Resumo: As razões aqui tecidas referem-se ao estudo da consignação extrajudicial efetuada por administrados de débitos para com o Poder Público.
1. Introdução
Vez por outra a Administração se depara com depósitos extrajudiciais realizados por seus credores. Este artigo objetiva analisar a possiblidade de tal providência, ante a característica da indisponibilidade dos créditos da Fazenda Pública. Será estudado se a previsão legal estampada no art. 890 do Código de Processo Civil aplica-se aos créditos fazendários.
2. Desenvolvimento
Os créditos da Fazenda Pública são indisponíveis, ou seja, a Administração não tem livre disposição de suas receitas. A Administração está estritamente vinculada aos ditames legais, o que elimina qualquer possibilidade de dispor dos valores relativos a tais obrigações.
A consignação extrajudicial prevista no art. 890 do Código de Processo Civil é um procedimento adequado para a solução de conflitos entre particulares com poderes para dispor dos seus próprios direitos, haja vista que o próprio §2º desse dispositivo prevê a possibilidade de a ausência de manifestação do credor implicar liberação da obrigação, o que não se admite em relação aos créditos da Fazenda Pública, sequer no âmbito de um processo judicial.
Fixadas estas premissas é possível verificar a inadequação da consignação extrajudicial para os créditos da Fazenda Pública, conforme será exposto a seguir.
Em se tratando de créditos tributários, a regra é a possibilidade, tão somente, de consignação judicial da importância, nos termos do art. 164 do Código Tributário Nacional:
Art. 164. A importância de crédito tributário pode ser consignada judicialmente pelo sujeito passivo, nos casos:
I - de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória;
II - de subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem fundamento legal;
III - de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador.
§ 1º A consignação só pode versar sobre o crédito que o consignante se propõe pagar.
§ 2º Julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e a importância consignada é convertida em renda; julgada improcedente a consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis.
No que tocam às inovações processuais civis advindas da Lei nº 8.951/1994 que possibilitam o depósito extrajudicial (parágrafos do art. 890 do Código de Processo Civil[1]), a doutrina[2] tem encarado que esse dispositivo legal não tem aplicação para a Fazenda Pública:
Tais novidades - é bem de ver - não se compadecem com a forma de extinção das obrigações tributárias, que passa ao largo de atropelos, prazos exíguos, manifestações imediatas, etc. Ademais, o lançamento de tributos (mesmo o lançamento por homologação) há de passar sempre pelo crivo do Fisco.
Deste modo, os parágrafos em pauta devem ser interpretados restritivamente, não se aplicando à Fazenda Pública (que, aliás, sequer não é mencionada).
Diante do exposto, pode-se concluir que, à falta de lei específica, não há como nem porque aplicar-se essas novas disposições (§§ 1º a 4º, do artigo 890, do CPC), em detrimento da Fazenda Pública.
Na doutrina de Antônio Carlos Marcato, outrossim, há expresso entendimento de vedação de pagamento por consignação nos créditos da Fazenda Pública, a qual estaria permitida, tão somente, o depósito judicial. É de se notar que no artigo desse doutrinador[3] há menção do termo “créditos da Fazenda Pública”, sem que haja distinção entre créditos tributários e não tributários:
Em síntese, temos hoje as seguintes situações envolvendo o pagamento por consignação:
A) Será necessariamente judicial o depósito que tenha por objeto coisa diversa de dinheiro, ou quando não seja possível a utilização da via extrajudicial, valendo-se o devedor, ou o terceiro interessado na extinção da obrigação, da ação consignatória, observado o procedimento previsto nos arts. 890 e seguintes do CPC - salvo em se tratando de prestações envolvendo aluguéis ou encargos da locação, caso em que o procedimento a ser atendido é aquele estabelecido pelo art. 67 da Lei 8.245, de 1991.
