RESUMO: O presente trabalho versa sobre a possibilidade de aplicação do direito penal ao direito ambiental e a consequente responsabilização das pessoas envolvidas, sejam elas físicas ou jurídicas, e as medidas adequadas às suas características, procurando servir como ponto de partida para este que é um assunto de extrema relevância para o meio ambiente e toda a coletividade.
Palavras-chave: Direito Ambiental. Responsabilização criminal. Sanções. Pessoas Físicas. Pessoas Jurídicas.
1. INTRODUÇÃO
Uma das maiores preocupações do homem hodiernamente é com a preservação do meio ambiente, o que o levou à criação de um novo ramo do direito, o Direito Ambiental.
A seu turno, em razão da relevância do objeto tutelado, necessitou-se, por conseguinte, haver a intervenção penal. Daí se falar em Direito Penal Ambiental. Outrossim, por ser o meio ambiente um bem difuso, alguns conceitos e princípios consagrados no Direito Penal tradicional a eles não se aplicam ou, se aplicados, devem se amoldar às especificidades e aos princípios do Direito Ambiental.
Por isso, trataremos a questão dos institutos do Direito Penal aplicáveis ao Direito Ambiental e vice-versa, o qual deve ser informando à luz de outros princípios que não só os que embasam o Direito Criminal clássico, visando dessa forma a integração das normas.
E é nesse sentido que as sanções penais ambientais deverão, portanto, apontar alternativas em face do direito positivo em vigor, ou seja, um direito positivo que ampliou as tradicionais e superadas concepções até então orientadas por um Código Penal elaborado sob a égide de um sistema constitucional que em momento algum se estruturou no Estado Democrático de Direito.
Destarte, na medida em que importa ao direito ambiental, pelo menos de forma preponderante, assegurar a incolumidade dos bens ambientais, claro está que não haveria sentido em elaborar sanções penais sem vincular a existência de crimes regrados para salvaguardar o conteúdo real da dignidade da pessoal humana: a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade, a proteção à infância, bem como a assistência aos desamparados. Estes são os valores maiores, além daqueles que se harmonizam com as demais necessidades da pessoa humana que merecerão tutela particularmente em países de estrutura jurídico-econômica capitalista.
Assim sendo, a Constituição Federal (BRASIL, 1988), em seu artigo 225, estruturou o Direito Ambiental Constitucional, definindo os critérios de proteção ao meio ambiente, tido como essencial à sadia qualidade de vida da pessoa humana e, ainda, estabeleceu de forma pioneira a possibilidade de sujeitar todo e qualquer infrator[1], ou seja, aqueles que praticam condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente a sanções penais.
Nesse sentido, entendeu por bem a Constituição Federal sujeitar qualquer infrator, seja ele pessoa física, seja ele pessoa jurídica às sanções penais ambientais, desde que observada a existência de crime ambiental, restando evidente, em face do princípio da individualização da pena, a fixação, por parte do legislador infraconstitucional, das sanções penais mais adequadas às diferentes hipóteses de responsabilidade criminal ambiental, ou seja, sanções penais para pessoas físicas, jurídicas de direito privado e jurídicas de direito público.
Todavia, inobstante o entendimento acima esposado, tenazes defensores (MENDONÇA, 201?) ainda apregoam acerca da impossibilidade de responsabilização da pessoa jurídica por crime ambiental no direito brasileiro.
Segundo sustentam, a sanção criminal, no atual modelo penal e constitucional brasileiro, é inadequada e impossível de ser posta em prática, sem jogar por terra grande parte dos direitos e garantias individuais previstos na Carta de 88, entre eles, o fundamental direito ao devido processo legal. Assevera que o nosso ordenamento jurídico-penal é todo ele subjetivo, isto é, apenas a pessoa humana pode delinquir, praticando o fato típico e antijurídico na esfera penal, diferentemente da esfera administrativa.
