RESUMO: O presente trabalho irá tratar do instituto da ação rescisória, demonstrando a responsabilidade da parte na contagem do prazo decadencial, bem como na insuscetibilidade de sua prorrogação.
Palavras-Chaves: Direito Processual Civil – Ação Rescisória – Prazo Decadencial – Improrrogabilidade.
I – INTRODUÇÃO
A ação rescisória está disciplinada no art. 485 do Código de Processo Civil, havendo, neste dispositivo, os requisitos de seu cabimento. Esse instituto processual visa, como o próprio nome já diz, rescindir sentenças de mérito que teve o seu trânsito em julgado. Porém, conforme disposição do art. 495 do Código de Processo Civil, o direito de propor ação rescisória se extingue em 02 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão. O presente estudo vai retratar exatamente sobre o dito prazo, demonstrando a sua natureza decadencial e, portanto, insuscetível de ser prorrogado.
II – ANÁLISE DA DATA DO TRÂNSITO EM JULGADO: ÔNUS EXCLUSIVO DA PARTE
É válido frisar que os jurisdicionados, através de seus advogados, é quem detêm o ônus de analisar a real data do trânsito em julgado da sentença para fins de manejo de ação rescisória. O próprio SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, através da Ação Rescisória nº 4.374/MA, afirmou que “constitui ônus exclusivo da parte, representada pelo seu advogado, a contagem do prazo de decadência, não sendo possível a transferência ou a atribuição deste ônus a funcionário do Poder Judiciário, a quem compete, como relembrou o Ministério Público, não mais do que certificar “o fato [como a publicação de uma decisão] que ocorre na sua secretaria ou na sua presença, e não as conclusões jurídicas daí decorrentes ou dizer do direito”.
O próprio advogado da parte, munido de conhecimentos jurídicos necessários para a averiguação da viabilidade da ação rescisória, deve se basear no dia imediatamente subsequente ao trânsito em julgado da última decisão. Esse, aliás, é o teor da Súmula 401 do STJ, in verbis:
Súmula 401 - O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.
Trânsito em julgado, como é de conhecimento notório dos juristas e do teor da súmula supratranscrita, ocorre a partir do momento em que não cabe mais recurso contra a decisão judicial, restando prescindível a ocorrência de certidão para tal fim. Nesse sentido, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS:
AÇÃO RESCISÓRIA - TRÂNSITO EM JULGADO - CERTIDÃO - PRESCINDIBILIDADE - OCORRÊNCIA PELO MERO DECURSO DO PRAZO - INOBSERVÂNCIA AO PRAZO PARA AJUIZAMENTO DA RESCISÓRIA - DECADÊNCIA.
O trânsito em julgado ocorre mediante simples transcurso do prazo sem a interposição do recurso pela parte, prescindindo de qualquer certidão ou ato que o reconheça, de forma que a data do trânsito indicada em certidão não possui qualquer relevância para tal desiderato. O ajuizamento de ação rescisória fora do prazo previsto no art. 495 do CPC enseja a decadência do direito à propositura da referida ação. Decadência acolhida.[1]
Portanto, resta concluir que cabe à parte averiguar a real data do trânsito em julgado da sentença, não podendo transferir esta incumbência ao servidor do judiciário.
Acontece, todavia, que há entendimento do próprio SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no sentido de conferir à parte prejudicada, por eventual equívoco, a justa expectativa do manejo da ação rescisória dentro do prazo certificado pelo servidor, em respeito ao princípio da fé pública que rege os documentos públicos. Veja-se:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. PRAZO DE DECADÊNCIA (CPC, ART. 495). CERTIDÃO EMITIDA PELO TRIBUNAL ATESTANDO A DATA DO TRÂNSITO EM JULGADO. INVOLUNTÁRIA INDUÇÃO A ERRO NA CONTAGEM DO PRAZO. DECADÊNCIA AFASTADA. RECURSO PROVIDO, COM EFEITOS INFRINGENTES.
