RESUMO: A Hermenêutica não se confunde com a Interpretação Jurídica, sendo inúmeras as teorias que buscaram compatibilizar os institutos, dando origem a diversas Teorias da Argumentação Jurídica, objeto do presente trabalho.
Palavras-chave: Hermenêutica – Interpretação –Interpretação estrutural – unidade do processo hermenêutico – limites objetivos do processo hermenêutico – globalidade do processo hermenêutico – natureza racional do ato interpretativo – Tópica de Viehweg – Nova retórica de Perelman – Teoria da Argumentação de Toulmin – Teoria Integradora da Argumentação Jurídica de Maccormick – Teoria da Argumentação Jurídica de Alexy – discurso jurídico.
Tema de suma relevância na comunidade jurídica contemporânea, há ainda quem confunda as expressões Hermenêutica e Interpretação Jurídica. Porém os termos registram conteúdos linguísticos distintos.
Interpretar denota, em síntese, o ato de revelar o sentido, estabelecendo-se o alcance da norma jurídica no contexto social em que inserida. Já a Hermenêutica consiste na ciência que fornece os critérios e elementos que serão, justamente, utilizados no ato de interpretar a norma jurídica.
Hermenêutica e Interpretação, embora complementares, notadamente distinguem-se:a primeira possui papel primordial no respeito à isonomia e igualdade jurídica, posto que, ao fornecer parâmetros para a atividade interpretativa, restringe a possibilidade de se imprimir exacerbado subjetivismo; a segunda decorre logicamente das opções adotadas pela primeira.
Suscita-se, portanto, a imprescindibilidade de que o processo hermenêutico afigure-se coeso, convergente a parâmetros hábeis a estabelecer certa unidade no ato de interpretar normas jurídicas. Vale dizer, neste aspecto, ser inegável a natureza axiológica do ato interpretativo, pressupondo a valoração objetivada nas proposições normativas.
Embora o caráter unitário da interpretação jurídica das normas constitua baliza à Hermenêutica, de qualquer modo não se nega a assertiva de que toda interpretação está condicionada pelas mutações históricos do sistema. Nesse particular, toda interpretação jurídica ocorre em determinado contexto, condicionada à estrutura global do ordenamento, afigurando-se simultaneamente retrospectiva e prospectiva.
Todavia, frise-se que, de qualquer modo, existem limites objetivos do processo hermenêutico. Nesse quadro, portanto, assume importância a premissa de que nenhuma interpretação jurídica pode ultrapassar a estrutura objetiva resultante da significação unitária e congruente dos modelos jurídicos positivos.
A garantia de respeito à lógica do ordenamento, diante destes limites, reside justamente na globalidade de sentido do processo hermenêutico, promovendo-se a compreensão da interpretação como parte constituinte da visão global de mundo e da vida, no plano cartesiano da ordem normativa que é objeto do ato de interpretar.
Tendo em vista justamente esta globalidade, o ato interpretativo deve respeitar uma natureza eminentemente racional, tendo como pressuposto a recepção dos modelos jurídicos como entidades lógicas. Daí a necessidade de os atos interpretativos serem válidos segundo exigências racionais, ainda que sua origem revele a presença de fatores que não necessitam de demonstração para serem tidos como certos ou verdadeiros.
A propósito, dentre as várias interpretações possíveis, a destinação ética do processo interpretativo exige que se opte por aquela que mais corresponda aos valores éticos da pessoa e da convivência social, não podendo obedecer a puros critérios de lógica formal. É certo, ainda, que a interpretação dos modelos jurídicos não pode ser reduzida à análise linguística, afigurando-se imperioso que se desenvolva segundo exigências da razão histórica, assim entendida como possibilidade teórica de materialização de questões filosóficas.
Observa-se, assim, que a Hermenêutica, por conta dos cânones que estabeleceu, permitiu a rejeição da lógica formal como único instrumento para se promover a Interpretação, denotando expressiva superação do positivismo. Daí surgiram, portanto, as mais diversas Teorias da Argumentação, à vista das concepções hermenêuticas que se deram ao longo dos tempos.
Enfrentando o peso dos parâmetros hermenêuticos, dentre as Teorias da Argumentação, verifica-se a Teoria da Argumentação de Toulmin, que refuta a lógica dedutiva. Estabelece, por seu turno, que o argumento apropriado e convincente variaria de acordo com o contexto histórico, disciplinar ou social, localizando a ciência da lógica como disciplina autônoma. Em linhas gerais, a Teoria da Argumentação de Toulmin institui que a lógica relacionar-se-ia diretamente com a forma como os homens pensam, argumentam e efetivamente interferem, não se pautando na tradição tópica ou retórica.
