Resumo: Costurou-se tese por meio da qual seus defensores postulam a aplicação, a todos os benefícios previdenciários em manutenção em junho de 1999 e/ou em maio de 2004, do índice proporcional do primeiro reajustamento dos novos tetos dos salários-de-contribuição do RGPS estabelecidos, respectivamente, pelas Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003. A alegação seria no sentido de que, como tais Emendas Constitucionais foram promulgadas em dezembro de 1998 e em dezembro de 2003, o primeiro reajuste dos novos tetos de salários-de-contribuição (junho/1999 e maio/2004) deveriam ter sido proporcionais a esse mês (nos termos das portarias respectivas), e não abranger o índice de atualização monetária desde o mês do último reajuste. Como o INSS aplicou o índice integral, a despeito da data das Emendas Constitucionais, o excedente configuraria "aumento real" da arrecadação, a ser, segundo se pretende com tal tese, estendido a todos os benefícios em manutenção (mesmo àqueles não limitados ao "teto" previdenciário em sua origem). Em apertada síntese, portanto, alegam os criadores de tal tese revisional que os reajustes que aumentaram os limites do teto de contribuição devam ser igualmente aplicáveis para reajustar os valores de todos os benefícios em manutenção, tenham ou não sido limitados ao teto previdenciário, aduzindo-se, para tanto, que o aumento geral do “teto” para contribuição, indicando aumento global de receita, implicaria, necessariamente, que se repassasse tal incremento, de forma exatamente igual, ao viés do gasto público com os benefícios previdenciários em manutenção. Intenta-se, assim, incorporar à renda mensal de todos os benefícios em manutenção os ditos "aumentos proporcionais" arrecadatórios gerais de 2,28%, em junho/1999, e de 1,75%, em maio/2004. Demonstrar-se-á, ao final do presente artigo, que se trata de tese absolutamente infundada, bem como se observará que a jurisprudência pátria já compreendeu que a mesma nada mais representa do que um mero desdobramento ou uma nova "roupagem" de tese antiga, já declarada improcedente em entendimento jurisprudencial sedimentado, que ora se tenta "ressuscitar" por meio de um enfoque parcial e específico: a pretensão de reconhecimento de suposta vinculação entre os índices de reajuste das rendas mensais de todos os benefícios previdenciários em manutenção e a elevação dos valores dos "tetos" dos salários-de-contribuição do RGPS.
Palavras-chave: Revisão. Reajuste. Benefício. Previdenciário. RGPS. Emenda Constitucional. Teto. Salários-De-Contribuição.
I) DISTINÇÃO EM RELAÇÃO A OUTROS OBJETOS REVISIONAIS
Em que pese tal tese referir-se, indiretamente, à alteração do chamado “teto” do salário-de-contribuição do RGPS pelo advento das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003, é importante ressaltar que o objeto revisional ora sob foco não se confunde com alguns outros já conhecidos, especialmente os que postulam:
a) Revisão de incorporação da diferença entre a média contributiva apurada e o limite do “teto” vigente à época da concessão do benefício:
Na forma das Leis 8.870/94 e 8.880/94, os benefícios cuja renda mensal inicial tenha sido calculada sobre salário-de-benefício que restou limitado ao “teto” então vigente foram revistos no primeiro reajuste anual seguinte à concessão, mediante a aplicação do percentual correspondente à diferença entra a média contributiva apurada (desconsiderando-se o “teto”) e o “teto” vigente à data da concessão (que foi, então, o salário-de-benefício considerado).
Ora, além de o INSS, salvo em hipóteses excepcionalíssimas, já ter implementado, administrativamente, tal revisão em obediência às Leis 8.870/94 e 8.880/94, constata-se, ainda, de forma clara, que tal previsão revisional só se aplica àqueles benefícios que tenham sido concedidos com a média dos salários-de-contribuição superior ao “teto” e, ante a limitação normativa expressa, tenham tido o salário-de-benefício limitado a tal patamar máximo.