Finaliza o entendimento asseverando que o art. 225, § 3º, da Constituição Federal (BRASIL, 1988) deve ser interpretado de forma sistêmica, ou seja, levando em conta todo o arcabouço jurídico pátrio, já que responsabilizar a pessoa jurídica como um todo é responsabilizar uma coletividade, ferindo de morte o direito à individualização da pena.
Portanto, a pauta desse trabalho versará sobre a possibilidade de aplicação do direito penal ao direito ambiental e a conseqüente responsabilização das pessoas envolvidas, sejam elas físicas ou jurídicas, e as medidas adequadas às suas características, procurando servir como ponto de partida para este que é um assunto de extrema relevância para o meio ambiente e toda a coletividade.
2. TUTELA PENAL DO MEIO AMBIENTE
O artigo 225 da Constituição Federal (Brasil, 1988), ao estruturar o Direito Ambiental Constitucional, bem como ao definir os critérios de proteção ao meio ambiente, tido como essencial à sadia qualidade de vida da pessoa humana em obediência ao artigo 1º, III, da Constituição Federal, definiu de forma pioneira a possibilidade de sujeitar todo e qualquer infrator, ou seja, aqueles que praticam condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente a sanções penais, conforme determina de forma clara e inequívoca o primevo artigo acima citado.
Nesse sentido, segundo Milaré (2005, p. 845) o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, na sua concepção moderna, é um dos direitos fundamentais da pessoa humana, o que, por si só, justifica a imposição de sanções penais às agressões contra ele perpetradas, como extrema ratio. Em outro modo de dizer, ultima ratio da tutela penal ambiental significa que esta é chamada a intervir somente nos casos em que as agressões aos valores fundamentais da sociedade alcancem o ponto do intolerável ou sejam objeto de intensa reprovação do corpo social.
Assim, preservar e restabelecer o equilíbrio ecológico em nossos dias é questão de vida ou morte. Os riscos globais, a extinção de espécies animais e vegetais, assim como a satisfação de novas necessidades em termos de qualidade de vida, deixam claro que o fenômeno biológico e suas manifestações sobre a Terra estão sendo perigosamente alterados. Por isso, arranhada estaria a dignidade do Direito Penal caso não acudisse a esse verdadeiro clamor social pela criminalização das condutas antiecológicas.
Destaca-se que a danosidade ambiental tem repercussão jurídica tripla, já que o poluidor, por um mesmo ato, pode ser responsabilizado, alternativa ou cumulativamente, na esfera penal, na administrativa e na civil.
No âmbito civil, ato de sancionar as condutas antiambientais já era uma realidade mesmo antes da entrada em vigor da Constituição de 1988, porquanto a obrigação reparatória de danos, segundo o princípio da responsabilidade objetiva a disciplinava, desde 1981, pela Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (BRASIL, 1981).
Para a plena efetividade daquela norma programática, faltava um tratamento adequado da responsabilidade penal e administrativa, espaço este agora preenchido com a incorporação ao ordenamento jurídico da Lei 9.605 de 1988, que dispõe sobre sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
2.1 CONDUTAS E ATIVIDADES CONSIDERADAS LESIVAS AO MEIO AMBIENTE
Pois bem, regulamentada a matéria pelo legislador infraconstitucional, cabe a definição das condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente em obediência ao princípio da legalidade.
Segundo FIORILLO (2013, p. 815), o direito positivo em vigor informa que são poluidores aqueles que degradam a qualidade ambiental resultante de atividades que direita ou indiretamente:
1) prejudiquem a saúde da população;
2) prejudiquem a segurança da população;
3) prejudiquem o bem-estar da população;
4) criem condições adversas às atividades sociais;
5) criem condições adversas às atividades econômicas;
6) afetem a biota;
7) afetem as condições estéticas do meio ambiente;
8) afetem as condições sanitárias do meio ambiente;
9) lancem matérias em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;
10) lancem energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
Desta feita, aliado à autorização Constitucional para sujeitar qualquer infrator, seja ele pessoa física, seja ele pessoa jurídica, às sanções penais ambientais, desde que observada a existência de crime ambiental, resta evidente que, em face do princípio da individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal de 1988) caberá ao legislador infraconstitucional fixar as hipóteses de responsabilidade criminal ambiental: sanções penais para pessoais físicas, jurídicas de direito público e jurídicas de direito privado.