B) Tendo por objeto prestação oriunda de compromisso de compra e venda de lote urbano (arts. 33 e 38, §1º, da Lei 6.766, de 19.12.79), o depósito será necessariamente o extrajudicial, carecendo o devedor da ação consignatória, por ausência de interesse de agir, pois a especialidade da Lei de parcelamento do solo urbano afasta a incidência, nas prestações que contempla, dos novéis dispositivos do CPC, devendo prevalecer, para fins de depósito, o disposto em seus arts. 33 e seguintes;
C) Nos demais casos (e independentemente da origem da obrigação) caberá ao devedor optar pela realização de qualquer dos depósitos aludidos, isto é, o judicial ou o extrajudicial, excetuados os créditos da Fazenda Pública, que só poderão ser objeto de depósito judicial, via ação de consignação em pagamento.
Grifou-se.
Cite-se, ainda, o Código de Processo Civil Comentado de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade, onde há o seguinte apontamento em relação ao mencionado art. 890:
9. Procedimento extrajudicial. Prevê-se procedimento extrajudicial para o depósito em consignação. Nessa parte, a norma tem natureza de direito material. Por esta razão, somente foram modificados os dispositivos materiais sobre a consignação. Os processuais, previstos em lei especial, não forma alcançados pela L 8953/94. De consequência, tal procedimento extrajudicial não é válido para as consignações de débitos fiscais (CTN 156 VIII e 164) nem de depósitos oriundos de relação locatícia (LI 67).
A jurisprudência acompanha a doutrina no sentido de considerar a estrita legalidade tributária, a qual impossibilita a via extrajudicial para depósitos de créditos tributários:
Processo: AC 200261050114175 / AC - APELAÇÃO CÍVEL – 1142874
Relator (a): JUIZ CONVOCADO SILVA NETO
Sigla do órgão: TRF3 (Órgão julgador: TURMA SUPLEMENTAR DA SEGUNDA SEÇÃO)
Fonte: DJF3 DATA: 06/08/2008 (Data da Decisão: 24/07/2008)
Ementa
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - IRPJ - CRÉDITO TRIBUTÁRIO - CONSIGNAÇÃO EXTRAJUDICIAL E INSUFICIENTE DEPÓSITO INOPONÍVEIS, COMO EXTINÇÃO NEM SUSPENSÃO RESPECTIVAS - ESTRITA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA A REGER O TEMA, CTN, ARTIGOS 109 E 164 - JUROS E SELIC : LEGALIDADE - TR A INCIDIR COMO JUROS - LEGITIMIDADE - IMPROCEDÊNCIA AOS EMBARGOS. 1. Supondo a consignatória prova do pólo devedor sobre resistência do pólo credor ao exercício do direito de adimplemento da obrigação envolvida, confunde a parte apelante os efeitos jurídicos do instituto da consignatória em pagamento. 2. Nos termos da parte final do artigo 109, CTN, os efeitos dos institutos de direito privado regem-se pelas normas tributárias em específico - que evidentemente assim existam, com efeito - como na espécie assim a estabelecer o artigo 164, CTN. 3. A superveniente inovação lançada pelo §1º do artigo 890, CPC, não se põe a alcançar o caso em espécie, seja porque em essência a não se cuidar de judicial consignatória, seja por que sequer evidenciado nestes autos na outra instância apontada tenha havido resistência ao exercício do dever de pagar tributo, seja por fim e em essência por que o próprio pólo contribuinte também faz por se lhe reconhecer desconhece somente é causa extintiva do crédito a consignatória vitoriosa, na qual de sucesso o pólo contribuinte em final solução judicial, consoante parte final do inciso VIII do artigo 156, CTN, e primeira parte do § 2º de seu artigo 164. 4. Sequer oponível o evento extintivo alegado, por incompatível com a estrita legalidade tributária, como se observa, artigo 97, CTN, artigo 150, inciso I, Lei Maior, este ditame por seus mais capitais efeitos. 5. Também sem sucesso a pretendida suspensividade da exigência com arrimo em depósito reconhecidamente a menor do que o devido, assim simultaneamente afrontadas a norma do inciso II, artigo 151, CTN, e a Súmula 112, E. STJ, a imporem ao sucesso suspensivo o prévio e total depósito do quanto envolvido. 