É de tal objeto que trata o Enunciado n. 67 das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais do Rio de Janeiro, em que também se estendeu o patamar-limite aos novos tetos das ECs 20/98 e 41/03, in verbis::
É cabível a revisão de benefício previdenciário para resgatar eventual diferença entre a média do salário-de-contribuição e o valor do salário-de-benefício que, porventura, não tenha sido recuperada no primeiro reajustamento do benefício previdenciário, na forma das Leis 8870/94 e 8880/94, até o limite do novo teto (EC 20/98 e 41/03), sendo indispensável a elaboração de cálculos para a solução da lide.
Não é disso, contudo, que trata o objeto revisional ora sob análise no presente ensaio! Por conseguinte, inaplicável à hipótese ora sob análise o Enunciado n. 67 das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais do Rio de Janeiro, por se tratar de postulação diversa.
b) Revisão de aplicação imediata dos novos tetos previdenciários trazidos pelas Emendas Constitucionais 20/98 e 41/03 aos benefícios pagos com base em limitador anterior:
Guarda-se franca semelhança/aplicabilidade entre tal objeto revisional (veiculado no Informativo STF n. 599) e o do Enunciado n. 67 das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais do Rio de Janeiro (mencionado acima), no que pertine à possibilidade de se reajustar a renda mensal dos benefícios previdenciários até valor superior ao limite-máximo (‘teto”) vigente à época da concessão, desde que a média contributiva apurada tenha sido superior àquele “teto” e, por conseguinte, limitadas até tal patamar (benefícios concedidos no valor-teto), observando-se os novos valores-limites introduzidos pelas referidas emendas constitucionais.
Perceba-se, pois, que também não é esse o objeto revisional da tese ora debatida.
II) CORRETA COMPREENSÃO DA TESE ORA SOB ENFOQUE
Os defensores da tese ora analisada advogam a aplicação, a todos os benefícios previdenciários em manutenção (mesmo àqueles que não tiveram o salário-de-benefício limitado ao patamar-máximo do salário-de-contribuição vigente à data de início do benefício, por força do art. 29, §2º, da Lei 8.213/91), do índice proporcional do primeiro reajustamento dos novos tetos dos salários-de-contribuição do RGPS estabelecidos, respectivamente, pelas Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003.
Explique-se: como tais Emendas Constitucionais foram promulgadas em dezembro/1998 e em dezembro/2003, os primeiros reajustes supervenientes (ocorridos, respectivamente, em junho/1999 e em maio/2004) deveriam ter sido proporcionais a esse mês (nos termos das portarias respectivas), e não abranger o índice de atualização monetária desde o mês do último reajuste. Como o INSS aplicou o índice integral, a despeito da data das Emendas Constitucionais, o excedente configuraria "aumento real" da arrecadação, a ser estendido, então, a todos os benefícios em manutenção.
Como já aduzido alhures, em apertada síntese, pretende-se que os reajustes que aumentaram os limites do teto de contribuição devam ser igualmente aplicáveis para reajustar os valores de todos os benefícios em manutenção, tenham ou não sido limitados ao teto previdenciário, aduzindo-se, para tanto, que o aumento geral do “teto” para contribuição, indicando aumento global de receita, implica, necessariamente, que se repasse tal incremento, de forma exatamente igual, ao viés do gasto público com os benefícios previdenciários em manutenção.
Visa-se, assim, à incorporação, à renda mensal de todos os benefícios em manutenção (mesmo àqueles jamais limitados ao "teto" previdenciário), dos ditos "aumentos proporcionais" arrecadatórios gerais de 2,28% (junho/1999) e de 1,75% (maio/2004).
