RESUMO: A Constituição Federal de 1988 classifica-se como escrita, haja vista que codificada em um só texto; dogmática e democrática uma vez que foi elaborada e promulgada por uma Assembléia Nacional Constituinte; rígida, pois apresenta como forma de alteração processo legislativo mais rigoroso para aprovação de uma lei ordinária; dirigente (e também garantia), pois além de garantir direitos ainda estabelece o modo de atuação e do exercício do poder estatal; e prolixa, na medida em que abarca uma imensidão de direitos em seu texto. Em decorrência da rigidez a Carta Magna apresenta um processo legislativo mais solene para a elaboração e alteração das normas constitucionais, o que se mostra no bojo da Carta Política, notadamente no elenco trazido no artigo 60. O controle de constitucionalidade volta-se à garantia da supremacia constitucional e à fiscalização da validade das normas infraconstitucionais. O Estado brasileiro adotou predominantemente o sistema de controle de constitucionalidade jurisdicional, que pode ser exercido de maneira difusa ou concentrada, essa através de ações específicas. A inconstitucionalidade se apresenta por ação ou omissão e as formas de controle podem se efetivar de maneira preventiva ou repressiva. A apreciação de inconstitucionalidade das normas se efetiva de maneira incidental ou por via de defesa e principal ou por via de ação, a depender da situação apresentada, e os efeitos das decisões se estendem inter partes ou erga omnes. No Estado brasileiro o Supremo Tribunal Federal é o órgão jurisdicional encarregado da guarda da Constituição Federal, cabendo-lhe ainda com fundamento no princípio da segurança jurídica a importante missão de modular os efeitos das decisões em sede de controle de constitucionalidade quando flagrante o interesse público envolvido.
Palavras-chave: Constituição Federal. Controle de Constitucionalidade. Inconstitucionalidade.Validade. Normas Infraconstitucionais.
I – INTRODUÇÃO
A República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, tendo o Direito Constitucional como base do direito público interno fundamental, voltado ao estudo da Constituição e à sua interpretação no plano jurídico.
A trajetória das Constituições Brasileiras é marcada por mudanças substanciais que trouxeram alterações na concepção de Estado, merecendo destaque o fato de que somente quatro Constituições foram democráticas e livremente votadas e promulgadas por Assembléias Constituintes, essas as dos anos de 1891, 1934, 1946 e 1988, podendo-se afirmar que as demais foram objeto de atos ilegítimos de outorga.
O termo Constituição pode apresentar várias concepções ou acepções a depender dos conceitos e fundamentos empregados para sua definição haja vista a ausência de consenso doutrinário entre as diversas correntes que se debruçam sobre o tema, contudo tem-se que todas essas não se excluem, mas se complementam.
Dentro da tipologia estabilidade ou alterabilidade as Constituições mostram-se como rígidas quando exigem para sua modificação um processo legislativo mais árduo do que as normas infraconstitucionais; Constituições flexíveis, também conhecidas como plásticas, aquelas que detêm o mesmo processo de alteração das demais normas não constitucionais; Constituições semi-rígidas, que se apresentam como uma junção das Constituições rígidas e das Constituições flexíveis, possuindo em seu corpo partes de ambas.
Já no se refere à forma tem-se Constituições escritas (instrumentais) ou costumeiras (não escritas), sendo as escritas a representação de Constituição codificada em um texto único e a costumeira aquela que apresenta seu arcabouço em textos esparsos, a exemplo da Constituição Inglesa.
A Constituição Federal de 1988 é classificada como escrita, uma vez que está codificada em um só texto, e rígida haja vista que as normas constitucionais se encontram em um patamar superior ao do regramento jurídico infraconstitucional.
Dessa feita para a preservação da supremacia constitucional e como forma de garantir validade ao sistema legal instituído em concordância com os preceitos constitucionais apresenta-se o controle de constitucionalidade.
II – O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO ESTADO BRASILEIRO
2.1 – Antecedentes Históricos
O controle de constitucionalidade no Brasil apresenta-se através de um sistema complexo, influenciado por Estados estrangeiros dentre eles os Estados Unidos da América, que foram a primeira nação a consolidar um texto constitucional, precisamente no ano 1787, seguidos pela França em 1791.
