RESUMO - Este trabalho tem como objetivo o estudo do Direito Penal do Inimigo, abordando os dois tipos do Direito Penal, o que trata do cidadão e o que aborda os criminosos que causam perigo para a sociedade, o considerado inimigo. Enfatiza as repercussões em relação aos Direitos Humanos e Fundamentais. Esse inimigo refere-se a alguém que não quer se juntar ao Estado, por esse motivo não recebe tratamento como cidadão, não tendo benefícios como outras pessoas.
Palavras- chave: Direito Penal do Inimigo. Direitos Humanos. Direitos Fundamentais.
INTRODUÇÃO
Jakobs, em seu pensamento, especificou que após sua preparação para a tese de DPI, deveriam existir dois tipos de Direito Penal: o que trata do cidadão e o que aborda os criminosos que causam perigo para a sociedade, o considerado inimigo.
O estudo referente ao inimigo tem tomado repercussões não muito positivas, em relação aos direitos humanos e fundamentais. Esse inimigo refere-se a alguém que não quer se juntar ao Estado, e por isso não tem o tratamento adequado de um cidadão, dessa forma não pode ter benefícios como outras pessoas. Essa distinção entre o inimigo e o cidadão, é ideal para entender as ideias de Jakobs em relação a esse Direito Penal. É conhecido também como uma não-pessoa, o Estado quer contestar e torná-lo nulo, onde nele são calculados direitos e garantias processuais. É tratado como uma fonte de perigo, diferente do direito penal de todos, que é o do cidadão. Portanto, é importante saber a razão do afastamento do inimigo em relação ao Direito, pois ele que se afasta do próprio direito adquirido, e quem se afasta acaba sendo conhecido como esse Inimigo. Por isso, que os Direitos Humanos são aplicados apenas aos cidadãos.
A ideia de Jakobs não é querer limitar e exercer uma pressão em todos. É somente aos inimigos que Jakobs quer enquadrar no DPI. Os que se mantiverem seguros ao Direito e a sociedade são garantidos como já se foi dito a cima, as garantias fundamentais do Direito Penal. O que Jakobs quer mesmo, por mais fora do comum que seja, é uma oferta garantista.
É importante observar que o maior problema do DPI é saber quem são esses inimigos. Mas Jakobs declara sempre uma saída inteligente, embora com muitos problemas em relação à não compatibilização ao Estado Democrático de Direito.
O DPI não visa punir uma pessoa ao contrário do fato, e sim pretende fixar uma certa punição, quando o agente resolver mostrar um comportamento totalmente desigual em relação a vida em sociedade.
DO DIREITO PENAL DO INIMIGO
O Direito Penal possui três velocidades. A primeira, da escola liberal clássica, que visa á proteção dos direitos e garantias fundamentais, aplicando a pena privativa de liberdade. A segunda velocidade torna flexível proporcionalmente determinadas garantias penais e processuais aliadas a adoção das medidas alternativas a prisão. Por fim, o Direito Penal da terceira velocidade, esse é uma mescla das duas velocidades citadas, é o conhecido Direito Penal do Inimigo. Essa ultima velocidade, utiliza-se da pena privativa de liberdade (como faz o direito penal da primeira velocidade), mas permite uma certa flexibilização de garantias matérias e processuais( o que ocorre no direito penal da segunda velocidade). Essa tendência pode ser vista em algumas recentes leis brasileiras, como por exemplo, a Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº8072 de 1990), que com ela aumentou consideravelmente a pena de vários delitos, estabeleceu o cumprimento da pena nos regimes fechados e suprimiu, ou tentou suprimir, algumas prerrogativas processuais (a liberdade provisória), e a Lei do Crime Organizado (Lei nº9034, de 1995), entre outras.
O Direito Penal assegura a sociedade condições de existência, garantindo uma vida em comum. É entendido com uma garantia contra o poder punitivo e por outro lado, uma garantia da segurança contra a criminalidade. Como lei infraconstitucional, ele deve ser sempre estudado e aplicado à base do princípio da hierarquia vertical de validade e soberania das normas. Dentro desse contexto, não se pode esquecer os direitos humanos dos condenados pela justiça penal, que são expressos em diversos instrumentos internacionais.
Então, essa relação direito penal e direitos humanos é bem importante, pois normalmente qualquer que seja o atentado contra os direitos humanos se caracterizará crime.
Em 1985, Gunther Jakobs, expandiu o seu pensamento sobre o Direito Penal do inimigo, porém, essa idéia não é recente, sendo aplicada, portanto, na Antiguidade, pois os romanos, frente aos outros indivíduos possuíam direitos e garantias inerentes a condição de cidadãos daquele lugar, tendo, por exemplo, o devido processo legal.