III) DA INSUBSISTÊNCIA JURÍDICA DA TESE
Podem-se apresentar, em linhas gerais, 4 principais pontos de contra-argumentação às equivocadas premissas consideradas pela tese ora abordada neste trabalho:
1°) foram perfeitamente constitucionais e correspondentes à reposição inflacionária os índices de reajuste aplicados aos benefícios em manutenção em junho-1999 e maio-2004;
2°) não existe qualquer previsão normativa estabelecendo necessária correlação entre eventual elevação do teto dos salários-de-contribuição do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) com índice de reajustamento anual definido para incidir sobre as rendas mensais dos benefícios em manutenção;
3°) não houve qualquer irregularidade perpetrada por ocasião dos reajustes dos novos “tetos” dos salários-de-contribuição às épocas em comento;
4°) e, ainda que supostamente considerada existente tal irregularidade, seria incabível tentar-se corrigir suposta irregularidade hipoteticamente perpetrada no viés arrecadatório em caráter geral e abstrato e com efeitos futuros (em decorrência de norma que teria, supostamente, aumentado de forma excessiva o teto dos salários-de-contribuição), através de um desvirtuamento de algo que foi perfeito, lícito e regular: os percentuais de reajustes dos valores de benefícios em manutenção (cujos titulares, por sua vez, sequer foram prejudicados pela majoração supostamente excessiva do teto arrecadatório, já que não mais contribuem).
Passemos, pois, a abordar tais pontos, de forma mais minuciosa:
Primeiramente, o INSS apenas deu cumprimento, por meio das Portarias n° 4.883/1998 e 12/2004 (ambas do Ministério da Previdência Social), às normas constitucionais que estabeleceram os novos tetos dos salários-de-contribuição do RGPS estabelecidos nas EC's nº 20/1998 e nº 41/2003, não se tratando de “aumento real” nem de reajustamento de renda mensal dos benefícios em manutenção o advento das portarias supervenientes, até porque os reajustes anuais seguem as prescrições legais e não se confundem com a majoração do teto dos salários-de-contribuição do regime previdenciário geral.
Desse modo, a observância estrita da norma constitucional derivada, que fixou novos tetos para os salários-de-contribuição, não caracteriza aplicação de reajuste de renda mensal de benefício nem mesmo violação aos dispositivos constitucionais de irredutibilidade do valor dos benefícios e manutenção do valor real.
Nossa Constituição da República de 1988 estabelece que nenhum benefício pode ser criado sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, §5°). Mas o inverso, no entanto, não é verdadeiro, pois não há exigência constitucional de que o aumento de custeio provoque igual aumento nos benefícios já concedidos (eventual aumento na fonte de custeio pode estar sendo utilizado, a título de exemplo, para a concessão ou criação de algum outro benefício, ou mesmo para superar eventual deficit orçamentário da Previdência).
O que o dispositivo normativo fixa é que qualquer aumento dos benefícios deverá corresponder ao mesmo aumento do salário-de-contribuição, uma das fontes de custeio desses benefícios. O inverso não está sendo estabelecido pela norma.
Estabelecida tal premissa, há de se entender que eventual irregularidade na fixação do limite máximo do salário-de-contribuição em junho de 1999 e em maio de 2004 não serve para alterar ou influenciar o valor dos benefícios em manutenção.
De fato, parece-nos lógico que, ainda que se entenda pela irregularidade ou ilegalidade no viés arrecadatório, com um aumento do teto supostamente ilegal, tal fato não pode ser aproveitado para o fim ora pretendido, porquanto não pode favorecer a quem não tenha sido diretamente influenciado por tal suposta irregularidade.
Como dito, o Texto Constitucional, no art. 195 §5°, apenas estabelece que nenhum benefício pode ser criado sem a correspondente fonte de custeio; mas não há, contudo, qualquer exigência constitucional de que o aumento de custeio (global, geral e abstratamente considerado) implique idêntico aumento nos benefícios já concedidos (até porque, a título de exemplo, tal aumento na fonte de custeio global, abstrata e com efeitos futuros pode estar sendo utilizado para a concessão ou criação de algum outro benefício, ou mesmo para superar eventual deficit orçamentário da Previdência).
Em outros termos: seria tentar corrigir-se uma suposta irregularidade no viés arrecadatório em caráter geral e abstrato, com efeitos futuros (norma que teria, supostamente, aumentado de forma excessiva o teto dos salários-de-contribuição), através de um desvirtuamento de algo que foi perfeito, lícito e regular: os percentuais de reajustes dos valores de benefícios em manutenção (cujos titulares, por sua vez, sequer foram prejudicados pela majoração supostamente excessiva do teto arrecadatório, já que não mais contribuem).
