalizaram no sentido de que a ADPF pode ser meio idôneo de controle preventivo de constitucionalidade. ROBERTO MENDES MANDELLI JÚNIOR comentou que, mesmo após o veto do Presidente da República, não se pode afastar a fiscalização a priori. Em suas razões, asseverou,in verbs:
No direito brasileiro, não obstante o veto, a lei foi editada permitindo a sindicabilidade dos atos do Poder Público. Não se pode negar que os atos interna corporis do Congresso Nacional sejam atos do Poder Público, igualmente passíveis de fiscalização por meio da argüição, caso descumpram preceito fundamental.
A lei, ao ingressar no ordenamento jurídico, assume realidade própria, independentemente da vontade dos órgãos competentes que participaram da sua elaboração.
A edição da Lei 9.882/99 proporcionará, certamente, mais uma vez, a possibilidade do STF enfrentar a possibilidade de realização de um controle de constitucionalidade dos atos interna corporis. Espera-se que, na oportunidade, a mais alta Corte do país altere sua decisão anterior, reafirmando sua posição de guardião da Constituição.[22]
Em tratado sobre a ADPF, ANDRÉ RAMOS TAVARES, lembrando que CLÈMERSON MERLIN CLÈVE também compartilha de sua posição, concluiu que o controle preventivo de constitucionalidade é possível na via abstrata.
O controle pela via da argüição de descumprimento abarcaria, neste sentido, a fiscalização e possível correção do ato normativo ou do comportamento tido por inconstitucional, inclusive o não normativo, mas oriundo do Estado.[23]
Vê-se que não é questão fechada a alternativa da ADPF como meio processual de controle jurisdicional dos projetos de lei e propostas de emenda constitucional, durante o processo legislativo. Ocorre que, a contar pela forte posição já esposada do STF, dificilmente, com a composição atual da Corte, se vislumbre a realização de uma fiscalização parlamentar nos moldes acima propugnados.
De qualquer sorte, há uma hipótese que não poderá ser rechaçada, qual seja: a utilização da ação de descumprimento de preceito fundamental com o fim de barrar a tramitação de proposta de emenda constitucional tendente a abolir uma cláusula pétrea. Senão vejamos.
Primeiramente, em vista das linhas anteriormente traçadas, restou caracterizado que, no conceito de preceito fundamental, estão, inegavelmente, comprendidas as cláusulas pétreas listadas no art. 60, § 4°, da CRFB, por mais estreita que seja a interpretação desse conceito indeterminado. Afinal, se sequer as cláusulas pétreas estão circunscritas no termo preceito fundamental, o que se poderia incluir em tal conceito?
De outra banda, conforme item precedente, o controle preventivo das emendas constitucionais violadoras das cláusulas petrificadas pelo Constituinte é passível de julgamento pelo STF. A sua jurisprudência, já colecionada no trabalho, é clara em considerar que a proibição constitucional, insculpida no § 4° do art. 60 da CRFB, extende-se até mesmo na deliberação sobre proposta que infrinja o núcleo essencial da Constituição.
Entretanto, ainda subsidiando-se do item anterior, somente o parlamentar envolvido na deliberação da proposta de emenda é parte legítima para ingressar às portas do Judiciário, porquanto tem direito subjetivo relativo ao processo legislativo em conformidade com os ditames constitucionais. De qualquer sorte, não se pode perder de vista que, tratando-se de ação de descumprimento de preceito fundamental, a questão dos legitimados resta alterada. Com efeito, na ADPF os legitimados são os mesmos da ação direta de inconstitucionalidade, inteligência do art. 2°, inciso I, da Lei 9.882/99. Assim, na via abstrata da ADPF, poderá qualquer dos legitimados ingressar com a ação visando evitar lesão a preceito fundamental, no qual se inclui, inexoravelmente, as cláusulas pétreas. No ponto, não é demais lembrar que o Constituinte vedou a deliberação, ou seja, sequer será objeto de votação uma proposta tendente a abolir uma cláusula pétrea.
