RESUMO: O presente artigo tem por objetivo apresentar os fenômenos que caracterizam a objetivização do controle difuso de constitucionalidade. Ao longo do texto, serão apresentados os institutos que levaram ao fortalecimento do controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos.
Palavras-chaves: Controle Difuso. Objetivização. Fenômenos caracterizadores.
1. INTRODUÇÃO
O inciso X do art. 52 da Constituição Federal de 1988 prescreve que compete privativamente ao Senado Federal “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”.
De acordo com uma visão clássica sobre o sistema de controle de constitucionalidade, o citado dispositivo serve de meio necessário para que o Senado Federal, discricionariamente, edite Resolução conferindo efeitos erga omnes à declaração de inconstitucionalidade tomada por via de controle concreto pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal.
Isso que dizer que somente com a declaração de vontade emitida pelo Senado é que a decisão tomada na Suprema Corte passará a atingir a esfera jurídica de outras pessoas, pois a questão prejudicial sobre a constitucionalidade de uma norma não está acobertada pelo manto da coisa julgada, na medida em não faz parte do dispositivo do julgado.
Parcela majoritária da doutrina prega que essa Resolução do Senado possui efeitos ex nunc, ou seja, não podendo retroagir para alcançar relações jurídicas fundadas na lei declarada inconstitucional. Porém, como será demonstrado no presente trabalho, a posição mais coerente, que garante uma maior efetividade e economia processual, capitaneada por Gilmar Ferreira Mendes, é aquela que atribuía a essa decisão política do Senado efeitos extunc.
Em posição diametralmente oposta a essa visão clássica, é cada vez mais difundia a idéia da objetivação do controle difuso. Quer-se com isso efetivar uma aproximação dos dois sistemas de controle de constitucionalidade. Com isso, segundo esse novo entendimento, a Resolução do Senado serviria apenas para dar publicidade ao que foi decido pela Corte Suprema, na medida em que a própria decisão tomada pelo STF, mesmo em controle concreto, já seria dotada de eficácia erga omnes.
Como será mostrado ao longo deste labor, a tese vem ganhando a atenção da jurisprudência e do próprio legislador. Serão apresentados alguns fenômenos caracterizadores desse processo, tais como: a opção pelo legislador constituinte da supremacia do controle concentrado em detrimento do controle difuso; as inovações no processo em busca de uma maior efetividade; a vinculação aos precedentes e a ampliação do rol de ações diretas. Esses são alguns dos fatores que tendencionam o enfraquecimento do controle difuso.
Desse modo, a decisão tomada em controle difuso não pode ser vista como algo estritamente subjetivo, ligado àquela idéia tradicional de somente gerar efeitos inter partes, não servindo em nada para alcançar outras situações. É a quebra desse laço estritamente interpessoal que sustenta a tese da abstração do controle difuso.
A tese não é pacifica na doutrina, tampouco na jurisprudência. Nesse sentido, serão apresentados argumentos que entendem por inconstitucional a proposta de mutação constitucional do art. 52, inciso X, da CR/88.
Por fim, será analisada a Reclamação 4335-5/AC que discute a possibilidade de adoção dessa tese em nosso ordenamento, ainda pendente de julgamento, e que certamente marcará uma completa ruptura com a visão clássica sobre o controle de constitucionalidade.
Essa visão crítica da analise realizada não deve ser tomada como desapreço à ordem constitucional vigente, mas como um esforço de contribuição para a compreensão da trajetória institucional e da realidade constitucional do país.
2. FENÔMENOS CARACTERIZADORES DA OBJETIVIZAÇÃO
2.1 Possibilidade de modulação de efeitos em controle difuso
Conforme apontado anteriormente, a declaração de inconstitucionalidade em sede de ação direta é dotada, em regra, de eficácia erga omnes, força vinculante e efeitos retroativos, sendo correta a afirmação de que os atos praticados com base na lei impugnada são considerados nulos, bem como ocorre a restauração da vigência das normas revogadas pela lei ou ato normativo declarado inconstitucional. [1]
A posição tradicional sobre a eficácia da decisão no controle de constitucionalidade de normas é a de que a decisão tem caráter retroativo, ou seja, possui efeitos extunc.