6. Se almeja a parte apelante paralisar a cobrança do crédito, deveria ter procedido ao depósito do todo em tela, ainda que discordasse do mesmo, como na espécie quanto aos juros. Desta forma, insubsistente também tal intento, ex vi legis. 7. Relativamente à afirmada exorbitância dos juros, calcada em que não admitiria o CTN excedimento a um por cento mensal, há de se salientar insubsistir o afirmado excesso de cobrança, em cotejo com o contido na certidão embasadora da execução em tela. 8. Extrai-se do estabelecido pelo parágrafo único do art. 201, CTN, bem como pelos incisos II e IV do § 5º, Lei 6.830/80, que o decurso do tempo, com a natural continuidade de fluência dos juros e de incidência de atualização monetária, não tem o condão de afastar a liquidez dos títulos executivos fiscais envolvidos, nem de revelar abuso a respeito. 9. Afigura-se coerente venha dado valor, originariamente identificado quando do ajuizamento da execução fiscal pertinente, a corresponder, quando do sentenciamento dos embargos, anos posteriores, a cifra maior, decorrência - límpida e lícita, em sua superioridade em si - da incidência dos acréscimos ou acessórios previstos pelo ordenamento jurídico. 10. Coerente se revela a compreensão segundo a qual os juros, consoante art. 161, CTN, recaem sobre o crédito tributário, figura esta naturalmente formada pelo capital ou principal e por sua indelével atualização monetária - esta fruto da inerente desvalorização, histórica, da moeda nacional - de tal sorte que sua incidência, realmente, deva se dar sobre o débito, a cujo principal, como se extrai, em essência adere a correção monetária, para dele fazer parte integrante. 11. Tão assim acertado o entendimento que a Administração, quando pratica a dispensa de correção monetária, em dados momentos e à luz evidentemente de lei a respeito, denomina a tanto de remissão, instituto inerente ao crédito tributário, à dívida em sua junção de principal com atualização. 12. Consoante histórico legislativo encartado na C.D.A., que o evoluir no tempo não malferiu a previsão a respeito, antes referida, pois que de cunho eminentemente subsidiário, a figura do propalado § 1o. do art. 161, CTN, em sua primeira parte: límpida sua dicção, então, no sentido de que o inadimplemento esteja sujeito a enfocado acréscimo. 13. Não aceita a parte embargante/apelante incidida a TR como juros nem como correção monetária. 14. A Lei 8.177/91, em seu art. 9º., redação originária, previu a incidência da T.R.D. sobre os débitos para com a Fazenda Nacional, sem especificar sob qual forma isso se daria, o que foi elucidado por meio da nova redação a este dispositivo, promovida pelo art. 30 da Lei 8.218/91, este fixando corresponderia a T.R.D. a juros de mora, o que se coaduna com os artigos 3º e 7º da referida Lei 8.218/91, o primeiro prevendo a incidência de T.R.D. como juros, sobre os débitos para com a Fazenda Nacional, e o segundo determinando a incidência da variação do B.T.N.F., até a extinção deste, e, a partir desta, de T.R.D., equivalente esta a juros de mora. 15. Ao tempo em que foi prevista, a T.R. atuou como juros, por decorrência prejudicada a angulação sob correção monetária. 16. Em sede de SELIC, a revelar dívidas com vencimentos nos anos 1987/1988, extrai-se se colocou tal evento sob o império da Lei n.º 9.250/95, a partir desta, cujo art. 39, §4º, estabelece a sujeição do crédito tributário federal à Selic e lhe é posterior. Precedente. 17. Improvimento à apelação. Improcedência aos embargos.
Grifou-se.
Em relação às receitas não tributárias, é possível ver a preocupação do legislador em relação a essa categoria de créditos quando os equiparou aos créditos tributários em diversos aspectos processuais. Na Lei nº 6.830/1980 há expressa aplicação dessa equivalência:
Art. 4º.
§ 4º - Aplica-se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional.