Num exercício de formulação de hipóteses, poder-se-ia até falar em “justiça” ao titular do benefício em manutenção se a norma, por exemplo, tivesse retroagido e determinado o recolhimento a maior das contribuições incidentes sobre os salários-de-contribuição utilizados para o cálculo de seu benefício. Mas, como visto, não é o que ocorre.
O aumento do teto contributivo apenas gera reflexos indiretos sobre o valor do benefício exclusivamente para os segurados de maior renda. Ao se verterem contribuições mais altas, esses mesmos segurados, consequentemente, contarão com um salário de benefício maior.
Mas isso em nada autoriza exigir-se que um benefício em manutenção seja imediatamente majorado, por se ter aumentado o “teto” coletivo de contribuição. O aumento do “teto” não significa que as contribuições vertidas pelo titular do benefício em manutenção tenham sido também aumentadas, logicamente! A relação do beneficiário é entre o que ele contribuiu e o valor de seu salário de benefício.
O aumento de arrecadação é efeito futuro do aumento do “teto” e é automaticamente compensado com o aumento do salário-de-benefício a ser calculado para os segurados que eventualmente passarem a pagar maior contribuição por tal aumento.
A tese ora debatida não resiste a uma acurada análise, haja vista o confronto com os preceitos legais, princípios jurídicos e precedentes jurisprudenciais que regulam a matéria, contrariando frontalmente os arts. 5°, XXXVI, 7°, IV, 195, § 5°, e 201, § 4º, todos da Constituição Federal de 1988, além dos arts.14 da EC 20/98 e 5°, da EC 41/2003.
Essa pretensão de revisão, caso bem sucedida, resultaria em intromissão em matéria de competência legislativa, infringindo os arts. 2º e 201, § 4º, da Constituição. Ali se vê claramente que a matéria de reajustamentos é regulada em lei, e que tal atribuição é legislativa.
É cediço que a Constituição Federal, em seu artigo 201, § 4º, atribuiu expressamente à lei tanto a possibilidade de estabelecer os critérios de reajustamento do valor dos benefícios, quanto para escolher os fatores de correção a serem utilizados para preservar o valor real dos mesmos. Desta maneira, são normas infraconstitucionais que caracterizam a preservação do valor do benefício.
Assim, não merece guarida a tese em tela, pois não há correlação entre eventual elevação do teto dos salários-de-contribuição do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) com índice de reajustamento anual definido para incidir sobre as rendas mensais dos benefícios em manutenção.
Isso porque não há, seja no texto constitucional, seja no infraconstitucional, qualquer garantia ou determinação dessa vinculação das rendas mensais dos benefícios previdenciários com o teto dos salários-de-contribuição, mas apenas que este seja também atualizado anualmente.
Assim, reserva-se tão-somente ao Poder Judiciário o controle da constitucionalidade dos atos normativos que venham a dar eficácia ao mandamento constitucional, não podendo escolher quaisquer índices de reajuste dentre os diversos existentes, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
“PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIOS – REAJUSTAMENTO PARA PRESERVAÇÃO DO VALOR REAL – ÍNDICES – Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, substituir índices legais de reajuste, a pretexto de melhor preservar o valor do benefício. Recurso conhecido, mas desprovido.” (STJ – REsp 200388/SP – 5ª T. – rel. Min. Gilson Dipp – DJU 10.04.2000)
Em julgamento acerca da constitucionalidade dos reajustes concedidos aos benefícios previdenciários, o Supremo Tribunal Federal assim decidiu:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nr.376846
ORIGEM:SC RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
JULGAMENTO DO PLENO - PROVIDO DECISÃO: O TRIBUNAL, POR MAIORIA, CONHECEU E DEU PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA REAFIRMAR A CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 12 E 13, DA LEI Nº 9.711, DE 20 DE NOVEMBRO DE 1998, 4º, §§ 2º E 3º, DA LEI Nº 9.971, DE 18 DE MAIO DE 2000, E Lº, DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.187-13, DE 24 DE AGOSTO DE 2001, E DO DECRETO Nº 3.826, DE 31 DE MAIO DE 2001, VENCIDOS OS SENHORES MINISTROS MARCO AURÉLIO E CARLOS BRITTO, QUE CONHECIAM DO RECURSO E O DESPROVIAM. VOTOU O PRESIDENTE, O SENHOR MINISTRO MAURÍCIO CORRÊA. NÃO VOTOU O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA POR NÃO TER ASSISTIDO AO RELATÓRIO. AUSENTE, JUSTIFICADAMENTE, A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE. PLENÁRIO, 24.09.2003.”
