RESUMO: O presente artigo analisará o direito à nomeação em concurso público a partir da análise atualizada das principais tendências jurisprudenciais verificadas no âmbito do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
Palavras-chave: concurso público, nomeação, vagas, direito subjetivo, expectativa de direito.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho destina-se a analisar o direito à nomeação em concurso público sob o prisma das recentes decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. O tema relaciona-se com o princípio constitucional do concurso público, que tem importante relevo em um Estado Democrático de Direito e é fortalecido sempre que o Poder Público assegura e observa as garantias fundamentais que viabilizam a efetividade desse princípio. Ao lado das garantias de publicidade, isonomia, transparência, impessoalidade, entre outras, o direito à nomeação representa também uma garantia fundamental da plena efetividade do princípio do concurso público.
Desse modo, serão investigados quais são os casos em que a jurisprudência entende estar presente o direito subjetivo à nomeação e quais são aqueles em que se estabelece mera expectativa de direito. Ademais, serão apresentadas as diretrizes adotadas pelos julgados para a convolação da mera expectativa em efetivo direito subjetivo à nomeação. E, por fim, a partir do reconhecimento da repercussão geral do RE 837311, em 24 de novembro de 2014, será demonstrado o desafio da Suprema Corte, cujas turmas possuem, atualmente, posicionamentos antagônicos em relação ao tema.
FUNDAMENTOS DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CONCURSO PÚBLICO
Nos termos que anuncia o art. 37, II da Constituição Federal, oingresso no serviço público dá-se, em regra, mediante a realização de concurso público:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
III - o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período;
IV - durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira
A exigência constitucional do concurso público para a investidura de agentes no serviço público é um importante preceito do Estado Democrático de Direito, na medida em que se propõe a selecionar aquele indivíduo que estiver mais bem preparado para atender aos interesses da coletividade, a partir de um sistema de mérito em que todos podem participar nas mesmas condições[1].
Segundo lecionaHely Lopes Meirelles[2]:
"( ...) é o meio técnico posto à disposição da administração pública para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, consoante determina o art. 37, II, da CF. Pelo concurso, afastam-se, pois, os ineptos e os apaniguados, que costumam abarrotar as repartições, num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantém no poder leiloando empregos públicos"
Infere-se do artigo supra transcrito que o princípio constitucional do concurso público diz respeito tanto às hipóteses do vínculo estatutário, quanto ao vínculo em regime celetista. As únicas exceções ao princípio estão expressas na própria norma constitucional, que estabelece a possibilidade de nomeação para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (art. 37, incisoII, in fine) e prevê a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, inciso IX).
Em razão desses preceitos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que estavam banidas das formas de investidura no serviço público admitidas pela Constituição a ascensão e a transferência, que são formas de ingresso em carreira diversa daquela para a qual o servidor público ingressa por concurso (ADIN n. 231, Rel. Min. Moreira Alves, julgada em 5.8.1992). Do julgamento originou-se a Súmula 685 do STF, segundo a qual “é inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”[3]
Uma vez finalizada a seleção, por meio de concurso público, com o resultado dos candidatos aprovados, é por meio da nomeação que a Administração dá investidura no cargo ou função.
Neste ponto, há muito que a doutrina e jurisprudência debatem o tema do direito à nomeação em diversas situações, como por exemplo, quando a aprovação se dá dentro ou fora do número de vagas, nos casos em que se verifica preterição ou contratação de terceirizados para desempenhar a mesma função, entre outros tantos aspectos.
Assim, adiante, será feito um compiladodo entendimento dos Tribunais pátrios a partir da análise da sua recente jurisprudência, em especial do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, destacando-se os pontos de convergência e divergência, bem como aquelas hipóteses tidas como configuradoras do direito subjetivo à nomeação em concurso público.
DO DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO
Depois de alguns debates, é possível afirmar que a jurisprudência dos Tribunais Superiores há algum tempo se firmou no sentido de que o candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital tem direito subjetivo à nomeação no prazo de validade do certame. Contudo, caberá à Administração Pública analisar discricionariamente a melhor oportunidade ou conveniência para realizar as nomeações durante o período de validade do concurso..
Consolidando esse entendimento, o Supremo Tribunal Federal decidiu em sede de repercussão geral:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS.
I. DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público. Uma vez publicado o edital do concurso com número específico de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no certame cria um dever de nomeação para a própria Administração e, portanto, um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas.
II. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. BOA-FÉ. PROTEÇÃO À CONFIANÇA. O dever de boa-fé da Administração Pública exige o respeito incondicional às regras do edital, inclusive quanto à previsão das vagas do concurso público. Isso igualmente decorre de um necessário e incondicional respeito à segurança jurídica como princípio do Estado de Direito. Tem-se, aqui, o princípio da segurança jurídica como princípio de proteção à confiança. Quando a Administração torna público um edital de concurso, convocando todos os cidadãos a participarem de seleção para o preenchimento de determinadas vagas no serviço público, ela impreterivelmente gera uma expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas nesse edital. Aqueles cidadãos que decidem se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no Estado administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia de comportamento. Isso quer dizer, em outros termos, que o comportamento da Administração Pública no decorrer do concurso público deve se pautar pela boa-fé, tanto no sentido objetivo quanto no aspecto subjetivo de respeito à confiança nela depositada por todos os cidadãos.
[omissis]
(RE 598099/MS, Min. Rel. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJ 10/08/2011, DJe 03/10/2011)
Em igual sentido, a jurisprudência do STJ:
ADMINISTRATIVO - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL -CONCURSO PÚBLICO - CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGASPREVISTO NO EDITAL - DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO – ACÓRDÃORECORRIDO NO MESMO SENTIDO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE: SÚMULA83/STJ.
1. O candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no editaltem direito subjetivo a ser nomeado no prazo de validade doconcurso.
2. Agravo regimental não provido.
(STJ, AgRg no AREsp 207155/MS, Min. Rel. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJ 02/05/2013, DJe 10/05/2013)
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOAPROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS. DIREITO À NOMEAÇÃORECONHECIDO. PRECEDENTES DO STJ. REPERCUSSÃO GERAL.
1. Este Superior Tribunal firmou entendimento no sentido de que a regularaprovação em concurso público em posição classificatória compatível com as vagas previstas em edital confere ao candidato direito subjetivo a nomeação e posse dentro do período de validade do certame.
2. Orientação consolidada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento doRE 598.099/MS, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe de 03/10/2012, com repercussão geral.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STJ, AgRg no REsp 1196718/AL, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, Julgamento 26/02/2013, DJe de 05/03/2013)
A respeito do prazo de validade do concurso público, é importante registrar que a jurisprudência se firmou no sentido de que a Administração não está obrigada a prorroga-lo, por se tratar de ato discricionário, submetido ao juízo de oportunidade e conveniência. Contudo, se novos cargos vêm a ser criados durante tal prazo de validade, mostra-se de todo recomendável que se proceda a essa prorrogação (RE 581113, Relator Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 05/04/2011).
Cumpre salientar, ainda, que o STJ ao analisar, em sede de mandado de segurança (MS 18.881-DF), edital que previa originariamente 49 vagas “acrescidos dos cargos que vagarem durante o período de validade do concurso público” considerou que a impetrante havia sido aprovada dentro do número de vagas oferecidas, haja vista sua classificação na 81ª posição e o surgimento de 45 vagas durante o prazo de validade do certame.
DA EXPECTATIVA DE DIREITO E DAS HIPÓTESES DE CONVOLAÇÃO
Situação diversa é a do candidato aprovado fora do número de vagas. Neste caso, a linha jurisprudencial majoritária vê apenas uma mera expectativa de direito:
O candidato aprovado fora das vagas previstas no edital não tem direito subjetivo à nomeação, ainda que surjam novas vagas durante o prazo de validade do certame, seja em decorrência de vacância nos quadros funcionais seja em razão da criação de novas vagas por lei. Isso porque, dentro do parâmetro fixado em repercussão geral pelo STF, os candidatos aprovados em concurso público, mas inseridos em cadastro de reserva, têm apenas expectativa de direito à nomeação. Nesses casos, compete à Administração, no exercício do seu poder discricionário (juízo de conveniência e oportunidade), definir as condições do preenchimento dos seus cargos vagos. (MS 17.886-DF - Rel. Min. Eliana Calmon - j. em 11/09/2013 - Informativo 531)
Mas os Tribunais pátrios não excluem a possibilidade de que a expectativa de direito venha, em alguns casos, se convolar em direito subjetivo à nomeação.
A primeira das hipóteses é quando a ordem classificatória for subvertida. Esse é o entendimento já sumulado pelo Pretório Excelso por meio da Súmula 15, redigida nos seguintes termos: “Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação.”
