RESUMO: O presente artigo cuida da análise sobre algumas questões que envolvem o procedimento para a investidura de reitor e de vice-reitor de universidade federal, na forma prevista na Lei 5.540/68, com redação determinada pela Lei 9.192/95, cuja regulamentação coube ao Decreto 1.916/96.
PALAVRAS CHAVE: Investidura, reitor, vice-reitor, eleição, consulta prévia, comunidade universitária, voto em chapa, voto uninominal, mandato, voto censitário.
SUMÁRIO: I - Introdução. II. O marco legal. III. Alguns aspectos da investidura. IV. O voto uninominal, o impedimento de votação em chapa e a possibilidade de mandatos descoincidentes de reitor e de vice-reitor. V. O voto censitário dos docentes no processo de eleição de reitor e de vice-reitor VI. Conclusão.
I - Introdução
A investidura de reitor e de vice-reitor de universidade federal encontra-se prevista no artigo 16 da Lei 5.540/68, com redação determinada pela Lei 9.192/95, sendo que sua regulamentação foi editada pelo Decreto 1.916/96.
No presente artigo, pretende-se discutir alguns aspectos relacionados à investidura, em si, desses dirigentes das universidades federais, bem como quanto ao impedimento de votação em chapa, ao voto uninominal, ao voto censitário dos docentes e à possibilidade de mandatos descoincidentes de reitor e de vice-reitor.
II – O marco legal
Conforme já adiantado acima, o marco legal que dispõe sobre o procedimento de investidura dos dirigentes de universidades federais (reitor e vice-reitor) é a Lei 5.540/68, cujo artigo 16, após redação conferida pela Lei 9.192/95, assim dispõe, verbis:
Art. 16. A nomeação de Reitores e Vice-Reitores de universidades, e de Diretores e Vice-Diretores de unidades universitárias e de estabelecimentos isolados de ensino superior obedecerá ao seguinte:
I – o Reitor e o Vice-Reitor de universidade federal serão nomeados pelo Presidente da República e escolhidos entre professores dos dois níveis mais elevados da carreira ou que possuam título de doutor, cujos nomes figurem em listas tríplices organizadas pelo respectivo colegiado máximo, ou outro colegiado que o englobe, instituído especificamente para este fim, sendo a votação uninominal;
II – os colegiados a que se refere o inciso anterior, constituídos de representantes dos diversos segmentos da comunidade universitária e da sociedade, observarão o mínimo de setenta por cento de membros do corpo docente no total de sua composição;
III – em caso de consulta prévia à comunidade universitária, nos termos estabelecidos pelo colegiado máximo da instituição, prevalecerão a votação uninominal e o peso de setenta por cento para a manifestação do pessoal docente em relação à das demais categorias;
IV – os Diretores de unidades universitárias federais serão nomeados pelo Reitor, observados os mesmos procedimentos dos incisos anteriores;
V – o Diretor e o Vice-Diretor de estabelecimento isolado de ensino superior mantido pela União, qualquer que seja sua natureza jurídica, serão nomeados pelo Presidente da República, escolhidos em lista tríplice preparada pelo respectivo colegiado máximo, observado o disposto nos incisos I, II e III;
VI – nos casos em que a instituição ou a unidade não contar com docentes, nos dois níveis mais elevados da carreira ou que possuam título de doutor, em número suficiente para comporem as listas tríplices, estas serão completadas com docentes de outras unidades ou instituição;
VII – os dirigentes de universidades ou estabelecimentos isolados particulares serão escolhidos na forma dos respectivos estatutos e regimentos;
VIII – nos demais casos, o dirigente será escolhido conforme estabelecido pelo respectivo sistema de ensino.
Parágrafo único. No caso de instituição federal de ensino superior, será de quatro anos o mandato dos dirigentes a que se refere este artigo, sendo permitida uma única recondução ao mesmo cargo, observado nos demais casos o que dispuserem os respectivos estatutos ou regimentos, aprovados na forma da legislação vigente, ou conforme estabelecido pelo respectivo sistema de ensino.
Fixa, pois, o texto legal, a competência para a nomeação, a necessidade de elaboração de listra tríplice pelo órgão colegiado máximo da universidade federal, o voto censitário para os docentes, a duração dos mandatos e o voto uninominal (e por consequência a vedação de votação em chapa), entre outros aspectos.
III – Alguns aspectos da investidura
A investidura de reitor e de vice-reitor ocorre por ato do Presidente da República. Tal escolha, porém, não é ampla. Primeiro, porque sofre o condicionamento de que apenas os professores dos dois níveis mais elevados da carreira podem ser investidos nessas funções. Segundo, porque tal escolha deve ocorrer dentro de uma lista tríplice elaborada pelo órgão colegiado superior da respectiva universidade federal.
Nesse sentido, pondera-se que o marco legal exige que se proceda a uma eleição no âmbito do respectivo colegiado superior para a formação da lista tríplice, sendo que tal eleição pode ser precedida, ou não, de consulta prévia à comunidade universitária, que é composta por professores, técnicos administrativos e acadêmicos.