Destaca-se que a nação americana também esteve na vanguarda da criação de vários institutos reguladores do exercício do poder, a exemplo do regime presidencialista de governo, da forma federativa de Estado, da declaração dos direitos individuais, além da adoção dos modelos de constituição escrita e rígida.
No ano de 1803 o célebre caso Willian Marbury vs. James Madison inaugurou no direito norte-americano o controle de constitucionalidade incidental ou difuso abrindo a possibilidade de não aplicação de lei infraconstitucional contrária ao Texto Maior.
No período Imperial regido sob forte influência do direito público europeu, notadamente inglês e francês, não houve sistematização do controle de constitucionalidade jurisdicional das leis em nosso país.
O Estado brasileiro durante esse período realizava o controle de constitucionalidade através do próprio Poder Legislativo, contudo tal sistema de fiscalização se mostrava sem efetividade diante da confusão estabelecida entre as figuras do legislador constituinte e ordinário, merecendo destaque a existência do Poder Moderador conferindo ao Imperador poder de veto suspensivo aos atos da Assembléia Geral.
Com o advento da República Velha e adoção da república como forma de governo e a federação como forma de estado, com nítida inspiração no sistema common law, a Constituição de 1891, sob inspiração de Rui Barbosa, apresentou o Poder Judiciário como órgão dissipador divergências constitucionais.
Assim a Constituição de 1891, ainda que de maneira restrita em razão da falta de instrumentos legais para o seu exercício, foi a responsável pela introdução no Estado Brasileiro do controle difuso de constitucionalidade realizado por qualquer juiz ou tribunal, observadas as regras de competência e organização judiciária.
Com a promulgação Constituição de 1934 ocorreu a manutenção do sistema de controle difuso e o estabelecimento da ação direta de inconstitucionalidade interventiva, a criação da cláusula de reserva de plenário, segundo a qual a declaração de inconstitucionalidade só poderia se efetivar pela maioria absoluta dos membros da respectiva corte e o estabelecimento da atribuição ao Senado Federal da competência para suspender a execução de lei ou ato declarado inconstitucional.
A Constituição Brasileira de 1934 é marcada por seu curto lapso existencial e por sua promulgação em meio à reformulação social sob impacto de novos processos econômicos, abandonando o sistema liberal e acenando ao absenteísmo do Poder Público.
Outorgada por Getúlio Vargas a Constituição de 1937, conhecida como constituição polaca, destaca-se por seu caráter autoritário e centralizador, permitindo ao chefe do Poder Executivo dispor sobre as matérias, inclusive emendas constitucionais, através de decretos-leis.
Embora tenha mantido o sistema difuso de controle constitucionalidade, a Constituição de 1937 permitia ao Presidente da República intervir nas decisões do Poder Judiciário quando da declaração de inconstitucionalidade admitindo a submissão da decisão ao Parlamento para reexame, o que reforça o imenso fortalecimento do Poder Executivo.
Com a redemocratização e reconstitucionalização do Estado brasileiro foi promulgada a Constituição de 1946, que retoma o tradicional sistema de controle de constitucionalidade previsto na Constituição de 1934 e ameniza a centralização do poder outrora conferido ao Executivo.
Entre os institutos de controle de constitucionalidade presentes na Constituição de 1946 destacam-se a representação para intervenção da União nos Estados e destes nos municípios; a possibilidade de o Senado de suspender, no todo ou em parte, a execução de leis ou decretos inconstitucionais por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal; o recurso extraordinário das causas decididas em única ou última instância por outros juízes ou tribunais e o princípio da reserva de plenário.
Já com o advento da emenda constitucional nº 16, em 26.11.1965, apresentou-se uma nova modalidade de ação direta de inconstitucionalidade, de competência originária do Supremo Tribunal Federal, e voltada ao julgamento de representação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, proposta exclusivamente pelo Procurador-Geral da República.