Ponto a se destacar, portanto, é que o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM REITERADOS JULGAMENTOS (COMO NO CASO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO ACIMA, BEM COMO NO DOS RE n° 203.867-9 e RE n° 313.382-9) JULGOU CONSTITUCIONAIS OS REAJUSTES CONCEDIDOS PELA PREVIDÊNCIA SOCIAL, entendendo que os critérios estabelecidos na Lei 8.213/91 e na legislação previdenciária correlata cumprem as disposições constitucionais que asseguram a irredutibilidade e a preservação do valor real dos benefícios.
Ora, o STF não determinou a adoção de outro índice, nem considerou incorretos os índices adotados pela Previdência Social. Foi, assim, mantida a forma de reajuste aplicada administrativamente, reputando-se-a perfeitamente consentânea com a Constituição Federal.
Tal como já aduzido ao início do presente artigo, a tese analisada não passa de um mero desdobramento de tese antiga, já declarada infundada, que ora se pretende ressuscitar por meio de um enfoque parcial e específico: a pretensão de reconhecimento de suposta vinculação entre os índices de reajuste das rendas mensais de todos os benefícios previdenciários em manutenção e a elevação dos valores dos “tetos” dos salários-de-contribuição do RGPS.
De fato, há alguns anos atrás se trazia à apreciação do Judiciário demanda que visava ao reajuste da renda mensal de benefícios em manutenção nas competências dezembro de 1998, dezembro de 2003 e janeiro de 2004, respectivamente, pelos índices de 10,96%, 0,91% e 27,23%, correspondentes aos mesmos aumentos dos tetos dos salários-de-contribuição, invocando seu suposto direito na aplicação do disposto no parágrafo 1° do art. 20 e parágrafo 5° do art. 28, ambos da Lei 8.212/91.
E, tal como na tese atual que ora se analise neste trabalho, também se pretendia fazer uma correlação entre os reajustes dos benefícios em manutenção e as seguidas majorações dos valores-limites (“tetos”) dos salários-de-contribuição.
Restou praticamente pacificado na Jurisprudência pátria o entendimento segundo o qual a finalidade daqueles dispositivos está em assegurar que as rendas mensais iniciais dos benefícios futuros acompanhem os acréscimos das contribuições atuais e não em reajustar aqueles benefícios já em manutenção. Assim, o atrelamento disposto nesses dispositivos garante um mínimo de aumento do salário-de-contribuição, dando aplicação à preservação do valor real dos futuros benefícios, o que não impede um aumento maior da base contributiva. Afinal, essa base contributiva majorada será levada em consideração quando da concessão de futuros benefícios. Assim, o que se percebe é que o atrelamento dá-se tão-somente num sentido e não no outro. O que essas normas fazem é atrelar o teto dos salários-de-contribuição, e os salários-de-contribuição, ao reajuste concedido aos benefícios em manutenção. No entanto, tais dispositivos não valem no sentido oposto. O inverso não é verdadeiro. Ou seja, o aumento dos salários-de-contribuição e do teto desses mesmos não deve, necessariamente, corresponder a um aumento equivalente nos benefícios em manutenção. Eis o entendimento da jurisprudência:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. EQUIVALÊNCIA ENTRE OS REAJUSTES DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO E DOS BENEFÍCIOS. AUSÊNCIA DE BASE LEGAL.