O argumento para esse posicionamento é o de que a lei inconstitucional é nula. A partir do momento em que fosse permitido que uma lei inconstitucional vigorasse, durante certo período de tempo, a despeito de sua contrariedade à Constituição, seria o mesmo que chancelar a violação da Constituição durante o referido período.
Essa idéia da teoria clássica das nulidades não foi incorporada ao modelo austríaco. Para Kelsen, desenvolvedor do controle concentrado de constitucionalidade, a decisão tinha sempre um efeito desconstitutivo. A partir do momento em que se afirma que a jurisdição possui um caráter criativo, diz-se que a eficácia da decisão deve sempre olhar para o futuro.
É importante ressaltar que essa relativização foi feita até nos EUA, berço da idéia da nulidade absoluta da lei inconstitucional. Aliás, muitos países passaram a mitigar o princípio da eficácia retroativa, influenciados pela evolução da jurisprudência americana nos anos 60.[2]
Essa possibilidade de manipulação dos efeitos também foi incorporada ao nosso ordenamento. A lei 9.868/99,que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, expressamente determina que:
Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
Não restam dúvidas que da analise do supracitado dispositivo é perfeitamente possível a manipulação dos efeitos temporais de uma decisão. A grande controvérsia é a possibilidade de aplicação de tal técnica ao controle de difuso de constitucionalidade.
O assunto foi amplamente estudado por Gilmar Ferreira Mendes. O autor inicia seus postulados traçando as dificuldades de implementação desse método ao controle norte-americano, em que o sistema é voltado para a defesa de posições subjetivas, mas ressalta que mesmo naquele sistema constitucional não tem sido aceita a idéia da nulidade clássica em decisões que introduzem alterações na jurisprudência, havendo casos em que a nova posição aplica-se aos casos pendentes.
Por fim, explica o eminente Ministro:
[...] tendo em vista a autonomia dos processos de controle incidental ou concreto e de controle abstrato, entre nós, mostra-se possível um distanciamento temporal entre as decisões proferidas nos dois sistemas (decisões anteriores, no sistema incidental, com eficácia extunc, decisão posterior, no sistema abstrato, com eficácia ex nunc. Esse fato poderá ensejar uma grande insegurança jurídica. Daí parecer razoável que o próprio STF declare, nesses casos, a inconstitucionalidade com eficácia ex nunc na ação direta, ressalvando-se, porém, os casos concretos já julgados ou, em determinadas situações, até mesmo os casos sub judice, até a data do ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade. Essa ressalva assenta-se em razoes de índole constitucional, especialmente no principio da segurança jurídica. Ressalta-se aqui que, alem da ponderação central entre o principio da nulidade e outro principio constitucional, com a finalidade de definir a dimensão básica da limitação, deverá a corte fazer outras ponderações, tendo em vista a repercussão da decisão tomada no processo de controle in abstrato nos diversos processos de controle concreto.[3]
Importante destacar que, embora a regra seja a teoria da nulidade no controle incidental, é possível destacar, após a Constituição de 1988, alguns precedentes do Supremo Tribunal Federal que, diante da excepcionalidade do caso concreto, quando se acham em risco a boa-fé e a segurança jurídica dos cidadãos ou da própria ordem jurídica, decide por projetar efeitos prospectivos às decisões que decretam a inconstitucionalidade.
No julgamento do RE 197.917, que tinha por objeto a constitucionalidade do parágrafo único do art. 6º da Lei Orgânica n. 222, de 1990, do Município de Mira Estrela, que estabelecia o numero de vereadores em desacordo com o estabelecido no art. 29, inciso IV, da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal, acolhendo proposta formulada pelo Ministro Gilmar Mendes, consagrou o entendimento de que a decisão de inconstitucionalidade seria dotada de efeitos ex nunc.[4]
Também foi esse posicionamento firmado pela Suprema Corte no julgamento que declarou, por maioria, em sede de habeas corpus, a inconstitucionalidade da vedação à progressão de regime no cumprimento de pena nos casos de crimes hediondos. Neste caso, o Supremo estabeleceu efeitos restritivos à declaração de inconstitucionalidade, ao asseverar que a decisão não acarretará consequências jurídicas com relação às penas já extintas na data do julgamento, e que a questão envolve tão somente o afastamento do óbice representado pela norma inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão.[5]
No que concerne às mudanças legislativas, com o advento da Lei 11.417/2006, o Supremo Tribunal Federal ganhou mais um mecanismo tendente a restringir efeitos ou decidir que a súmula vinculante só tenha eficácia a partir de outro momento, por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse jurídico (art. 4º). Nada impede, pois, que o Supremo adote essa orientação no âmbito do controle incidental de constitucionalidade, mediante decisão proferida em recurso extraordinário.