1. Sendo ônus da parte a contagem do prazo de decadência para o manejo da ação rescisória, a interpretação errônea de certidão, que apenas ateste a ocorrência do trânsito em julgado, sem especificar a data em que se teria consumado o biênio, deve ser suportada pelo próprio interessado.
2. Todavia, a certidão emitida pelo Tribunal atestando não só o trânsito em julgado, mas também a data exata do trânsito em julgado do acórdão, confere à parte prejudicada por eventual equívoco a justa expectativa do manejo tempestivo da ação rescisória dentro do prazo certificado, em vista do princípio da fé pública que emana das certidões e dos documentos públicos em geral.
3. Mesmo em se tratando de prazo decadencial, há situações em que excepcionalmente se admite sua prorrogação, como no caso dos autos, em que se justifica a dilação em vista do equívoco cometido pelo Judiciário.
4. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes.[2]
Diante da referida decisão, o Tribunal Superior admitiu a prorrogação do prazo decadencial, retirando da parte a responsabilidade de averiguar, de forma exata, a contagem do prazo decadencial, transferindo, por consequência, essa responsabilidade para o servidor cartorário quando este insere, em sua certidão, não só o trânsito em julgado, mas também a data exata do trânsito em julgado da decisão rescindenda.
III – DA IMPRORROGABILIDADE DO PRAZO DECADENCIAL
Uma questão que deve ser analisada é a improrrogabilidade do prazo decadencial.
Como se sabe, o prazo da ação rescisória é típico exemplo de decadência legal, que visa regular a perda de um direito devido ao decurso de determinado prazo fixado em lei, possuindo natureza de ordem pública.
A decadência legal é marcada pela sua improrrogabilidade, tendo o próprio Código Civil a previsão de que “salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição” (Art. 207).
Assim, se a legislação não prevê qualquer tipo de suspensão ou interrupção de prazo decadencial em caso de erro em certidão cartorária, a sua prorrogação se caracterizaria em um verdadeiro ato contra legem, além de tornar o Judiciário – caso assim o reconheça – em um verdadeiro legislador positivo.
Além do mais, considerando que o prazo decadencial é insusceptível de sofrer suspensão, interrupção ou dilação, conforme preconizado no supracitado art. 207 do Código Civil, há de se reconhecer a sua condição de prazo peremptório e, sobre tal, a doutrina é absolutamente dominante[3] acerca de sua improrrogabilidade, senão vejamos:
CHIOVENDA em sua memorável obra Instituições de Direito Processual Civil, vol. III, p. 122:
"Os prazos peremptórios em sentido estrito ocorrem quando ao expirar dão lugar a uma preclusão absoluta, a uma extinção. No comum, estes prazos são prazos legais; porém também as vezes o juiz pode fixar um prazo sob pena de extinção do direito. Não se admite restituio in integrum contra o transcurso dos prazos peremptórios, nem sequer em caso de força maior. Não podem ser suspensos senão em virtude expressa de lei."
J.E. CARREIRA ALVIM em Elementos de Teoria Geral do Processo, p. 304:
"Peremptório é o prazo dentro do qual o ato processual deve ser praticado sob pena de, não o sendo, não poder sê-lo mais (decadência)".
PONTES DE MIRANDA em Comentários ao Código de Processo Civil, tomo III, p. 133:
O eterno mestre destaca com precisão que "peremptório é o prazo, dentro do qual, sem exceção, se há de praticar o ato, ou não mais se pode praticar.". E, posteriormente, o mesmo rábula conclui que "os prazos são ditos peremptórios quando inalteráveis".
DE PLÁCIDO E SILVA:
"Prazo improrrogável e fatal, dentro do qual se deve exercitar ou executar certos atos, que parecerão, desde que não sejam executados ou praticados".
JOSÉ DE ALBUQUERQUE ROCHA:
"A não-observância dos prazos peremptórios acarreta a perda do poder de praticar o ato", sendo "nulo o ato praticado depois de decorrido o prazo peremptório".