A Lei n° 4.320/1964 em seu art. 52, por sua vez, trata do que vem a ser objeto do lançamento, inserindo, ao lado dos impostos, as rendas com vencimento determinado em lei, regulamento ou contrato. Assim, por esse documento legal, houve tratamento similar entre créditos tributários e não tributários.
Dessa feita, tanto as receitas tributárias quanto as não tributárias são caracterizadas pela indisponibilidade, consequência do próprio princípio da indisponibilidade do interesse público.
A indisponibilidade dos créditos não tributários da Fazenda Pública também pode ser vista a partir do afastamento da incidência do art. 320 do Código de Processo Civil, entendimento consagrado nos tribunais, que não se restringe às ações que discutem matéria tributária.
PROCESSUAL CIVIL - EMBBARGOS DE TERCEIRO - FAZENDA PÚBLICA - EFEITOS DA REVELIA - ART. 319 DO CPC - INAPLICÁVEL - INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE EM DISCUSSÃO - NULIDADE DA SENTENÇA - REMESSA OFICIAL - PROVIMENTO. 1. O Juízo "a quo" aplicou ao INSS os efeitos da revelia, com fundamento no artigo 319 do CPC ("se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor"), considerando que, conquanto citado, não apresentou contestação. Contudo, ao teor do que estabelece o inciso II, do art. 320 do Código de Processo Civil, não se opera a revelia contra a Fazenda Pública. 2. "A inexistência de contestação pelo INSS, por se tratar de pessoa jurídica de direito público, cujos direitos são indisponíveis, não acarreta os efeitos da revelia". (Precedente: AC 0004680-72.2005.4.01.3303/BA, Rel. Des. Federal Neuza Maria Alves da Silva, 2ª Turma do T.R.F. da 1ª Região, e-DJF1 de 23/09/2010, pág. 83). 3. Declarada a nulidade do processo, a partir da fase de provas. 4. Remessa oficial provida. 5. Peças liberadas pelo Relator, em 29/08/2011, para publicação.
(Tribunal Regional Federal da Primeira Região, 6ª Turma Suplementar, rel. Juiz Federal Andre Prado de Vasconcelos, Remessa ex officio nº 200101990213684, Data da decisão 29/08/2011, Publicação no e-DJF1 de 06/09/2001, p.517)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – PENSÃO POR MORTE – DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA – NÃO COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ALEGADA SOMENTE EM SEDE RECURSAL – INOVAÇÃO – ANULAÇÃO DA SENTENÇA – PRESERVAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. - A concessão do benefício de pensão por morte é devida à esposa e aos filhos de segurado falecido, sendo a dependência econômica presumida, nos termos do § 4o, do art. 16, da Lei 8.213/91. - Tendo o Instituto Previdenciário deduzido, somente em sede de apelação, a perda da qualidade de segurado do instituidor da pensão, restou violado o princípio da eventualidade ou da concentração, e ainda foi suprimida uma instância, eis que antes da sentença, em nenhum momento tal matéria foi alegada perante o juiz da causa. - O réu deve manifestar-se precisamente, na contestação, sobre todos os fatos narrados na inicial e apresentar toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito necessárias para impugnar o pedido do autor (arts. 300/302 do CPC). - Por outro giro, caberá ao Juiz, de ofício ou a requerimento das partes, determinar a produção de provas necessárias a instrução do processo, que deverá ser apreciada livremente de acordo com os demais fatos e circunstâncias constantes dos autos mesmo não alegados pelas partes, levando-se em consideração, ainda, que a ausência de impugnação específica, ou mesmo a revelia, não prejudicam a Pessoa Jurídica de Direito Público, ante a indisponibilidade do interesse público. - A anulação da sentença merece ser aplicável a fim de que se proceda à instrução probatória do fato controvertido – perda da qualidade de segurado do de cujus. - Preservação dos efeitos da tutela até que o juízo de primeiro grau analise a questão, tendo em vista o caráter alimentar que envolve a verba discutida. - Apelação e Remessa Oficial a que se dá parcial provimento.
(Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Primeira Turma Especializada, Rel. Desembargador Federal Abel Gomes, Apelação Cível 200202010349058, Data da decisão 11/04/2007, Publicação no DJU de 09/08/2007, p.234)
Grifou-se.
Nesses precedentes, considerou-se a indisponibilidade do interesse público como razão suficiente para afastar os efeitos da revelia, sendo oportuno destacar que os precedentes não tratam de matéria tributária. Constata-se que, na perspectiva processual, não se fez diferença entre o prejuízo que o Poder Público poderia sofrer na seara tributária ou relativo a outro ramo do direito. Considerou-se tão somente que o fato de se vincular à Fazenda Pública, por si só, já torna o direito indisponível.
Vale destacar, ainda, mais um exemplo de equiparação da cobrança dos créditos não tributários da Fazenda Pública aos créditos tributários. A aplicação analógica do art. 151, II do CTN (possibilidade de suspensão do crédito mediante depósito judicial) aos créditos decorrentes de multas administrativas decorrentes do Poder de Polícia.
Nessa perspectiva, cumpre destacar o entendimento da Jurisprudência os quais consideram a possibilidade de depósito judicial de multa administrativa, em razão das semelhanças existentes entre a cobrança do crédito não tributário da Fazenda Pública e a do próprio crédito tributário.
TRIBUTÁRIO - ADMINISTRATIVO - PROCESSUAL CIVIL - DÍVIDA NÃO TRIBUTÁRIA - DEPÓSITO JUDICIAL - FACULDADE DA PARTE COM EFEITOS PRÓPRIOS IMEDIATOS, INDEPENDENTEMENTE DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - PRECEDENTES. 1. A realização de depósito judicial do crédito controvertido, seja de natureza tributária ou não, é direito subjetivo do particular-contribuinte. 2. O depósito judicial do valor controvertido é faculdade da parte, que dela pode utilizar-se independentemente de autorização judicial. Tal depósito, então, gera de imediato seus efeitos legais (suspensão da exigibilidade da cobrança, inclusive), independentemente do despacho judicial de conteúdo, que, se houver, é meramente expletivo. 3. A cobrança de dívida ativa não tributária segue os mesmos procedimentos de execução previstos na Lei 6.830/80, com as mesmas vantagens e prerrogativas da dívida ativa tributária (LEF, art. 4º, § 2º) - AG 2002.01.00.024673-8/MG, Rel. Juiz Federal Convocado Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma,DJ p.173 de 10/06/2003 e 4. Em conseqüência, "equiparada à dívida ativa tributária, há que se admitirem aplicáveis as previsões do CTN para suspensão da exigibilidade do crédito (art. 151 do CTN), ainda mais quando efetuado depósito integral do valor discutido, estando plenamente garantida a pretensão da administração." (AGTAG 2008.01.00.042530-2/DF, Rel. Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, Sétima Turma,e-DJF1 p.358 de 20/03/2009). No mesmo diapasão: STJ, RESP 466362, Rel. Min. Luiz Fux. 1ª T., DJ de 15/03/2007. 5. Aliás, antes mesmo da introdução do novo art. 273 do Código de Processo Civil pela Lei 8.952/94, ou da edição de seu § 7º pela Lei 10.444/02, a jurisprudência desta Corte, na esteira da diretriz consolidada pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, já admitia a realização de depósito integral do débito impugnado, em sede de ação ordinária, para suspender a exigibilidade de multa administrativa (AMS nº 1997.01.00.051680-9-MG, Rel. Des. Federal Tourinho Neto, DJU/II de 06.11.1998, p. 171) ou tributária (AG nº 93.01.08417-1-DF, Rel. então Juiz Fernando Gonçalves, hoje Ministro do STJ, DJU/II de 27.05.1993, p. 20.117) ou, ainda, a execução extrajudicial em lide envolvendo o Sistema Financeiro da Habitação (AG nº 1997.01.00.003558-9-MT, Rel. Des. Federal Amílcar Machado, DJU/II de 24.10.1997, p. 89191). Tal orientação, na verdade, garante o legítimo e constitucional acesso à jurisdição e preserva, de outro lado, o direito da parte ex-adversa. Trata-se, pois, de hipótese típica de tutela acautelatória, passível de deferimento não somente na seara tributária. A realização de depósito na forma da Lei 9.703/98 (art. 1º) é, inclusive, mais vantajosa para a Fazenda Pública do que a cobrança de débito via execução. 6. Além do mais, a aplicação de normas do Código Tributário Nacional às exações não tributárias não constitui novidade em nosso ordenamento jurídico (CTN, arts. 186, 188 e 192 e LEF, art. 4º, § 2º), mesmo porque a cobrança da dívida ativa não tributária é feita pelo mesmo procedimento, vantagens e prerrogativas da execução da dívida tributária (Lei 6.830/80) 7. Agravo regimental não provido. (Grifos nossos)