Nesta seara é que delimitaremos as exposições a seguir, esboçando as penas cabíveis às pessoas físicas e às pessoas jurídicas.
3. RESPONSABILIDADE PENAL INDIVIDUAL
Até há pouco, sustentava-se que só o ser humano, pessoa física, podia ser sujeito ativo de crime, por estar a responsabilidade penal, no sistema brasileiro, assentada na imputabilidade, definida como, segundo Bruno e Milaré (2005, p. 856) o “conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a pratica de um fato punível”.
Em outros termos, a imputabilidade exige do autor, no momento da prática delitiva, plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Eis por que a resistência do legislador brasileiro em aceitar a responsabilidade da pessoa jurídica.
Nesse sentido, destaca Milaré (2005, p. 856) que:
“O infrator da norma penal ambiental não se encaixa no perfil do criminoso comum. Em verdade, o criminoso ambiental via de regra não age individualmente, mas atua em nome de uma pessoa jurídica. Por outro lado, a atividade do infrator ambiental não se volta para o crime como um fim em si mesmo; ao contrário, a conduta delitiva ocorre como resultado de um atuar em tese até positivo e benéfico para a sociedade, que é a produção de bens. O crime ecológico, pois, nasce como um excesso, como um resíduo patológico da atividade produtiva.”
4. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA
Indo no encalço do Direito Penal moderno de superar o caráter meramente individual da responsabilidade penal até então vigente, e cumprindo promessa do artigo 225, s 3º, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), o legislador brasileiro erigiu a pessoa jurídica à condição de sujeito ativo da relação processual penal, dispondo, no artigo 3º da Lei 9.605 (BRASIL, 1998), que:
“As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativamente, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício de sua entidade” (Milaré, 2005, p. 857).
O intento do legislador, como se nota, foi punir o criminoso certo e não apenas o mais humilde eis que, via de regra, o verdadeiro delinquente ecológico não é a pessoa física, mas a pessoa jurídica que quase sempre busca o lucro como finalidade precípua.
Merece destaque, ainda, as hipóteses de relevância da omissão elencadas no artigo 13, § 2º, do Código Penal (BRASIL, 1940), que acrescentou a nova lei mais uma situação, ao estabelecer, no artigo 2º, a responsabilidade do diretor, administrador, membro de conselho e de órgão técnico, auditor, gerente, preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la. Destarte, tendo referidas pessoas o dever jurídico de agir para evitar danos ao ambiente, tornam-se, pela omissão, partícipes do fato delituoso.
No entanto, merece destaque que mesmo diante da expressa determinação legal, ainda existe posições divergentes quanto a possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica. Neste sentido podemos citar Mendonça (201?), Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o qual defende pela impossibilidade de responsabilização da pessoa jurídica por crime ambiental no direito brasileiro em artigo de mesmo nome.
Segundo o ilustre Desembargador:
“Apesar da preservação, da recuperação e da revitalização do meio ambiente constituírem uma preocupação do Poder Público e do Direito, tem que se perceber que a sanção criminal, no atual modelo penal e constitucional brasileiro, é inadequada e impossível de ser posta em prática, sem jogar por terra grande parte dos direitos e garantias individuais previstos na Carta de 88, entre eles, o fundamental direito ao devido processo legal.” (Mendonça, 201?).
Acrescenta que, com efeito, o nosso ordenamento jurídico-penal é todo ele subjetivo, isto é, apenas a pessoa humana pode delinquir, praticando o fato típico e antijurídico na esfera penal, diferentemente da esfera administrativa.