Há mais: o caráter subsidiário, já estudado, permite a utilização desse instrumento processual, na medida em que não há remédio jurídico adequado para efetivar este controle constitucional. Não se poderá dizer que o mandado de segurança de parlamentar por ser medida eficaz, afastaria a possibilidade da ADPF, em vista da disciplina legal conferida peloart. 4°, § 1°, da Lei 9.882/99. A pensar assim, restritas seriam as possibilidades de apreciação, pelo Supremo, de preceito fundamental violado ou ameaçado, na medida em que sempre se poderá perquirir se os remédios contitucionais – habeas corpus, habeas data, mandado de segurança, mandado de injunção e ação popular – ou o recurso extraordinário são meios eficazes de sanar a lesividade.
Pertinente trazer o pensamento de GILMAR FERREIRA MENDES no ponto:
Não se pode admitir que a existência de processos ordinários e recursos extraordinários deva excluir, a priori, a utilização da argüição de descumprimento de preceito fundamental. Até porque, tal como assinalado, o instituto assume, entre nós, feição marcadamente objetiva.[24]
Conclusão
Por fim, mesmo que a jurisprudência do STF seja tranqüila em negar a existência de um controle prévio na via da ação direta, vislumbrou-se uma possibilidade concreta. Em vista do caráter subsidiário da ADPF, bem como os precedentes já firmados pelo próprio STF, admitindo-se o controle preventivo material para aferir a preservação das cláusulas pétreas, poderá um dos legitimados do controle concentrado, por meio da ADPF, buscar o Judiciário para sustar a deliberação de uma emenda constitucional tendente a abolir uma das cláusulas do § 4° do art. 60 da CRFB.
A questão ainda não foi posta ao STF, mas, na esteira do precedente conferido pelo julgamento do MS 20257/ DF[25], admitindo-se o controle preventivo material para aferir a preservação das cláusulas pétreas, poderá, na via da ADPF, sustar-se a deliberação de uma emenda constitucional tendente a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais.
[1] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007
[2] ADI2024 / DF–Publicação DJE-042DIVULG 21-06-2007 PUBLIC 22-06-2007 - DJ 22-06-2007 PP-00016 - EMENT VOL-02281-01 PP-00128 - EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: seu cabimento - sedimentado na jurisprudência do Tribunal - para questionar a compatibilidade de emenda constitucional com os limites formais ou materiais impostos pela Constituição ao poder constituinte derivado: precedentes. II. Previdência social (CF, art. 40, §13, cf. EC 20/98): submissão dos ocupantes exclusivamente de cargos em comissão, assim como os de outro cargo temporário ou de emprego público ao regime geral da previdência social: argüição de inconstitucionalidade do preceito por tendente a abolir a "forma federativa do Estado" (CF, art. 60, §4º, I): improcedência. 1. A "forma federativa de Estado" - elevado a princípio intangível por todas as Constituições da República - não pode ser conceituada a partir de um modelo ideal e apriorístico de Federação, mas, sim, daquele que o constituinte originário concretamente adotou e, como o adotou, erigiu em limite material imposto às futuras emendas àConstituição; de resto as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, §4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege. 2. Àvista do modelo ainda acentuadamente centralizado do federalismo adotado pela versão originária da Constituição de 1988, o preceito questionado da EC 20/98 nem tende a aboli-lo, nem sequer a afetá-lo. 3. Jáassentou o Tribunal (MS 23047-MC, Pertence), que no novo art. 40 e seus parágrafos da Constituição (cf. EC 20/98), nela, pouco inovou "sob a perspectiva da Federação, a explicitação