A segunda hipótese, externadas em várias decisões oriundas do STJ, reconheceram que o candidato aprovado fora do número de vagas do edital adquire direito à nomeação se comprovar: a) o surgimento de novas vagas durante o prazo de validade do concurso público e b) o interesse da Administração Pública em preencher taisvagas. Nesse sentido, a Primeira Seção deste Tribunal disse:
A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que os candidatos classificados em concurso público fora do número de vagas previstas no edital possuem mera expectativa de direito à nomeação, apenas adquirindo esse direito caso haja comprovação do surgimento de novas vagas durante o prazo de validade do concurso público, bem como o interesse da Administração Pública em preenchê-la, o que não ocorreu no caso dos autos. (...)
(MS 17.147/DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 27/06/2012)
Pode-se verificar a ocorrência do interesse da Administração Pública em preencher a vaga quando, dentro do prazo de validade do certame, ocorre a contratação de pessoal de forma precária para o preenchimento de vagas existentes, com preterição daqueles que, aprovados, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou função:
:AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. EXISTÊNCIA DE CANDIDATOS DEVIDAMENTE APROVADOS E HABILITADOS EM CERTAME VIGENTE. PRECEDENTES. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A ocupação precária, por comissão, terceirização, ou contratação temporária, para o exercício das mesmas atribuições do cargo para o qual promovera oconcurso público, configura ato administrativo eivado de desvio de finalidade, caracterizando verdadeira burla à exigência constitucional do artigo 37, II, da Constituição Federal. Precedente: AI 776.070-AgR, Relator Ministro Gilmar Mendes, Dje 22/03/2011. 2. In casu, o acórdão originariamente recorrido assentou: “MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. EXISTÊNCIA DE CANDIDATOS DEVIDAMENTE APROVADOS E HABILITADOS EM CERTAME VIGENTE. BURLA À EXIGÊNCIA CONSTITUCIONAL DO ART. 37, II, DA CF/88. CARACTERIZAÇÃO. DEFERIMENTO DA ORDEM QUE SE IMPÕE. I- A aprovação em concurso público, fora da quantidade de vagas, não gera direito à nomeação, mas apenas expectativa de direito. II- Essa expectativa, no entanto, convola-se em direito subjetivo, a partir do momento em que, dentro do prazo de validade do concurso, há contratação de pessoal, de forma precária, para o preenchimento de vagas existentes, em flagrante preterição àqueles que, aprovados em concurso ainda válido, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou função. Precedentes do STJ (RMS nº 29.973/MA, Quinta Turma. Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIS FILHO. DJE 22/11/2010). III- A realização de processo seletivo simplificado, no caso ora apresentado, representou manifesta afronta à Lei Estadual nº 6.915/97, a qual regula a contratação temporária de professores no âmbito do Estado do Maranhão, especificamente do inciso VII do seu art. 2º. IV- Com efeito, a disposição acima referida é clara no sentido de que somente haverá necessidade temporária de excepcional interesse público na admissão precária de professores na Rede Estadual de Ensino acaso não existam candidatos aprovados em concurso público e devidamente habilitados. V- A atividade de docência é permanente e não temporária. Ou seja, não se poderia admitir que se façam contratações temporárias para atividades permanente, mormente quando há concurso público em plena vigência, como no caso em apreço. Essa contratação precária, friso uma vez mais, é uma burla à exigência constitucional talhada no art. 37, II, da CF/88. VI- Segurança concedida.” 3. Agravo regimental não provido.
ARE 649046 AgR / MA - MARANHÃO
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO
Relator(a): Min. LUIZ FUX
Julgamento: 28/08/2012 Órgão Julgador: Primeira Turma
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. INEXISTÊNCIA. CONCURSO PÚBLICO. DIREITO À NOMEAÇÃO EM FACE DE CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS POSTERIORES E DENTRO DO PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. HIPÓTESE DOS AUTOS QUE SUBSUME-SE AO JULGADO PROFERIDO PELA SUPREMA CORTE NO ARE N.º 808.524/RS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Segundo o Supremo Tribunal Federal, "Não possui repercussão geral a controvérsia relativa ao direito à nomeação de candidato participante de concurso público, quando decidida pelo Juízo de origem à luz da legislação infraconstitucional, dos fatos da causa e das cláusulas do edital do certame." (AgRg no ARE 808524, Relator Min. TEORI ZAVASCKI, julgado em 29/05/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 09-06-2014 PUBLIC 10-06-2014.)
2. Em face das peculiaridades do caso concreto, não obstante a Impetrante ter sido aprovada em 2.º lugar, fora do número inicial de vagas previstas no Edital (uma vaga), o Município realizou contratações temporárias para o mesmo cargo, antes de expirado o prazo de validade do certame. Hipótese que subsume-se ao julgado da Suprema Corte.