A Constituição de 1967 e a emenda constitucional nº 1/69 mantiveram as disposições sobre o controle de constitucionalidade encontradas na Constituição de 1946, com destaque para a mudança de atuação do Supremo Tribunal Federal, que passou a dispensar a comunicação do Senado Federal das decisões proferidas nas representações de inconstitucionalidade, reservando a cientificação somente para os casos de reconhecimento incidental de inconstitucionalidade.
Em 1985 foi convocada a Assembléia Nacional Constituinte que foi a responsável pela elaboração da Constituição 1988, vigente no Brasil.
A Constituição de 1988 pouco alterou a o formato do Poder Judiciário em relação aos últimos anos da ditadura militar, contudo merece ressalta-se o fato de que o Supremo Tribunal Federal perdeu as atribuições referentes à guarda da legislação federal, passando esse múnus ao Superior Tribunal de Justiça.
Insta destacar que a Constituição de 1988 ampliou a legitimação para propositura da representação de inconstitucionalidade encerrando o monopólio exercido pelo Procurador-Geral da República, assim como estabeleceu a possibilidade de controle de constitucionalidade por omissão legislativa e concedeu aos Estados a possibilidade de instituírem a representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual.
A Ação Declaratória de Constitucionalidade foi instituída através da emenda constitucional 03/93, que também manteve as disposições afetas à previsão da ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental).
Já com a reforma do Poder Judiciário efetivada através da emenda constitucional 45/2004 a legitimidade para propositura de Ação Declaratória de Constitucionalidade e Ação Direta de Inconstitucionalidade se uniformizou, assim como foi estendido o efeito vinculante previsto anteriormente somente para a Ação Declaratória de Constitucionalidade para a Ação Direta de Inconstitucionalidade em consagração à idéia de ambivalência entre as duas ações.
Pontofinalizando tem-se que a Constituição de 1988 firmou o entendimento de que o Supremo Tribunal Federal ficaria restrito ao controle jurisdicional de constitucionalidade de forma incidental e ao controle concentrado exercendo papel de legislador negativo, suspendendo os efeitos da norma considerada inconstitucional e declarando a omissão legislativa.
2.2 – O Controle de Constitucionalidade no Estado Brasileiro
O controle de constitucionalidade é o mecanismo criado pelo constituinte originário com vistas a promover e verificar a adequação e compatibilidade de um ato normativo ou legislativo à lei e à Constituição.
A partir do conceito de controle de constitucionalidade pode-se afirmar que qualquer ato normativo que contrariar a Lei Fundamental será declarado inconstitucional, dada a supremacia da Constituição Federal frente às normas infraconstitucionais, que, conforme escala estabelecida na pirâmide jurídica de Hans Kelsen, se encontram em patamar inferior.
Para o exercício do controle de constitucionalidade e, via de conseqüência, garantia da supremacia constitucional pressupõe-se a existência de uma constituição rígida e da previsão no texto fundamental de competência e legitimidade para sua efetivação, através da formação de um sistema.
A inconstitucionalidade pode se apresentar por ação ou por omissão e, atualmente, no Estado Democrático de Direito Brasileiro todos os poderes têm o dever de controlar a constitucionalidade das leis e atos normativos, muito embora o Poder Judiciário seja seu principal ator, agindo de forma repressiva, enquanto os demais poderes, via de regra, atuam de forma preventiva.
No caso do Poder Legislativo vislumbra-se o exercício do controle de constitucionalidade através do exame pelas comissões de constituição e justiça de projetos de lei a serem submetidos à aprovação pelos plenários dos respectivos órgãos legiferantes.
Quanto ao Poder Executivo o controle de constitucionalidade se efetiva através do veto jurídico que possui expressa previsão constitucional no §1º do artigo 66 da Carta Magna, exercido quando o chefe do executivo considerar o projeto lei, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público.
Conforme já ressaltado o controle de constitucionalidade no Estado brasileiro é exercido precipuamente pelo Poder Judiciário, mantendo esse poder a exclusividade do controle repressivo da validade das normas infraconstitucionais frente à Constituição Federal, quando o advento da norma no ordenamento jurídico já se consolidou.