(Tribunal Regional Federal da Primeira Região, Sétima Turma, Rel. Desembargador Federal Reynaldo Fonseca, Agravo de Instrumento nº 200901000344132, Data da decisão 13/09/2011, Publicação e- DJF de 23/09/2011, p. 266)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. LIMINAR EM AÇÃO CAUTELAR. REQUISITOS PREENCHIDOS. DEPÓSITO DO VALOR. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. MULTA ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DE NORMAS TRIBUTÁRIAS. POSSIBILIDADE. 1. Para a concessão de liminar, faz-se necessária a existência concomitante de seus dois requisitos, quais sejam, o perigo na demora e a plausibilidade da tese alegada. 2. Vislumbra-se o periculum in mora ante a possibilidade da autora ter que suportar os efeitos das providências contidas na autuação da ANVISA, acarretando restrições à atividade do contribuinte, bem como o fumus boni iuris diante do posicionamento adotado neste egrégio Tribunal no sentido de admitir o depósito judicial do valor em discussão, quando não se trate de débito tributário, invocando, por analogia, o disposto no art. 151 do CTN, que estabelece, no seu inciso II, como uma das formas de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, o depósito de seu montante integral. Ademais, a LC 104/01, que alterou o Código Tributário Nacional, acrescentando o inciso V ao citado art. 151, passou-se a admitir a suspensão da exigibilidade do tributo até mesmo sem efetivação de depósito, quando concedida medida liminar ou tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial que não o mandado de segurança. 3. Se o Código Tributário Nacional admite que o depósito do montante integral e a concessão de liminar, em qualquer tipo de ação judicial, têm a faculdade de suspender a exigibilidade do crédito tributário (art. 151, II e V), com tanto mais razão é legítima a suspensão da exigibilidade de crédito fiscal, não-tributário, já que a multa administrativa transforma-se em dívida ativa, equiparando-se a débito tributário, para fins de suspensão de sua exigibilidade. Precedentes desta Corte. 4. Agravo de instrumento não provido.
(Tribunal Regional Federal da Primeira Região, Sétima Turma, Rel. Desembargador Federal Antônio Ezequiel da Silva, Agravo de Instrumento nº 200401000332784, Data da decisão 18/10/2005, Publicação no DJ de 13/01/2006, p. 87).
Também é oportuno destacar que a indisponibilidade dos créditos tributários, característica compartilhada pelos créditos não tributários da Fazenda Pública, tem sido adotada como fundamento para impedir que a extemporaneidade de manifestação repercuta em abdicação de valores devidos, característica própria do procedimento de consignação extrajudicial (art. 890, §2º do Código de Processo Civil). Veja-se o teor do seguinte precedente:
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. DEPÓSITO. EXTEMPORANEIDADE DA IMPUGNAÇÃO. EXTINÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO PÚBLICO INDISPONÍVEL. SENTENÇA ANULADA.
– Na sentença, foi considerado quitado o débito e julgada extinta a execução fiscal, sob o fundamento da manifestação extemporânea da Autarquia Previdenciária, quanto à insuficiência do depósito efetuado pela executada à fl. 59 dos autos.
– Nos termos do artigo 320, II, do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente nas execuções fiscais, conforme estabelece o artigo 1.º da Lei 6.830/80, mesmo que não haja contestação, não se aplicam os efeitos da revelia, quando o direito posto em discussão for indisponível.
