A Ação Renovatória está prevista na Lei nº 8.245/91. Anteriormente à vigência da atual Lei nº 8.245/91 a locação predial urbana era disciplinada pela Lei nº 6.649/79 que não tratava do direito a renovação compulsória, mas remetia a aplicação do Decreto nº 24.150/34 que admitia a renovação compulsória às locações para fins comerciais ou industriais. Conviviam, pois, ambos os diplomas.
A matéria ora abordada vinha, até a entrada em vigor da Lei nº 8.245/91, disciplinada no Decreto nº 24.150/34, vulgarmente conhecida como “Lei de Luvas”.
A Lei nº 8.245/91 revogou expressamente o Decreto nº 24.150/34 unificando a disciplina da locação urbana nesse diploma.
A ação renovatória tem por objetivo garantir ao locatário a renovação compulsória do contrato de locação. Serve para proteger o fundo de comércio.A ação renovatória só pode alcançar as locações não residenciais.
Rubens Requião[1] define fundo de comércio com sendo“o instrumento da atividade do empresário”. Continua o autor[2]: “Compõe-se o estabelecimento comercial de elementos corpóreos e incorpóreos, que o empresário comercial une para o exercício de sua atividade”.
Se não existisse a proteção legal, o locador poderia, ao final do contrato, exigir a devolução do imóvel, para se beneficiar do ponto formado pelo inquilino, utilizando pessoalmente o imóvel no mesmo ramo de atividade do locatário ou exigir quantia de dinheiro elevada, conhecida como luvas, para concordar com a renovação.
Tratando da ação renovatória, Cláudio Cintra Zarif,Luis Eduardo Simardo e Rogério Licastro Torres[3] lecionam:
A Lei do Inquilinato garante a renovação da locação não residencial ao locatário, ainda que contra o desejo do locador, quando presentes os requisitos que relaciona.
A necessidade de o locatário buscar a renovação pela via judicial está diretamente ligada à frustração da negociação amigável. Claro, se o locador e locatário têm interesse na renovação do vínculo, e estão de acordo com as condições da avença, não há razão para a propositura da ação renovatória. Basta redigir e firmar o novo ajuste.
É certo, contudo, que não pode o locatário esperar o fim do prazo contratual, ou a iminência dele, para procurar o locador e tentar ajustar a renovação amigavelmente. Isso porque a propositura da ação renovatória deve se dar entre um ano e seis meses antes do término do prazo contratual
Ao dar a garantia da renovação compulsória ao locatário não residencial, tem a lei o confessado propósito de garantir a este último, que aplica sua energia e economia no desenvolvimento do fundo de comércio, o direito de permanecer no imóvel, na condição de locatário, usufruindo do ponto que criou e desenvolveu.
Os autores[4] continuam tratando do objetivo da ação renovatória, qual seja:
..., resulta a real vocação da ação renovatória: garantir ao locatário titular do fundo de comércio o direito de permanecer no imóvel, explorando o seu negócio, ainda que contra a vontade do locador, que não poderá lhe exigir luvas para renovar a avença.
Para que o locatário tenha direito à renovação compulsória de seu contrato, é preciso que preencha os requisitos do art. 51 da Lei nº 8.245/91, in verbis:
Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente:
I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado;
II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos;
III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.
[...]
§ 5º do direito a renovação decai aquele que não propuser a ação no interregno de um ano, no máximo, até seis meses, no mínimo, anteriores à data da finalização do prazo do contrato em vigor.
A ação renovatória deverá ser obrigatoriamente proposta entre um ano e seis meses anteriores à data do término do contrato a ser renovado.
O art. 45 da Lei nº 8.245/91 impõe nulidade a cláusula que afasta ou imponha obrigação pecuniária para a renovação, assim dispõe que:
Art. 45. São nulas de pleno direito as cláusulas do contrato de locação que visem a elidir os objetivos da presente lei, notadamente as que proíbam a prorrogação prevista no art. 47, ou que afastem o direito à renovação, na hipótese do art. 51, ou que imponham obrigações pecuniárias para tanto.