3. Agravo regimental desprovido.
(STJ, AgRg no RE nos EDcl no AgRg no RMS 37499/MA, Min. Rel. Laurita Vaz, Corte Especial, DJ 01/10/2014, DJe 22/10/2014)
RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. CONCURSO PÚBLICO.
CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS
PREVISTO NO EDITAL. SUPERVENIENTE SURGIMENTO DE
NOVAS VAGAS. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO. NECESSIDADE
DA ADMINISTRAÇÃO CONFIGURADA. NOMEAÇÃO. DIREITO
PÚBLICO SUBJETIVO. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO.
Omissis
A prática de ato, pela Administração, que evidencie a necessidade de preenchimento de cargos vagos gera direito subjetivo à nomeação dos candidatos aprovados e classificados em concurso público inicialmente além do número de vagas ofertado pelo edital do certame.
Na espécie, ao promover a nomeação de candidatos classificados além do número de vagas previsto no certame, bem como ao realizar contratação temporária de professores, a Administração revelou a existência de cargos vagos e a necessidade do serviço, de maneira que a desistência de alguns convocados não poderia ensejar a preterição dos remanescentes. (...)
(REsp 1185379/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 15/03/2012)
Outra hipótese em que resta demonstrado o interesse da Administração Pública no preenchimento das vagas é a realização de novo certame para os mesmos cargos dos aprovados que não foram chamados, mesmo ante a existência de vagas abertas do concurso anterior:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. CANDIDATO CLASSIFICADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS OFERECIDAS PELO EDITAL. EXPECTATIVA DE DIREITO. SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. ABERTURA DE NOVO CERTAME AINDA NA VALIDADE DO ANTERIOR. EXPECTATIVA DE DIREITO QUE SE CONVOLA EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO. EXAME DAS REGRAS DO EDITAL. ÓBICE DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ.
1. Não se conhece de Recurso Especial em relação à ofensa ao art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF.
2. O STJ adota o entendimento de que a mera expectativa de nomeação dos candidatos aprovados em concurso público (fora do número de vagas) convola-se em direito líquido e certo quando, dentro do prazo de validade do certame, há contratação de pessoal de forma precária para o preenchimento de vagas existentes, com preterição daqueles que, aprovados, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou função.
3. Tal direito também se manifesta quando, durante o prazo de validade do concurso, demonstrado o interesse da Administração Pública, surgirem novas vagas, seja em razão da criação de novos cargos mediante lei, seja em virtude de vacância decorrente de exoneração, demissão, aposentadoria, posse em outro cargo inacumulável ou falecimento, seja pela realização de novo concurso público dentro do prazo de vigência do certame anterior.
4. In casu, o Tribunal a quo consignou que foi aberto novo certame, na validade do concurso anterior, na mesma área que o impetrante concorrera - Química. Portanto, a expectativa de direito se convalidou em direito subjetivo à nomeação.
(STJ, AgRg no REsp 1402265, Min. Rel. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJ 04/02/2014, DJe 07/03/2014)
Outro caso no qual o STJ também entendeu que a expectativa à nomeação se convola em direito subjetivo trata do surgimento de vagas decorrentes da desistência de candidatos nomeados e que decidiram não assumir o cargo ou pediram exoneração. Dessa forma, caso haja vagas disponíveis e a Administração decida por não nomear os candidatos aprovados fora do número de vagas, este ato deverá ser motivado. Não servirá como motivação o simples argumento de que tais candidatos ficaram mal posicionados no concurso, uma vez que do primeiro ao último aprovado, todos foram considerados aptos pela Administração:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NORECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS. DESISTÊNCIA DECANDIDATOS MELHOR CLASSIFICADOS. DIREITO SUBJETIVO. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA N. 283 DO STF. PRETENSÃO QUEENCONTRA ÓBICE NA SÚMULA N. 7 DO STJ. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOART. 535 DO CPC.
1. No caso, o acórdão recorrido concedeu a segurança levando em conta eventuais desistênciasde candidatos melhor classificados do que a impetrante, daí porque concluiu que havia o interesse da administração no preenchimento dos cargos vagos e o direito subjetivo à nomeação.
2. O entendimento do Tribunal de origem se encontra em sintonia com o posicionamentojurisprudencial do STJ, no sentido de que a desistência de candidatos, em número suficiente para alcançar a classificação do candidato que ingressa em juízo para assegurar sua nomeação, gera para este direito subjetivo. Nesse sentido, dentre outros: RMS 36.916/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 08/10/2012.