de que aos servidores efetivos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, "éassegurado regime de previdência de caráter contributivo, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial", assim como as normas relativas às respectivas aposentadorias e pensões, objeto dos seus numerosos parágrafos: afinal, toda a disciplina constitucional originária do regime dos servidores públicos - inclusive a do seu regime previdenciário - jáabrangia os três níveis da organização federativa, impondo-se àobservância de todas as unidades federadas, ainda quando - com base no art. 149, parág. único - que a proposta não altera - organizem sistema previdenciário próprio para os seus servidores": análise da evolução do tema, do texto constitucional de 1988, passando pela EC 3/93, atéa recente reforma previdenciária. 4. A matéria da disposição discutida éprevidenciária e, por sua natureza, comporta norma geral de âmbito nacional de validade, que àUnião se facultava editar, sem prejuízo da legislação estadual suplementar ou plena, na falta de lei federal (CF 88, arts. 24, XII, e 40, §2º): se jáo podia ter feito a lei federal, com base nos preceitos recordados do texto constitucional originário, obviamente não afeta ou, menos ainda, tende a abolir a autonomia dos Estados-membros que assim agora tenha prescrito diretamente a norma constitucional sobrevinda. 5. Éda jurisprudência do Supremo Tribunal que o princípio da imunidade tributária recíproca (CF, art. 150, VI, a) - ainda que se discuta a sua aplicabilidade a outros tributos, que não os impostos - não pode ser invocado na hipótese de contribuições previdenciárias. 6. A auto-aplicabilidade do novo art. 40, §13 équestão estranha àconstitucionalidade do preceito e, portanto, ao âmbito próprio da ação direta. - grifou-se
[3] Extraído do relatório do MS 20257/ DF - Relator(a): Min. DECIO MIRANDA –Julgamento: 08/10/1980 - Publicação DJ 27-02-1981 PP-01304 EMENT VOL-01201-02 PP-00312 - RTJ VOL-00099-03 PP-01031
[4] Extraído do voto do ministro MOREIRA ALVES do MS 20257/ DF - Relator(a): Min. DECIO MIRANDA –Julgamento: 08/10/1980 - Publicação DJ 27-02-1981 PP-01304 EMENT VOL-01201-02 PP-00312 - RTJ VOL-00099-03 PP-01031
[5] Segue a ementa do mandado de segurança referido nas notas anteriores: Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DA MESA DO CONGRESSO QUE ADMITIU A DELIBERAÇÃO DE PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL QUE A IMPETRAÇÃO ALEGA SER TENDENTE A ABOLIÇÃO DA REPUBLICA. CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA EM HIPÓTESES EM QUE A VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL SE DIRIGE AO PRÓPRIO PROCESSAMENTO DA LEI OU DA EMENDA, VEDANDO A SUA APRESENTAÇÃO (COMOE O CASO PREVISTO NO PARAGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 57) OU A SUA DELIBERAÇÃO (COMO NA ESPÉCIE). NESSES CASOS, A INCONSTITUCIONALIDADE DIZ RESPEITO AO PRÓPRIO ANDAMENTO DO PROCESSO LEGISLATIVO, E ISSO PORQUE A CONSTITUIÇÃO NÃO QUER - EM FACE DA GRAVIDADE DESSAS DELIBERAÇÕES, SE CONSUMADAS - QUE SEQUER SE CHEGUE A DELIBERAÇÃO, PROIBINDO-A TAXATIVAMENTE. A INCONSTITUCIONALIDADE, SE OCORRENTE, JA EXISTE ANTES DE O PROJETO OU DE A PROPOSTA SE TRANSFORMAR EM LEI OU EM EMENDA CONSTITUCIONAL, PORQUE O PRÓPRIO PROCESSAMENTO JA DESRESPEITA, FRONTALMENTE, A CONSTITUIÇÃO. INEXISTÊNCIA, NO CASO, DA PRETENDIDA INCONSTITUCIONALIDADE, UMA VEZ QUE A PRORROGAÇÃO DE MANDATO DE DOIS PARA QUATRO ANOS, TENDO EM VISTA A CONVENIENCIA DA COINCIDENCIA DE MANDATOS NOS VARIOS NIVEIS DA FEDERAÇÃO, NÃO IMPLICA INTRODUÇÃO DO PRINCÍPIO DE QUE OS MANDATOS NÃO MAIS SÃO TEMPORARIOS, NEM ENVOLVE, INDIRETAMENTE, SUA ADOÇÃO DE FATO. MANDADO DE SEGURANÇA INDEFERIDO. - grifou-se.