2.2 Intervenção do Amicus Curiae
Consoante se extrai do conteúdo da Lei 9.868/90, norma regulamentadora do controle concentrado, a figura do amicus curiae materializa o auxilio de terceiro interessado doravante a relevância da questão respaldada no processo.
Entende-se por amicus curiae a pessoa que intervém de modo a auxiliar o Juízo no que se refere ao aprimoramento das decisões em âmbito judicial; assim, “a participação do amicus curiae consubstancia-se em apoio técnico ao magistrado.”[6]
Em conceituação desconstitutiva, afirma Didier:
Não se trata de um postulante, parte do processo com interesse específico em determinado resultado para o julgamento [...] Não se cuida, pois, propriamente de uma intervenção de terceiro. Sua função é de auxiliar do juízo. A marca de sua intervenção é a pendência de demandas que envolvam conhecimentos técnico-jurídicos especializados, ou que tenham alta relevância política.[7]
Destarte, urge ressalvar, que a jurisprudência já é pacifica no que tange à admissibilidade do instituto do amicus curiae em sede de controle difuso.
Nesse viés, emerge a seguinte jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
O Tribunal iniciou julgamento de dois recursos extraordinários interpostos pelo INSS nos quais se pretende cassar acórdão de Turma Recursal de Juizado Especial Federal que determinara a revisão da renda mensal de benefício de pensão por morte, com efeitos financeiros correspondentes à integralidade do salário de benefícios da previdência geral, a partir da vigência da Lei 9.032/95, independentemente da norma em vigor ao tempo do óbito do segurado. Por maioria, o Tribunal, considerando a relevância da matéria, e, apontando a objetivação do processo constitucional também em sede de controle incidental, especialmente a realizada pela Lei 10.259/2001 (arts. 14, § 7º, e 15), resolveu questão de ordem no sentido de admitir a sustentação oral da Confederação Brasileira dos Aposentados, Pensionistas e Idosos - COBAP e da União dos Ferroviários do Brasil. Vencidos, no ponto, os Ministros Marco Aurélio, Eros Grau e Cezar Peluso que não a admitiam, sob o fundamento de que o instituto do amicus curiae restringe-se ao processo objetivo, não sendo extensível, ao Supremo, que não é Turma de Uniformização, o procedimento previsto no § 7º do art. 14 da Lei 10.259/2001.RE 416827/SC e RE 415454/SC, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.9.2005. (RE-416827)[8]
Portanto, facultou-se o auxílio por parte de terceiros – como o Ministério Público, pessoas jurídicas de direito público responsáveis por editar o ato em lide, ou mesmo, titulares dos direitos em xeque – havendo, pois “oportunidade para a efetiva abertura do processo de controle de constitucionalidade incidental, que passa, nesse ponto, a ter estrutura semelhante à dos processos de índole estritamente objetiva.”[9]
2.3 A vinculação dos motivos determinantes: o obter dictum e a ratio decidendi
É sabido que uma decisão judicial se divide em três partes: relatório, fundamentação e dispositivo. Via de regra, seja no controle concentrado, seja no controle difuso, o que transita em julgado é o dispositivo (onde o juiz discute e analisa o pedido).