Contudo no ordenamento jurídico pátrio existem duas exceções a esta regra, a exemplo do artigo 49, V, da Constituição Federal que confere ao Congresso Nacional a competência exclusiva para sustar atos normativos do Poder Executivo que extrapolem o poder regulamentar ou os limites da delegação legislativa.
Das disposições do artigo 62, §5º, da Lei Fundamental depreende-se a segunda possibilidade de controle repressivo de constitucionalidade exercido pelo Poder Legislativo consistente na apreciação pelo Congresso Nacional do atendimento dos pressupostos constitucionais das medidas provisórias, em juízo prévio, antes da análise do mérito.
O controle de constitucionalidade no cenário jurídico mundial é efetivado através de três principais modelos: o controle concreto, de inspiração norte-americana e consagrado pelo famoso caso Marbury vs Madison, no século XIX, que representou importante avanço no reconhecimento da supremacia constitucional e na possibilidade de acionamento do Poder Judiciário para aplicar a Constituição em casos concretos.
Já nos idos de 1920 surgiu na Áustria o controle abstrato de constitucionalidade idealizado por Hans Kelsen, que se firmava na ideia de existência de um Tribunal Constitucional com atribuição exclusiva de apreciar a constitucionalidade de uma norma em tese, diferentemente do sistema norte-americano que se voltava à análise de casos concretos.
Destaca-se ainda a existência do controle preventivo, de inspiração francesa, no qual um Conselho Constitucional, desde que devidamente provocado, poderia analisar a constitucionalidade de uma norma ainda não promulgada.
A República Federativa do Brasil adotou o sistema de controle misto de constitucionalidade, no qual foram aglutinadas as diretrizes dos métodos concentrado e difuso, constituindo-se em um dos únicos países a utilizarem esse meio de controle.
2.2.1 – Controle Difuso de Constitucionalidade
O controle difuso, incidental ou por via de exceção, se apresenta como um meio de controle a ser exercido por qualquer juiz ou tribunal do Poder Judiciário que, ao analisar um caso concreto, pode averiguar a compatibilidade de uma determinada norma à Constituição Federal.
Esse meio de controle apresenta-se de forma incidental e prejudicialmente ao exame do mérito, tendo por objeto a tutela de um direito concreto, individual ou coletivo, que para ser apreciada demanda a averiguação pelo órgão jurisdicional da questão de constitucionalidade suscitada.
Destaca-se que o controle difuso de inconstitucionalidade não tem como o principal objetivo a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo uma vez que se apresenta apenas como causa de pedir. Para os autores pode ser arguida através de mandado de segurança, habeas corpus e demais ação judiciais, enquanto para o réu por ocasião do oferecimento de defesa.
A decisão proferida em sede de controle difuso de constitucionalidade produz efeito somente em relação às partes envolvidas na relação processual e uma vez declarada a inconstitucionalidade, em sede de recurso extraordinário, o Supremo Tribunal Federal faz comunicação ao Senado Federal com vistas à adoção de medidas para a suspensão da executoriedade do ato normativo eivado de inconstitucionalidade.
O professor André Puccineli Júnior ao discorrer sobre o controle difuso de constitucionalidade preleciona:
O controle difuso de constitucionalidade, que foi implantado no Brasil em 1891 sob nítida inspiração americana, distribui a todos os juízes e tribunais o poder de declarar incidentalmente, por ocasião do julgamento das causas que lhe são afetas, a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo de qualquer esfera de governo.
O objetivo principal da fiscalização difusa não é o invalidar normas jurídicas, mas o de resolver litígio pendente sobre um interesse subjetivo qualquer, razão por que eventual reconhecimento de inconstitucionalidade normativa fará lei apenas entre as partes do processo. (PUCCINELLI JÚNIOR, 2013, p.142).