Omissis
(STJ, AgRg no Resp 1225356/AM, Min. Rel. Benedito Gonçalves, 1º Turma, DJ 18/12/2012, DJe 04/02/2013)
Em todas as hipóteses elencadas acima, o traço comum é a necessidade de se demonstrar que além do surgimento da vaga, havia o interesse da Administração Pública em preenchê-la, seja porque realizou contratação de terceirizado para idêntica função, pela abertura de novo certame no prazo de validade do concurso anterior com aprovados, ou pela desistência de candidatos já convocados para assumirem as vagas. Para este Tribunal, diante da inexistência dessas ou outra situação em que se demonstre de modo inequívoco o interesse na nomeação, o preenchimento estará sujeito ao juízo de conveniência e oportunidade da Administração:
1. Os aprovados em concurso público têm apenas expectativa de direito, em virtude da discricionariedade administrativa, submetendo a nomeação dos candidatos ao juízo de conveniência e oportunidade da Administração, e não viola, destarte, os princípios da isonomia e legalidade. Não há, portanto, qualquer direito líquido e certo aos demais candidatos que, fora das vagas indicadas no edital, seguiram como suplentes na ordem de classificação do certame.
2. Não restaram comprovadas as hipóteses excepcionais como, por exemplo, quando ocorre preterição na ordem de classificação dos candidatos, criação de novos concursos enquanto vigente o anterior, ou na hipótese de contratação de servidores precários para mesmas funções do cargo em que o concurso esteja em andamento.
3. Ainda que novas vagas surjam no período de validade do concurso, - por criação de lei, ou mesmo por força de vacância -, o seu preenchimento está sujeito a juízo de conveniência e oportunidade da Administração. (...)
(AgRg no RMS 21.362/SP, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), Sexta Turma, julgado em 10/04/2012)
DA DIVERGÊNCIA NO ÂMBITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Recentemente, em 21 de novembro de 2014, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a existência de repercussão geral no Recurso Extraordinário (RE) 837311, cujo objeto é o direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados fora do número de vagas previstas no edital de concurso público no caso de surgimento de novas vagas durante o prazo de validade do certame.
O tema é palpitante no âmbito daquela Corte Suprema uma vez que tem sido decidido de forma divergente pelas duas Turmas. Nesse aspecto, destacou o relator do processo, ministro Luiz Fux, a importância do pronunciamento do Plenário a fim de que seja fixada uma só tese, “de modo a assegurar a segurança e a previsibilidade necessárias nos inúmeros certames públicos tanto para a Administração Pública quanto para os candidatos aprovados”.
Para a Primeira Turma do STF, a criação de novas vagas durante o prazo de validade de concurso não gera, automaticamente, direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas do edital, salvo se comprovados arbítrios ou preterições. Esse não é o entendimento da Segunda Turma, para qual o direito à nomeação deve ser estendido ao candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital na hipótese em que surgirem novas vagas no prazo de validade do concurso.
Por serem representativas da controvérsia, passo a transcrever as duas ementas citadas pelo Min. Luiz Fux no voto em que reconheceu a repercussão geral da matéria:
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NORECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO.NOVAS VAGAS CRIADAS POR LEI NA VIGÊNCIADE CONCURSO VÁLIDO. CANDIDATOAPROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS DOEDITAL. PRETERIÇÃO NÃO CARACTERIZADA.DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO.INEXISTÊNCIA. PRECEDENTES. NECESSIDADEDO REEXAME DO CONJUNTO FÁTICOPROBATÓRIO.INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279/STF.
1. A preterição do candidato em concurso público,quando aferida pelas instâncias ordinárias, não podeser revista pela E. Suprema Corte, em face daincidência da Súmula 279/STF que dispõe,verbis:Para simples reexame de prova não cabe recursoextraordinário.
2. O recurso extraordinário não sepresta ao exame de questões que demandamrevolvimento do contexto fático-probatório dosautos, adstringindo-se à análise da violação direta daordem constitucional.
3. A jurisprudência do STF jáfirmou entendimento no sentido de que tem direitosubjetivo à nomeação o candidato aprovado dentrodas vagas previstas no edital do concurso público aque se submeteu. Nestes casos, a Administração temum dever de nomeação, salvo situaçõesexcepcionalíssimas plenamente justificadas.Contudo, a criação de novas vagas durante o prazo de validade de concurso não gera, automaticamente, direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas do edital, salvo se comprovados arbítrios ou preterições. Precedentes.