A petição inicial, sem prejuízo dos requisitos constantes do artigo 282 do CPC, de acordo com o art. 71 da Lei nº 8.245/91, assim dispõe:
Art. 71. Além dos demais requisitos exigidos no art. 282 do Código de Processo Civil, a petição inicial da ação renovatória deverá ser instruída com:
I - prova do preenchimento dos requisitos dos incisos I, II e III do art. 51;
II - prova do exato cumprimento do contrato em curso;
III - prova da quitação dos impostos e taxas que incidiram sobre o imóvel e cujo pagamento lhe incumbia;
IV - indicação clara e precisa das condições oferecidas para a renovação da locação;
V – indicação do fiador quando houver no contrato a renovar e, quando não for o mesmo, com indicação do nome ou denominação completa, número de sua inscrição no Ministério da Fazenda, endereço e, tratando-se de pessoa natural, a nacionalidade, o estado civil, a profissão e o número da carteira de identidade, comprovando, desde logo, mesmo que não haja alteração do fiador, a atual idoneidade financeira; (Redação dada pela Lei nº 12.112, de 2009)
VI - prova de que o fiador do contrato ou o que o substituir na renovação aceita os encargos da fiança, autorizado por seu cônjuge, se casado for;
VII - prova, quando for o caso, de ser cessionário ou sucessor, em virtude de título oponível ao proprietário.
Parágrafo único. Proposta a ação pelo sublocatário do imóvel ou de parte dele, serão citados o sublocador e o locador, como litisconsortes, salvo se, em virtude de locação originária ou renovada, o sublocador dispuser de prazo que admita renovar a sublocação; na primeira hipótese, procedente a ação, o proprietário ficará diretamente obrigado à renovação.
No entanto, esse direito não é absoluto, pois, pode, em certas situações, ser colocado em contraposição ao direito de propriedade do locador constitucionalmente garantido. Trata-se da chamada exceção de retomada.
O art. 52 da Lei nº 8.245/91 elenca as hipóteses em que o locador não tem a obrigação de renovar o contrato, in verbis:
Art. 52. O locador não estará obrigado a renovar o contrato se:
I - por determinação do Poder Público, tiver que realizar no imóvel obras que importarem na sua radical transformação; ou para fazer modificações de tal natureza que aumente o valor do negócio ou da propriedade;
II - o imóvel vier a ser utilizado por ele próprio ou para transferência de fundo de comércio existente há mais de um ano, sendo detentor da maioria do capital o locador, seu cônjuge, ascendente ou descendente.
1º Na hipótese do inciso II, o imóvel não poderá ser destinado ao uso do mesmo ramo do locatário, salvo se a locação também envolvia o fundo de comércio, com as instalações e pertences.
2º Nas locações de espaço em shopping centers , o locador não poderá recusar a renovação do contrato com fundamento no inciso II deste artigo.
3º O locatário terá direito a indenização para ressarcimento dos prejuízos e dos lucros cessantes que tiver que arcar com mudança, perda do lugar e desvalorização do fundo de comércio, se a renovação não ocorrer em razão de proposta de terceiro, em melhores condições, ou se o locador, no prazo de três meses da entrega do imóvel, não der o destino alegado ou não iniciar as obras determinadas pelo Poder Público ou que declarou pretender realizar.
De acordo com Fabio Ulhoa Coelho:[5]
Se caracterizada a locação empresarial e proposta a ação renovatória dentro do prazo, o locatário terá, em determinadas situações, direito à indenização pela perda do ponto, caso o locador obtenha a retomada do imóvel.
O direito a renovação compulsória tem seu fundamento na legislação ordinária e o direito de propriedade é garantido na CF (art. 5º, XXII), dessa forma, tem que ser analisado com cautela,sob pena, de esvaziar o direito de propriedade do locador.
Uma questão interessante acerca da ação renovatória é quando se trata da locação de espaço em shopping center, diante das características dessa espécie de locação.
Na locação comum, o locador simplesmente loca determinado espaço a um empresário que irá desenvolver seu negócio. No shopping center o empresário deve organizar os gêneros de atividade econômica que se instalarão no grande estabelecimento.
Analisando o assunto são as lições de Fábio Ulhoa Coelho[6]:
Em suma, o empresário que explora shopping center desenvolve atividade econômica bastante singular, que não se reduz a um simples negócio imobiliário. Há todo um planejamento de distribuição do espaço (tenantmix), de sorte a oferecer aos consumidores uma variada gama de produtos, marcas, além de atrativos na área de lazer e restauração. Ao locar uma loja, o empreendedor não pode perder de vista o complexo em sua inteireza, devendo atentar à necessária combinação da diversidade de ofertas, fator inerente ao sucesso do empreendimento. Se no shopping já há uma farmácia estabelecida, não se justifica pela lógica do negócio, locar espaço para outra. Se o consumidor está nutrindo particular afeição por certa marca de doceria, o empreendedor deve procurar atrair o titular desta, ou um franqueado, propondo-lhe condições vantajosas para se estabelecer no shopping.