2.2.2 – Controle Concentrado de Constitucionalidade
Já o controle concentrado de constitucionalidade, também conhecido como abstrato e por via de ação, possui raízes históricas alemãs, e se apresenta como meio de controle que visa a invalidação de lei ou ato normativo, sendo conferido a um único órgão, no caso do Estado brasileiro ao Supremo Tribunal Federal, que conforme expressa disposição constitucional tem como competência precípua a guarda da Constituição.
Em sede de controle concentrado de constitucionalidade vislumbra-se que o objeto da ação, proposta diretamente no Supremo Tribunal Federal, é a própria declaração de inconstitucionalidade ou constitucionalidade de lei ou ato normativo, e a decisão apresenta efeitos erga omnes, gerando a inaplicabilidade do ato declarado inconstitucional.
Outro destaque do controle de constitucionalidade em abstrato é a existência de rol taxativo de legitimados, previsto expressamente no artigo 103 da Constituição Federal.
Nesse diapasão ensina Pedro Lenza:
Ao contrário da via de exceção ou defesa, pela qual o controle (difuso) se verificava em casos concretos e incidentalmente ao objeto principal da lide, no controle concentrado a representação de inconstitucionalidade, em virtude de ser em relação a um ato normativo em tese, tem por objeto principal a declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo impugnado. O que se busca saber, portanto, é se a lei (lato sensu) é inconstitucional ou não, manifestando-se o Judiciário de forma específica sobre o aludido objeto. (LENZA, 2009, p.191)
A Constituição Federal de 1988 estabelece diversas formas para exercício do controle abstrato de constitucionalidade a exemplo da Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental e Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) volta-se à declaração de inconstitucionalidade em tese de lei ou ato normativo federal ou estadual em face da Constituição Federal, possui rol de legitimados elencado no artigo 103 da Lei Fundamental e seu procedimento está previsto da Lei 9.868/99.
Ainda no que diz respeito à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) merece destaque o fato de que a decisão proferida no bojo de seus autos, via de regra, produz efeitos retroativos (ex tunc), oponíveis erga omnes e vinculantes aos demais órgãos da Administração Pública e do Poder Judiciário, sendo possível a modulação dos seus efeitos por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse público (art. 27 da Lei 9868/99).
O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) é de competência originária do Supremo Tribunal Federal, e em se tratando de arguição de inconstitucionalidade de lei estadual ou municipal em face da Constituição Estadual, conforme expressa disposição legal, é atribuída competência originária aos Tribunais de Justiça dos Estados.
Segundo a doutrina de Dimitri Dimoulis e Soraya Lunardi:
Objetivo geral da ADIn é impedir que norma contrária à Constituição permaneça no ordenamento jurídico, comprometendo a regularidade do sistema normativo por violar a supremacia constitucional. Procura-se, dessa forma, assegurar que a norma constitucional será imposta inclusive em relação aos poderes estatais. A aplicação de atos normativos inconstitucionais costumam ter grande repercussão social gera danos de difícil reparação, sendo recomendada sua eliminação célere e definitiva. (DIMOULIS & LUNARDI, 2013, p.97)
Já a Ação de Declaratória de Constitucionalidade (ADC) tem por objeto a declaração da constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, buscando o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade de determinado regramento atacado por juízes e tribunais inferiores.
Os legitimados para a propositura da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) são os mesmos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e sua decisão possui efeito erga omnes e vinculantes aos demais órgãos administrativos e judiciários, conduzindo à efetiva aplicação da norma objeto de análise.
Insta salientar que em caso de improcedência da Ação Declaratória de Constitucionalidade o Supremo Tribunal Federal, a exemplo do caso de procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade, poderá promover a modulação dos efeitos da decisão com vistas ao atendimento de excepcional interesse público e por razões de segurança jurídica.
Como requisito para o ajuizamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade exige-se a existência de relevante controvérsia jurisprudencial passível de justificar o exercício dessa modalidade de controle de constitucionalidade devendo ser apresentadas concomitantemente à petição inicial as teses contrárias e favoráveis ao ato normativo impugnado.