Aduz que o art. 225, § 3º, da Constituição Federal (BRASIL, 1988) deve ser interpretado de forma sistêmica, ou seja, levando em conta todo o arcabouço jurídico pátrio. Responsabilizar a pessoa jurídica como um todo é responsabilizar uma coletividade, ferindo de morte o direito à individualização da pena.
Os muitos dos componentes humanos da pessoa jurídica criminalizada podem não ter desejado o resultado danoso, não terem assumido o risco de produzi-lo e não terem agido com culpa e, mesmo assim, seriam processados sem qualquer garantia, até mesmo a do contraditório e da ampla defesa. Inegável que as pessoas jurídicas devem arcar criminalmente com os danos causados a um bem comum, que é o meio ambiente, elevado à categoria de bem comum pela Carta de 1988. Inegável também que, com a legislação em vigor, tal punição se torna impossível e inexequível.
Finaliza ser necessária uma nova legislação prevendo a responsabilidade objetiva no que diz respeito aos crimes contra o meio ambiente, conferindo a todos os entes humanos, componentes das corporações, o direito ao devido processo legal, restando, ser impossível responsabilizar a pessoa jurídica, não só por crime ambiental, mas por todo e qualquer delito no atual estágio legislativo brasileiro, reafirmando a necessidade de adequação da lei para preservar um bem comum tão precioso, que é o meio ambiente, instituindo-se em todo o sistema jurídico pátrio a responsabilidade penal objetiva das empresas.
Superada a tese acerca da impossibilidade de responsabilização da pessoa jurídica, cumpre-se apresentar as condicionantes para responsabilização da pessoa jurídica.
Segundo Milaré (2005, p. 858), o artigo 3º da Lei 9605/98 (BRASIL, 1998) determina que a responsabilidade penal da pessoa jurídica fica condicionada: (i) a que a infração tenha sido cometida em seu interesse ou benefício, (ii) por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado.
Aduz o autor que não mais se considera a pessoa jurídica apenas uma pessoa estranha aos membros que a compõem, como os dirigentes. Também se atribui a essa pessoa autoria da conduta que intelectualmente foi pensada por seu representante e materialmente executada por seus agentes, apenas com a condicionante de ter sido o ato praticado no interesse ou benefício da entidade.
Desse modo, se o ato praticado, mesmo através da pessoa jurídica, apenas violou a satisfazer os interesses do dirigente, sem qualquer vantagem ou benefício para a pessoa jurídica, essa deixa de ser o agente do tipo penal e passa a ser meio utilizado para a realização da conduta criminosa. Ao contrário, quando a conduta visa à satisfação dos interesses da sociedade, essa deixa de ser meio e passa a ser agente.
5. SANÇÕES PENAIS
A repressão às infrações penais ambientais acompanha a moldura do Direito Penal: penas privativas de liberdade, restritivas de direito e multa.
Nesse sentido, assevera Milaré (2005, p. 862) a preferência da Lei de Crimes Ambientais pelas penas restritivas de direitos e pecuniárias, não só porque apropriadas tanto às pessoas físicas como às pessoas jurídicas, como também porque a pena de prisão, em razão do perfil diferenciado do delinquente ambiental, tem-se mostrado inadequada, por impor à sociedade um duplo castigo: suportar o dano e pagar a conta do presídio.
5.1 PENAS APLICÁVEIS ÀS PESSOAS FÍSICAS
As sanções previstas para as infrações cometidas por pessoas físicas compreendem: pena privativa de liberdade, pena restritiva de direitos e multa.
5.1.1 Pena privativa de liberdade
As penas privativas de liberdade para os ilícitos penais praticados pelas pessoas físicas são as tradicionais reclusão e detenção, para os crimes, e prisão simples, para as contravenções.
Cabe ressaltar, segundo Milaré (2005, p. 863) que a maioria das novas infrações penais, pela quantidade da pena cominada, enseja a aplicação dos institutos da transação penal, suspensão do processo e suspensão condicional da pena.
5.1.2 Penas restritivas de direitos
Com os olhos postos no perfil do delinquente comum ambiental, cujo encarceramento não é aconselhável, possibilitou o legislador a aplicação de penas restritivas de direitos em substituição às privativas de liberdade.