Omissis
(STF, ARE 757.978-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 7/4/2014)
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282 DO STF. ADMINISTRATIVO. INVESTIDURA EM CARGO OU EMPREGO PÚBLICO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. SUBMISSÃO À REGRA CONSTITUCIONAL DO CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO QUE PASSA A FIGURAR DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
I – Ausência de prequestionamento dos arts. 2º e 173, § 1º, II, da Constituição. Incidência da Súmula 282 do STF. Ademais, a tardia alegação de ofensa ao texto constitucional, apenas deduzida em embargos de declaração, não supre o prequestionamento. Precedentes.
II – A jurisprudência deste Tribunal é pacífica no sentido de que, para a investidura em cargo ou emprego público, as empresas públicas e as sociedades de economia mista se submetem à regra constitucional do concurso público, prevista no art. 37, II, da Lei Maior. Precedentes.
III – O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 598.099/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, firmou entendimento no sentido de que possui direito subjetivo à nomeação o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital de concurso público.
IV – O direito à nomeação também se estende ao candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital na hipótese em que surgirem novas vagas no prazo de validade do concurso. Precedentes.
V – Agravo regimental a que se nega provimento.
(ARE 790897 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 25/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-07-03-2014)
Com efeito, é importante que a Corte Suprema pronuncie-se a respeito desta questão relativa a concurso público, recorrente no meio jurídico e portadora de especial relevância para um Estado Democrático de Direito, que zela pela igualdade de oportunidades e pela escolha motivada pelo mérito. Como bem destaca o próprio Tribunal, o princípio constitucional do concurso público é fortalecido quando o Poder Público assegura e observa as garantias fundamentais que viabilizam a efetividade desse princípio. Ao lado das garantias de publicidade, isonomia, transparência, impessoalidade, entre outras, o direito à nomeação representa também uma garantia fundamental da plena efetividade do princípio do concurso público.
CONCLUSÃO
Analisando-se a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, pode-se afirmar que as jurisprudências de ambos os tribunais convergem ao entender que o aprovado em concurso público dentro do número de vagas do edital possui direito subjetivo à nomeação, enquanto que aquele aprovado fora do número de vagas possui mera expectativa de direito.
Contudo, sob o prisma do Superior Tribunal de Justiça, essa expectativa, pode convolar-se em direito subjetivo quando comprovadas a existência de vagas e o interesse da Administração Pública em provê-las, que pode ser demonstrado a partir da contratação de pessoal de forma precária para exercer idêntica atividade à do cargo, pela abertura de novo concurso enquanto ainda não expirado o anterior, pela desistência de candidatos aprovados e convocados, entre outras situações.
No âmbito do Supremo Tribunal Federal, a questão tem recebido tratamentos diversos por suas turmas, na medida em que para a primeira, a existência de vagas não gera aos candidatos aprovados fora do número de vagas, automaticamente, o direito subjetivo de ser nomeado; enquanto que para a segunda turma, nesses casos, o direito à nomeação deve ser a eles estendido.
A fim de dirimir a controvérsia e consequentemente levar a questão para julgamento do Plenário, foi reconhecida pelo STF, em 24 de novembro de 2014, a repercussão geral do RE 837311/PI. Pretende-se estabelecer uma tese única a ser abraçada pela Suprema Corte, de modo a assegurar a segurança e a previsibilidade de inúmeros certames tanto para a Administração Pública quanto para os candidatos aprovados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª ed. Rio de Janeiro: 2007.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30ª ed., Atualizado por Eurico de Andrade Azevedo, DélcioBalestro Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 2005.
[1]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª ed. Rio de Janeiro: 2006.
[2]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30ª ed., Atualizado por Eurico de Andrade Azevedo, DélcioBalestro Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 2005.
[3]Disponível em http://download.rj.gov.br/documentos/10112/842868/DLFE-48882.pdf/Revista46PoderJudiciario_pg_268_a_304.pdf. Acesso em 15/12/2014.
Procuradora Federal desde 2007, com atuação no contencioso da área previdenciária, administrativa e de pessoal. Pós-graduada em Direito Público e em Direito Tributário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PERES, Camila Gomes. O direito à nomeação em concurso público sob a perspectiva jurisprudencial brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 dez 2014, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42575/o-direito-a-nomeacao-em-concurso-publico-sob-a-perspectiva-jurisprudencial-brasileira. Acesso em: 23 dez 2024.
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