Sobre a relevante controvérsia judicial ou jurisprudencial a justificar o ajuizamento da ação declaratória de constitucionalidade ensinam Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:
Constitui pressuposto para o ajuizamento da ADC a existência de controvérsia judicial que esteja pondo em risco a presunção de constitucionalidade da lei ou ato normativo.
A controvérsia deverá ser demonstrada na petição inicial, pela indicação da existência de ações em andamento em juízos ou tribunais inferiores em que a constitucionalidade da lei esteja sendo impugnada, e deverão ser levados ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal os argumentos pró e contra a constitucionalidade da norma, possibilitando que essa Corte uniformize o entendimento sobre a sua legitimidade. (PAULO & ALEXANDRINO, 2010, p.132/133)
A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão tem assento legal no artigo 103, §2°, da Carta Magna e tem por objetivo suprir a omissão dos poderes constituídos que deixaram de elaborar norma regulamentadora que viabilizaria o pleno exercício de direitos e garantias constitucionais.
Assim como as demais ações de controle de constitucionalidade acima explanadas a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão tem seus legitimados elencados no artigo 103 da Lei Fundamental e declarada a omissão legislativa caracteriza-se judicialmente a mora, gerando efeito erga omnes e ex tunc.
Muito embora declarada judicialmente a omissão legislativa essa decisão do Supremo Tribunal Federal só apresenta caráter mandamental em casos de omissão de um órgão administrativo, subordinado e sem função política, conferindo ao responsável pela elaboração o prazo de trinta dias para sua edição, sob pena de responsabilização, inclusive, criminal, por crime de desobediência.
Porém caso a mora seja do Poder Legislativo o caráter da decisão proferida da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão é de mera advertência, sendo certo que o Supremo Tribunal Federal não pode substituir a atuação do órgão estatal moroso sob pena de ferir o Princípio da Separação dos Poderes.
Sobre a Ação de Inconstitucionalidade por Omissão preleciona o doutrinador André Puccinelli Júnior:
Bem se vê que ela não busca assegurar a ninguém a fruição concreta de um direito subjetivo. Pelo contrário, a procedência da ação, longe de possibilitar o usufruto imediato de uma prestação material, converte-se em mera advertência para que o órgão remisso adote as medidas tendentes a conferir plena exeqüibilidade ao texto constitucional. Dito de outro modo: a ação sub examinen, diferentemente do mandado de injunção, não persegue interesse subjetivo ou direito concreto, mas limita a impulsionar o processo de elaboração de normas abstratas e gerais, reforçando a aplicabilidade dos preceitos constitucionais (PUCCINELLI JÚNIOR, 2013, p.173).
Com previsão constitucional no artigo 102, §1°, e regulamentação prevista na Lei 9882/99, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) constitui-se em um mecanismo inovador na fiscalização da constitucionalidade, possibilitando o controle concentrado de leis municipais, além do controle de constitucionalidade dos atos não normativos e de atos anteriores à promulgação da Lei Maior.
O Supremo Tribunal Federal até a promulgação da Lei 9.882/99 considerava as disposições do artigo 102, §1º, da Constituição Federal como norma de eficácia limitada e, portanto, pendente de regulamentação, o que obstaculizava a apreciação dessa ação constitucional.
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental apresenta a espécie autônoma e a incidental e tem como legitimados o mesmo rol previsto no artigo 103 da Constituição Federal, havendo divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto a legitimidade para propositura da ADPF Incidental haja vista o veto presidencial ao artigo 2°, II, da Lei 9.882/99, que concedia a qualquer cidadão lesado por ato público a possibilidade de seu ajuizamento.
A exemplo da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional, o Supremo Tribunal Federal também não apresentou um conceito específico de preceito fundamental, o que tem ficado a cargo da doutrina e da jurisprudência, reservando-se a Corte Maior a análise de cada caso concreto a verificação da presença ou não do preceito fundamental.
Segundo a doutrina de André Puccinelli Júnior:
Enquanto o STF não se pronunciar em definitivo a respeito do tema, parece-nos justo entender por preceitos fundamentais os princípios fundamentais dos arts. 1º a 4º, os princípios sensíveis do artigo 34, os direitos e garantias fundamentais e as demais cláusulas pétreas. (PUCCINELLI JÚNIOR, 2013, p.179).