Se entende por ratio decidendi “[...] os fundamentos jurídicos que sustentam a decisão. É a opção hermenêutica adotada na sentença, sem a qual decisão não teria sido proferida como foi, trata-se da tese jurídica acolhida pelo órgão julgador no caso concreto.”[10]
Explica Fredie Didier que a ratio decidendi “estabelecida na fundamentação de determinadas decisões judiciais tem o condão de vincular decisões posteriores, obrigando que os órgãos jurisdicionais adotem aquela mesma tese jurídica na sua própria fundamentação”.[11]
A importância do real significado da vinculação às razoes de decidir de uma decisão pode ser demonstrada no exemplo a seguir: no julgamento de uma ADI, o STF adota o entendimento que uma determina lei estadual possui vício formal por invadir competência privativa da União necessitando, pois, de uma lei federal para regulamentar a matéria. Se for editada uma nova lei de outro ente da federação, que não a União, essa lei será também inconstitucional, pois a vinculação não atinge somente o dispositivo da decisão, recaindo a força do julgado também sobre a fundamentação.
Já o obiter dictum possui uma definição por negação: aquilo que não for considerado como estruturante da tese jurídica, ou seja, aquilo que serve apenas como fundamento de passagem para a formação do precedente judicial. É apenas algo que deve ser usado na argumentação, mas é algo que não forma o seu núcleo essencial. É algo que se revela “prescindível para o deslinde da controvérsia.” [12]
A importância de saber diferenciar esse dois estágios de uma decisão judicial é etapa necessária para entender o efeito vinculante da própria decisão judicial. De acordo com a dicção do art. 472 do CPC a coisa julgada vinculada as partes ao que foi posto no dispositivo, é esta parte da decisão que será importante para saber os limites do deslinde de uma controvérsia especifica.
A partir do momento em que partimos para o estudo da força vinculante do precedente judicial, abandonando-se a idéia de lide como algo estritamente intersubjetivo, é necessário investigar a fundamentação das decisões anteriores sempre em busca de sua ratio decidendi. A parte escolhida como fundamento determinante de uma decisão torna-se uma regra geral que pode ser aplicada a diversas outras situações semelhantes.
Com isso se observa que “[...] da solução de um caso concreto (particular) extrai-se uma regra de direito que pode ser generalizada. Configura exatamente o que Luiz Guilherme Marinoni chama de norma jurídica criada pelo magistrado, à luz do caso concreto, a partir da conformação da hipótese legal de incidência às normas constitucionais.” [13]
Essa extrapolação dos limites que fundamentam uma decisão, servindo como parâmetro para solução de outras causas idênticas, recebe o nome de teoria da transcendência dos motivos determinantes. Tal raciocínio deita suas raízes no art. 102, parágrafo 2º, da CF, sendo certo que os fundamentos relevantes (obiterdictum) que determinaram a decisão vincularão os juízes e tribunais como também a própria administração.
O Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de manifestar-se sobre o assunto, no qual ficou consignado que:
O litígio jurídico-constitucional suscitado em sede de controle abstrato (ADI 2.868/PI), examinado na perspectiva do pleito ora formulado pelo Estado de Sergipe, parece introduzir a possibilidade de discussão, no âmbito deste processo reclamatório, do denominado efeito transcendente dos motivos determinantes da decisão declaratória de constitucionalidade proferida no julgamento plenário da já referida ADI 2.868/PI, Cabe registrar, neste ponto, por relevante, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no exame final da Rcl 1.987/DF, Rel. Min. MAURÍCIO CORREA, expressamente admitiu a possibilidade de reconhecer-se, em nosso sistema jurídico, a existência do fenômeno da "transcendência dos motivos que embasaram a decisão" proferida por esta Corte, em processo de fiscalização normativa abstrata, em ordem a proclamar que o efeito vinculante refere-se, também, à própria "ratio decidendi", projetando-se, em conseqüência, para além da parte dispositiva do julgamento, "in abstracto", de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade.
Essa visão do fenômeno da transcendência parece refletir a preocupação que a doutrina vem externando a propósito dessa específica questão, consistente no reconhecimento de que a eficácia vinculante não só concerne à parte dispositiva, mas refere-se, também, aos próprios fundamentos determinantes do julgado que o Supremo Tribunal Federal venha a proferir em sede de controle abstrato, especialmente quando consubstanciar declaração de inconstitucionalidade, como resulta claro do magistério de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS/GILMAR FERREIRA MENDES ("O Controle Concentrado de Constitucionalidade", p. 338/345, itens ns. 7.3.6.1 a 7.3.6.3, 2001, Saraiva) e de ALEXANDRE DE MORAES ("Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional", p. 2.405/2.406, item n. 27.5, 2ª ed., 2003, Atlas).