Embora seja comum denominar de “eleição” a votação feita pela comunidade universitária, em verdade a eleição ocorre mesmo no órgão colegiado máximo da entidade, que é quem realmente vota e elabora a lista tríplice para permitir a escolha pelo Presidente da República, inclusive não estando tal órgão vinculado à vontade da comunidade universitária apurada a partir da consulta prévia.
Seja como for, importante registrar que dificilmente o órgão colegiado máximo da entidade desobedece à vontade da comunidade universitária apurada nas urnas, dado o peso político que tal vontade exerce na gestão da entidade.
IV – O voto uninominal, o impedimento da votação em chapa e a possibilidade de mandatos descoincidentes de reitor e de vice-reitor
Essas questões têm gerado algumas controvérsias nos procedimentos de investidura de reitor e de vice-reitor de universidade federal.
Inicialmente, é preciso esclarecer que algumas universidades federais mantêm em seus estatutos a chamada “eleição em chapa”, sobretudo no momento da consulta prévia à comunidade universitária. É dizer, o voto é dado em uma chapa que contém o nome do candidato a reitor e o nome de seu respectivo vice.
Ocorre que o marco legal fala em votação uninominal (artigo 16, inc. I e II, parte final, da Lei 5.540/68). É dizer, o eleitor deveria votar em apenas um nome para cada cargo. A propósito, confira-se o § 2º do artigo 1º do Decreto 1916/96, verbis:
Art. 1º. (...) § 2º A votação será uninominal, devendo as listas ser compostas com os três primeiros nomes mais votados em escrutínio único, onde cada eleitor vota em apenas um nome para cada cargo a ser preenchido.
Essa questão – votação uninominal –, como não poderia deixar de ser, também possibilita que reitor e vice-reitor tenham mandatos com duração descoincidente. É dizer, o mandato de vice-reitor não necessariamente estará atrelado ao mandato de reitor, e vice-versa.
Com efeito, tratando-se de eleição uninominal, tem-se como decorrência prática que o vice-reitor será investido para a exercer, pelo prazo de quatro anos, a função de vice-reitor, podendo assumir a função de reitor apenas temporariamente. Ou, na hipótese de vacância extraordinária do cargo de reitor, apenas pelo prazo necessário para a realização de uma nova eleição, quando então, após a investidura do novo reitor, ele retorna à sua função de vice-reitor para concluir o seu mandato.
É isso, pois, o que se extrai do artigo 6º do Decreto 1.916/96, verbis:
Art. 6° Nos casos de vacância dos cargos de Reitor ou Vice-Reitor de universidade, de Diretor ou Vice-Diretor de estabelecimento isolado de ensino superior, de Diretor-Geral ou Vice-Diretor de centro federal de educação tecnológica e de Diretor ou Vice-Diretor de unidade universitária, as listas a que se referem o caput e os §§ 1°, 2º, 3° e 4º do art. 1°, serão organizadas no prazo máximo de sessenta dias após a abertura da vaga e os mandatos dos dirigentes que vierem a ser nomeados serão de quatro anos.
Nessa linha, então, percebe-se que uma vez vagando de forma extraordinária o cargo de reitor abre-se a possibilidade de que esse e o vice-reitor, doravante, passem a ter mandatos descoincidentes temporalmente, o que, a nosso ver, não parece ser a melhor decisão sob o ponto de vista da harmonia da gestão da entidade, embora seja essa a vontade do legislador a ser cumprida.
De igual modo, caso o cargo de vice-reitor venha a vagar de maneira extraordinária, ou seja, sem que seja por implemento de prazo, iniciar-se-á um novo procedimento apenas para a investidura do vice-reitor, pelo que o novo vice-reitor exercerá na integralidade o mandado de 4 anos, e não apenas terminará o mandato que já estava em curso anteriormente, sob outra titularidade.
V – O voto censitário dos docentes no processo de eleição de reitor e de vice-reitor
Segundo os incisos II e III do artigo 1º da Lei 5.450/68, o voto dos docentes, seja no órgão colegiado superior que elabora a lista tríplice, seja na consulta prévia à comunidade universitária, tem peso de 70% (setenta por cento), sendo que o voto dos outros segmentos da comunidade universitária – técnicos administrativos e discentes – tem peso de 15% (quinze por cento) cada um.
Esse maior peso do voto dos docentes tem gerado inúmeros conflitos no seio da comunidade universitária, inclusive se estendendo, em algumas situações, para o Poder Judiciário. É que grande parte das universidades têm regrado em seus estatutos que o voto dos três seguimentos da comunidade universitária teria peso idêntico, podendo, cada um, influenciar em 33,33% o resultado da eleição.