Ademais a decisão proferida em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental tem efeito vinculante em relação de demais órgãos do Poder Público e alcance erga omnes, podendo o Supremo Tribunal Federal por maioria qualificada de 2/3 de seus membros e por razões de segurança jurídica e excepcional interesse público promover a modulação de seus efeitos, assim como ocorre com na Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Dentre as Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental já ajuizadas merece destaque a ADPF nº 45, de relatoria do ministro Celso de Mello, que voltou-se à discussão da legitimidade constitucional do controle e da intervenção do Poder Judiciário em tema de implementação de políticas públicas, quando configurada abusividade governamental. Essa ADPF foi extinta em razão da perda superveniente do objeto uma vez que a omissão motivadora de seu ajuizamento foi suprida durante o seu trâmite.
E a ADPF nº 54, de relatoria do ministro Marcelo Aurélio, que tinha por objetivo a interpretação conforme a Constituição Federal dos dispositivos do Código Penal para declarar inconstitucional a interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto de anencefálo é conduta tipificada nos artigos 124, 126, 128, incisos I e II do Código Penal, essa com julgado final de procedência em 2012.
Segundo o ministro Luis Roberto Barroso:
Os casos expostos demonstram que, a despeito das desconfianças iniciais e do longo lapso de tempo decorrido até sua regulamentação, a arguição de descumprimento de preceito fundamental vem se tornado um instrumento valioso de tutela dos direitos fundamentais. (BARROSO, 2011, p.342).
A Ação de Inconstitucionalidade Interventiva tem por objetivo o restabelecimento da ordem constitucional do Estado e do Município e a defesa da Constituição Federal para resguardar concretamente a observação dos princípios constitucionais sensíveis, previstos no artigo 34, inciso VII.
Essa modalidade de ação constitucional é decorrente da forma federativa de Estado, inserida na Constituição Federal de 1988 dentre as cláusulas pétreas, que embora assegure aos Estados membros, ao Distrito Federal e aos Municípios autonomia política, administrativa e financeira, possibilita a intervenção do ente superior como medida de caráter sancionatório em caso de violação aos princípios sensíveis.
Como é sabido a intervenção de um ente federativo em outro é medida excepcional e só se apresenta em situações atípicas havendo previsão legal de intervenção da União nos Estados Membros, Distrito Federal e dos Municípios situados nos Territórios; e dos Estados em seus Municípios, respectivamente nos artigos 34 e 35 da Carta Magna.
A ação de inconstitucionalidade interventiva apresenta-se em duas modalidades: federal e estadual e constitui-se em pressuposto para decretação da intervenção, nas situações elencadas no texto constitucional.
A legitimidade para propositura da Ação de Inconstitucionalidade Interventiva federal é exclusiva do Procurador-Geral da República, tem previsão constitucional expressa no artigo 36, inciso III, e sua apreciação é da competência do Supremo Tribunal Federal.
Já a Ação de Inconstitucionalidade Interventiva estadual deve ser proposta perante os Tribunais de Justiça pelo Procurador-Geral de Justiça, legitimado exclusivo, conforme se infere das disposições do artigo 129, IV, da Constituição Federal.
O objeto da Ação de Inconstitucionalidade Interventiva federal volta-se não só à declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo estadual, mas também a decretação de intervenção no Estado, apresentando-se como um dos poucos exemplos do exercício do controle concentrado pelo Supremo Tribunal Federal no sistema difuso, ou seja, em um caso concreto.
Nesse diapasão, merecem colação as lições de Uadi Lammêgo Bulos:
Na realidade, a ação interventiva é consectária do instituto da intervenção. Isso porque se os Estados ou o Distrito Federal deixarem de acatar os princípios sensíveis estão submetidos à maior sanção política aplicada no plano federativo: a intervenção na autonomia que possuem.