– No caso em tela, discute-se direito público indisponível, pois executa-se valores devidos a título de contribuições previdenciárias não pagas no vencimento.
– Assiste razão à exeqüente, pois, à fl. 65, foi apresentado cálculo de atualização do débito, demonstrando a insuficiência do valor depositado pela executada à fl. 59. Além disso, a Contadoria Judicial manifestou-se duas vezes, às fls. 71 e 77, ratificando a conta da exeqüente que impugnou os cálculos da executada, apontando a insuficiência do depósito de fl. 59.
– Não obstante, acolhendo a manifestação da executada de fls. 99/100, o MM Juízo a quo, sentenciou o feito, em fls. 108/110, e, entendendo ser inoportuna a impugnação, considerou o depósito efetuado pela executada, como integral e pleno para satisfazer o débito pleiteado, julgando extinta a execução, com fundamento no artigo 794, I, do Código de Processo Civil.
– Remessa oficial e apelação providas. Sentença Anulada. Determinado o retorno dos autos à Primeira Instância, para prosseguimento do feito. (Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Turma Suplementar da Primeira Seção, Rel. Juíza (conv) Noemi Martins, processo nº 96.03.064133-2 AC 333357, data da decisão 21/06/2007).
Assim, dada a similitude de tratamentos entre os créditos tributários e não tributários, compreende-se que a Administração não deve aceitar consignações extrajudiciais feitas pelos seus devedores.
Considerando a carência de normatização sobre o assunto e a fim de evitar questionamentos futuros acerca da possibilidade ou não dessa via especial de pagamento, compreende-se que caberá manifestação expressa de recusa no prazo assinalado no § 1º do art. 890 do Código de Processo Civil, qual seja, 10 (dez) dias.
3. Conclusão
Tendo em conta as razões aqui defendidas, amparadas em doutrina e jurisprudência, compreende-se ser incabível a consignação extrajudicial de créditos públicos (tributários e não tributários). Na hipótese de a Administração se deparar com esse tipo de depósito, à ela caberá, por precaução, a formalização de recusa expressa e explícita na forma prevista e no prazo previsto no art. 890, § 1º, do Código de Processo Civil, asseverando a inadequação desse tipo de procedimento para quitação de seus créditos.
4. Referências Bibliográficas
CARRAZZA, Roque Antônio. A impossibilidade de depósito extrajudicial envolvendo crédito da Fazenda Publica. Disponível em: http://www.justitia.com.br/revistas/ww0680.pdf Acesso em 25 de maio de 2014.
NERY JR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 14ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.
MARCATO, Antônio Carlos. Ação de consignação em pagamento. Disponível em http://clubejus.com.br/?artigos&ver=2.3235 Acesso em 25 de maio de 2014.
[1] Art. 890. Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida.
§ 1º Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar pelo depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária, cientificando-se o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa.
§ 2º Decorrido o prazo referido no parágrafo anterior, sem a manifestação de recusa, reputar-se-á o devedor liberado da obrigação, ficando à disposição do credor a quantia depositada.
§ 3º Ocorrendo a recusa, manifestada por escrito ao estabelecimento bancário, o devedor ou terceiro poderá propor, dentro de 30 (trinta) dias, a ação de consignação, instruindo a inicial com a prova do depósito e da recusa.
§ 4º Não proposta a ação no prazo do parágrafo anterior, ficará sem efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante.
[2] Artigo de Roque Antônio Carrazza. Disponível em: http://www.justitia.com.br/revistas/ww0680.pdf Acesso em 25 de maio de 2014.
[3] Disponível em http://clubejus.com.br/?artigos&ver=2.3235 Acesso em 25 de maio de 2014.
Procuradora Federal em Brasília - DF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOREIRA, Teresa Resende. Da consignação extrajudicial de créditos da Fazenda Pública Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42679/da-consignacao-extrajudicial-de-creditos-da-fazenda-publica. Acesso em: 23 dez 2024.
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