O par. 1º do art. 20, o parágrafo único do art. 21 e o par. 5º do art. 28, todos da Lei 8.212/91, ao determinarem que os valores dos salários-de-contribuição dos segurados empregados, avulso, contribuinte individual e facultativo, bem como o próprio teto do salário-de-contribuição, sejam reajustados na mesma época e com os mesmos índices do reajustamento dos benefícios da prestação continuada da Previdência Social, pretende apenas assegurar que as RMIs dos benefícios futuros acompanhem os acréscimos dos atuais. Esse atrelamento diz respeito à garantia de um mínimo de aumento do salário-de-contribuição, regra que visa preservar o valor real dos futuros benefícios, nada impedindo um aumento maior da base contributiva. Assim, dos dispositivos retromencionados extrai-se que não há qualquer equivalência entre os reajustes dos salários-de-contribuição e dos benefícios, inclusive porque o aumento da contribuição produzirá seus efeitos em relação aos segurados que contribuirão em maior extensão e, por isso, terão direito a uma RMI maior, e não aos que tiveram uma base de custeio menor e estavam sujeitos a outra realidade atuarial. (TRF da 4ª Região, AC 2004.70.00.031931-0/PR, 5ª Turma, Rel. Des. Fed. Victor Luiz dos Santos Laus, Julg. 10/05/2005, DJ 01/06/2005)
Aliás, seria realmente injusto que aquele segurado, que teve um aumento em sua base contributiva, visse repercutir o mesmo aumento naqueles benefícios já em manutenção, em que os já beneficiários contribuíram sobre base menor. Além disso, interpretação em outro sentido diferente seria inconstitucional em vista da regra que determina o equilíbrio financeiro e atuarial dos benefícios da Previdência Social, disposta no caput do art. 201 da Constituição Federal:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a (...):
Assim, quem contribui com mais tem direito a ver observado esse aumento quando da concessão de seu benefício, e quem contribuiu com menos, à evidência, não tem esse direito.
Os segurados de maior renda poderão contribuir sobre valores maiores que antes, incluindo mais de sua renda na proteção do RGPS. De outro lado, os segurados de menor renda não verão qualquer prejuízo, pois o aumento do teto de contribuição não afeta em absolutamente nada sua vida contributiva e muito menos no cálculo do seu salário-de- benefício.
Vê-se, pois, que a fixação do chamado “teto” dos salários-de-contribuição é matéria de custeio, cujo grande objetivo parafiscal é indicar qual é o nível de inclusão previdenciária desejado em relação aos ganhos de maior monta, de forma a que, quanto maior o salário-de-contribuição, maiores serão os futuros salários-de-benefício, abarcando na proteção previdenciária estatal salários de maior monta.
Mas, se o Estado-Administração optar por manter o nível de proteção previdenciária em um montante mais modesto, para reduzir os custos, ele deve manter/reduzir gradativamente o teto da contribuição.
Isso é uma escolha que se situa dentro do mérito administrativo: aumentar o valor coberto e incluir rendas maiores no RGPS ou reduzir o valor coberto e excluir tais rendas do RGPS, levando-as a procurar, caso queiram, outras formas de previdência para complementar a estatal.
Já o reajuste dos benefícios - matéria de benefício -, conforme devidamente determinado pela CRFB-1988, tem por objetivo evitar as perdas inflacionárias e repor o valor real de compra do benefício (princípio da manutenção do valor real dos benefícios).
Não há, assim, a alegada correlação entre um (“teto” do salário-de-contribuição) e outro (índice de reajuste dos benefícios em manutenção).
É inquestionável que o reajuste dos benefícios pode ser diferente daquele aplicado ao teto dos salários-de-contribuição, razão pela qual é claramente equivocada a premissa básica de toda a argumentação dos defensores da tese em questão.
Reforçando esse entendimento, transcrevemos o voto do Eminente Juiz Otávio Roberto Pamplona, Presidente da E. Turma Recursal de Santa Catarina, lavrado no processo 2003.72.00.054845-1:
Em verdade, a referida emenda constitucional apenas estabeleceu um novo limite ao salário-de-contribuição e, por conseguinte, um novo teto aos benefícios previdenciários a serem concedidos após sua vigência, sem quaisquer efeitos sobre os benefícios previdenciários concedidos anteriormente a sua promulgação.