Mas veja-se bem: a ação interventiva, embora seja uma medida correlata à intervenção, com ela não se confunde. Enquanto a primeira - a ação interventiva – é um mecanismo de controle abstrato da constitucionalidade, disciplinada em preceito específico (art. 34, VII), a segunda – a intervenção – é uma sanção de índole política, aplicada no âmbito do Estado Federal, e que se dessume de um plexo de normas constitucionais (arts. 34, 35 e 36) (BULLOS, 2012, p. 655).
No âmbito estadual a ação de inconstitucionalidade interventiva tem como objeto a apreciação de lei ou ato normativo municipal que violem os princípios sensíveis insculpidos na Constituição Estadual e o provimento da execução das leis e das decisões judiciais
III – CONSIDERAÇÕES FINAIS
O final do século XVIII foi marcado pelo surgimento das Constituições escritas nos países da Europa e da América em decorrência da ruptura dos regimes anteriores, predominantemente autoritários e monarquistas.
Com o fortalecimento do constitucionalismo passou-se a limitar o poder do Estado com o estabelecimento de Constituições rígidas, que exigiam procedimento diferenciado para a alteração do Texto Maior.
Bem assim com o objetivo de garantir a supremacia constitucional e conferir a validade aos atos normativos infraconstitucionais frente à Constituição surgiu o controle de constitucionalidade, sistema que apresenta variações estruturais de Estado para Estado, a exemplo do momento de controle, órgão responsável pela análise, efeitos das decisões e outros.
O Estado Brasileiro adota o sistema de controle de constitucionalidade misto ou híbrido consistente na possibilidade de exercício do controle por via incidental ou difusa e por via principal ou concreta, essa de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal.
Destaca-se ainda que no Brasil o controle de constitucionalidade é exercido precipuamente pelo Poder Judiciário, contudo a própria Carta Magna estabeleceu hipóteses de controle a serem exercidas pelos outros poderes, de forma preventiva ou repressiva e no plano concreto e abstrato.
Durante o pressente estudo restou constatada a importância do controle de constitucionalidade para a plena garantia do estado democrático de direito e para o fortalecimento da Constituição, assim como reveladas as peculiaridades do sistema adotado no país.
Tem-se que o controle de constitucionalidade deve ser exercido por todos os poderes legalmente constituídos e pelo Supremo Tribunal Federal, em ultima ratio, e simbolicamente por todos os cidadãos mediante atuação política e fiscalização constante da aplicação das normas constitucionais de forma a coibir violações e abusos.
Pontofinalizando, merecem destaque as lições de Konrad Hesse, citadas na obra doutrinador Elival da Silva Ramos:
A resposta à indagação sobre o futuro do nosso Estado é uma questão de poder ou um problema jurídico depende da preservação e do fortalecimento da força normativa da Constituição, bem como de seu pressuposto fundamental, a vontade de Constituição. Essa tarefa foi confiada a todos nós. (RAMOS apud HESSE, 2012, p. 487).
BARROSO, Luís Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011.
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2012.
DIMOULIS, Dimitri & LUNARDI, Soraya. Curso de Processo Constitucional. Controle de Constitucionalidade e Remédios Constitucionais. 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2013.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado.13ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009.
MENDES, Gilmar Ferreira.COELHO, Inocênio Mártires.BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4ª edição.São Paulo:Saraiva, 2009.
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo. Controle de Constitucionalidade. 9ª edição. São Paulo: Método, 2010.
PUCINELLI JÚNIOR, Curso de Direito Constitucional. 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 2013.
RAMOS, Elival da Silva. Controle de Constitucionalidade no Brasil perspectivas de evolução. edição. São Paulo: Saraiva, 2010.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.36ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013.
WWW.TJRJ.JUS.BR, Breve História do Controle de Constitucionalidade. Nagib Slaibi Filho, Banco de Conhecimento, 16/07/2008.
Graduada em Direito pela Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC/BARBACENA. Oficiala de Justiça - TJMG 2003/2010. Analista do Ministério Público de Minas Gerais 2010.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Fernanda Iatarola Barbosa. O controle de constitucionalidade no estado brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 set 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45128/o-controle-de-constitucionalidade-no-estado-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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