Destaque-se que o próprio SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, em decisão proferida recentemente, decidiu na mesma linha de ideia:
AÇÃO RESCISÓRIA – PRAZO DECADENCIAL – IMPRORROGABILIDADE – NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO PEDIDO.[4]
E ainda de forma mais explicativa, o Supremo decidiu:
AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO DECADENCIAL DE 02 (DOIS) ANOS. DIREITO MATERIAL. NÃO INCIDÊNCIA DA NORMA QUE PRORROGA O TERMO FINAL DO PRAZO AO PRIMEIRO DIA ÚTIL POSTERIOR. 1. Por se tratar de decadência, o prazo de propositura da ação rescisória estabelecido no art. 495 do CPC não se suspende, não se interrompe, nem se dilata (RE 114.920, rel. Min. Carlos Madeira, DJ 02.09.1988), mesmo quando o termo final recaia em sábado ou domingo. 2. Prazo de direito material. Não incidência da norma que prorroga o termo final do prazo ao primeiro dia útil posterior, pois referente apenas a prazos de direito processual. 3. Na espécie, o trânsito em julgado do acórdão rescindendo ocorreu em 1º de dezembro de 1999 (dies a quo), tendo o prazo decadencial se esgotado em 1º.12.2001 (sábado), ante o disposto no art. 1º da Lei 810/49 - "Considera-se ano o período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte". Ação rescisória protocolada nesta Suprema Corte apenas em 03 de dezembro de 2001 (segunda-feira), portanto, extemporaneamente. 4. Decadência reconhecida. Processo extinto com base no art. 269, inc. IV, do Código de Processo Civil.[5]
Percebe-se, portanto, que o prazo decadencial é peremptório e, segundo a doutrina dominante e a jurisprudência pátria, estes tipos de prazos não podem sofrer prorrogação.
Configurada, portanto, a decadência do direito da parte para o manejo da ação rescisória, esta deverá ser extinta com a resolução de mérito.
IV – CONCLUSÃO
Face o exposto, resta concluir que, é de responsabilidade da parte, através de seu advogado, a contagem do prazo decadencial da ação rescisória e, havendo certidão contendo data equivocada do trânsito em julgado da decisão rescindenda, ao Judiciário não cabe prorrogar o prazo tido como peremptório, devendo, quiçá, eventual prejuízo ser discutido em ação própria de indenização pelos prejuízos causados pelo erro do servidor.
BIBLIOGRAFIA
- BRASIL, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, que institui o Código de Processo Civil.
- BRASIL, Lei nº 10.405, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil.
- MENIN, Sávio Mahmed Qasem. A ação de impugnação de mandato eletivo e seu prazo decadencial. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 933, 22 jan. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/7852>. Acesso em: 5 out. 2014.
- SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, disponível em: www.stf.jus.br, acesso em: 19/11/2014.
- SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, disponível em: www.stj.jus.br, acesso em: 19/11/2014.
- TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, disponível em: www.tjmg.jus.br, acesso em: 19/11/2014.
[1] TJMG – AR 10000120352919000 MG, Rel. Fernando Caldeira Brant, DJ: 06/02/2014, DP: 14/02/2014.
[2] EDcl na AR 4.374/MA, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/05/2013, DJe 01/08/2013.
[3] MENIN, Sávio Mahmed Qasem. A ação de impugnação de mandato eletivo e seu prazo decadencial. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 933, 22 jan. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/7852>. Acesso em: 5 out. 2014.n
[4] STF – Ação Rescisória nº 1.970.
[5] AR 1681, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 27/09/2006, DJ 15-12-2006 PP-00081 EMENT VOL-02260-01 PP-00111 RT v. 96, n. 860, 2007, p. 157-163 RDDP n. 48, 2007, p. 134-140
Procurador Federal da AGU - Advocacia Geral da União. Mestrando em Direito. Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Direito Processual Civil. Especialista em Ciências Criminais.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Jorge Andersson Vasconcelos. O prazo decadencial da ação rescisória e a sua improrrogabilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42119/o-prazo-decadencial-da-acao-rescisoria-e-a-sua-improrrogabilidade. Acesso em: 22 dez 2024.
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