Uma Corte Suprema não deve editar normas constitucionais (súmulas vinculantes), pelo contrário, sua função originária é a manutenção da jurisdição constitucional. Vale destacar que a pretensão do Direito Constitucional é o alcance de sua essência nas Cortes constitucionais, e não apenas de seu conteúdo normativo vinculante.
Pode-se afirmar que, a recepção abrandada da teoria em análise configura-se num retrocesso, isto porque o judiciário, frequentemente, ao atuar no exercício de matérias dos outros poderes se transforma em um órgão jurídico-legislativo. Ainda, vale registrar que esta concepção, parece que insere o Judiciário num sistema institucionalizado.
Ora, a interpretação da Constituição deve ser direcionada como um ato de constituir direitos. Desta forma, não se admite um raciocínio jurídico em desconformidade com o texto constitucional, uma vez que a função de todo tribunal incide no alcance do princípio da segurança jurídica.
Fala-se, então numa reconstrução da tese do juiz Blasckstone, em que defendia a declaração da lei pelos precedentes judiciais. Desse modo, pode-se afirmar que, então, na visão deste, o precedente não deveria ser utilizado como técnica de elaboração de leis e atos normativos.
O juiz Edward Coke, um dos defensores do Direito inglês, advogava contra o parlamento soberano e defendia a supremacia anglo-saxônica contra o absolutismo. Naquela época, o legislativo se denominava como Magistrado do Estado.
Assim, Cappelletti (1999) defende que tal soberania inglesa repercutiu na formação do controle judicial de atos legislativos, principalmente, na Colônia da América e logo depois em outras colônias.
Faz necessário preceituar a diferença entre as famílias romano-germânica e anglo-saxônica, na primeira há uma falsa ideologia de que a lei é por si só suficiente para a resolução de litígios judiciais, ou seja, para o juiz a normatividade é completa para a interpretação e solução da demanda. Isto porque, com alguns respaldos da Revolução Francesa, a segurança jurídica, nessa concepção, era tutelada pelo princípio da legalidade. Assim, quanto à segunda tradição, esta não se limita na codificação, posto que para o magistrado, independentemente, da lei garantir a previsibilidade jurídica, o juiz não se vinculava na norma, pelo contrário, ele não pensava que uma situação estivesse regulamentada em lei.
O precedente obrigatório é, portanto, uma atividade jurisdicional em que o corpo de magistrados deve seguir as decisões da mesma forma que foram interpretadas. Então, o conceito de força vinculante se insere quando a Suprema Corte Norte Americana decide questão constitucional, cuja eficácia possui efeitos erga omnes. Assim, verifica-se que a evolução do Direito americano é marcada por traços jurisprudenciais proporcionais à Constituição estadunidense (MARINONI, 2011).
Um dos fundamentos da tradição saxônica se justifica pelo controle judicial dos atos do parlamento, ou seja, compete ao tribunal anular o ato caso seja contrário aos princípios e regras do direito costumeiro. Nesta cultura, o que se destaca, talvez, seja o fato do direito americano acompanhar o desenvolvimento jurisprudencial, mesmo diante de uma Constituição escrita. Desse modo, a relação constitucional não se encerra na codificação, pelo contrário, a tradição americana aceita o pensamento de que o direito deve ser aprimorado em cada decisão judicial.
Este instituto reflete a obrigatoriedade dos juízes continuarem com essa cultura, instituída na ideia do direito enquanto construção histórica e evolutiva em todos os tempos.
Nos EUA, a aplicação de precedentes representa o respeito das decisões superiores, vez que a jurisdição rege-se pela vinculação jurisprudencial. Nessa corrente, para Justice Kennedy, em respeitável decisão prolatada: “a doutrina do staredecisis é essencial para o respeito devido aos julgamentos da Corte e para a estabilidade do direito” (MARINONI, 2011, p.77).
Já a doutrina italiana, comandada por Cappelletti (1999), defende que um sistema, cuja jurisdição não rege pela vinculação de precedentes, contribui para a não racionalização da justiça. Na mesma obra, preceitua Marinoni (2011, p.83) ao citar o dispositivo § 31,1 da lei orgânica do Direito alemão: “As decisões do Tribunal Federal Constitucional vinculam os órgãos constitucionais federais e estaduais, bem como todos os Tribunais e autoridades administrativas”.
Há, no entanto, uma questão que não deve ser omitida, diante da diferença de ambas as tradições, costuma-se afirmar que, na cultura fundada nos precedentes, sua vinculação reflete que uma Constituição escrita não traduz segurança jurídica. Enquanto na tradição romano-germânico, apesar de não viger a teoria de precedentes, existem as súmulas persuasivas e vinculativas, cujo efeito da última vincula o Poder Judiciário e Administração Pública Direta e Indireta.
Pode-se afirmar que, além de limitar a interpretação e o diálogo entre as partes, o enunciado vinculante flexibiliza a liberdade de julgamento, isto porque o instituto brasileiro prevê a reclamação cujo efeito impede o magistrado de discordar da súmula vinculante.
A partir daí, afirma-se que: o ativismo judicial configura uma postura saxônica, típica no sistema de precedentes. Numa tradição fundada no princípio da legalidade, a atuação do Supremo, em matérias que não deveriam ser resolvidas no Judiciário, não é compatível com as características de uma corte constitucional, uma vez que o tribunal se transforma num órgão legislativo.
Os direitos fundamentais, inclusive a jurisdição, devem ser interpretados conforme prescreve a Constituição Federal. Isto porque, a judicialização do direito não é peculiar ao civil lawbrasileiro, cuja característica insere a justiça como o único meio de solução dos litígios (GARAPON, 1996).
REFERÊNCIAS
CAPPELLETTI, Mauro. O controle Judicial de Constitucionalidade das Leis no Direito Comparado. 2°ed. Trad. Aroldo Plínio Gonçalves. Rev. José Carlos Barbosa Moreira. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 1999.
GARAPON, Antoine. O Guardador de Promessas justiça e democracia. Lisboa: Instituto Piaget, 1996.
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes Obrigatórios. 2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
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