RESUMO: Antes, para que um motorista fosse considerado embriagado, bastava que um policial detectasse nele sinais de bebedeira. A Lei Seca alterou essa regra ao estabelecer um nível preciso de álcool no sangue, a partir do qual o motorista abordado pela autoridade policial passa a ser considerado embriagado em situação de flagrante pelo crime de embriaguez, a quantidade igual ou superior de 6 dg/L de álcool no sangue ou 0,34 mg/L no ar alveolar. Com a nova lei seca em caso de recusa passou-se a admitir também a adoção de testemunhas e outros meios de prova admitidos para comprovação da embriaguez.
PALAVRAS-CHAVE: embriaguez, acidentes, prisão, crime, lei seca.
1 INTRODUÇÃO
Diante o elevado índice de acidentes que ocorrem diariamente em todo o Brasil, gerados pela combinação de álcool e direção, desde o advento da Lei nº. 9.503 de 1997 procura-se uma solução para controlar tal incidência negativa.
No entanto, como a redação disposta no artigo que penalizava a ação de conduzir veículo sob a influência de álcool, não estava suprindo a carência de norma regulamentadora, despertou se a necessidade de sua reformulação.
Inicialmente, a conduta consistente em conduzir veículo automotor sob a influência de álcool era punida através da antiga redação do artigo 306 do Código de Transito Brasileiro.
Como laborar então uma norma legal que ao mesmo tempo respeitasse os preceirtos constitucionais e atingisse seus objetivos sociais de reduzir a mortalidade no trânsito?
Destarte, para configurar o crime bastava tão somente que aquele que conduzisse veículo, sob influência alcoólica, demonstrasse as reações da bebida ou de qualquer substância psicoativa, capaz de gerar perigo potencial.
Em detrimento a tal necessidade, em 19 de junho de 2008, surge a Lei Federal nº 11.705, intitulada Lei Seca, proposta com o fim de modificar o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro.
2. NOVA LEI SECA
Por meio da Resolução 432/13, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) regulamentou, em 29/01/13, a Lei 12.760/12, de 21.12.12, conhecida como nova lei seca. Com a adoção (não absoluta) da “tolerância zero” de álcool no sangue, estamos diante de uma das legislações mais duras do planeta, seja na parte administrativa, seja na parte criminal, que prevê prisão de 6 meses a 3 anos de detenção, suspensão ou proibição do direito de dirigir.
Com a promulgação da nova Lei Seca com objetivo de reduzir os acidentes provocados por motoristas embriagados no Brasil, endurecendo as punições contra quem bebe antes de pegar o volante. A principal mudança foi à definição legal do que é embriaguez ao volante – e, para comprová-la, passou a ser necessário submeter o suspeito a um exame, de sangue ou de bafômetro, sendo admitida também a comprovação através de laudo testemunhal.
Atenuar os acidentes de trânsito causados por motoristas embriagados. O consumo de bebidas alcoólicas é uma das principais causas de acidentes automobilísticos no país, segundo estatística da Polícia Rodoviária Federal. O Brasil ostenta o triste título de detentor de um dos mais altos índices de mortes no trânsito por habitante. Na última década, o número de fatalidades subiu mais de 30%.
Ao verificar o texto legal, percebe que requer uma aplicabilidade das penalidades aplicadas aos motoristas que dirigem embriagados assim precisando que o legislador não fosse omisso causando dúvida sobre quando a resistência do motorista em fazer o teste, no qual com resolução passou a existir outros meios de provas.
O Brasil encontra-se regido constitucionalmente por um Estado Democrático de Direito, que possui regras limitadoras do tendencialmente autoritário poder punitivo estatal, que também pode ser criminoso (Zaffaroni, 2012a, p. 38), tal como foi o direito penal nazista de 1933-1945.
Na redação original do Código de Trânsito (Lei 9.503, de 23/9/1997), para a configuração do crime previsto no artigo 306 exigia-se prova da ocorrência de perigo concreto, não se exige um conduzir anormal, manobras perigosas que exponham a dano efetivo a incolumidade de outrem. O crime é de perigo abstrato; presumido sendo suficiente o perigo abstrato.
A Lei 11.705, de 19 de junho de 2008, deu nova redação ao caput do artigo 306 do CTB e deixou de exigir a ocorrência de perigo concreto, sendo certo que as alterações introduzidas com a Lei 12.760, de 20 de dezembro de 2012, não modificaram esta realidade jurídica.