A tradição tópica encontra na Teoria da Argumentação de Viehweg sua maior expressividade. A Tópica de Viehweg assevera que, como essência do Direito, a tópica objetiva localizar e identificar as premissas a serem utilizadas no raciocínio jurídico, rejeitando a lógica formal dedutiva. A tradição tópica, no entanto, é insuficiente a explicar os meandros da argumentação jurídica, expressamente mencionados pela Teoria da Argumentação de Toulmin, não permitindo estabelecer as influências da lei, da dogmática e do precedente na formulação do raciocínio jurídico.
Por outro lado, a tradição retórica, balizada nas ideias de Quintiliano, Aristóteles e Cícero, considera a argumentação como processo em que todos os seus elementos constantemente se influenciam, uns em face dos outros. Essa fórmula é adotada pela Teoria da Argumentação de Perelman, também alcunhada de Nova Retórica.A proposta almejou ampliar o campo da razão para além dos limites das ciências dedutivas, bem como das ciências indutivas e empíricas. Seu maior erro, no entanto, consistiu em não oferecer esquema algum a permitir a adequada análise dos argumentos jurídicos retratados, muito menos do processo de argumentação stricto sensu.
Não é menos certo, por outro lado, que as Teorias da Argumentação acima retratadas permitiram o amplo diálogo da comunidade acadêmica quanto aos parâmetros que deveriam restar materializados para a Hermenêutica. Neste contexto surgiu outra teoria, fundada na justificação como único método suficiente a permitir a manutenção da coerência intrínseca ao processo de persuasão: a Teoria Integradora da Argumentação Jurídica de Maccormick. Por ela, os casos considerados singelos poderiam ser solucionados pela argumentação dedutiva, ao passo que os mais complexos exigiriam o emprego de outras virtudes humanas, como a sensatez, a elevação de objetivos, o senso de justiça, a humanidade e a compaixão, sem olvidar a observância da universalidade, consistência e coerência da decisão. Apesar de a Teoria de Maccormick sustentar-se nas normas vigentes e nos fatos estabelecidos, indicando razões a demonstrar a garantia da realização da justiça mediante determinada decisão, havia inegável pobreza de conceitos – muitas vezes por demais pragmáticos -, atendo-se exclusivamente acerca da aplicação do direito e olvidando os cânones filosóficos que deveriam calcar o raciocínio jurídico adotado.
Por tais motivos surgiu a Teoria da Argumentação Jurídica de Alexy, que partiu de teoria da argumentação prática geral que migra, no curso de seu desenvolvimento, para o campo do direito. A Teoria de Alexy, por assim dizer, adota a sistematização e reinterpretação do discurso prático, direcionando-o para o campo do direito, considerando o discurso jurídico, a argumentação jurídica, como um caso especial. Não obstante a inumerabilidade dos argumentos abrigados no discurso jurídico, a assertiva de que um enunciado normativo é racionalmente fundamentável deve respeitar as restrições atinentes à subordinação à lei, obrigatória consideração dos precedentes, e limitações impostas, eventualmente, pelo ordenamento adjetivo.
A complexidade da Teoria da Argumentação Jurídica de Alexy implicou afirmar que o discurso jurídico, do modo posto, poderia ser comandado por qualquer pessoa que pudesse introduzi-lo, inaugurando diversos questionamentos, desde que o fizesse na dialeticidade lógico-argumentativa. De tudo o quanto expusesse, porém, deveria respeitar a aplicação do seu discurso no âmbito universal do ordenamento jurídico, integrando-o na medida em que determinada ilação fosse apropriada a qualquer outro objeto semelhante, nos aspectos essenciais, àqueloutro sob análise. A coerência deste discurso, portanto, só restaria mantida enquanto não se operasse qualquer espécie de contradição, por mais singela que pudesse se afigurar, afirmando-se somente aquilo que possua fundamento verossímil e, concomitantemente, crível.
Talvez o equívoco da Teoria da Argumentação Jurídica de Alexy, no contexto da Hermenêutica, resida no fato de que, para ela, o argumento em si, desde que não exista um contra-argumento, bastaria para manutenção do discurso jurídico. Porém, a Hermenêutica visa justamente a conferir parâmetros interpretativos estáveis que permitam, a despeito da atuação de outros intérpretes, aferir a lógica e coerência do próprio discurso que visa a interpretar determinada norma jurídica. A Teoria de Alexy, não temos dúvida, permite a relativização do signo lógico-linguístico de acordo com a capacidade intelectual dos participantes do discurso jurídico (seja argumentando ou contra-argumentando), limitando, por conseguinte, o significado da própria hermenêutica.
Procurador Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JANNUCCI, Alessander. Teorias da argumentação jurídica e hermenêutica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 dez 2014, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42485/teorias-da-argumentacao-juridica-e-hermeneutica. Acesso em: 23 dez 2024.
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