Na realidade, essa preocupação, realçada pelo magistério doutrinário, tem em perspectiva um dado de insuperável relevo político-jurídico, consistente na necessidade de preservar-se, em sua integralidade, a força normativa da Constituição, que resulta da indiscutível supremacia, formal e material, de que se revestem as normas constitucionais, cuja integridade, eficácia e aplicabilidade, por isso mesmo, hão de ser valorizadas, em face de sua precedência, autoridade e grau hierárquico, como enfatiza o magistério doutrinário (ALEXANDRE DE MORAES, "Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional", p. 109, item n. 2.8, 2ª ed., 2003, Atlas; OSWALDO LUIZ PALU, "Controle de Constitucionalidade", p. 50/57, 1999, RT; RITINHA ALZIRA STEVENSON, TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR. e MARIA HELENA DINIZ, "Constituição de 1988: Legitimidade, Vigência e Eficácia e Supremacia", p. 98/104, 1989, Atlas; ANDRÉ RAMOS TAVARES, "Tribunal e Jurisdição Constitucional", p. 8/11, item n. 2, 1998, Celso Bastos Editor; CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, "A Fiscalização Abstrata de Constitucionalidade no Direito Brasileiro", p. 215/218, item n. 3, 1995, RT, v.g.).
Cabe destacar, neste ponto, tendo presente o contexto em questão, que assume papel de fundamental importância a interpretação constitucional derivada das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função institucional, de "guarda da Constituição" (CF, art. 102, "caput"), confere-lhe o monopólio da última palavra em tema de exegese das normas positivadas no texto da Lei Fundamental, como tem sido assinalado, com particular ênfase, pela jurisprudência desta Corte Suprema:[14]
2.4 O reflexo da decisão sobre a inconstitucionalidade em outros tribunais
Na década de 90, o STF desenvolveu um entendimento jurisprudencial de que se o Pleno ou Órgão Especial do tribunal já tiver julgado questão idêntica, não seria necessário que o órgão fracionário do tribunal submetesse a questão ao Plenário ou Órgão Especial para julgamento, pois o próprio órgão fracionário poderia afastar a aplicabilidade da lei ou ato normativo no caso concreto.
Essa orientação jurisprudência acabou sendo positivada em 1998 com a edição da Lei 9756/98, que acrescentou um parágrafo único ao art. 481 do CPC. Nesse sentido, conforma a dicção do CPC, os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.
Esse entendimento marca evolução no sistema de controle de constitucionalidade brasileiro, que passa a equiparar, praticamente, os efeitos das decisões proferidas nos processos de controle abstrato e concreto. A decisão do Supremo Tribunal Federal, tal como colocada, antecipa o efeito vinculante de seus julgados em matéria de controle de constitucionalidade incidental, permitindo que o órgão fracionário se desvincule do dever de observância da decisão do Pleno ou do Órgão Especial do Tribunal a que se encontra vinculado. Decide-se autonomamente, com fundamento na declaração de inconstitucionalidade (ou de constitucionalidade) do Supremo Tribunal Federal, proferida incidenter tantum.[15]
Essa cláusula de reserva de plenário presente no art. 97 da CR/88 foi, no decorrer dos últimos anos, objeto de inúmeros ataques dos Tribunais, que recorrentemente tentavam burlá-la, usando de um procedimento por via obliquo para tanto. Era comum o órgão fracionário deixar de aplicar uma norma por entender que a mesma era inconstitucional em casos concretos. O STF passou a questionar tal prática, aduzindo que, deixar de aplicar uma norma por entender que a mesma é inconstitucional é o mesmo que declarar a inconstitucionalidade da norma.
Por fim, em virtude de constantes manifestações de desrespeito à clausula de reserva de plenário, o STF editou súmula vinculante que preleciona que “viola a cláusula de reserva de plenário (CF , art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte.