Conduzir veículo nas condições do artigo 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro, é conduta que, por si, independentemente de qualquer outro acontecimento, gera perigo suficiente ao bem jurídico tutelado, de modo a justificar a imposição de pena criminal.
Atualmente, a nossa legislação tem tolerância zero para o condutor de veiculo que ingeriu bebida alcoólica. O CTB (Código de Trânsito Brasileiro) prevê duas principais penalidades aos condutores que bebem e dirigem. A primeira é a penalidade administrativa que consiste no pagamento de uma multa no valor R$ 1.915,40 e suspensão do direito de dirigir por 12 meses.
Aquele que enquadrado no crime de trânsito do 306 do CTB, deve ser conduzido a delegacia, onde será registrada a ocorrência sendo o condutor submetido a um processo crime. As penas ainda podem ser mais severas em caso de reincidência
O que distingue a imposição das penalidades é o teor de álcool ou a demonstração da alteração da capacidade psicomotora do condutor. Para a verificação da infração administrativa, basta que o condutor tenha ingerido qualquer valor alcoólico ou utilizado qualquer substancia psicoativa que determine dependência. Já para verificação do crime de trânsito é necessário a constatação de que o condutor tenha quantidade igual ou superior de 6 dg/L de álcool no sangue ou 0,34 mg/L no ar alveolar, como também, tiver sua capacidade psicomotora alterada por qualquer outra substância.
A primeira diferença entre a infração administrativa e a penal, como se vê, está no nível de concentração de álcool no sangue. O fator distintivo (por enquanto) é meramente quantitativo. A quantidade de álcool é o primeiro critério diferenciador.
A segunda diferença está no seguinte: o crime (do art. 306) exige não só um condutor embriagado (com 0,6 decigramas, no mínimo) senão também uma condução anormal (que coloca em risco a segurança viária). E se o sujeito dirigia com menos de seis decigramas de álcool por litro de sangue, porém, normalmente (corretamente) – essa, aliás, é uma situação absolutamente corriqueira? Trata-se da infração administrativa do art. 165, visto que ela exige (só) “estar sob a influência de álcool” (ou seja: uma condição pessoal alterada). Não se trata de infração penal porque a concentração era menos de seis decigramas.
Baseadas em situações cotidianas nos plantões de polícia judiciária, nas quais o motorista investigado é apresentado sob possível estado flagrancial, em geral por ocasião de abordagens em operações policiais fiscalizatórias ou no atendimento de acidentes de trânsito. Em regra, vislumbra-se o chamado “flagrante real” ou “próprio”, já que o agente está cometendo ou acaba de cometer a infração penal, nos moldes dos artigos 302, incisos I e II, e 303, todos do CPP (lembrando que o verbo “conduzir” anuncia crime permanente), sem prejuízo da ocorrência das demais hipóteses flagranciais (“flagrante impróprio” ou “quase-flagrante” e “flagrante ficto” ou “presumido”, previstos, respectivamente, nos incisos III e IV, do mesmo artigo 302, do CPP).
2.1 MEIOS DE PROVAS ADMITIDOS NA LEI SECA
Desde logo, considerando a forma equivocada, autoritária, automática e midiática com que estão interpretando a nova lei seca, não há nenhuma dúvida de que os motoristas tenderão a não fazer qualquer tipo de exame pericial, porque, com isso, mesmo nas situações em que está praticando uma mera infração administrativa, vai correr altíssimo risco de ser enquadrado, aberrantemente, como criminoso. Vamos ao exame:
A verificação destes teores e sintomas podem ser constatados pelo aparelho etilômetro, mais conhecido como bafômetro, por exames clínicos, prova testemunhal, vídeos, fotos e demais meios hábeis e admitidos no Direito
O artigo 277 do CTB cuida dos meios probatórios que podem conduzir à constatação da embriaguez ao volante. Por força da Lei 11.705/2008, agregou-se ao art. 277 um novo parágrafo (§ 2º) que diz o seguinte:
“§ 2o A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor”.
O art. 277 diz: “Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado”.
O § 1o desse mesmo artigo diz: “Medida correspondente aplica-se no caso de suspeita de uso de substância entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos”.
As três formas clássicas de se provar a embriaguez ao volante são: (a) exame de sangue; (b) bafômetro e (c) exame clínico. No novo § 2o o legislador ampliou a possibilidade da prova, falando em outras provas em direito admitidas.
A prova da embriaguez não se restringe, mais, às clássicas formas. Outras provas em direito admitidas podem ser produzidas, para que sejam constatados os notórios sinais de embriaguez, a excitação ou o torpor apresentado (s) pelo condutor. Por exemplo: prova testemunhal.