As universidades que adotam tal entendimento, que vai contra o texto expresso do artigo 16 da Lei 5.540/68, fundamentam-se no princípio democrático abrigado na Constituição, bem como em uma evidente contradição dos próprios termos da norma que institui tal procedimento de investidura. Isso porque, note-se, a pretexto de trazer o oxigênio da democracia para a gestão das universidades, realizando-se eleição no processo de investidura de seus dirigentes, o peso maior atribuído ao voto dos docentes acaba por criar um voto censitário para estes últimos, o que é a própria negação do princípio democrático. Inclusive, pondera-se, o voto censitário foi de há muito banido do sistema jurídico do país, de sorte que a Constituição vigente, de forma clara e insofismável, adota o voto igualitário para todos[i].
Ademais, também sustentam as universidades que se levantam contra tal regra, que o texto do artigo 16 da Lei 5.540/68, ao criar um peso de 70% para o voto dos docentes e peso de apenas 15%, respectivamente, para o voto dos técnicos e dos acadêmicos, ostenta inequívoco vício de inconstitucionalidade material, uma vez que viola flagrantemente o princípio democrático, beneficiando, sem qualquer justificativa razoável, um dos seguimentos da comunidade universitária (docentes) em detrimento dos outros dois (técnicos administrativos e acadêmicos).
Em verdade, não é difícil perceber que em uma situação de normalidade e razoabilidade, sobretudo considerando o estágio atual de maturidade das instituições democráticas do país, não há o menor sentido em se realizar um procedimento eleitoral quando uma determinada categoria de votantes participa com peso de 70% no resultado da eleição. Isso, a rigor, não seria uma eleição, mas sim um simulacro de eleição, já que não há razão constitucional séria ou minimamente aceitável para que o voto de uma categoria de votantes tenha peso de 70% e o voto das demais categorias tenha peso, respectivamente, de apenas 15% cada um no resultado da eleição.
O estado de inconstitucionalidade do voto censitário acima referenciado, pois, é patente. E tanto o é que o legislador, sensível ao problema, já iniciou a respectiva correção, posto que na eleição para o cargo de Reitor dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, regulado pela Lei 11.892/2008, já decretou a paridade democrática na realização da consulta prévia à comunidade universitária, tendo estabelecido no artigo 12 da referida lei o peso de 1/3 para a manifestação dos docentes, o peso de 1/3 para a manifestação dos servidores técnico-administrativos e o peso de 1/3 para a manifestação do corpo discente[ii].
Com isso, pois, espera-se seja corrigida o mais rapidamente possível o texto do artigo 16 da Lei 5.540/68, de maneira a espancar de vez tamanha inconstitucionalidade, o que deverá motivar, de igual modo, também a correção da regra contida no parágrafo único do artigo 56 da Lei 9.394/96 (LDB), que estabelece igualmente o voto censitário para os docentes na eleição e ou escolha dos respectivos dirigentes das universidades.
III – Conclusão
Como visto ao longo da exposição, o procedimento para a investidura de reitor e vice-reitor encontra-se regrado pela Lei 5.540/68 e pelo Decreto 1.916/96, onde são previstos a competência para a nomeação, a necessidade de elaboração de listra tríplice pelo órgão colegiado máximo da universidade federal, o voto censitário para os docentes na escolha dos dirigentes da entidade, a duração dos mandatos e o voto uninominal (e por consequência a vedação de votação em chapa), entre outros aspectos.
De toda forma, o procedimento apresenta problemas no que se refere à inviabilidade de votação em chapa, bem como no que toca ao voto censitário dos docentes, o que, dada a sua inconstitucionalidade, precisa ser revisto pelo legislador.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e Legislação Federal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em 19 de dezembro de 2014.
____. Lei 5.540, de 28 de novembro de 1968. Fixa normas de organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5540.htm>. Acesso em 19 de dezembro de 2014.
___. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em 19 de dezembro de 2014.
___. Lei 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11892.htm>. Acesso em 19 de dezembro de 2014.
___. Decreto nº 1.916, de 23 de maio de 1996.
Regulamenta o processo de escolha dos dirigentes de instituições federais de ensino superior, nos termos da Lei n° 9.192, de 21 de dezembro de 1995. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1916.htm>. Acesso em 19 de dezembro de 2014.
NOTAS:
[i] Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
[ii] Art. 12. Os Reitores serão nomeados pelo Presidente da República, para mandado de 4 (quatro) anos, permitida uma recondução, após processo de consulta à comunidade escolar do respectivo Instituto Federal, atribuindo-se o peso de 1/3 (um terço) para a manifestação do corpo docente, de 1/3 (um terço) para a manifestação dos servidores técnico-administrativos e de 1/3 (um terço) para a manifestação do corpo discente.
Procuradora Federal da Advocacia Geral da União. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Pós Graduada em Direito Penal e Processo Penal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARROS, Fabiana Martinelli Santana de. Apontamentos sobre a investidura de reitor e de vice-reitor de universidade federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 dez 2014, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42680/apontamentos-sobre-a-investidura-de-reitor-e-de-vice-reitor-de-universidade-federal. Acesso em: 23 dez 2024.
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