[6] Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal;
[7] Nesse sentido: ADI466 / DF - Relator(a): Min. CELSO DE MELLO- Julgamento: 03/04/1991 - Publicação - DJ 10-05-1991 PP-05929 - EMENT VOL-01619-01 PP-00055 -RTJ VOL-00136-01 PP-00025 - Ementa AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO FEDERAL - INSTITUIÇÃO DA PENA DE MORTE MEDIANTE PREVIA CONSULTA PLEBISCITARIA - LIMITAÇÃO MATERIAL EXPLICITA DO PODER REFORMADOR DO CONGRESSO NACIONAL (ART. 60, PAR. 4., IV) - INEXISTÊNCIA DE CONTROLE PREVENTIVO ABSTRATO (EM TESE) NO DIREITO BRASILEIRO - AUSÊNCIA DE ATO NORMATIVO - NÃO-CONHECIMENTO DA AÇÃO DIRETA. - O DIREITO CONSTITUCIONAL POSITIVO BRASILEIRO, AO LONGO DE SUA EVOLUÇÃO HISTORICA, JAMAIS AUTORIZOU - COMO A NOVA CONSTITUIÇÃO PROMULGADA EM 1988 TAMBÉM NÃO O ADMITE - O SISTEMA DE CONTROLE JURISDICIONAL PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE, EM ABSTRATO. INEXISTE, DESSE MODO, EM NOSSO SISTEMA JURÍDICO, A POSSIBILIDADE DE FISCALIZAÇÃO ABSTRATA PREVENTIVA DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DE MERAS PROPOSIÇÕES NORMATIVAS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ATOS NORMATIVOS "IN FIERI", AINDA EM FASE DE FORMAÇÃO, COM TRAMITAÇÃO PROCEDIMENTAL NÃO CONCLUIDA, NÃO ENSEJAM E NEM DAO MARGEM AO CONTROLE CONCENTRADO OU EM TESE DE CONSTITUCIONALIDADE, QUE SUPOE - RESSALVADAS AS SITUAÇÕES CONFIGURADORAS DE OMISSAO JURIDICAMENTE RELEVANTE - A EXISTÊNCIA DE ESPÉCIES NORMATIVAS DEFINITIVAS, PERFEITAS E ACABADAS. AO CONTRARIO DO ATO NORMATIVO - QUE EXISTE E QUE PODE DISPOR DE EFICACIA JURÍDICA IMEDIATA, CONSTITUINDO, POR ISSO MESMO, UMA REALIDADE INOVADORA DA ORDEM POSITIVA -, A MERA PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA NADA MAIS ENCERRA DO QUE SIMPLES PROPOSTA DE DIREITO NOVO, A SER SUBMETIDA A APRECIAÇÃO DO ÓRGÃO COMPETENTE, PARA QUE DE SUA EVENTUAL APROVAÇÃO, POSSA DERIVAR, ENTÃO, A SUA INTRODUÇÃO FORMAL NO UNIVERSO JURÍDICO. A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL TEM REFLETIDO CLARAMENTE ESSA POSIÇÃO EM TEMA DE CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO, EXIGINDO, NOS TERMOS DO QUE PRESCREVE O PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL - E RESSALVADA A HIPÓTESE DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSAO - QUE A AÇÃO DIRETA TENHA, E SÓPOSSA TER, COMO OBJETO JURIDICAMENTE IDONEO, APENAS LEIS E ATOS NORMATIVOS, FEDERAIS OU ESTADUAIS, JA PROMULGADOS, EDITADOS E PUBLICADOS. - A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DE CONTROLE ABSTRATO PREVENTIVO DE MERAS PROPOSTAS DE EMENDA NÃO OBSTA A SUA FISCALIZAÇÃO EM TESE QUANDO TRANSFORMADAS EM EMENDAS A CONSTITUIÇÃO. ESTAS - QUE NÃO SÃO NORMAS CONSTITUCIONAIS ORIGINARIAS - NÃO ESTAO EXCLUIDAS, POR ISSO MESMO, DO ÂMBITO DO CONTROLE SUCESSIVO OU REPRESSIVO DE CONSTITUCIONALIDADE. O CONGRESSO NACIONAL, NO EXERCÍCIO DE SUA ATIVIDADE CONSTITUINTE DERIVADA E NO DESEMPENHO DE SUA FUNÇÃO REFORMADORA, ESTA JURIDICAMENTE SUBORDINADO A DECISÃO DO PODER CONSTITUINTE ORIGINARIO QUE, A PAR DE RESTRIÇÕES DE ORDEM CIRCUNSTANCIAL, INIBITORIAS DO PODER REFORMADOR (CF, ART. 60, PAR. 1.), IDENTIFICOU, EM NOSSO SISTEMA CONSTITUCIONAL, UM NUCLEO TEMATICO INTANGIVEL E IMUNE A AÇÃO REVISORA DA INSTITUIÇÃO PARLAMENTAR. AS LIMITAÇÕES MATERIAIS EXPLICITAS, DEFINIDAS NO PAR. 4. DO ART. 60 DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA, INCIDEM DIRETAMENTE SOBRE O PODER DE REFORMA CONFERIDO AO PODER LEGISLATIVO DA UNIÃO, INIBINDO-LHE O EXERCÍCIO NOS PONTOS ALI DISCRIMINADOS. A IRREFORMABILIDADE DESSE NUCLEO TEMATICO, ACASO DESRESPEITADA, PODE LEGITIMAR O CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO, E MESMO A FISCALIZAÇÃO JURISDICIONAL CONCRETA, DE CONSTITUCIONALIDADE.