Jakobs levou em consideração o terrorista como inimigo. Inimigo, portanto, é a pessoa que põe em risco a existência do Estado, que diante das premissas trazidas ao contratualismo de Hobbes e Kant, deve se defender do inimigo, levando, portanto, segurança à população, que pode exigir do Estado e, daí, detendo o inimigo antes que ele contamine o Direito Penal.
Para Hobbes, o delinqüente deve ser mantido em seu status de pessoa (ou cidadão), a não ser que cometa delitos de “alta traição”, os quais representariam uma negação absoluta a submissão estatal, então resultando que esse indivíduo não deveria ser tratado como “súdito”, mas como “inimigo”.
O cidadão, por sua vez, é aquele que comete crimes, mas que não vive nessa constância, podendo voltar a ser fiel ao Direito Penal.
O inimigo não oferece essa garantia, deve ser tratado de uma maneira diferenciada, pois ele não aceita o ordenamento vigente, querendo implantar suas próprias convicções, não merecendo, a aplicação do ordenamento que rejeita. Não é legitimo, a usufruir dos direitos e garantias fundamentais.
O Direito Penal do Inimigo pune o indivíduo pelo que ele é, levando em consideração o direito penal do autor, chocando com o direito penal de fato, que julga relevante a conduta, analisando o autor no momento do estudo da culpabilidade.
O inimigo não é sujeito de direitos, é objeto de coação. Deve ser punido para não causar danos futuros, ou seja, o direito penal do inimigo visa a condutas futuras. Deve-se buscar a eliminação do perigo. A punibilidade avança para a incriminação dos atos preparatórios. É punido, portanto, pela sua periculosidade, não pela culpabilidade.
É formado por três pilares: 1) antecipação da punição do inimigo; 2) desproporcionalidade das penas e supressão ou relativização de direitos e garantias fundamentais; 3) criação de leis severas para o inimigo.
O conceito de Direito Penal do Inimigo só pode ser considerado como instrumento para mostrar o não Direito Penal que está presente na legislação positiva. Ele é um direito de exceção, ou melhor, são pessoas cujo modo de pensar ou proceder não é comum. É um direito de necessidade do Estado de Direito. Só é possível decidi-lo como Direito Penal do Inimigo em um Estado de Direito; em um Estado de não-Direito, ele não organiza uma unicidade por ver inimigos em toda parte.
Um claro exemplo dessa doutrina no Brasil é a Lei nº10.792, que entrou em vigor em 1º de dezembro de 2003, alterou a Lei de Execuções Penais brasileira (Lei nº7.210, de 11 de junho de 1984) e introduziu o chamado Regime Disciplinar Diferenciado. Essa lei produziu uma grande reação doutrinária contrária em razão das importantes violações a garantias fundamentais, em especial à humanidade da execução de pena e o princípio de igualdade, deve-se punir quem cometeu o ato criminoso não pelo fato praticado, regra do ordenamento jurídico brasileiro, mas pela periculosidade do autor como característica notável do Direito Penal do Inimigo.
O artigo 52 da Lei de Execuções Penais, depois das mudanças, fixa o isolamento do apenado que faz o delito doloso ou falta grave, por até 360 dias, como capacidade de se repetir com um prazo igual a um sexto do prazo estabelecido inicialmente. Além disso, determinam-se restrições quanto à capacidade de receber visitas.
Alguns doutrinadores afirmam que tais dispositivos do Regime Disciplinar Diferenciado são inconstitucionais, pois no Brasil não é possível a utilização de penais cruéis (art.5.º, XLVII, alínea “e”, CF/88), assegurando sempre ao preso a sua integridade física, o respeito e sua dignidade e garantindo que ninguém será sujeito a tratamento desumano ou degradante(art.5.º, III,CF/88). Os problemas do RDD são suas hipóteses de aplicação, já que se utiliza o direito penal do autor e não do fato ( hipóteses no artigo 52 do CP).
Todo ser humano, sem nenhum tipo de distinção, possui todas as garantias e todos os direitos que lhes são conferidos pelo Estado Democrático de Direito, dentre eles, um principal: a dignidade da pessoa humana. Sem a liberdade não há igualdade, e por sua vez, não existirá efetiva liberdade. Os direitos humanos garantem a total liberdade, igualdade e dignidade.