Nesse sentido a Lei 9.605 (BRASIL, 1988) dispõe que as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as penas privativas de liberdade nos casos em que se tratar de crime culposo, ou for aplicada pena privativa de liberdade inferior a quatro anos, ou, ainda, a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime (artigo 7º, I e II).
As penas restritivas de direitos, que terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída, compreendem:
“I – Prestação de serviços à comunidade
II – Interdição temporária de direitos
III – Suspensão parcial ou total de atividades
IV – prestação pecuniária
V – recolhimento domiciliar” (BRASIL, 1988)
Anote-se, ainda, a possível conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade, em caso de descumprimento injustificado da restrição imposta ou de superveniente condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, conforme o disposto no artigo 44, §§ 4º e 5º do Código Penal (BRASIL, 1940), com a redação dada pela lei 9.714 de 1998 e diante da subsidiariedade da lei penal comum expressamente prevista no artigo 79 da Lei 9.605 de 1998.
5.1.3 Pena de Multa
A pena de multa, instrumento tradicional de exigir ações socialmente corretas para que mantenha força retributiva, será calculada segundo os critérios do Código Penal (BRASIL, 1940); se revelar ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.
Delimitada as penas aplicáveis às pessoas físicas, passemos agora ao rol de penas aplicáveis às pessoas jurídicas, senão vejamos:
5.2 PENAS APLICÁVEIS ÀS PESSOAS JURÍDICAS
Segundo Freitas, (2005, p. 417), a Lei de Crimes Ambientais não previu, nos tipos penais, as penas aplicáveis às pessoas jurídicas, estabelecendo no artigo 21 que: “As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no artigo 3º são: I – multa; II – restritivas de direitos; III – prestação de serviços à comunidade."
Aduz que, à evidencia, não será imposta pena de prisão à pessoa jurídica e como todas as infrações penais prevê a pena de multa, cumulativa ou alternativa, ao lado desta poderá ser imposta uma das penas restritivas de direito mencionado no citado artigo 21.
Desta feita, de acordo com a gravidade do fato, as consequências para o meio ambiente e a saúde pública, os antecedentes da empresa no que concerne ao cumprimento da legislação ambiental, o juiz aplicará ou não, ao lado da multa, a pena restritiva de direitos ou de prestação de serviços à comunidade.
De outra parte, assevera o citado autor, embora não tenha o legislador obedecido à técnica usual, segundo a qual a sanção vem prevista no preceito secundário da norma, tal circunstância não dificulta a sua aplicação, observando-se que não haveria necessidade de repeti-la em cada tipo.
5.2.1 Pena de multa
A pena de multa, prevista no artigo 21, I, da Lei 9.605 (BRASIL, 1998), obedece aos critérios previstos nos artigos 49 do Código Penal (BRASIL, 1940) e 18 do diploma supra citado, devendo-se, ainda, observar a situação econômica do infrator (artigo 6, III).
5.2.2 Penas restritivas de direito
Por sua vez, as penas restritivas de direitos que mantêm o caráter de penas substitutivas em relação às penas privativas de liberdade, segundo a regra do artigo 44 do Código Penal (BRASIL, 1940), em se tratando de pessoa jurídica, o uso alternativo será a regra.