2.5 Da cláusula de reserva de plenário
Conforme demonstrado, no âmbito do controle difuso é conferido o poder a qualquer órgão do Poder Judiciário, juiz ou tribunal, de declarar a inconstitucionalidade de qualquer lei ou ato normativo que esteja em desacordo com a Constituição, sempre tendo a finalidade de afastá-lo da incidência de caso concreto.
Um juiz de primeiro grau, de acordo com o seu livre convencimento pode declarar a inconstitucionalidade de uma lei, negando-lhe aplicação ao caso concreto. Deverá, entretanto, observar o comando constitucional contido no art. 93, inciso IX, da CR/88, que impõe a obrigatoriedade de fundamentação para todos os julgados proferidos pelo Poder Judiciário.[16]
Já em relação à atuação dos tribunais, a Constituição Federal estabelece um procedimento especifico para a declaração de inconstitucionalidade, conhecido na doutrina como “cláusula de reserva de plenário” (art. 97 do CR/88).
O Ministro Gilmar Mendes[17] adota a tese de que todas as decisões do controle incidental têm efeito erga omnes. Um dos principais argumentos que o faz entender dessa forma é o princípio da reserva de plenário, instituído no artigo 97, CF/88, que institui que só a maioria absoluta dos membros do tribunal pode declarar uma lei inconstitucional.
Art. 97 da CF: Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.
Esse princípio se aplica tanto ao controle abstrato quanto ao controle incidental, ou seja, aplicando-se a reserva de plenário ao Supremo, exige a maioria absoluta dos membros, tanto para declarar a inconstitucionalidade de uma lei no controle abstrato quanto no controle incidental. O Ministro Gilmar diz que não faz nenhum sentido que seis Ministros do STF declarem a lei inconstitucional numa ADIN, a decisão tem efeito erga omnes e se os mesmos seis ministros do STF declararem uma lei inconstitucional num RE ou num HC, a decisão tenha efeito apenas inter partes.
3. CONCLUSÃO
A vista de todo o exposto, percebe-se que a atual evolução do direito constitucional caminha para o fortalecimento do controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos. Prova isso os inúmeros instrumento de objetivização que estão sendo aplicados ao controle difuso de constitucionalidade.
Assim, acreditamos, que o processo busca dar efetividade ao texto constitucional, sempre de olho no postulado da segurança das relações jurídicas. Como enfatizado acima, o controle abstrato pode ser uma das saídas para a crise encontrada em nosso judiciária, tendo em vista que um único julgamento pode servir de base para a solução de inúmeros conflitos, as chamadas demandas em massa.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 15ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008.
DIDIER, Fredie Jr. Curso de direito processual Civil. Volume 01. Bahia: Jus Podivm, 2009.
DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Volume 02. Salvador: Juspodivm, 2009.
DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da: Curso de Direito Processual Civil – volume 03. – 7 ed. – Salvador: Jus Podivm, 2009,
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional.4 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva e Instituto Brasiliense de Direito Público, 2009
[1]ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Constitucional Descomplicado. 15ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008, p. 790
[2]MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet op. cit. p. 1134, nota 2
[3]Idem, Ibdem. p. 1324
[4] STF, RE 197.917, Rel. Min. Maurício Correia, DJ, 07.05.2004
[5] STF, HC 82.959, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ, 13.03.2006
[6]DIDIER, Fredie Jr. Curso de direito processual Civil. V.1. Bahia: Jus Podivm, 2009, p. 389.
[7]Idem, Ibdem. p. 389
[8] Disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo402.htm Acessado em 25/10/10
[9]MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo GustavoGonet op. cit. p. 1124, nota 2.
[10] DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. Salvador: Juspodivm, 2009, p. 381
[11]DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. op. cit. p. 389
[12]Idem, Ibdem. p. 383
[13]Idem, Ibdem. p. 384
[14]Rcl 2986 MC/SE, Min. Celso de Mello, DJ, 11.03.05
[15]MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonetop. cit. p. 1133, nota 2.
[16]ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. op. cit. p. 728, nota 27
[17]MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo GustavoGonet op. cit. p. 1010, nota 2.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GUEDES, Bruno Torres. Da objetivização do controle difuso de constitucionalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42289/da-objetivizacao-do-controle-difuso-de-constitucionalidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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