Em Direito e Liberdade: Contrapontos entre Poder, Não Poder e Dever de autoria de Eduardo Bittar , menciona que “a lei é o parâmetro da conduta do cidadão”. “A limitação da liberdade pode ser condicionada por ela.” Estabelece o art.5°, inciso II, da Constituição Federal de 1988:
“art.5°(...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”
“Em outras palavras, tão somente a lei poderá obrigar a execução de um dever, ou impedir a execução de um determinado ato. Os limites da liberdade do ser humano são necessários, pois ele é capaz de praticar de ato mais sublime ao mais bestial. A grande contribuição trazida pelo conceito de Estado de Direito é que essas limitações só poderão ser realizadas pela lei. Assim o ser humano não está sujeito ao poder desmesurado de outro ser.’’
Sendo contrário aos Direitos Humanos, pois para eles é garantido a total liberdade, igualdade e dignidade do indivíduo, já para o Direito Penal do Inimigo há uma limitação da liberdade, como menciona Eduardo Bittar, acrescenta ainda que esse limites da liberdade são necessários , pois ele é capaz de praticar do ato mais sublime ao mais bestial, prevendo isso que o Direito Penal do Inimigo altera lei para poder punir quem cometer o ato criminoso não pelo fato praticado, regra do ordenamento jurídico brasileiro, mas pela periculosidade do autor sendo característica notável do Direito Penal do Inimigo, pois somente a lei poderá obrigar a execução de um dever ou impedir a execução de determinado ato como menciona Eduardo Bittar em “Direito e Liberdade” .
Para Hegel, o Estado é o “reino da liberdade realizada”. Não se pode ter liberdade fora do Estado, não considerado este como um aparato, mas sim com a totalidade dos sujeitos que o compõem, os que juntos conformam o grande sujeito coletivo.
As pessoas e instituições precisam de uma base com cognição para prover determinações socialmente reais. Inventar um ordenamento ideal é uma coisa, mas estabelecer um ordenamento concreto, de forma que ele se preste a orientação do cotidiano, é algo bem diferente. Uma razão bem real é a explicação de a noite pessoas trancar as portas de suas casas.
O Direito Penal do Inimigo segue a mesma linha do funcionalismo sistêmico de Jakobs, ou seja, o Direito Penal tem a função essencial de proteger a norma, sendo que essa proteção aos bens jurídicos só acontecerá de maneira indireta. Seu grande problema é justamente a excessiva proteção dada á norma, uma vez que essa norma seja inconstitucional causando injustiças.
Os direitos fundamentais são normas totalmente ligadas à dignidade humana, dando limite ao poder, é o que garante a Constituição. Existem valores importantes que ainda não estão positivados em na Carta Magna, mas esses são ligados também à dignidade humana e sua limitação de poder. Mas, nesse caso, os juristas não denominam esses valores de direitos fundamentais, mas a chamam de direitos do homem. Esses direitos do homem seriam valores éticos-políticos que ainda não foram positivados. Eles existem em um estagio pré-positivo.
Um conceito que se confunde geralmente com os direitos fundamentais é a ideia de direitos humanos, uma expressão que se utiliza para se referir aos valores que se positivam na esfera do direito internacional. O doutrinador George Marmelstein distingue direitos humanos e direitos fundamentais:
Vale ressaltar que essa distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais é plenamente compatível com o texto constitucional. Toda vez que a Constituição se refere ao âmbito internacional, ela fala em direitos ela fala em “direitos humanos”. E quando, ela tratou de direitos que ela própria reconhece, chamou de “direitos fundamentais”, tanto que o Titulo II da Constituição de 88 é intitulado “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”.
A Constituição, em seu artigo 5º, garante que todos são iguais perante a lei, sem nenhuma distinção, garantindo aos brasileiros e estrangeiros a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade.
O autor Leo Van Holtle, fala das características mais importantes dos direitos fundamentais, que diz respeito a sua relatividade e sua limitação. Nenhum direito fundamental pode ser usado com garantia da impunidade para a execução de atividades ilícitas, razão pela qual os direitos fundamentais não são tidos como absolutos ou ilimitados.