[8] Pinto Ferreira, Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins são alguns dos doutrinadores que comentam tal característica do art. 103, §3°, da CRFB.
[9] Conforme tradicional classificação de JOSÉAFONSO DA SILVA. São de eficácia limitada as normas constitucionais que apresentam aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses, após uma normatividade ulterior que lhe desenvolva a aplicabilidade. (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 11a edição,São Paulo: Atlas, 2004: p. 7)
[10] Pet-AgR 1140 / TO - Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES- Julgamento: 02/05/1996 - Publicação DJ 31-05-1996 PP-18803 - EMENT VOL-01830-01 PP-00001 - EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL: ART. 102, §1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. DECRETO ESTADUAL DE INTERVENÇÃO EM MUNICÍPIO. Arts. 4ºda Lei de Introdução ao Código Civil e art. 126 do Código de Processo Civil. 1. O §1ºdo art. 102 da Constituição Federal de 1988 ébastante claro, ao dispor: "a argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, seráapreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei". 2. Vale dizer, enquanto não houver lei, estabelecendo a forma pela qual seráapreciada a argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente da Constituição, o S.T.F. não pode apreciá-la. 3. Atéporque sua função precípua éde guarda da Constituição (art. 102, "caput"). E éesta que exige Lei para que sua missão seja exercida em casos como esse. Em outras palavras: trata-se de competência cujo exercício ainda depende de Lei. 4. Também não compete ao S.T.F. elaborar Lei a respeito, pois essa émissão do Poder Legislativo (arts. 48 e seguintes da C.F.). 5. E nem se trata aqui de Mandado de Injunção, mediante o qual se pretenda compelir o Congresso Nacional a elaborar a Lei de que trata o §1ºdo art. 102, se éque se pode sustentar o cabimento dessa espécie de ação, com base no art. 5º, inciso LXXI, visando a tal resultado, não estando, porém, "sub judice", no feito, essa questão. 6. Não incide, no caso, o disposto no art. 4ºda Lei de Introdução ao Código Civil, segundo o qual "quando a lei for omissa, o Juiz decidiráo caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito". Éque não se trata de lei existente e omissa, mas, sim, de lei inexistente. 7. Igualmente não se aplica àhipótese a 2a.parte do art. 126 do Código de Processo Civil, ao determinar ao Juiz que, não havendo normas legais, recorra àanalogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito, para resolver lide "inter partes". Tal norma não se sobrepõe àconstitucional, que, para a argüição de descumprimento de preceito fundamental dela decorrente, perante o S.T.F., exige Lei formal, não autorizando, àsua falta, a aplicação da analogia, dos costumes e dos princípios gerais de direito". 8. De resto, para se insurgir contra o Decreto estadual de intervenção no Município, tem este os meios próprios de impugnação, que, naturalmente, não podem ser sugeridos pelo S.T.F. 9. Agravo improvido. Votação unânime.
