Introdução
O princípio em destaque é embasado em valores de política criminal, objetiva resguardar da apreciação da justiça penal àquelas infrações penais em que a aplicação do Direito Penal mostra-se desproporcional a mínima ofensividade da conduta, ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade da conduta e inexpressividade da lesão jurídica.
De início assim pode-se definir como insignificante no âmbito penal, conforme João Mestieri[1]:
“A ausência de tipicidade pela insignificância do suporte fático (crime de bagatela) é a hipótese mais interessante. Sendo certo que a sanção penal deva ser usada apenas quando a rebeldia individual contra o mandamento normativo geral não possa ser obviada de outro modo (princípio da intervenção mínima), é necessário entender-se que não será qualquer violação formal do tipo que deva ensejar o reconhecimento da tipicidade.”
Desta feita, para outros, o princípio da insignificância decorre dos princípios da proporcionalidade ou da razoabilidade. Ou seja, impor prisão ou condenação criminal por crimes de diminuta dimensão não se justificaria por sua desproporcionalidade.
Doutra banda, a jurisprudência dos Tribunais Superiores[2] é firme no sentido de que para o reconhecimento do crime de bagatela são necessário cumular quatro requisitos: a) mínima ofensividade da conduta; b) inexistência de periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica.
Assim, presume-se que nas hipóteses de infrações penais tributárias pelo cabimento da aplicação do princípio da insignificância (crimes tipificados na lei nº 8137/90), haja vista não existir qualquer vedação legal que impeça sua utilização.
No entanto, ultrapassados esses requisitos, qual o valor máximo para que se possa aplicar a um crime tributário o princípio da bagatela?
Face o exposto, a jurisprudência criou a tese de que nos crimes tributários, para decidir se incide ou não o princípio da insignificância, será necessário analisar, no caso concreto, o valor dos tributos que deixaram de ser pagos.
Inicialmente, pronunciou-se o Superior Tribunal de Justiça, com analogia ao art. 20 da lei 10.522/2002[3], reconhecendo a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, nos casos em que o débito tributário não ultrapasse o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Nesse sentido:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 105, III, A E C DA CF/88. PENAL. ART. 334, § 1º, ALÍNEAS C E D, DO CÓDIGO PENAL. DESCAMINHO. TIPICIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. I - Segundo jurisprudência firmada no âmbito do Pretório Excelso - 1ª e 2ª Turmas - incide o princípio da insignificância aos débitos tributários que não ultrapassem o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei nº 10.522/02 II - Muito embora esta não seja a orientação majoritária desta Corte (vide EREsp 966077/GO, 3ª Seção, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 20/08/2009), mas em prol da otimização do sistema, e buscando evitar uma sucessiva interposição de recursos ao c. Supremo Tribunal Federal, em sintonia com os objetivos da Lei nº 11.672/08, é de ser seguido, na matéria, o escólio jurisprudencial da Suprema Corte. Recurso especial desprovido” (REsp 1.112.748/TO, Terceira Seção, Rel. Min. Felix Fischer, DJe de 13.10.2009).
Entretanto, com o advento da Portaria 75/2012[4] do Ministério da Fazenda, segundo a qual, em seu inciso II, do art. 1º, o Ministro da Fazenda determinou o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), questionou-se a possibilidade desse novo valor ser aplicado ao princípio da insignificância nos crimes tributários.
Igualmente, para o Superior Tribunal de Justiça, o novo valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), fixado mediante portaria ministerial, não teve o condão de produzir efeitos penais, alterando a aplicação dos valores no princípio da insignificância.
Em verdade, argumentou-se que a portaria não poderia alterar o disposto numa lei ordinária. Ademais, utilizou-se que o novo patamar monetário estabelecido por ter sido o mesmo fixado administrativamente, não pode subordinar o exercício da jurisdição penal, vinculando o magistrado.
Suscitado a se posicionar no tema, o Superior Tribunal Federal, manifestou-se pela aplicação do novo patamar de R$ 20.000,00, no julgamento do HC 120617, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 04/02/2014, assim se manifestou:
“HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. DESCAMINHO. VALOR INFERIOR AO ESTIPULADO PELO ART. 20 DA LEI 10.522/2002. PORTARIAS 75 E 130/2012 DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. A pertinência do princípio da insignificância deve ser avaliada considerando-se todos os aspectos relevantes da conduta imputada. 2. Para crimes de descaminho, considera-se, para a avaliação da insignificância, o patamar de R$ 20.000,00, previsto no art 20 da Lei n.º 10.522/2002, atualizado pelas Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda. Precedentes. 3. Na espécie, aplica-se o princípio da insignificância, pois o descaminho envolveu elisão de tributos federais que perfazem quantia inferior ao previsto no referido diploma legal. 4. Ordem concedida.”
Sendo assim, para o STF, quando o valor sonegado for inferior ao estabelecido no art. 20 da lei 10.522/2002, com as atualizações realizadas pelas Portarias do Ministério da Fazenda, o princípio da insignificância deverá ser aplicado. Atualmente este valor é de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Desta feita, o que se verifica é que para o Superior Tribunal de Justiça, o valor máximo para fins de aplicação do princípio da insignificância, no caso de crimes tributários, é o previsto no art. 20 da lei 10.522/2002, ou seja, R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Doutra banda, para o Supremo Tribunal Federal, o valor é de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), considerando-se o teor do inciso III, do art. 1º da Portaria do Ministério da Fazenda nº 75/2012, a qual atualizou o limite estabelecido por lei.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 331.852 - PR (2013/0145794-6).Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal/site/STJ>. Acessado em: 25 mar 2015.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - HC 118.000/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, DJe 17.9.2011. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp>. Acessado em: 25 mar 2015.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - HC 120617, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 04/02/2014. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp>. Acessado em: 25 mar 2015.
Noschang, Édna Márcia Marçon, A descriminalização do crime de descaminho em razão da aplicação do princípio da insignificância. Disponível em : www.revista.grupointegrado.br/discursojuridico /include/ getdoc.php?id=289& article=25&mode=pdf, acesso em 01/07/2008.
BARROS, Alan Douglas Chagas. O valor máximo para aplicação do princípio da insignificância no caso de crimes tributários . Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3994, 8 jun. 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/28170>. Acesso em: 25 mar. 2015.
MESTIERI, João, Manual de direito penal. volume I. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 138
[1] Manual de direito penal. volume I. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 138
[2] HC 98.152 -MG, 2.ª T., rel. Celso de Mello, 19.05.2009, v.u.).
[3] Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).
[4] Art. 1º Determinar:
I - a não inscrição na Dívida Ativa da União de débito de um mesmo devedor com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 (mil reais); e
II - o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). >disponível em: http://www.normaslegais.com.br/legislacao/portaria-mf-75-2012.htm<
Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós Graduado em Direito Civil pela UNIDERP/LFG. Pós Graduando em Direito Processual Tributário pela UNIDERP/LFG. Assessor Técnico Judiciário em Gabinete de Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco. <br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DUQUE, Felipe Viana de Araujo. Princípio da Insignificância nos Crimes Tributários Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 abr 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43756/principio-da-insignificancia-nos-crimes-tributarios. Acesso em: 23 dez 2024.
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