Por sua vez, o lojista, ao ocupar espaço no centro de compras, passa a fazer parte de um sistema empresarial, devendo se submeter às normas fixadas quanto ao horário de funcionamento, padrão dos produtos oferecidos, layout, bem como participar das promoções conjuntas de vendas, contribuir para a manutenção dos espaços comuns, integrar a associação dos lojistas etc. Pode-se, portanto, compreender que nem o empreendedor de shopping center é um locador comum, nem o lojista um locatário comum.
Continua o renomado autor[7]:
O shopping center é um empreendimento peculiar, em que espaços comerciais são alugados pra empresários com determinados perfis, de forma que o complexo possa atender diversas necessidades dos consumidores.
Assim, em razão da natureza especial do contrato de locação de espaço comercial em shopping center questiona-se se possível o cabimento da ação renovatória, em favor do lojista.
O renomado autorFábio Ulhoa Coelho[8] conclui pela possibilidade da ação renovatória, porém em algumas situações deve prevalecer o direito de propriedade do locador, nos seguintes termos:
Quando a tutela do direito de inerência redundar injustificável redução de receita do locador, por inadequação do negócio do locatário às evoluções do mercado de consumo, é decorrência da proteção do seu direito constitucional do direito de propriedade o impedimento da renovação compulsória da locação. O locatário receberá a correspondente indenização, pela perda do ponto, se for o caso, mas não poderá o empreendedor deixar de exercer o seu direito de propriedade – neste caso, traduzindo pela faculdade de reorganizar a oferta dos produtos e serviços, no interior do complexo – para fins de ajustar a exploração econômica do seu bem às demandas dos consumidores.
Diante do exposto, observa-se que a Lei nº 8.245/91 admite expressamente a renovação compulsória do contrato de locação de espaços de shopping center.
No entanto, sua aplicação deve ser analisada com mais cautela do que na locação comum, pois no que se refere ao shopping center, o direito de propriedade abrange também a prerrogativa do empresário do shopping center de organizar o tenantmix visando a um melhor atendimento aos consumidores. Assim, quando a manutenção de algum estabelecimento implicar em injustificável prejuízo ao locador ou gerar óbice ao direito de organização, mostra-se mais razoável que o locatário receba a correspondente indenização a fim de garantir o seu direito ao fundo de comércio, sendo afastada a renovação compulsória e assegurado o direito de propriedade do locador.
BIBLIOGRAFIA
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. V1: direito de empresa. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
FILHO, Mario Cerveira. Shopping Centers: Direito dos Lojistas. 5ª ed., São Paulo: Saraiva, 2009.
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. V1. 29º edição. São Paulo: Saraiva,2010.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Lei Do Inquilinato Comentada: Doutrina e Prática.11ª ed., São Paulo: Atlas, 2012.
ZARIF, Cláudio Cintra; FERNANDES, Luís Eduardo Simardi; MELLO, Rogério Licastro Torres. Ações Locatícias. São Paulo: Método, 2010.
[1]REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. V1. 29º edição. São Paulo: Saraiva, 2010. Pág. 320.
[2]REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. V1. 29º edição. São Paulo: Saraiva, 2010. Pág. 320.
[3]ZARIF, Cláudio Cintra; FERNANDES, Luís Eduardo Simardi; MELLO, Rogério Licastro Torres. Ações Locatícias. São Paulo: Método, 2010. Pág. 184.
[4]ZARIF, Cláudio Cintra; FERNANDES, Luís Eduardo Simardi; MELLO, Rogério Licastro Torres. Ações Locatícias. São Paulo: Método, 2010. Pág. 186.
[5] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. V1: direito de empresa. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 179.
[6] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. V1: direito de empresa. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 181/182.
[7] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. V1: direito de empresa. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 183.
[8]COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. V1: direito de empresa. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 184.
Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Katiane da Silva. Ação Renovatória de lojas situadas em Shopping Center Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 nov 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41909/acao-renovatoria-de-lojas-situadas-em-shopping-center. Acesso em: 23 dez 2024.
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