[11] TAVARES, AndréRamos. Tratado da argüição de preceito fundamental : lei n. 9.868/99 e lei n. 9.882/99. São Paulo : Saraiva, 2001: p. 24.
[12] Razões do veto presidencial: Impõe-se o veto das disposições acima referidas por inconstitucionalidade.
Não se faculta ao Egrégio Supremo Tribunal Federal a intervenção ilimitada e genérica em questões afetas à"interpretação ou aplicação dos regimentos internos das respectivas casas, ou regimento comum do Congresso Nacional" prevista no inciso II do parágrafo único do art. 1o. Tais questões constituem antes matéria interna corporis do Congresso Nacional. A intervenção autorizada ao Supremo Tribunal Federal no âmbito das normas constantes de regimentos internos do Poder Legislativo restringe-se àquelas em que se reproduzem normas constitucionais. Essa orientação restou assentada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Mandado de Segurança no 22503-DF, Relator para o Acórdão Ministro Maurício Corrêa, DJ 06.06.97, p. 24872. Do mesmo modo, no julgamento do Mandado de Segurança no-22183-DF, Relator Ministro Marco Aurélio, o Supremo Tribunal Federal assentou: "3. Decisão fundada, exclusivamente, em norma regimental referente àcomposição da Mesa e indicação de candidaturas para seus cargos (art. 8o). 3.1 O fundamento regimental, por ser matéria interna corporis, sópode encontrar solução no âmbito do Poder Legislativo, não ficando sujeito àapreciação do Poder Judiciário. 3.2 Inexistência de fundamento constitucional (art. 58, §1o), caso em que a questão poderia ser submetida ao Judiciário" (DJ 12-12-97, p. 65569). Dito isso, impõe-se o veto da referida disposição por transcender o âmbito constitucionalmente autorizado de intervenção do Supremo Tribunal Federal em matéria interna corporis do Congresso Nacional. No que toca àintervenção constitucionalmente adequada do Supremo Tribunal Federal, seria oportuno considerar a colmatação de eventual lacuna relativa a sua admissão, em se tratando da estrita fiscalização da observância das normas constitucionais relativas a processo legislativo. (Mensagem 1.807 de 03 de dezembro de 1999)
[13] SILVA, JoséAfonso da.Curso de Direito Constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 1997: p. 530
[14] TAVARES, AndréRamos e outros. Argüição de descumprimento de preceito fundamental: análises àluz da lei nº9.882/99. São Paulo: Atlas, 2001: p.91.
[15] Extraído do voto do Ministro Néri da Silveira, relator da ADPF QO1/RJ
[16] ADPF-QO1 / RJ - Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA - Julgamento: 03/02/2000- Publicação DJ 07-11-2003 PP-00082 - EMENT VOL-02131-01 PP-00001 - EMENTA: Argüição de descumprimento de preceito fundamental. Lei nº9882, de 3.12.1999, que dispõe sobre o processo e julgamento da referida medida constitucional. 2. Compete ao Supremo Tribunal Federal o juízo acerca do que se háde compreender, no sistema constitucional brasileiro, como preceito fundamental. 3. Cabimento da argüição de descumprimento de preceito fundamental. Necessidade de o requerente apontar a lesão ou ameaça de ofensa a preceito fundamental, e este, efetivamente, ser reconhecido como tal, pelo Supremo Tribunal Federal. 4. Argüição de descumprimento de preceito fundamental como instrumento de defesa da Constituição, em controle concentrado. 5. Argüição de descumprimento de preceito fundamental: distinção da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade. 6. O objeto da argüição de descumprimento de preceito fundamental háde ser "ato do Poder Público" federal, estadual, distrital ou municipal, normativo ou não, sendo, também, cabível a medida judicial "quando for relevante o fundamento da controvérsia sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores àConstituição". 