Tratou-se de uma elevação extraordinária do limite máximo do salário-de-contribuição – e, por conseguinte, do teto do salário-de-benefício e da renda mensal do benefício -, decorrente de um critério eminentemente político do legislador e não de majoração decorrente da correção do salário-de-contribuição, com o intuito de recompô-lo em face do processo inflacionário, reajustamento esse a que se referia o artigo 29, § 1°, da Lei n. 8.212/91, na redação vigente por ocasião da edição da Emenda Constitucional n. 20/98.
No âmbito dos Juizados Especiais Federais, a jurisprudência é no mesmo sentido, como se pode facilmente verificar, a título de exemplo, no enunciado da Súmula nº 8 da Turma Recursal de Santa Catarina:
Súmula n° 08: “Não há direito ao reajustamento dos benefícios previdenciários com base nas Portarias MPAS n°. 4.883/98 e MPS n°. 12/2004, que trataram do escalonamento das alíquotas incidentes sobre os novos valores máximos contributivos estipulados pelas EC nºs 20/98 e 41/2003”.
Como se vê, o acolhimento da malsinada tese implicaria a violação expressa de diversos dispositivos constitucionais.
Em primeiro lugar, aos próprios artigos 14, da EC n°. 20/98, e 5°, da EC 41/2003, que não previram a aplicação dos novos tetos como fator de reajuste para os benefícios em manutenção.
Em segundo lugar, implicaria a majoração do valor de um benefício sem a correspondente indicação da fonte de custeio, ao revés do que o exige expressamente o art. 195, § 5°, da CF/88.
De fato, menos lógico é pretender-se que o aumento do teto se estenda a todos os beneficiários, mesmo os que passaram a perceber o benefício sob a égide da lei anterior. Tal decisão implicaria majoração de benefício sem a correspondente fonte de custeio total, o que é vedado não só para o legislador, mas também para o aplicador da lei ao caso concreto, nos termos do art. 195, § 5°, da Constituição Federal.
Tal obstáculo intransponível está umbilicalmente ligado ao princípio do equilíbrio atuarial do sistema, demonstrando que o legislador, ao decidir pela majoração do percentual do teto dos benefícios, entendeu que o orçamento comportaria o aumento para os benefícios futuros, sem considerar os já concedidos, o que não restou expresso. Ou seja, caminhando em sentindo inverso, percebe-se a impossibilidade de majoração em período anterior à alteração legal, quando o sistema ainda não o comportava. Presume-se que, assim que foi possível a alteração do limite, o constituinte revisor o fez, imbuído de sentimento de proteção social. Para o período anterior, conquanto ciente da necessidade, conhecia a insuficiência do orçamento previdenciário.
IV) CONCLUSÃO
Não são poucas, portanto, as razões pelas quais se evidencia a total insubsistência jurídica da tese revisional aqui analisada, que carece de amparo normativo mínimo (constitucional, legal e infralegal) e que, por outro lado, se estrutura, basicamente, sobre uma premissa absolutamente equivocada: a de que haveria necessária correlação entre eventual elevação do teto dos salários-de-contribuição do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) com índice de reajustamento anual definido para incidir sobre as rendas mensais dos benefícios em manutenção. Ao contrário, como se viu, é inquestionável que o reajuste dos benefícios previdenciários em manutenção pode perfeitamente ser diferente (índices diversos) daquele aplicado ao chamado "teto" dos salários-de-contribuição, razão pela qual se faz claramente equivocada a premissa básica de toda a argumentação dos defensores da tese em questão, que não merece qualquer guarida.
Procurador Federal (Advocacia-Geral da União). Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade do Estado do RJ e Pós-Graduado em Direito Público pela Universidade de Brasília. Foi Técnico Judiciário e Analista Judiciário do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) entre os anos de 1998-2004. Aprovado e nomeado Procurador da República (MPF) no ano de 2006
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAVES, Roberto de Souza. Análise sobre a tese revisional da incorporação dos percentuais de 2,28% de junho/1999 e de 1,75% de maio/2004 aos benefícios previdenciários (RGPS) em manutenção Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42271/analise-sobre-a-tese-revisional-da-incorporacao-dos-percentuais-de-2-28-de-junho-1999-e-de-1-75-de-maio-2004-aos-beneficios-previdenciarios-rgps-em-manutencao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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