Em matéria de prova da embriaguez há, de qualquer modo, uma premissa básica a ser observada: ninguém está obrigado a fazer prova contra si mesmo (direito de não-autoincriminação, que vem previsto de forma expressa no art. 8º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que possui valor constitucional – HC 87.585-TO – cf. GOMES, L.F. e MAZZUOLI, Valério, Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, São Paulo: RT, 2008). O sujeito não está obrigado a ceder seu corpo ou parte dele para fazer prova (contra ele mesmo). Em outras palavras: não está obrigado a ceder sangue, não está obrigado a soprar o bafômetro (porque essas duas provas envolvem o corpo humano do suspeito e porque exigem dele uma postura ativa).
Havendo recusa, resta o exame clínico (que é feito geralmente nos Institutos Médico-Legais) ou a prova testemunhal.
O motorista surpreendido, como se vê, pode recusar duas coisas: exame de sangue e bafômetro. Mas não pode recusar o exame clínico. E se houver recusa desse exame? Disso cuida o § 3º (novo) que diz:
“§ 3o (do art. 277). Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.”
A leitura rápida desse dispositivo pode levar o intérprete a equívocos. O texto legal disse mais do que podia dizer. Veremos em seguida. Na prática, alguns delegados estão falando em prisão em flagrante por desobediência (quando houver recusa ao exame de sangue, ao bafômetro ou ao exame clínico). Não é isso, propriamente, o que diz o novo § 3º do art. 277 do CTB. Como se vê, o correto não é falar em desobediência, sim, nas sanções administrativas do art. 165.
2.2 SINAIS DE ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA;
Art. 5ª da Resolução 432/2013
Os sinais de alteração da capacidade psicomotora poderão ser verificados por:
I - exame clínico com laudo conclusivo e firmado por médico perito; ou
II - constatação, pelo agente da Autoridade de Trânsito, dos sinais de alteração da capacidade psicomotora nos termos do Anexo II.
§ 1º Para confirmação da alteração da capacidade psicomotora pelo agente da Autoridade de Trânsito, deverá ser considerado não somente um sinal, mas um conjunto de sinais que comprovem a situação do condutor.
§ 2º Os sinais de alteração da capacidade psicomotora de que trata o inciso II deverão ser descritos no auto de infração ou em termo específico que contenha as informações mínimas indicadas no Anexo II, o qual deverá acompanhar o auto de infração.
Quando ingressamos nesse terreno dos “sinais indicadores da alteração psicomotora” o subjetivismo é quase que absoluto, cabendo considerar cada pessoa, cada caso. Aquele automatismo que se pretende contra o motorista que fez exame de sangue (ou etilômetro) desaparece. Sai a matemática e entra o singularismo de cada caso.
3. CONLUSÃO
A quantificação de álcool no sangue (em relação aos motoristas que fizeram o exame ou o teste) é apenas um dos sinais indicativos da embriaguez. Mas uma coisa é provar a embriaguez e outra distinta é o grau de alteração da capacidade psicomotora do agente assim como a forma como ele conduzia o veículo, sob a influência do álcool (ou outra substância psicoativa). O legislador de 2012 abandonou o critério do perigo abstrato puro (ou presumido), na medida em que o caput do artigo 306 não apresenta nenhum dado numérico.
O que está previsto no novo artigo 306 é o perigo abstrato de perigosidade real, que exige a comprovação efetiva da alteração da capacidade psicomotora do agente assim como uma condução anormal (por exemplo, um zigue-zague, uma batida em outro veículo etc.), que é da essência do crime de dirigir sob a influência de substância psicoativa.
Fora disso, estamos diante de uma infração administrativa. O motorista não escapa, de forma alguma, pois vai responder por algo. Mas esse critério é muito mais justo, porque trata todos os motoristas igualmente. É o critério do caso concreto, competindo ao juiz a palavra final sobre o enquadramento do fato como infração administrativa ou como infração penal.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
. Decreto-lei 2848/40 | Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 15 – ed. – São Paulo Saraiva, 2008. Curso de Processo Penal. 19 – ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
GOMES, Luiz Flávio. 6 decigramas de álcool já significam crime? Ou não?. Jus Navigandi, Teresina, dez. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23320>. Acesso em: 12 maio. 2014
LESSA, Marcelo de Lima. A independência funcional do delegado de polícia paulista. São Paulo: Adpesp - Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, 2012.
Bacharelando do curso de Direito da Faculdade AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, José Flávio Matos. Lei Seca Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 maio 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44151/lei-seca. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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