Segundo o autor, tais penas encontram-se elencadas no artigo 22 e são:
“Suspensão parcial ou total das atividades: Segundo dispõe o S 1º, do artigo 22, a suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente. O dispositivo praticamente repete o artigo 11, observando-se que essa pena se mostra bastante adequada para os crimes permanentes, uma vez que fará cessar a atividade danosa. Por sua vez, como a lei não estabelece prazo para a suspensão, por analogia, dever-se-á aplicar a regra do artigo 55 do Código Penal que estabelece que as penas restritivas de direito terão a mesma duração da pena privativas de liberdade substituída;
Interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade: segundo dispõe o S 2º, do citado artigo 22, a interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar. A interdição, conforme ensina Meirelles (1999, p 172) , é o ato pelo qual a autoridade veja a alguém a pratica de atos sujeitos ao seu controle ou que incidam sobre seus bens. A interdição aqui prevista tem a mesma finalidade, com a diferença que resulta de sentença penal. Tratando-se de medida temporária, a sentença deverá fixar o prazo;
Proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações: no que concerne à proibição de contratar com o Poder Público ou dele receber subsídios, subvenções ou doações, temos que se trata de pena mais do que adequada, pois, aquele que atua sem autorização, aquele que não obedece à legislação específica, causando danos ao meio ambiente, certamente não tem condições de contratar com a Administração e muito menos dela receber qualquer espécie de benefício. A expressão poder público abrange todas as esferas administrativas direta ou indireta. O prazo da proibição, segundo dispõe o S 3º, do artigo 22, não poderá exercer dez anos. Observa-se que, com relação à pessoa física, de acordo com artigo 10 da Lei dos Crimes Ambientais, o prazo será de cinco anos, quando o crime for doloso, e de três anos, quando o crime for culposo.” (FREITAS, 2005, p.418).
Destarte, cabe observar, ainda, que ao contrário do que estabelece, o artigo 22 não prevê a proibição da pessoa jurídica condenada em participar de licitação, tal como consta do artigo 10 do mesmo diploma. Entretanto, diante do estabelecido pelo artigo 88, inciso III, combinado com o artigo 87, inciso III, da Lei 8.666 de 1993 (BRASIL, 1993), a empresa condenada pela pratica de um crime ambiental poderá ser impedida de participar de licitação.
5.2.3 Pena de prestação de serviços à comunidade
Cumpre-se registra que tal pena, na conformidade do artigo 8º, inciso I, da Lei 9.605 de 1998, e artigo 43, inciso IV, do Código Penal (BRASIL, 1940), constitui espécie das penas restritivas de direito e será imposta pelo juiz da sentença e fiscalizada pelo juiz da execução.
Trata-se de espécie da mais alta relevância para a proteção do meio ambiente, eis que vem ao encontro de uma das finalidades da lei ambiental, ou seja, a restauração e reparação do dano.
Segundo estabelece o artigo 23 da Lei de Crimes Ambientais (BRASIL, 1998), a prestação de serviços à comunidade consistirá em: “I) custeios de programas e de projetos ambientais; II – execução de obras de recuperação de áreas degradadas; III – manutenção de espaços públicos; IV – contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.”
Tais modalidades de pena, segundo Freitas (2005, p. 419), trazem um componente social bastante importante, possuindo um caráter pedagógico da mais alta relevância.
5.2.4 Custeio de programas ambientais
Em tal modalidade de pena, a sentença deverá fixar o quantum a ser despendido pela empresa para o custeio do programa ou projeto ambiental, o prazo de duração, podendo, de acordo com o disposto no artigo 66, inciso V, da Lei de Execução Penal (BRASIL, 1984), delegar ao juiz da execução a indicação do programa ou projeto.
5.2.5 Execução de obras de recuperação de áreas degradas
Como um dos efeitos da condenação é a obrigação de reparar o dano, Código Penal, artigo 91, inciso I, o juiz deverá, na medida do possível, optar pela imposição de outras sanções ao agente que provocou um dano ao meio ambiente, na medida em que ele estará obrigado a repará-lo.
Entretanto, falando a lei em recuperação de áreas degradadas e não das áreas degradadas nada impede que o magistrado indique outra área para que a empresa condenada promova a recuperação.
Outrossim, considerando que a recuperação de áreas degradadas pode demandar tempo superior ao quantum da pena prevista que, como dito, servirá de parâmetro para a fixação da pena, se mostra conveniente que o juiz estabeleça a quantia a ser desembolsada pela ré.
5.2.6 Manutenção de espaços públicos
Registre-se, em um primeiro lugar, que, por espaços públicos entendem-se os bens de uso comum do povo e de uso especial.