7. Na espécie, a inicial aponta como descumprido, por ato do Poder Executivo municipal do Rio de Janeiro, o preceito fundamental da "separação de poderes", previsto no art. 2ºda Lei Magna da República de 1988. O ato do indicado Poder Executivo municipal éveto aposto a dispositivo constante de projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal da Cidade do Rio de Janeiro, relativo ao IPTU. 8. No processo legislativo, o ato de vetar, por motivo de inconstitucionalidade ou de contrariedade ao interesse público, e a deliberação legislativa de manter ou recusar o veto, qualquer seja o motivo desse juízo, compõem procedimentos que se hão de reservar àesfera de independência dos Poderes Políticos em apreço. 9. Não é, assim, enquadrável, em princípio, o veto, devidamente fundamentado, pendente de deliberação política do Poder Legislativo - que pode, sempre, mantê-lo ou recusá-lo, - no conceito de "ato do Poder Público", para os fins do art. 1º, da Lei nº9882/1999. Impossibilidade de intervenção antecipada do Judiciário, - eis que o projeto de lei, na parte vetada, não élei, nem ato normativo, - poder que a ordem jurídica, na espécie, não confere ao Supremo Tribunal Federal, em via de controle concentrado. 10. Argüição de descumprimento de preceito fundamental não conhecida, porque não admissível, no caso concreto, em face da natureza do ato do Poder Público impugnado
[17] MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007: p. 1097
[18] MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007: p. 1100
[19] Art. 1° A argüição prevista no §1° do art. 102 da Constituição Federal seráproposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terápor objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público. - grifou-se
[20] BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo:. Saraiva, 2007: p. 236
[21] AgRgADPF 43-2/DF - Relator(a): Min. CARLOS BRITTO - Julgamento: 20/11/2003 - Publicação - DJ 19-12-2003 PP-00049 - EMENT VOL-02137-01 PP-00001 - EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL ADVERSANDO DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO A ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL, UMA VEZ QUE, ÀLUZ DA LEI Nº9.882/99, ESTA DEVE RECAIR SOBRE ATO DO PODER PÚBLICO NÃO MAIS SUSCETÍVEL DE ALTERAÇÕES. A PROPOSTA DE EMENDA ÀCONSTITUIÇÃO NÃO SE INSERE NA CONDIÇÃO DE ATO DO PODER PÚBLICO PRONTO E ACABADO, PORQUE AINDA NÃO ULTIMADO O SEU CICLO DE FORMAÇÃO. ADEMAIS, O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL TEM SINALIZADO NO SENTIDO DE QUE A ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL VEIO A COMPLETAR O SISTEMA DE CONTROLE OBJETIVO DE CONSTITUCIONALIDADE. ASSIM, A IMUPGNAÇÃO DE ATO COM TRAMITAÇÃO AINDA EM ABERTO POSSUI NÍTIDA FEIÇÃO DE CONTROLE PREVENTIVO E ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE, O QUAL NÃO ENCONTRA SUPORTE EM NORMA CONSTITUCIONAL-POSITIVA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. - grifou-se
[22] MANDELLI JUNIOR, Roberto Mendes. Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003: p. 145-6
[23] TAVARES, AndréRamos. Tratado da argüição de preceito fundamental : lei n. 9.868/99 e lei n. 9.882/99. São Paulo : Saraiva, 2001: p. 204
[24] MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007: p. 1100
[25] Ementa transcrita na nota de rodapén. 136.
Procurador Federal, mestre em Direito pela UFRGS, professor da pós-graduação da IMED-RS e formado em engenharia civil pela UFRGS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Odilon Carpes Moraes. Do controle preventivo de constitucionalidade de proposta de emenda constitucional tendente a abolir cláusula pétrea por meio da ADPF Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 nov 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41545/do-controle-preventivo-de-constitucionalidade-de-proposta-de-emenda-constitucional-tendente-a-abolir-clausula-petrea-por-meio-da-adpf. Acesso em: 23 dez 2024.
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