Os direitos humanos surgiram para se valerem contra o Estado. E o inimigo, em relação ao Direito Penal do Inimigo, é a pessoa que põe em risco a existência do Estado, por isso que é tratado de uma madeira diferenciada, causando uma quebra no artigo 5º da CF. Ele o pune pelo que ele é, levando em consideração o direito penal do autor, chocando com o direito penal de fato, que julga relevante a conduta, analisando o autor no momento do estudo da culpabilidade
A definição do Direito Penal do Inimigo é incompleta. Ele só se ajusta, de uma maneira parcial com a realidade (a legislativa, política e a opinião publicada). Jakobs, o inventor dessa modalidade do Direito Penal, explica sobre esse conceito:
A essência deste conceito de Direito Penal do Inimigo está, então, em que este se constitui em uma reação de combate, do ordenamento jurídico, contra indivíduos especialmente perigoso, que nada significam, já que de modo paralelo as medidas de segurança, supõe tão só um processamento desapaixonado, instrumental, de determinadas fontes de perigo
A identificação de um infrator como um ser inimigo, por parte do ordenamento penal, por muito que possa parecer, a primeira vista, é na verdade, uma identificação como uma fonte de perigo.
Jakobs distingue dois círculos de direitos que são aplicáveis em um só contexto jurídico. O primeiro sendo o Direito Penal do cidadão, estando restritos aos delitos do cotidiano e o segundo, o Direito Penal do Inimigo, aplicado aos casos que são inversos. Essa idéia se encontra numa concepção contratualista de Jean Jacques
Rousseau acerca das organizações sócias, em que a vontade do Estado representa sempre uma vontade geral, que assegura as liberdades individuais4.
Não existe um direito que justifique essa opressão de um povo com outro, a invasão do território de uma nação por outra, assim como não há direito que justifique a quebra dos princípios do devido processo legal e do respeito a dignidade da pessoa humana. Fora disso, não existem garantias, nem existe liberdade, não pode haver convivência segura entre os cidadãos. 5
O que se pode concluir, é que atualmente, só há Direito quando já se existe um Direito válido e legítimo, que seja democraticamente construído.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O DPI já se encontra no nosso ordenamento jurídico brasileiro, seja por meio da Lei dos Crimes hediondos e o RDD, dentre outras. Nosso ordenamento não ficou afastado da polêmica onda do DPI. Infelizmente, há uma aplicação da Teoria do Direito Penal do Inimigo no nosso ordenamento, e isso causou imensas mudanças em relação a vida do acusado, para pior, tais como a tentativa de suprimir a liberdade provisória, estabeleceu a pena dos regimes fechado e aumentou consideravelmente a pena de vários delitos.
A Teoria dos Direitos Humanos é totalmente incompatível com a Teoria do Direito Penal do Inimigo. A principal característica para essa afirmação é o fato de a Teoria do Direito Penal do Inimigo colocar duas categorias para o indivíduo: de um lado o cidadão e de outro o inimigo. Sendo que, os enquadrados como inimigos são totalmente aleijados de direitos e garantias fundamentais previstas para os demais cidadãos. O motivo dessa incompatibilidade entre essas duas teorias é esta diferenciação de um indivíduo com o outro.
O Direito penal do inimigo possui vantagens e desvantagens. Com ele o indivíduo não segue o devido processo legal, não seguindo o processo democrático, sendo um verdadeiro procedimento de guerra, valendo tudo conta o inimigo, perdem lugar as garantias penais e processuais, mas se trata de um Direito prospectivo e não retrospectivo, na medida em que se pune o inimigo pelo o que ele poderá fazer, em razão do perigo que representa sendo essa uma das vantagens, pois leva segurança a população, combatendo o perigo, detendo o inimigo antes que ele contamine o Direito Penal. O que deve ser feito é aplicar uma punição para o inimigo sem ferir suas garantias processuais, sem ferir a Constituição e levar a segurança para população sem que piore a situação do individuo, buscando um equilíbrio.
REFERÊNCIAS
MARMELTEIN, George; Editora Atlas, 2º edição, 2009, pags 26 e 27- Curso de Direitos Fundamentais.
HOLTLE, Leo Van. Pag 247- Direito Constitucional.
BITTAR, Eduardo, Direito e Liberdade: Contrapontos entre poder, não poder e dever, São Paulo.
JAKOBS, Gunther. Melia, Manuel Cancio, Livraria do Advogado, 3 edição, 2008, pag 95- Direito Penal do Inimigo- Noções e Criticas.
Revista Jurídica Consulex- Regularização Fundiária, P 201, 01.06.01, fas 345, pag 49.
Revista Brasileira de Ciências Criminais- P. 187, 09/2008, faz 74, pag 31e 32.
http://jus.com.br/revista/texto/10836/direito-penal-do-inimigo
Procurador Federal - PGF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NOGUEIRA, Marden de Carvalho. Direito penal do inimigo: uma análise sob a perspectiva dos direitos humanos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41576/direito-penal-do-inimigo-uma-analise-sob-a-perspectiva-dos-direitos-humanos. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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