A sentença deverá fixar o prazo e indicar, sempre que possível, o local em que o serviço deverá ser prestado.
5.2.7 Contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas
A contribuição, que pode ser em dinheiro ou espécie, será fixada na sentença. O juiz deverá estabelecer para a fixação da prestação pecuniária prevista no artigo 12, da Lei 9.605 de 1998.
5.2.8 Da liquidação forçada da pessoa jurídica
Finalmente, segundo informa o autor, Freitas (2005, p. 420), a Lei dos Crimes Ambientais (BRASIL, 1998) prevê em seu artigo 24, a liquidação forçada da pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido no referido diploma.
Segundo dispõe o artigo supracitado, a pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta Lei, terá decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional.
A liquidação forçada, que se constitui num efeito da condenação, não se apresenta como uma novidade. O Código Penal (BRASIL, 1949) até a reforma de 1984 previa, no artigo 99, uma modalidade de medida de segurança, que consiste na interdição de estabelecimento ou sede de sociedade ou associação que servisse de meio ou pretexto para a prática de infração penal, que a ela se assemelha.
Cuida-se de medida de grande relevância para a proteção do meio ambiente, que será aplicada com observância do contraditório. Realmente a empresa constituída ou utilizada, com a finalidade preponderante de praticara ilícitos penais ambientais ou ocultá-los, deve ser liquidada, porque não cumpre seu fim social.
Seu patrimônio, segundo dispõe o citado artigo 24, será considerado instrumento de crime, e como tal, perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como acima esposado, em razão da relevância do meio ambiente, bem fundamental, é perfeitamente justificável a intervenção do Direito Penal. A previsão dos crimes de perigo, inclusive de perigo abstrato, diante da natureza do bem jurídico tutelado, se mostra adequada, favorecendo o papel dos implementadores da legislação ambiental.
Apesar de alguns senões apontados, houve inegável avanço no ordenamento jurídico ambiental com o tratamento agora mais sistêmico da tutela penal, por força da Lei 9.605/98.
Além do mais, a gestão ambiental sairá beneficiada, principalmente se a aplicação da Lei for caçada em princípios científicos e técnicos, não somente de ordem jurídica.
REFERÊNCIAS
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BRASIL, Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 01 maio 2015.
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BRASIL, Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 01 maio 2015.
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 14ª Edição. São Paulo, SP. Saraiva. 2013.
FREITAS, Gilberto Passos de. Curso Interdisciplinar de Direito Ambiental. Direito Penal Ambiental. 1ª Edição. Barueri, SP. Manole, 2005.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 14ª Edição. São Paulo, SP. Malheiros. 2006.
MENDONÇA, José Osvaldo Correa Furtado de. Da impossibilidade de responsabilização da pessoa jurídica por crime ambiental no direito brasileiro. Disponível em <http://www.ejef.tjmg.jus.br/home/files/publicacoes/artigos/642012.pdf>. Acessado em 01 maio 2015.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. Doutrina, Jurisprudência, Glossário. 4ª Edição. São Paulo, SP. Revista dos Tribunais. 2005.
[1] FIORILLO, 2013. p 809.
Graduado em Direito pela PUC MG em 2006. Oficial de Justiça - TJMG 2005/2010 - Nível médio. Analista do MPMG 2010/? - Nível Superior. Atualmente se encontra na PJ com atribuições na Execução Penal e Infância e Juventude - Infracional, tendo passado pelas Pjs de Património Público, Infância e Juventude Cível, Meio Ambiente e Cível.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MEDEIROS, Fabiano Saraiva. Da proteção penal ao Direito Ambiental: das sanções aplicáveis às pessoas físicas e às pessoas jurídicas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 ago 2015, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44923/da-protecao-penal-ao-direito-ambiental-das-sancoes-aplicaveis-as-pessoas-fisicas-e-as-pessoas-juridicas. Acesso em: 23 dez 2024.
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